O mercado ilegal de cigarros eletrônicos cresce ano a ano no País. Se fosse cobrar os impostos estaduais e federais dos responsáveis por esse comércio, o Estado de São Paulo arrecadaria R$ 1,65 bilhão. Isso é que mostra uma pesquisa inédita feita pela Escola de Segurança Multidimensional (ESEM), do Instituto de Relações Internacionais (IRI), da Universidade de São Paulo (USP), divulgada nesta quarta-feira, dia 25.
De acordo com o estudo, o consumo do produto não para de crescer no País. E a razão é simples, conforme conta o professor Leandro Piquet, coordenador do ESEM-USP: “Apesar de proibido, redes criminosas nacionais e transnacionais, organizadas ou não, estão suprindo a oferta de forma eficiente e eficaz, praticando preços condizentes com o mercado brasileiro e, nesse ínterim, canalizando recursos econômicos para outras atividades criminosas, como corrupção de agentes públicos, tráfico de armas, tráfico de drogas, entre outros”.
Piquet explica que, atualmente, “o cigarro eletrônico vive uma situação intermediária no País. A venda e publicidade de dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) é proibida no Brasil desde 2009 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em abril passado, a agência expandiu a proibição, que agora atinge também a fabricação e o transporte desses produtos.
Até abril, a situação legal dos cigarros eletrônicos permitiu, segundo Piquet, a construção de uma rede de distribuição e contrabando dessa mercadoria. “Com o endurecimento da lei, o crime organizado vai se interessar e se apropriar desse mercado”, afirmou o professor. De acordo com ele, redes que atualmente dominam o contrabando de cigarros e jogos ilegais estariam entrando no mercado do cigarro eletrônico.
Segundo os pesquisadores da USP, o aumento no número de consumidores está relacionado ao impacto do isolamento social durante a pandemia de covid-19 e o crescimento das vendas online. O estudo afirma que, “diferentemente de produtos como a cocaína, cuja comercialização online seria imediatamente detectada e reprimida, os cigarros eletrônicos são vendidos abertamente em plataformas de e-commerce e redes sociais, muitas vezes sob disfarces, como ‘vaporizadores’ ou ‘aparelhos eletrônicos’. Isso facilita o acesso dos consumidores, que compram esses dispositivos sem precisar recorrer a canais de tráfico tradicionais”.
Ou seja, a dificuldade das autoridades para monitorar e controlar a venda online de DEFs, segundo os pesquisadores, “representa um desafio adicional à repressão desse mercado”. A pesquisa analisou dados de 14 sites que oferecem os cigarros eletrônicos no País, com entregas a domicílio nas grandes cidades. A estimativa atual é de que o mercado para esse produto conte com até 4 milhões de brasileiros por ano. Segundo o estudo, o Paraguai é o principal ponto de origem do contrabando de DEFs para o Brasil.
“A facilidade com que esses produtos cruzam a fronteira é uma consequência direta das assimetrias legais e da fraca fiscalização entre os dois países. Enquanto o Brasil mantém uma proibição rigorosa sobre a comercialização dos dispositivos, no Paraguai, as leis são mais flexíveis, o que facilita o escoamento do produto”, afirmou Piquet.
Para ele, um aspecto importante desse negócio é o “papel da corrupção no fortalecimento desse mercado ilegal”. “Para que os dispositivos contrabandeados entrem no Brasil e sejam distribuídos nos grandes centros urbanos, há indícios de cooperação de agentes públicos”, afirmou o professor. Ou seja, o mercado desse produto no Brasil ilustraria “como a combinação de proibição, contrabando transnacional, corrupção e comercialização digital pode criar um ambiente propício para o florescimento de mercados ilícitos”.
Crescimento de consumo
Piquet conclui que o crescimento contínuo desse consumo, mesmo diante da ilegalidade, “levanta questões sobre a eficácia das políticas atuais e, se a regulamentação, com a devida tributação, poderia ser uma solução mais viável para combater tanto o mercado ilegal quanto os problemas de segurança pública associados a ele”. “A regulamentação dos DEFs poderia reduzir a violência, enfraquecer as receitas dessas organizações e gerar arrecadação tributária, promovendo maior controle sobre a comercialização desses produtos”, concluiu.
A pesquisa estima ainda que em 2028, com a evolução desse mercado ilegal, a receita tributária arrecadada no Estado poderia chegar até R$ 3,5 bilhões, considerando o preço médio dos cigarros eletrônicos. São Paulo é responsável por 20% de todas as apreensões desse tipo de produto no País. A receita estimada da legalização desse mercado só para o ano de 2024 poderia, segundo Piquet, custear aproximadamente 12,02% do investimento em policiamento de São Paulo.
O anúncio da pesquisa será feito com a participarão de Edson Vismona, presidente do Fórum Nacional Contra A Pirataria e Ilegalidade (FNCP); de Renato Gomides, gerente financeiro da CropLife Brasil; de João Henrique Martins, coordenador da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo; de Emerson Kapaz, CEO do Instituto Combustível Legal (ICL) e de Andrea Chieregatto, Consultora de Segurança Pública da Fundação Brava.