IPCA pressionado: o que deve levar a inflação a estourar a meta mais uma vez em 2025


Desvalorização do real frente ao dólar deve levar a novos reajustes de preços, sobretudo dos serviços, em meio a uma atividade econômica ainda aquecida

Por Márcia De Chiara
Atualização:

A herança inflacionária de 2024 para 2025 é pesada. Além dos aumentos sazonais, típicos da virada de ano, como em tarifas de ônibus, pedágios, mensalidades escolares, por exemplo, que levam em conta a inflação passada, a grande preocupação no momento é o estrago que a desvalorização cambial dos últimos meses pode causar nos preços dos produtos e serviços ao longo de 2025, apontam economistas ouvidos pelo Estadão.

O real acumula uma perda de mais de 25% em relação ao dólar nos últimos 12 meses. A tendência é de que esse forte aumento de custos, acelerado sobretudo no último trimestre do ano passado, leve empresas a reajustar preços este ano, como muitas já declararam. Com a atividade aquecida, o emprego e a renda em alta, o risco é de que esses reajustes se alastrem e provoquem um espalhamento da inflação por vários setores da economia.

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Essa preocupação já foi captada pelo Boletim Focus do Banco Central. Depois de a inflação oficial do País, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ter encerrado 2024 com alta de 4,83%, acima do teto da meta (4,5%), para este ano o mercado espera, por enquanto, um novo estouro.

De acordo com o último Boletim Focus do Banco Central, do dia 6 de janeiro, a projeção é de que o IPCA de 2025 fique em 4,99%. Pela 12.ª semana seguida, a mediana da projeção da inflação para 2025 foi revisada para cima.

“Iniciamos 2025 com uma preocupação em relação a esse conjunto de reajustes tradicionais de início de ano num ambiente mais conturbado de depreciação da moeda, economia forte e mercado de trabalho apertado”, diz o economista chefe do BMG, Flávio Serrano. Ele projeta um IPCA de 4,80% para este ano, praticamente o mesmo patamar de 2024, considerando a hipótese de que o câmbio volte para R$ 5,70 no segundo semestre.

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Inflação de serviços preocupa

No entanto, Serrano destaca que o ponto crucial para o Banco Central neste momento é a propagação do choque do câmbio para os demais preços da economia e, em especial, para os serviços. “A inflação de serviços é mais inercial, demora mais para cair e, por isso, preocupa mais.”

Inclusive, na opinião de Serrano, o ritmo de propagação do choque do câmbio para os demais preços deve determinar o limite de alta da taxa básica de juros, a Selic, hoje em 12,25% ao ano. Isto é, se os juros ficarão abaixo ou acima de 15% ao ano, conforme esperado pelo mercado.

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Tatiana Pinheiro, economista chefe da Galapagos Capital, ressalta que, apesar das poucas informações disponíveis até o momento sobre a inflação de 2025, um dos fatores de destaque do IPCA deste ano é o efeito da mudança do nível do câmbio nos preços da economia. “A mudança do patamar do câmbio, de R$ 5 para R$ 6, não foi trivial”, afirma.

Alimentos devem ter impacto menor na inflação em 2025 Foto: Epitácio Pessoa/Estadão

E o efeito da taxa de câmbio nos preços não é imediato. De acordo com o modelo usado pela economista, os desdobramentos da mudança do câmbio podem demorar até 12 meses para se propagarem pelos preços da economia, sendo que o auge ocorre entre seis e nove meses após o choque. “Alguma coisa dessa mudança de patamar já apareceu na inflação do quarto trimestre de 2024, mas vamos continuar vendo os efeitos até o terceiro trimestre de 2025″, prevê.

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Ajuste fiscal é crucial

Por ora, Tatiana está revisando para cima a projeção inicial de inflação de 4,5% para este ano, levando em conta vários fatores. Em destaque está o cenário político internacional, que inclui o novo governo dos Estados Unidos, comandado pelo presidente eleito Donald Trump, e as crises geopolíticas, como guerra na Ucrânia e no Oriente Médio, com possíveis impactos sobre os preços do petróleo. Internamente, ela destaca a condução da política fiscal brasileira como um fator crucial para o resultado da inflação deste ano.

A economista acrescenta também que os eventos climáticos extremos, fora dos fenômenos monitorados de El Niño e La Niña, são uma incógnita e afetam a inflação por meio de quebra de safras agrícolas.

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“A agricultura não deve ser a vilã da inflação em 2025″, afirma André Braz, economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) e coordenador de índices de preços da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Ele lembra que a grande surpresa na inflação de 2024 foi a agricultura muito afetada pelo clima, que levou a alimentação subir 8%, superando todas as previsões. Além disso, houve uma forte desvalorização cambial, que explodiu no final do ano em razão das incertezas sobre a condução da política fiscal brasileira.

Para 2025, Braz, que projeta um IPCA de 5%, acredita que a agricultura poderá surpreender positivamente com safras muito boas. Entretanto, essa ajuda vinda dos alimentos não deve levar a uma inflação menor no ano, em razão de pressões em vários segmentos, turbinadas pela desvalorização do real.

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“Me parece que a inflação estará neste ano mais espalhada por causa do câmbio, do aquecimento do mercado de trabalho e todo dinamismo que a economia pegou em 2024″, observa Braz.

Ele acrescenta a esse cenário o ambiente de maior incerteza sobre a condução da política fiscal, que afeta o câmbio e os custos, e contribui, por tabela, para piora da inflação. Isto é, os agentes econômicos ficam mais dispostos a aumentar preços como forma de proteção. E isso amplia a inércia inflacionária. “É fogo na palha”, compara.

Mais pessimismo?

Nesse sentido, o economista da XP Investimentos, Alexandre Maluf, está pessimista. Ele acaba de ampliar em quase um ponto porcentual, de 5,2% para 6,1%, a projeção de inflação para este ano. O motivo é a maior desvalorização prevista para o câmbio.

Desdobramentos da disparada do dólar sobre outros preços é a principal ameaça da inflação em 2025 Foto: Clayton de Souza/Estadâo

Anteriormente, ele projetava o dólar cotado a R$ 5,85 e agora espera que fique em R$ 6,20. “O impacto da taxa de câmbio se dá praticamente em todos os grupos do IPCA”, afirma.

Entre as razões apontadas por Maluf para aumentar a projeção da desvalorização do real em relação à moeda americana estão as incertezas na condução da política fiscal, que é o principal fator. Além disso, o dólar tem se fortalecido em relação a outras moeda no mundo por conta das incertezas sobre o que será o novo governo de Donald Trump, nos Estados Unidos.

Finalmente, o economista aponta o enfraquecimento dos fundamentos do balanço de pagamentos do Brasil. “As contas externas seguem saudáveis, mas menos do que anos atrás e algumas linhas, como a balança de pagamentos de serviços, propriedade intelectual, têm mostrado deterioração.”

Inflação zero em janeiro?

Apesar das grandes preocupações que rondam a inflação deste ano, principalmente em relação aos desdobramentos do choque cambial sobre os preços, o IPCA deverá ter comportamentos diferentes ao longo do ano.

Tanto Serrano, do BMG, como Braz, da FGV, apontam que a maior concentração da inflação deve ocorrer no primeiro semestre. Nas contas de Serrano, dos 4,80% projetados de inflação para o ano, 2,90 pontos serão registrados entre janeiro e junho de 2025 e o restante,1,90 ponto, ficará para o segundo semestre.

“É uma diferença de um ponto porcentual entre os semestres”, observa. Ele explica que o primeiro semestre será carregado por muitos choques – câmbio, produtos agrícolas, carne –, além da atividade aquecida e do mercado de trabalho apertado, que podem gerar pressões nos preços dos serviços.

Braz destaca que a inflação será mais concentrada no primeiro semestre por causa dos inúmeros reajustes sazonais da virada do ano (escolas, transporte, entre outros), somados ao efeito menor da alta da taxa básica de juros, que deve ser potencializado mais para a frente.

Mercado de trabalho apertado e atividade aquecida devem sancionar aumentos de preços Foto: Tiago Queiroz / Estadão

De toda forma, mesmo com todas as pressões inflacionárias, aumentos das passagens de ônibus em oito capitais do País e outros reajustes sazonais, o IPCA de janeiro deverá ser muito baixo, próximo de zero, preveem Serrano e Braz. O motivo é o bônus de Itaipu que deve reduzir a conta de energia elétrica em mais de 10%.

Em fevereiro, no entanto, a expectativa de ambos os economistas é de que o IPCA dispare e atinja quase 1,5%. “A taxa de 1,45% prevista para fevereiro de 2025 será a mais alta desde março de 2022, a mais elevada de 2025, será uma pancada”, afirma Serrano.

Além do fim do bônus de Itaipu na conta de energia elétrica, devem engrossar o caldo das pressões inflacionárias em fevereiro os reajustes das mensalidades escolares, a alta dos preços dos alimentos por conta do final da entressafra de grãos e o aumento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis.

A herança inflacionária de 2024 para 2025 é pesada. Além dos aumentos sazonais, típicos da virada de ano, como em tarifas de ônibus, pedágios, mensalidades escolares, por exemplo, que levam em conta a inflação passada, a grande preocupação no momento é o estrago que a desvalorização cambial dos últimos meses pode causar nos preços dos produtos e serviços ao longo de 2025, apontam economistas ouvidos pelo Estadão.

O real acumula uma perda de mais de 25% em relação ao dólar nos últimos 12 meses. A tendência é de que esse forte aumento de custos, acelerado sobretudo no último trimestre do ano passado, leve empresas a reajustar preços este ano, como muitas já declararam. Com a atividade aquecida, o emprego e a renda em alta, o risco é de que esses reajustes se alastrem e provoquem um espalhamento da inflação por vários setores da economia.

Essa preocupação já foi captada pelo Boletim Focus do Banco Central. Depois de a inflação oficial do País, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ter encerrado 2024 com alta de 4,83%, acima do teto da meta (4,5%), para este ano o mercado espera, por enquanto, um novo estouro.

De acordo com o último Boletim Focus do Banco Central, do dia 6 de janeiro, a projeção é de que o IPCA de 2025 fique em 4,99%. Pela 12.ª semana seguida, a mediana da projeção da inflação para 2025 foi revisada para cima.

“Iniciamos 2025 com uma preocupação em relação a esse conjunto de reajustes tradicionais de início de ano num ambiente mais conturbado de depreciação da moeda, economia forte e mercado de trabalho apertado”, diz o economista chefe do BMG, Flávio Serrano. Ele projeta um IPCA de 4,80% para este ano, praticamente o mesmo patamar de 2024, considerando a hipótese de que o câmbio volte para R$ 5,70 no segundo semestre.

Inflação de serviços preocupa

No entanto, Serrano destaca que o ponto crucial para o Banco Central neste momento é a propagação do choque do câmbio para os demais preços da economia e, em especial, para os serviços. “A inflação de serviços é mais inercial, demora mais para cair e, por isso, preocupa mais.”

Inclusive, na opinião de Serrano, o ritmo de propagação do choque do câmbio para os demais preços deve determinar o limite de alta da taxa básica de juros, a Selic, hoje em 12,25% ao ano. Isto é, se os juros ficarão abaixo ou acima de 15% ao ano, conforme esperado pelo mercado.

Tatiana Pinheiro, economista chefe da Galapagos Capital, ressalta que, apesar das poucas informações disponíveis até o momento sobre a inflação de 2025, um dos fatores de destaque do IPCA deste ano é o efeito da mudança do nível do câmbio nos preços da economia. “A mudança do patamar do câmbio, de R$ 5 para R$ 6, não foi trivial”, afirma.

Alimentos devem ter impacto menor na inflação em 2025 Foto: Epitácio Pessoa/Estadão

E o efeito da taxa de câmbio nos preços não é imediato. De acordo com o modelo usado pela economista, os desdobramentos da mudança do câmbio podem demorar até 12 meses para se propagarem pelos preços da economia, sendo que o auge ocorre entre seis e nove meses após o choque. “Alguma coisa dessa mudança de patamar já apareceu na inflação do quarto trimestre de 2024, mas vamos continuar vendo os efeitos até o terceiro trimestre de 2025″, prevê.

Ajuste fiscal é crucial

Por ora, Tatiana está revisando para cima a projeção inicial de inflação de 4,5% para este ano, levando em conta vários fatores. Em destaque está o cenário político internacional, que inclui o novo governo dos Estados Unidos, comandado pelo presidente eleito Donald Trump, e as crises geopolíticas, como guerra na Ucrânia e no Oriente Médio, com possíveis impactos sobre os preços do petróleo. Internamente, ela destaca a condução da política fiscal brasileira como um fator crucial para o resultado da inflação deste ano.

A economista acrescenta também que os eventos climáticos extremos, fora dos fenômenos monitorados de El Niño e La Niña, são uma incógnita e afetam a inflação por meio de quebra de safras agrícolas.

“A agricultura não deve ser a vilã da inflação em 2025″, afirma André Braz, economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) e coordenador de índices de preços da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Ele lembra que a grande surpresa na inflação de 2024 foi a agricultura muito afetada pelo clima, que levou a alimentação subir 8%, superando todas as previsões. Além disso, houve uma forte desvalorização cambial, que explodiu no final do ano em razão das incertezas sobre a condução da política fiscal brasileira.

Para 2025, Braz, que projeta um IPCA de 5%, acredita que a agricultura poderá surpreender positivamente com safras muito boas. Entretanto, essa ajuda vinda dos alimentos não deve levar a uma inflação menor no ano, em razão de pressões em vários segmentos, turbinadas pela desvalorização do real.

“Me parece que a inflação estará neste ano mais espalhada por causa do câmbio, do aquecimento do mercado de trabalho e todo dinamismo que a economia pegou em 2024″, observa Braz.

Ele acrescenta a esse cenário o ambiente de maior incerteza sobre a condução da política fiscal, que afeta o câmbio e os custos, e contribui, por tabela, para piora da inflação. Isto é, os agentes econômicos ficam mais dispostos a aumentar preços como forma de proteção. E isso amplia a inércia inflacionária. “É fogo na palha”, compara.

Mais pessimismo?

Nesse sentido, o economista da XP Investimentos, Alexandre Maluf, está pessimista. Ele acaba de ampliar em quase um ponto porcentual, de 5,2% para 6,1%, a projeção de inflação para este ano. O motivo é a maior desvalorização prevista para o câmbio.

Desdobramentos da disparada do dólar sobre outros preços é a principal ameaça da inflação em 2025 Foto: Clayton de Souza/Estadâo

Anteriormente, ele projetava o dólar cotado a R$ 5,85 e agora espera que fique em R$ 6,20. “O impacto da taxa de câmbio se dá praticamente em todos os grupos do IPCA”, afirma.

Entre as razões apontadas por Maluf para aumentar a projeção da desvalorização do real em relação à moeda americana estão as incertezas na condução da política fiscal, que é o principal fator. Além disso, o dólar tem se fortalecido em relação a outras moeda no mundo por conta das incertezas sobre o que será o novo governo de Donald Trump, nos Estados Unidos.

Finalmente, o economista aponta o enfraquecimento dos fundamentos do balanço de pagamentos do Brasil. “As contas externas seguem saudáveis, mas menos do que anos atrás e algumas linhas, como a balança de pagamentos de serviços, propriedade intelectual, têm mostrado deterioração.”

Inflação zero em janeiro?

Apesar das grandes preocupações que rondam a inflação deste ano, principalmente em relação aos desdobramentos do choque cambial sobre os preços, o IPCA deverá ter comportamentos diferentes ao longo do ano.

Tanto Serrano, do BMG, como Braz, da FGV, apontam que a maior concentração da inflação deve ocorrer no primeiro semestre. Nas contas de Serrano, dos 4,80% projetados de inflação para o ano, 2,90 pontos serão registrados entre janeiro e junho de 2025 e o restante,1,90 ponto, ficará para o segundo semestre.

“É uma diferença de um ponto porcentual entre os semestres”, observa. Ele explica que o primeiro semestre será carregado por muitos choques – câmbio, produtos agrícolas, carne –, além da atividade aquecida e do mercado de trabalho apertado, que podem gerar pressões nos preços dos serviços.

Braz destaca que a inflação será mais concentrada no primeiro semestre por causa dos inúmeros reajustes sazonais da virada do ano (escolas, transporte, entre outros), somados ao efeito menor da alta da taxa básica de juros, que deve ser potencializado mais para a frente.

Mercado de trabalho apertado e atividade aquecida devem sancionar aumentos de preços Foto: Tiago Queiroz / Estadão

De toda forma, mesmo com todas as pressões inflacionárias, aumentos das passagens de ônibus em oito capitais do País e outros reajustes sazonais, o IPCA de janeiro deverá ser muito baixo, próximo de zero, preveem Serrano e Braz. O motivo é o bônus de Itaipu que deve reduzir a conta de energia elétrica em mais de 10%.

Em fevereiro, no entanto, a expectativa de ambos os economistas é de que o IPCA dispare e atinja quase 1,5%. “A taxa de 1,45% prevista para fevereiro de 2025 será a mais alta desde março de 2022, a mais elevada de 2025, será uma pancada”, afirma Serrano.

Além do fim do bônus de Itaipu na conta de energia elétrica, devem engrossar o caldo das pressões inflacionárias em fevereiro os reajustes das mensalidades escolares, a alta dos preços dos alimentos por conta do final da entressafra de grãos e o aumento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis.

A herança inflacionária de 2024 para 2025 é pesada. Além dos aumentos sazonais, típicos da virada de ano, como em tarifas de ônibus, pedágios, mensalidades escolares, por exemplo, que levam em conta a inflação passada, a grande preocupação no momento é o estrago que a desvalorização cambial dos últimos meses pode causar nos preços dos produtos e serviços ao longo de 2025, apontam economistas ouvidos pelo Estadão.

O real acumula uma perda de mais de 25% em relação ao dólar nos últimos 12 meses. A tendência é de que esse forte aumento de custos, acelerado sobretudo no último trimestre do ano passado, leve empresas a reajustar preços este ano, como muitas já declararam. Com a atividade aquecida, o emprego e a renda em alta, o risco é de que esses reajustes se alastrem e provoquem um espalhamento da inflação por vários setores da economia.

Essa preocupação já foi captada pelo Boletim Focus do Banco Central. Depois de a inflação oficial do País, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ter encerrado 2024 com alta de 4,83%, acima do teto da meta (4,5%), para este ano o mercado espera, por enquanto, um novo estouro.

De acordo com o último Boletim Focus do Banco Central, do dia 6 de janeiro, a projeção é de que o IPCA de 2025 fique em 4,99%. Pela 12.ª semana seguida, a mediana da projeção da inflação para 2025 foi revisada para cima.

“Iniciamos 2025 com uma preocupação em relação a esse conjunto de reajustes tradicionais de início de ano num ambiente mais conturbado de depreciação da moeda, economia forte e mercado de trabalho apertado”, diz o economista chefe do BMG, Flávio Serrano. Ele projeta um IPCA de 4,80% para este ano, praticamente o mesmo patamar de 2024, considerando a hipótese de que o câmbio volte para R$ 5,70 no segundo semestre.

Inflação de serviços preocupa

No entanto, Serrano destaca que o ponto crucial para o Banco Central neste momento é a propagação do choque do câmbio para os demais preços da economia e, em especial, para os serviços. “A inflação de serviços é mais inercial, demora mais para cair e, por isso, preocupa mais.”

Inclusive, na opinião de Serrano, o ritmo de propagação do choque do câmbio para os demais preços deve determinar o limite de alta da taxa básica de juros, a Selic, hoje em 12,25% ao ano. Isto é, se os juros ficarão abaixo ou acima de 15% ao ano, conforme esperado pelo mercado.

Tatiana Pinheiro, economista chefe da Galapagos Capital, ressalta que, apesar das poucas informações disponíveis até o momento sobre a inflação de 2025, um dos fatores de destaque do IPCA deste ano é o efeito da mudança do nível do câmbio nos preços da economia. “A mudança do patamar do câmbio, de R$ 5 para R$ 6, não foi trivial”, afirma.

Alimentos devem ter impacto menor na inflação em 2025 Foto: Epitácio Pessoa/Estadão

E o efeito da taxa de câmbio nos preços não é imediato. De acordo com o modelo usado pela economista, os desdobramentos da mudança do câmbio podem demorar até 12 meses para se propagarem pelos preços da economia, sendo que o auge ocorre entre seis e nove meses após o choque. “Alguma coisa dessa mudança de patamar já apareceu na inflação do quarto trimestre de 2024, mas vamos continuar vendo os efeitos até o terceiro trimestre de 2025″, prevê.

Ajuste fiscal é crucial

Por ora, Tatiana está revisando para cima a projeção inicial de inflação de 4,5% para este ano, levando em conta vários fatores. Em destaque está o cenário político internacional, que inclui o novo governo dos Estados Unidos, comandado pelo presidente eleito Donald Trump, e as crises geopolíticas, como guerra na Ucrânia e no Oriente Médio, com possíveis impactos sobre os preços do petróleo. Internamente, ela destaca a condução da política fiscal brasileira como um fator crucial para o resultado da inflação deste ano.

A economista acrescenta também que os eventos climáticos extremos, fora dos fenômenos monitorados de El Niño e La Niña, são uma incógnita e afetam a inflação por meio de quebra de safras agrícolas.

“A agricultura não deve ser a vilã da inflação em 2025″, afirma André Braz, economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) e coordenador de índices de preços da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Ele lembra que a grande surpresa na inflação de 2024 foi a agricultura muito afetada pelo clima, que levou a alimentação subir 8%, superando todas as previsões. Além disso, houve uma forte desvalorização cambial, que explodiu no final do ano em razão das incertezas sobre a condução da política fiscal brasileira.

Para 2025, Braz, que projeta um IPCA de 5%, acredita que a agricultura poderá surpreender positivamente com safras muito boas. Entretanto, essa ajuda vinda dos alimentos não deve levar a uma inflação menor no ano, em razão de pressões em vários segmentos, turbinadas pela desvalorização do real.

“Me parece que a inflação estará neste ano mais espalhada por causa do câmbio, do aquecimento do mercado de trabalho e todo dinamismo que a economia pegou em 2024″, observa Braz.

Ele acrescenta a esse cenário o ambiente de maior incerteza sobre a condução da política fiscal, que afeta o câmbio e os custos, e contribui, por tabela, para piora da inflação. Isto é, os agentes econômicos ficam mais dispostos a aumentar preços como forma de proteção. E isso amplia a inércia inflacionária. “É fogo na palha”, compara.

Mais pessimismo?

Nesse sentido, o economista da XP Investimentos, Alexandre Maluf, está pessimista. Ele acaba de ampliar em quase um ponto porcentual, de 5,2% para 6,1%, a projeção de inflação para este ano. O motivo é a maior desvalorização prevista para o câmbio.

Desdobramentos da disparada do dólar sobre outros preços é a principal ameaça da inflação em 2025 Foto: Clayton de Souza/Estadâo

Anteriormente, ele projetava o dólar cotado a R$ 5,85 e agora espera que fique em R$ 6,20. “O impacto da taxa de câmbio se dá praticamente em todos os grupos do IPCA”, afirma.

Entre as razões apontadas por Maluf para aumentar a projeção da desvalorização do real em relação à moeda americana estão as incertezas na condução da política fiscal, que é o principal fator. Além disso, o dólar tem se fortalecido em relação a outras moeda no mundo por conta das incertezas sobre o que será o novo governo de Donald Trump, nos Estados Unidos.

Finalmente, o economista aponta o enfraquecimento dos fundamentos do balanço de pagamentos do Brasil. “As contas externas seguem saudáveis, mas menos do que anos atrás e algumas linhas, como a balança de pagamentos de serviços, propriedade intelectual, têm mostrado deterioração.”

Inflação zero em janeiro?

Apesar das grandes preocupações que rondam a inflação deste ano, principalmente em relação aos desdobramentos do choque cambial sobre os preços, o IPCA deverá ter comportamentos diferentes ao longo do ano.

Tanto Serrano, do BMG, como Braz, da FGV, apontam que a maior concentração da inflação deve ocorrer no primeiro semestre. Nas contas de Serrano, dos 4,80% projetados de inflação para o ano, 2,90 pontos serão registrados entre janeiro e junho de 2025 e o restante,1,90 ponto, ficará para o segundo semestre.

“É uma diferença de um ponto porcentual entre os semestres”, observa. Ele explica que o primeiro semestre será carregado por muitos choques – câmbio, produtos agrícolas, carne –, além da atividade aquecida e do mercado de trabalho apertado, que podem gerar pressões nos preços dos serviços.

Braz destaca que a inflação será mais concentrada no primeiro semestre por causa dos inúmeros reajustes sazonais da virada do ano (escolas, transporte, entre outros), somados ao efeito menor da alta da taxa básica de juros, que deve ser potencializado mais para a frente.

Mercado de trabalho apertado e atividade aquecida devem sancionar aumentos de preços Foto: Tiago Queiroz / Estadão

De toda forma, mesmo com todas as pressões inflacionárias, aumentos das passagens de ônibus em oito capitais do País e outros reajustes sazonais, o IPCA de janeiro deverá ser muito baixo, próximo de zero, preveem Serrano e Braz. O motivo é o bônus de Itaipu que deve reduzir a conta de energia elétrica em mais de 10%.

Em fevereiro, no entanto, a expectativa de ambos os economistas é de que o IPCA dispare e atinja quase 1,5%. “A taxa de 1,45% prevista para fevereiro de 2025 será a mais alta desde março de 2022, a mais elevada de 2025, será uma pancada”, afirma Serrano.

Além do fim do bônus de Itaipu na conta de energia elétrica, devem engrossar o caldo das pressões inflacionárias em fevereiro os reajustes das mensalidades escolares, a alta dos preços dos alimentos por conta do final da entressafra de grãos e o aumento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis.

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