Ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central

Opinião|Possibilidade de recessão nos EUA gera instabilidade no mercado e afeta o crescimento global


Quem estiver pensando em comandar o Brasil a partir de 2023 precisa levar em conta a inflação mundial nos seus planos e promessas

Por Henrique Meirelles

A inflação é um fenômeno mundial no momento, uma consequência de dois anos de pandemia de covid-19. No Brasil, a taxa anual está perto de ficar acima de dois dígitos pelo segundo ano consecutivo. No Reino Unido, está em 9,1%, a maior em 40 anos – a alta no custo de vida motivou a maior greve de trens em 30 anos, na semana passada. Nos Estados Unidos, a inflação está em 8,5%, a maior desde 1981. Uma das razões para os aumentos de preços é a desorganização das cadeias produtivas. A outra, sobre a qual vou tratar hoje, é oposta à escassez que eleva preços: os efeitos da abundância de recursos injetados pelos governos. 

O caso emblemático é o dos Estados Unidos. O governo Joe Biden colocou em prática um pacote de estímulos de US$ 1,9 trilhão. É uma quantidade enorme de dinheiro. As consequências ainda não são totalmente visíveis. Por enquanto, apareceu a inflação. O Fed iniciou um movimento de elevação e terá de subir substancialmente os juros, após anos de taxas baixas. Avisou que promoverá novas elevações para trazer a inflação à meta de 2%.

Joe Biden Foto: Andrew Harnik/ AP
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Muita gente me pergunta se teremos uma repetição do que ocorreu no início dos anos 1980. O então presidente do Fed, Paul Volcker, elevou os juros a 20% para controlar a inflação, o que fez quebrar economias de países “em desenvolvimento” (ainda não havia o termo “emergentes”) endividados em dólar, como o Brasil. Eu respondo: não há comparação. Volcker assumiu um Fed que havia sido leniente para atender às vontades do presidente Richard Nixon. 

O problema agora é fiscal, agravado pela desorganização gerada pela pandemia. É mais complexo de lidar. O governo Biden está gastando demais e a economia americana dá sinais de superaquecimento. Há risco de formação de bolhas. O problema clássico já aparece: a taxa de desemprego está em 3,6%, o que significa falta de mão de obra em alguns setores e regiões. Empresas podem diminuir a produção por falta de pessoal. Soa favorável ao trabalhador, mas a inflação corrói os salários na outra ponta. Não existe inflação benigna. Por isso, o Fed tem de elevar os juros, mesmo sob o risco de causar uma recessão. 

O Brasil de hoje tem reservas de US$ 340 bilhões, o que permite aguentar alguns desaforos (externos e, mais comumente, internos). Mas a possibilidade de recessão nos Estados Unidos gera instabilidade no mercado, aumenta o custo do dinheiro e, em última análise, afeta o crescimento global. Quem estiver pensando em comandar o Brasil a partir de 2023 precisa levar esse novo cenário em conta nos seus planos e promessas. 

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* EX-PRESIDENTE DO BC E EX-MINISTRO DA FAZENDA

A inflação é um fenômeno mundial no momento, uma consequência de dois anos de pandemia de covid-19. No Brasil, a taxa anual está perto de ficar acima de dois dígitos pelo segundo ano consecutivo. No Reino Unido, está em 9,1%, a maior em 40 anos – a alta no custo de vida motivou a maior greve de trens em 30 anos, na semana passada. Nos Estados Unidos, a inflação está em 8,5%, a maior desde 1981. Uma das razões para os aumentos de preços é a desorganização das cadeias produtivas. A outra, sobre a qual vou tratar hoje, é oposta à escassez que eleva preços: os efeitos da abundância de recursos injetados pelos governos. 

O caso emblemático é o dos Estados Unidos. O governo Joe Biden colocou em prática um pacote de estímulos de US$ 1,9 trilhão. É uma quantidade enorme de dinheiro. As consequências ainda não são totalmente visíveis. Por enquanto, apareceu a inflação. O Fed iniciou um movimento de elevação e terá de subir substancialmente os juros, após anos de taxas baixas. Avisou que promoverá novas elevações para trazer a inflação à meta de 2%.

Joe Biden Foto: Andrew Harnik/ AP

Muita gente me pergunta se teremos uma repetição do que ocorreu no início dos anos 1980. O então presidente do Fed, Paul Volcker, elevou os juros a 20% para controlar a inflação, o que fez quebrar economias de países “em desenvolvimento” (ainda não havia o termo “emergentes”) endividados em dólar, como o Brasil. Eu respondo: não há comparação. Volcker assumiu um Fed que havia sido leniente para atender às vontades do presidente Richard Nixon. 

O problema agora é fiscal, agravado pela desorganização gerada pela pandemia. É mais complexo de lidar. O governo Biden está gastando demais e a economia americana dá sinais de superaquecimento. Há risco de formação de bolhas. O problema clássico já aparece: a taxa de desemprego está em 3,6%, o que significa falta de mão de obra em alguns setores e regiões. Empresas podem diminuir a produção por falta de pessoal. Soa favorável ao trabalhador, mas a inflação corrói os salários na outra ponta. Não existe inflação benigna. Por isso, o Fed tem de elevar os juros, mesmo sob o risco de causar uma recessão. 

O Brasil de hoje tem reservas de US$ 340 bilhões, o que permite aguentar alguns desaforos (externos e, mais comumente, internos). Mas a possibilidade de recessão nos Estados Unidos gera instabilidade no mercado, aumenta o custo do dinheiro e, em última análise, afeta o crescimento global. Quem estiver pensando em comandar o Brasil a partir de 2023 precisa levar esse novo cenário em conta nos seus planos e promessas. 

* EX-PRESIDENTE DO BC E EX-MINISTRO DA FAZENDA

A inflação é um fenômeno mundial no momento, uma consequência de dois anos de pandemia de covid-19. No Brasil, a taxa anual está perto de ficar acima de dois dígitos pelo segundo ano consecutivo. No Reino Unido, está em 9,1%, a maior em 40 anos – a alta no custo de vida motivou a maior greve de trens em 30 anos, na semana passada. Nos Estados Unidos, a inflação está em 8,5%, a maior desde 1981. Uma das razões para os aumentos de preços é a desorganização das cadeias produtivas. A outra, sobre a qual vou tratar hoje, é oposta à escassez que eleva preços: os efeitos da abundância de recursos injetados pelos governos. 

O caso emblemático é o dos Estados Unidos. O governo Joe Biden colocou em prática um pacote de estímulos de US$ 1,9 trilhão. É uma quantidade enorme de dinheiro. As consequências ainda não são totalmente visíveis. Por enquanto, apareceu a inflação. O Fed iniciou um movimento de elevação e terá de subir substancialmente os juros, após anos de taxas baixas. Avisou que promoverá novas elevações para trazer a inflação à meta de 2%.

Joe Biden Foto: Andrew Harnik/ AP

Muita gente me pergunta se teremos uma repetição do que ocorreu no início dos anos 1980. O então presidente do Fed, Paul Volcker, elevou os juros a 20% para controlar a inflação, o que fez quebrar economias de países “em desenvolvimento” (ainda não havia o termo “emergentes”) endividados em dólar, como o Brasil. Eu respondo: não há comparação. Volcker assumiu um Fed que havia sido leniente para atender às vontades do presidente Richard Nixon. 

O problema agora é fiscal, agravado pela desorganização gerada pela pandemia. É mais complexo de lidar. O governo Biden está gastando demais e a economia americana dá sinais de superaquecimento. Há risco de formação de bolhas. O problema clássico já aparece: a taxa de desemprego está em 3,6%, o que significa falta de mão de obra em alguns setores e regiões. Empresas podem diminuir a produção por falta de pessoal. Soa favorável ao trabalhador, mas a inflação corrói os salários na outra ponta. Não existe inflação benigna. Por isso, o Fed tem de elevar os juros, mesmo sob o risco de causar uma recessão. 

O Brasil de hoje tem reservas de US$ 340 bilhões, o que permite aguentar alguns desaforos (externos e, mais comumente, internos). Mas a possibilidade de recessão nos Estados Unidos gera instabilidade no mercado, aumenta o custo do dinheiro e, em última análise, afeta o crescimento global. Quem estiver pensando em comandar o Brasil a partir de 2023 precisa levar esse novo cenário em conta nos seus planos e promessas. 

* EX-PRESIDENTE DO BC E EX-MINISTRO DA FAZENDA

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