RIO - A indústria brasileira iniciou o segundo semestre no vermelho. A produção recuou 0,6% em julho ante junho, após ter ficado estagnada no mês anterior, segundo os dados da Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física divulgados nesta terça-feira, 5, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“O desempenho da produção industrial reflete o aperto monetário e condições financeiras restritivas, o que interfere nas decisões de consumo e investimento da economia”, avaliou a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em comunicado.
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“No que tange ao custo do crédito, mesmo com o relaxamento da política monetária iniciado na última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central), o setor deverá sentir os efeitos somente em 2024. Além disso, soma-se a esse quadro desafiador a desaceleração global, sobretudo em virtude de taxa de juros elevadas nas principais economias.”
Na passagem de junho para julho, houve perdas em 15 dos 25 ramos pesquisados industriais pelo IBGE, com destaque para as retrações em veículos automotores (-6,5%), indústrias extrativas (-1,4%), equipamentos de informática (-12,1%) e máquinas e equipamentos (-5,0%).
Setores sensíveis aos juros tiveram desempenho pior do que o de categorias mais dependentes da renda na produção industrial de julho, destacou a gestora de recursos G5 Partners, em relatório.
“Essa dicotomia está em concordância com o atual ciclo de política monetária, com as medidas para sustentação de renda tomadas pelo governo e com os números positivos de extração de minério de ferro, petróleo e gás natural”, explicou o economista-chefe da G5, Luís Otávio de Souza Leal.
A política monetária restritiva, com taxa básica de juros elevada, é o principal fator por trás da perda de dinamismo na produção industrial ao longo de 2023, avaliou André Macedo, gerente da pesquisa industrial do IBGE. Na série com ajuste sazonal, em comparação ao mês imediatamente anterior, a produção cresceu em apenas dois dos primeiros sete meses de 2023: março e maio.
“Na nossa visão, a indústria deve seguir em ritmo fraco até o final do ano, refletindo o impacto dos juros altos por período prolongado na economia e desaceleração global da economia”, previu Claudia Moreno, economista do C6 Bank, em comentário.
O comportamento negativo faz com que a indústria permaneça distante de recuperar as perdas recentes, lembrou André Macedo, do IBGE. A produção operava em julho em nível 0,4% abaixo do patamar de dezembro de 2022.
Ele corrobora que os juros elevados mostram impacto importante na produção industrial não apenas no que se refere às decisões de investimentos das empresas, mas também pelo lado da demanda das famílias, diante das condições mais difíceis de crédito e “inadimplência em patamares elevados”. De forma geral, a produção de bens de capital e de bens de consumo duráveis é a que está mais prejudicada.
“A taxa de juros embora tenha começado o processo de redução, o reflexo disso na economia se dá de forma bastante desfasada”, confirmou Macedo.
O pesquisador do IBGE reconhece que o aumento atual na massa de salários em circulação na economia seja benéfico para a demanda, mas ponderou que o crédito permanece restrito para a aquisição de bens mais caros, como os duráveis.
“Há melhora do mercado de trabalho, com maior incorporação de pessoas nesse mercado de trabalho, mas o processo ainda é calcado na informalidade e precarização”, opinou. “Talvez a questão relacionada à taxa de juros seja o aspecto mais importante para entender não só o resultado para este mês da produção industrial, mas esse comportamento de menor intensidade muito marcado na produção industrial ao longo de 2023.”
Em julho, a indústria brasileira operava 18,7% aquém do pico alcançado em maio de 2011. A produção de bens de capital estava 39,1% abaixo do pico registrado em abril de 2013, enquanto os bens de consumo duráveis operavam 42,1% abaixo do ápice de março de 2011. Os bens intermediários estavam 16,1% aquém do auge de maio de 2011, e os bens semiduráveis e não duráveis operavam em nível 13,4% inferior ao pico de junho de 2013.
O fato de o ponto mais alto da série histórica da indústria estar em 2011, além de muito distante de ser recuperado, revela que há problemas conjunturais e estruturais afetando o setor.
“Significa que esse setor precisa muito mais do que somente a queda na taxa básica de juros. Claro que tão somente a queda de juros não vai dar efeito por si só a todos os problemas do setor industrial”, disse Macedo, que menciona o chamado “Custo Brasil” como um dos empecilhos à recuperação industrial. “A melhora dos fatores conjunturais ajuda, mas não resolve por completo todas as dificuldades que o setor industrial enfrenta para ter trajetória mais consistente.”/Colaborou Cícero Cotrim