‘Estamos inquietos, mas corte de juros nos EUA em setembro é nosso cenário’, diz economista do UBS


Jonathan Pingle, economista-chefe para os Estados Unidos do banco suíço, diz que reunião do Fed desta semana será decisiva para o mercado e dá conselho ao Brasil: ‘estejam preparados para o inesperado’

Por Alvaro Gribel
Foto: UBS/Divulgação
Entrevista comJonathan PingleEconomista-chefe do UBS para os EUA

BRASÍLIA – O economista-chefe para os Estados Unidos do banco suíço UBS, Jonathan Pingle, admite que está ansioso sobre os rumos da política monetária na maior economia do mundo. Ele afirma, porém, que o cenário base do banco ainda é de início dos cortes dos juros em setembro, mesmo com os dados fortes do mercado de trabalho divulgados na última sexta-feira.

Pingle explica que a reunião do Fed (Banco Central americano) nesta semana será decisiva para ditar os rumos do mercado financeiro, porque trará a atualização das previsões feitas por cada um dos 19 membros do comitê de política monetária, incluindo as projeções de juros para o final de 2024.

O economista, que também trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI) e foi chefe de Economia para Renda Fixa das Américas no fundo BlackRock, pondera, no entanto, que o cenário é de grande incerteza. Por isso, há risco de o Fed ser obrigado a voltar a subir os juros no ano que vem, caso a inflação não caia como esperado e os números de crescimento voltem a acelerar.

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Sobre as eleições presidenciais nos EUA, o economista entende que o melhor para a política fiscal é que o partido vencedor não controle também a Câmara e o Senado. Isso limitaria a capacidade de expansão de gastos pelo governo. Em conversa com o Estadão, o economista diz que o principal conselho a ser dado a países emergentes como o Brasil é que “estejam preparados para o inesperado”.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

Qual o cenário do UBS para o início dos cortes de juros pelo Fed?

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Ainda apostamos no primeiro corte em setembro. Neste momento, o Fed está desapontado com os dados de inflação, mas eles tiveram um grande progresso. Pela nossa previsão, a inflação ficará rodando 2,7% ou 2,6% (taxa anual) pelos próximos meses (para uma meta de 2%), mas entendemos que haverá uma grande melhora na composição do número. O Fed está muito preocupado com a inflação dos aluguéis, e, se houver um arrefecimento, isso lhes dará mais confiança. A outra coisa é que o crescimento do PIB está desacelerando. Isso tudo vai ajudar. Portanto, estamos inquietos, mas ainda temos um corte em setembro como nosso cenário base.

O mercado de trabalho nos EUA na última sexta-feira veio muito forte...

Sim. Nós prevíamos uma alta de 185 mil (o dado veio em 272 mil). Os dados provavelmente vão reforçar a visão no Fed de que a economia está resiliente. Também coloca em risco nossa projeção de dois cortes este ano. Mas há outras razões para achar que o Fed vá manter a opção pelo corte em setembro. Haverá mais três relatórios de emprego antes dessa reunião, e esperamos ver mais ganhos abaixo de 200 mil que reduzam a média móvel trimestral. No entanto, a força relatada na sexta-feira pode alimentar a preocupação de que o mercado de trabalho forte possa impedir o Fed de alcançar suas metas de inflação. Isso é uma receita para potencialmente retomar os aumentos de juros em 2025.

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Quais dados mudaram o humor do mercado em relação ao que se previa no início do ano?

Foram os dados de inflação do primeiro trimestre: de janeiro, fevereiro e março. Os números mensais do final de 2023 estavam rodando com uma inflação de 2%, e parecia, na época, que o Fed teria muita facilidade em descer a taxa anual para próximo de 2% ou 2,5%. Mas, depois, o que se viu foi um progresso muito mais lento. A reunião desta semana será decisiva para se saber o que fará o Fed no restante do ano.

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Esta reunião traz as projeções feitas por cada um dos membros do Comitê. Como isso funciona?

Todos os 19 membros do Fed apresentarão suas previsões econômicas: PIB, taxa de desemprego, inflação cheia, inflação subjacente. E, então, eles descrevem o que consideram ser a política monetária apropriada para esse cenário. Com isso, é possível saber quantos dos 19 enxergam um ou dois cortes de juros no final do ano. Se a maioria entender que haverá apenas um corte, então não haverá tempo para que eles mudem de ideia até a reunião de setembro, porque não há tantos dados para serem divulgados até lá. Essa é uma informação muito importante, porque o dot plot (gráfico de pontos) pode fechar as portas para um corte em setembro e empurrar para dezembro.

Por que a inflação continua elevada? Há influência do mercado de trabalho, com desemprego tão baixo?

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Parte se explica pelo aumento nominal dos salários. Mas esse crescimento está desacelerando rapidamente –devido, em parte, à imigração adicional que houve este ano. Se olharmos para o que separa o atual nível de inflação subjacente da meta de 2%, mais de metade são os aluguéis. Há desinflação nos bens e inflação nos serviços. Mas o maior obstáculo de fato são os aluguéis.

Por que eles estão elevados?

A complicação é que os aluguéis, no mercado, já desaceleraram bastante, mas isso não está aparecendo no índice do CPI (o IPCA americano). Isso é uma complicação grande porque o presidente do Fed, Jerome Powell, vem falando que a queda dos aluguéis é um fator importante para a queda da inflação. Quando a gente fala com grandes construtoras, fora de Nova York e Miami, os aluguéis estão desacelerando fortemente, mas há uma defasagem em relação ao CPI, essa queda não aparece no índice. Entendemos que isso vai começar a acontecer no verão (a partir deste mês no Hemisfério Norte).

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Além disso, daqui a setembro, quais os principais indicadores que serão determinantes para a queda dos juros?

Os dados do mercado de trabalho são muito importantes, porque se os EUA estiverem criando menos de 200 mil vagas por mês, por exemplo, 175 mil, ainda é bom, mas deixa o Fed mais confortável para cortar os juros do que uma criação de 250 mil. Os componentes da inflação também serão importantes, eles querem ter certeza que a política monetária está fazendo o seu trabalho e desacelerando a economia.

O governo americano tem tido déficits primários elevados. Qual o peso da política fiscal sobre a inflação no país?

Há um grande debate sobre isso. Especialmente, se houve um choque de demanda ou um choque de oferta. Na nossa visão, a maior parte do problema foi por oferta. E estamos vendo isso diminuir, com o aumento da imigração. Também tivemos grande problema com as cadeias de produção, que pressionou os preços. Mas é claro que o fiscal não ajudou. O PIB cresceu 3%, e entendemos que 1 ponto percentual aconteceu por causa de estímulos fiscais. Mas o grande ponto agora é que esse efeito está diminuindo. Os programas do governo Biden já atingiram uma espécie de platô. Os gastos diretos do governo e os investimentos estão desacelerando, então parte da desaceleração do PIB que estamos vendo agora é graças ao fiscal. Isso fará com que a política monetária pareça mais restritiva.

Os gastos com duas guerras influenciam esse cenário?

É um pouco problemático. Não temos uma métrica precisa para isso, mas pode ser que metade da despesa com a guerra da Ucrânia seja gasto domesticamente com produção de bens que depois são enviados à Ucrânia. Mas acho que é uma pequena parte da expansão fiscal. O principal mesmo para o fiscal são gastos com construção de fábricas, suportes para veículos elétricos, créditos fiscais. São volumes de dólares muito maiores.

Teremos eleições presidenciais nos EUA este ano. O que muda com Trump ou Biden?

Acho que o cenário depende não só da eleição presidencial, mas do controle do Congresso. Se os republicanos controlarem a Casa Branca, a Câmara e o Senado, poderão aprovar mais medidas de expansão fiscal. E teremos também medidas de contenção de imigração. Isso tudo provavelmente terá impacto na inflação. Já com um governo dividido, você terá maiores restrições fiscais. Na imigração, haverá medidas para aumentar o controle na fronteira Sul do país, seja com democratas ou republicanos, mas a diferença será na severidade. Os republicanos querem um sistema mais rigoroso com aumento de deportações. Os democratas querem refinar o sistema atual. Mas, em termos do impacto global sobre a inflação, depende mais de quem controla a Câmara e o Senado, porque isso vai determinar se teremos dificuldades orçamentais ou expansão fiscal.

Ou seja, independentemente do vencedor, do ponto de vista fiscal, é melhor o Congresso dividido?

Sim.

Que conselhos o sr. daria para países emergentes como o Brasil?

Há uma possibilidade real, se a inflação parar de cair, de o crescimento continuar forte; há um cenário em que os juros tenham de voltar a subir em 2025. Há muita incerteza neste momento, nós não sabemos o que vai acontecer. Não tenho bola de cristal, tenho cenários de previsões, mas com muitas incertezas para o cenário econômico. Então, acho que o conselho seria, estejam preparados para as incertezas e o inesperado.

BRASÍLIA – O economista-chefe para os Estados Unidos do banco suíço UBS, Jonathan Pingle, admite que está ansioso sobre os rumos da política monetária na maior economia do mundo. Ele afirma, porém, que o cenário base do banco ainda é de início dos cortes dos juros em setembro, mesmo com os dados fortes do mercado de trabalho divulgados na última sexta-feira.

Pingle explica que a reunião do Fed (Banco Central americano) nesta semana será decisiva para ditar os rumos do mercado financeiro, porque trará a atualização das previsões feitas por cada um dos 19 membros do comitê de política monetária, incluindo as projeções de juros para o final de 2024.

O economista, que também trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI) e foi chefe de Economia para Renda Fixa das Américas no fundo BlackRock, pondera, no entanto, que o cenário é de grande incerteza. Por isso, há risco de o Fed ser obrigado a voltar a subir os juros no ano que vem, caso a inflação não caia como esperado e os números de crescimento voltem a acelerar.

Sobre as eleições presidenciais nos EUA, o economista entende que o melhor para a política fiscal é que o partido vencedor não controle também a Câmara e o Senado. Isso limitaria a capacidade de expansão de gastos pelo governo. Em conversa com o Estadão, o economista diz que o principal conselho a ser dado a países emergentes como o Brasil é que “estejam preparados para o inesperado”.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

Qual o cenário do UBS para o início dos cortes de juros pelo Fed?

Ainda apostamos no primeiro corte em setembro. Neste momento, o Fed está desapontado com os dados de inflação, mas eles tiveram um grande progresso. Pela nossa previsão, a inflação ficará rodando 2,7% ou 2,6% (taxa anual) pelos próximos meses (para uma meta de 2%), mas entendemos que haverá uma grande melhora na composição do número. O Fed está muito preocupado com a inflação dos aluguéis, e, se houver um arrefecimento, isso lhes dará mais confiança. A outra coisa é que o crescimento do PIB está desacelerando. Isso tudo vai ajudar. Portanto, estamos inquietos, mas ainda temos um corte em setembro como nosso cenário base.

O mercado de trabalho nos EUA na última sexta-feira veio muito forte...

Sim. Nós prevíamos uma alta de 185 mil (o dado veio em 272 mil). Os dados provavelmente vão reforçar a visão no Fed de que a economia está resiliente. Também coloca em risco nossa projeção de dois cortes este ano. Mas há outras razões para achar que o Fed vá manter a opção pelo corte em setembro. Haverá mais três relatórios de emprego antes dessa reunião, e esperamos ver mais ganhos abaixo de 200 mil que reduzam a média móvel trimestral. No entanto, a força relatada na sexta-feira pode alimentar a preocupação de que o mercado de trabalho forte possa impedir o Fed de alcançar suas metas de inflação. Isso é uma receita para potencialmente retomar os aumentos de juros em 2025.

Quais dados mudaram o humor do mercado em relação ao que se previa no início do ano?

Foram os dados de inflação do primeiro trimestre: de janeiro, fevereiro e março. Os números mensais do final de 2023 estavam rodando com uma inflação de 2%, e parecia, na época, que o Fed teria muita facilidade em descer a taxa anual para próximo de 2% ou 2,5%. Mas, depois, o que se viu foi um progresso muito mais lento. A reunião desta semana será decisiva para se saber o que fará o Fed no restante do ano.

Esta reunião traz as projeções feitas por cada um dos membros do Comitê. Como isso funciona?

Todos os 19 membros do Fed apresentarão suas previsões econômicas: PIB, taxa de desemprego, inflação cheia, inflação subjacente. E, então, eles descrevem o que consideram ser a política monetária apropriada para esse cenário. Com isso, é possível saber quantos dos 19 enxergam um ou dois cortes de juros no final do ano. Se a maioria entender que haverá apenas um corte, então não haverá tempo para que eles mudem de ideia até a reunião de setembro, porque não há tantos dados para serem divulgados até lá. Essa é uma informação muito importante, porque o dot plot (gráfico de pontos) pode fechar as portas para um corte em setembro e empurrar para dezembro.

Por que a inflação continua elevada? Há influência do mercado de trabalho, com desemprego tão baixo?

Parte se explica pelo aumento nominal dos salários. Mas esse crescimento está desacelerando rapidamente –devido, em parte, à imigração adicional que houve este ano. Se olharmos para o que separa o atual nível de inflação subjacente da meta de 2%, mais de metade são os aluguéis. Há desinflação nos bens e inflação nos serviços. Mas o maior obstáculo de fato são os aluguéis.

Por que eles estão elevados?

A complicação é que os aluguéis, no mercado, já desaceleraram bastante, mas isso não está aparecendo no índice do CPI (o IPCA americano). Isso é uma complicação grande porque o presidente do Fed, Jerome Powell, vem falando que a queda dos aluguéis é um fator importante para a queda da inflação. Quando a gente fala com grandes construtoras, fora de Nova York e Miami, os aluguéis estão desacelerando fortemente, mas há uma defasagem em relação ao CPI, essa queda não aparece no índice. Entendemos que isso vai começar a acontecer no verão (a partir deste mês no Hemisfério Norte).

Além disso, daqui a setembro, quais os principais indicadores que serão determinantes para a queda dos juros?

Os dados do mercado de trabalho são muito importantes, porque se os EUA estiverem criando menos de 200 mil vagas por mês, por exemplo, 175 mil, ainda é bom, mas deixa o Fed mais confortável para cortar os juros do que uma criação de 250 mil. Os componentes da inflação também serão importantes, eles querem ter certeza que a política monetária está fazendo o seu trabalho e desacelerando a economia.

O governo americano tem tido déficits primários elevados. Qual o peso da política fiscal sobre a inflação no país?

Há um grande debate sobre isso. Especialmente, se houve um choque de demanda ou um choque de oferta. Na nossa visão, a maior parte do problema foi por oferta. E estamos vendo isso diminuir, com o aumento da imigração. Também tivemos grande problema com as cadeias de produção, que pressionou os preços. Mas é claro que o fiscal não ajudou. O PIB cresceu 3%, e entendemos que 1 ponto percentual aconteceu por causa de estímulos fiscais. Mas o grande ponto agora é que esse efeito está diminuindo. Os programas do governo Biden já atingiram uma espécie de platô. Os gastos diretos do governo e os investimentos estão desacelerando, então parte da desaceleração do PIB que estamos vendo agora é graças ao fiscal. Isso fará com que a política monetária pareça mais restritiva.

Os gastos com duas guerras influenciam esse cenário?

É um pouco problemático. Não temos uma métrica precisa para isso, mas pode ser que metade da despesa com a guerra da Ucrânia seja gasto domesticamente com produção de bens que depois são enviados à Ucrânia. Mas acho que é uma pequena parte da expansão fiscal. O principal mesmo para o fiscal são gastos com construção de fábricas, suportes para veículos elétricos, créditos fiscais. São volumes de dólares muito maiores.

Teremos eleições presidenciais nos EUA este ano. O que muda com Trump ou Biden?

Acho que o cenário depende não só da eleição presidencial, mas do controle do Congresso. Se os republicanos controlarem a Casa Branca, a Câmara e o Senado, poderão aprovar mais medidas de expansão fiscal. E teremos também medidas de contenção de imigração. Isso tudo provavelmente terá impacto na inflação. Já com um governo dividido, você terá maiores restrições fiscais. Na imigração, haverá medidas para aumentar o controle na fronteira Sul do país, seja com democratas ou republicanos, mas a diferença será na severidade. Os republicanos querem um sistema mais rigoroso com aumento de deportações. Os democratas querem refinar o sistema atual. Mas, em termos do impacto global sobre a inflação, depende mais de quem controla a Câmara e o Senado, porque isso vai determinar se teremos dificuldades orçamentais ou expansão fiscal.

Ou seja, independentemente do vencedor, do ponto de vista fiscal, é melhor o Congresso dividido?

Sim.

Que conselhos o sr. daria para países emergentes como o Brasil?

Há uma possibilidade real, se a inflação parar de cair, de o crescimento continuar forte; há um cenário em que os juros tenham de voltar a subir em 2025. Há muita incerteza neste momento, nós não sabemos o que vai acontecer. Não tenho bola de cristal, tenho cenários de previsões, mas com muitas incertezas para o cenário econômico. Então, acho que o conselho seria, estejam preparados para as incertezas e o inesperado.

BRASÍLIA – O economista-chefe para os Estados Unidos do banco suíço UBS, Jonathan Pingle, admite que está ansioso sobre os rumos da política monetária na maior economia do mundo. Ele afirma, porém, que o cenário base do banco ainda é de início dos cortes dos juros em setembro, mesmo com os dados fortes do mercado de trabalho divulgados na última sexta-feira.

Pingle explica que a reunião do Fed (Banco Central americano) nesta semana será decisiva para ditar os rumos do mercado financeiro, porque trará a atualização das previsões feitas por cada um dos 19 membros do comitê de política monetária, incluindo as projeções de juros para o final de 2024.

O economista, que também trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI) e foi chefe de Economia para Renda Fixa das Américas no fundo BlackRock, pondera, no entanto, que o cenário é de grande incerteza. Por isso, há risco de o Fed ser obrigado a voltar a subir os juros no ano que vem, caso a inflação não caia como esperado e os números de crescimento voltem a acelerar.

Sobre as eleições presidenciais nos EUA, o economista entende que o melhor para a política fiscal é que o partido vencedor não controle também a Câmara e o Senado. Isso limitaria a capacidade de expansão de gastos pelo governo. Em conversa com o Estadão, o economista diz que o principal conselho a ser dado a países emergentes como o Brasil é que “estejam preparados para o inesperado”.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

Qual o cenário do UBS para o início dos cortes de juros pelo Fed?

Ainda apostamos no primeiro corte em setembro. Neste momento, o Fed está desapontado com os dados de inflação, mas eles tiveram um grande progresso. Pela nossa previsão, a inflação ficará rodando 2,7% ou 2,6% (taxa anual) pelos próximos meses (para uma meta de 2%), mas entendemos que haverá uma grande melhora na composição do número. O Fed está muito preocupado com a inflação dos aluguéis, e, se houver um arrefecimento, isso lhes dará mais confiança. A outra coisa é que o crescimento do PIB está desacelerando. Isso tudo vai ajudar. Portanto, estamos inquietos, mas ainda temos um corte em setembro como nosso cenário base.

O mercado de trabalho nos EUA na última sexta-feira veio muito forte...

Sim. Nós prevíamos uma alta de 185 mil (o dado veio em 272 mil). Os dados provavelmente vão reforçar a visão no Fed de que a economia está resiliente. Também coloca em risco nossa projeção de dois cortes este ano. Mas há outras razões para achar que o Fed vá manter a opção pelo corte em setembro. Haverá mais três relatórios de emprego antes dessa reunião, e esperamos ver mais ganhos abaixo de 200 mil que reduzam a média móvel trimestral. No entanto, a força relatada na sexta-feira pode alimentar a preocupação de que o mercado de trabalho forte possa impedir o Fed de alcançar suas metas de inflação. Isso é uma receita para potencialmente retomar os aumentos de juros em 2025.

Quais dados mudaram o humor do mercado em relação ao que se previa no início do ano?

Foram os dados de inflação do primeiro trimestre: de janeiro, fevereiro e março. Os números mensais do final de 2023 estavam rodando com uma inflação de 2%, e parecia, na época, que o Fed teria muita facilidade em descer a taxa anual para próximo de 2% ou 2,5%. Mas, depois, o que se viu foi um progresso muito mais lento. A reunião desta semana será decisiva para se saber o que fará o Fed no restante do ano.

Esta reunião traz as projeções feitas por cada um dos membros do Comitê. Como isso funciona?

Todos os 19 membros do Fed apresentarão suas previsões econômicas: PIB, taxa de desemprego, inflação cheia, inflação subjacente. E, então, eles descrevem o que consideram ser a política monetária apropriada para esse cenário. Com isso, é possível saber quantos dos 19 enxergam um ou dois cortes de juros no final do ano. Se a maioria entender que haverá apenas um corte, então não haverá tempo para que eles mudem de ideia até a reunião de setembro, porque não há tantos dados para serem divulgados até lá. Essa é uma informação muito importante, porque o dot plot (gráfico de pontos) pode fechar as portas para um corte em setembro e empurrar para dezembro.

Por que a inflação continua elevada? Há influência do mercado de trabalho, com desemprego tão baixo?

Parte se explica pelo aumento nominal dos salários. Mas esse crescimento está desacelerando rapidamente –devido, em parte, à imigração adicional que houve este ano. Se olharmos para o que separa o atual nível de inflação subjacente da meta de 2%, mais de metade são os aluguéis. Há desinflação nos bens e inflação nos serviços. Mas o maior obstáculo de fato são os aluguéis.

Por que eles estão elevados?

A complicação é que os aluguéis, no mercado, já desaceleraram bastante, mas isso não está aparecendo no índice do CPI (o IPCA americano). Isso é uma complicação grande porque o presidente do Fed, Jerome Powell, vem falando que a queda dos aluguéis é um fator importante para a queda da inflação. Quando a gente fala com grandes construtoras, fora de Nova York e Miami, os aluguéis estão desacelerando fortemente, mas há uma defasagem em relação ao CPI, essa queda não aparece no índice. Entendemos que isso vai começar a acontecer no verão (a partir deste mês no Hemisfério Norte).

Além disso, daqui a setembro, quais os principais indicadores que serão determinantes para a queda dos juros?

Os dados do mercado de trabalho são muito importantes, porque se os EUA estiverem criando menos de 200 mil vagas por mês, por exemplo, 175 mil, ainda é bom, mas deixa o Fed mais confortável para cortar os juros do que uma criação de 250 mil. Os componentes da inflação também serão importantes, eles querem ter certeza que a política monetária está fazendo o seu trabalho e desacelerando a economia.

O governo americano tem tido déficits primários elevados. Qual o peso da política fiscal sobre a inflação no país?

Há um grande debate sobre isso. Especialmente, se houve um choque de demanda ou um choque de oferta. Na nossa visão, a maior parte do problema foi por oferta. E estamos vendo isso diminuir, com o aumento da imigração. Também tivemos grande problema com as cadeias de produção, que pressionou os preços. Mas é claro que o fiscal não ajudou. O PIB cresceu 3%, e entendemos que 1 ponto percentual aconteceu por causa de estímulos fiscais. Mas o grande ponto agora é que esse efeito está diminuindo. Os programas do governo Biden já atingiram uma espécie de platô. Os gastos diretos do governo e os investimentos estão desacelerando, então parte da desaceleração do PIB que estamos vendo agora é graças ao fiscal. Isso fará com que a política monetária pareça mais restritiva.

Os gastos com duas guerras influenciam esse cenário?

É um pouco problemático. Não temos uma métrica precisa para isso, mas pode ser que metade da despesa com a guerra da Ucrânia seja gasto domesticamente com produção de bens que depois são enviados à Ucrânia. Mas acho que é uma pequena parte da expansão fiscal. O principal mesmo para o fiscal são gastos com construção de fábricas, suportes para veículos elétricos, créditos fiscais. São volumes de dólares muito maiores.

Teremos eleições presidenciais nos EUA este ano. O que muda com Trump ou Biden?

Acho que o cenário depende não só da eleição presidencial, mas do controle do Congresso. Se os republicanos controlarem a Casa Branca, a Câmara e o Senado, poderão aprovar mais medidas de expansão fiscal. E teremos também medidas de contenção de imigração. Isso tudo provavelmente terá impacto na inflação. Já com um governo dividido, você terá maiores restrições fiscais. Na imigração, haverá medidas para aumentar o controle na fronteira Sul do país, seja com democratas ou republicanos, mas a diferença será na severidade. Os republicanos querem um sistema mais rigoroso com aumento de deportações. Os democratas querem refinar o sistema atual. Mas, em termos do impacto global sobre a inflação, depende mais de quem controla a Câmara e o Senado, porque isso vai determinar se teremos dificuldades orçamentais ou expansão fiscal.

Ou seja, independentemente do vencedor, do ponto de vista fiscal, é melhor o Congresso dividido?

Sim.

Que conselhos o sr. daria para países emergentes como o Brasil?

Há uma possibilidade real, se a inflação parar de cair, de o crescimento continuar forte; há um cenário em que os juros tenham de voltar a subir em 2025. Há muita incerteza neste momento, nós não sabemos o que vai acontecer. Não tenho bola de cristal, tenho cenários de previsões, mas com muitas incertezas para o cenário econômico. Então, acho que o conselho seria, estejam preparados para as incertezas e o inesperado.

BRASÍLIA – O economista-chefe para os Estados Unidos do banco suíço UBS, Jonathan Pingle, admite que está ansioso sobre os rumos da política monetária na maior economia do mundo. Ele afirma, porém, que o cenário base do banco ainda é de início dos cortes dos juros em setembro, mesmo com os dados fortes do mercado de trabalho divulgados na última sexta-feira.

Pingle explica que a reunião do Fed (Banco Central americano) nesta semana será decisiva para ditar os rumos do mercado financeiro, porque trará a atualização das previsões feitas por cada um dos 19 membros do comitê de política monetária, incluindo as projeções de juros para o final de 2024.

O economista, que também trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI) e foi chefe de Economia para Renda Fixa das Américas no fundo BlackRock, pondera, no entanto, que o cenário é de grande incerteza. Por isso, há risco de o Fed ser obrigado a voltar a subir os juros no ano que vem, caso a inflação não caia como esperado e os números de crescimento voltem a acelerar.

Sobre as eleições presidenciais nos EUA, o economista entende que o melhor para a política fiscal é que o partido vencedor não controle também a Câmara e o Senado. Isso limitaria a capacidade de expansão de gastos pelo governo. Em conversa com o Estadão, o economista diz que o principal conselho a ser dado a países emergentes como o Brasil é que “estejam preparados para o inesperado”.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

Qual o cenário do UBS para o início dos cortes de juros pelo Fed?

Ainda apostamos no primeiro corte em setembro. Neste momento, o Fed está desapontado com os dados de inflação, mas eles tiveram um grande progresso. Pela nossa previsão, a inflação ficará rodando 2,7% ou 2,6% (taxa anual) pelos próximos meses (para uma meta de 2%), mas entendemos que haverá uma grande melhora na composição do número. O Fed está muito preocupado com a inflação dos aluguéis, e, se houver um arrefecimento, isso lhes dará mais confiança. A outra coisa é que o crescimento do PIB está desacelerando. Isso tudo vai ajudar. Portanto, estamos inquietos, mas ainda temos um corte em setembro como nosso cenário base.

O mercado de trabalho nos EUA na última sexta-feira veio muito forte...

Sim. Nós prevíamos uma alta de 185 mil (o dado veio em 272 mil). Os dados provavelmente vão reforçar a visão no Fed de que a economia está resiliente. Também coloca em risco nossa projeção de dois cortes este ano. Mas há outras razões para achar que o Fed vá manter a opção pelo corte em setembro. Haverá mais três relatórios de emprego antes dessa reunião, e esperamos ver mais ganhos abaixo de 200 mil que reduzam a média móvel trimestral. No entanto, a força relatada na sexta-feira pode alimentar a preocupação de que o mercado de trabalho forte possa impedir o Fed de alcançar suas metas de inflação. Isso é uma receita para potencialmente retomar os aumentos de juros em 2025.

Quais dados mudaram o humor do mercado em relação ao que se previa no início do ano?

Foram os dados de inflação do primeiro trimestre: de janeiro, fevereiro e março. Os números mensais do final de 2023 estavam rodando com uma inflação de 2%, e parecia, na época, que o Fed teria muita facilidade em descer a taxa anual para próximo de 2% ou 2,5%. Mas, depois, o que se viu foi um progresso muito mais lento. A reunião desta semana será decisiva para se saber o que fará o Fed no restante do ano.

Esta reunião traz as projeções feitas por cada um dos membros do Comitê. Como isso funciona?

Todos os 19 membros do Fed apresentarão suas previsões econômicas: PIB, taxa de desemprego, inflação cheia, inflação subjacente. E, então, eles descrevem o que consideram ser a política monetária apropriada para esse cenário. Com isso, é possível saber quantos dos 19 enxergam um ou dois cortes de juros no final do ano. Se a maioria entender que haverá apenas um corte, então não haverá tempo para que eles mudem de ideia até a reunião de setembro, porque não há tantos dados para serem divulgados até lá. Essa é uma informação muito importante, porque o dot plot (gráfico de pontos) pode fechar as portas para um corte em setembro e empurrar para dezembro.

Por que a inflação continua elevada? Há influência do mercado de trabalho, com desemprego tão baixo?

Parte se explica pelo aumento nominal dos salários. Mas esse crescimento está desacelerando rapidamente –devido, em parte, à imigração adicional que houve este ano. Se olharmos para o que separa o atual nível de inflação subjacente da meta de 2%, mais de metade são os aluguéis. Há desinflação nos bens e inflação nos serviços. Mas o maior obstáculo de fato são os aluguéis.

Por que eles estão elevados?

A complicação é que os aluguéis, no mercado, já desaceleraram bastante, mas isso não está aparecendo no índice do CPI (o IPCA americano). Isso é uma complicação grande porque o presidente do Fed, Jerome Powell, vem falando que a queda dos aluguéis é um fator importante para a queda da inflação. Quando a gente fala com grandes construtoras, fora de Nova York e Miami, os aluguéis estão desacelerando fortemente, mas há uma defasagem em relação ao CPI, essa queda não aparece no índice. Entendemos que isso vai começar a acontecer no verão (a partir deste mês no Hemisfério Norte).

Além disso, daqui a setembro, quais os principais indicadores que serão determinantes para a queda dos juros?

Os dados do mercado de trabalho são muito importantes, porque se os EUA estiverem criando menos de 200 mil vagas por mês, por exemplo, 175 mil, ainda é bom, mas deixa o Fed mais confortável para cortar os juros do que uma criação de 250 mil. Os componentes da inflação também serão importantes, eles querem ter certeza que a política monetária está fazendo o seu trabalho e desacelerando a economia.

O governo americano tem tido déficits primários elevados. Qual o peso da política fiscal sobre a inflação no país?

Há um grande debate sobre isso. Especialmente, se houve um choque de demanda ou um choque de oferta. Na nossa visão, a maior parte do problema foi por oferta. E estamos vendo isso diminuir, com o aumento da imigração. Também tivemos grande problema com as cadeias de produção, que pressionou os preços. Mas é claro que o fiscal não ajudou. O PIB cresceu 3%, e entendemos que 1 ponto percentual aconteceu por causa de estímulos fiscais. Mas o grande ponto agora é que esse efeito está diminuindo. Os programas do governo Biden já atingiram uma espécie de platô. Os gastos diretos do governo e os investimentos estão desacelerando, então parte da desaceleração do PIB que estamos vendo agora é graças ao fiscal. Isso fará com que a política monetária pareça mais restritiva.

Os gastos com duas guerras influenciam esse cenário?

É um pouco problemático. Não temos uma métrica precisa para isso, mas pode ser que metade da despesa com a guerra da Ucrânia seja gasto domesticamente com produção de bens que depois são enviados à Ucrânia. Mas acho que é uma pequena parte da expansão fiscal. O principal mesmo para o fiscal são gastos com construção de fábricas, suportes para veículos elétricos, créditos fiscais. São volumes de dólares muito maiores.

Teremos eleições presidenciais nos EUA este ano. O que muda com Trump ou Biden?

Acho que o cenário depende não só da eleição presidencial, mas do controle do Congresso. Se os republicanos controlarem a Casa Branca, a Câmara e o Senado, poderão aprovar mais medidas de expansão fiscal. E teremos também medidas de contenção de imigração. Isso tudo provavelmente terá impacto na inflação. Já com um governo dividido, você terá maiores restrições fiscais. Na imigração, haverá medidas para aumentar o controle na fronteira Sul do país, seja com democratas ou republicanos, mas a diferença será na severidade. Os republicanos querem um sistema mais rigoroso com aumento de deportações. Os democratas querem refinar o sistema atual. Mas, em termos do impacto global sobre a inflação, depende mais de quem controla a Câmara e o Senado, porque isso vai determinar se teremos dificuldades orçamentais ou expansão fiscal.

Ou seja, independentemente do vencedor, do ponto de vista fiscal, é melhor o Congresso dividido?

Sim.

Que conselhos o sr. daria para países emergentes como o Brasil?

Há uma possibilidade real, se a inflação parar de cair, de o crescimento continuar forte; há um cenário em que os juros tenham de voltar a subir em 2025. Há muita incerteza neste momento, nós não sabemos o que vai acontecer. Não tenho bola de cristal, tenho cenários de previsões, mas com muitas incertezas para o cenário econômico. Então, acho que o conselho seria, estejam preparados para as incertezas e o inesperado.

BRASÍLIA – O economista-chefe para os Estados Unidos do banco suíço UBS, Jonathan Pingle, admite que está ansioso sobre os rumos da política monetária na maior economia do mundo. Ele afirma, porém, que o cenário base do banco ainda é de início dos cortes dos juros em setembro, mesmo com os dados fortes do mercado de trabalho divulgados na última sexta-feira.

Pingle explica que a reunião do Fed (Banco Central americano) nesta semana será decisiva para ditar os rumos do mercado financeiro, porque trará a atualização das previsões feitas por cada um dos 19 membros do comitê de política monetária, incluindo as projeções de juros para o final de 2024.

O economista, que também trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI) e foi chefe de Economia para Renda Fixa das Américas no fundo BlackRock, pondera, no entanto, que o cenário é de grande incerteza. Por isso, há risco de o Fed ser obrigado a voltar a subir os juros no ano que vem, caso a inflação não caia como esperado e os números de crescimento voltem a acelerar.

Sobre as eleições presidenciais nos EUA, o economista entende que o melhor para a política fiscal é que o partido vencedor não controle também a Câmara e o Senado. Isso limitaria a capacidade de expansão de gastos pelo governo. Em conversa com o Estadão, o economista diz que o principal conselho a ser dado a países emergentes como o Brasil é que “estejam preparados para o inesperado”.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

Qual o cenário do UBS para o início dos cortes de juros pelo Fed?

Ainda apostamos no primeiro corte em setembro. Neste momento, o Fed está desapontado com os dados de inflação, mas eles tiveram um grande progresso. Pela nossa previsão, a inflação ficará rodando 2,7% ou 2,6% (taxa anual) pelos próximos meses (para uma meta de 2%), mas entendemos que haverá uma grande melhora na composição do número. O Fed está muito preocupado com a inflação dos aluguéis, e, se houver um arrefecimento, isso lhes dará mais confiança. A outra coisa é que o crescimento do PIB está desacelerando. Isso tudo vai ajudar. Portanto, estamos inquietos, mas ainda temos um corte em setembro como nosso cenário base.

O mercado de trabalho nos EUA na última sexta-feira veio muito forte...

Sim. Nós prevíamos uma alta de 185 mil (o dado veio em 272 mil). Os dados provavelmente vão reforçar a visão no Fed de que a economia está resiliente. Também coloca em risco nossa projeção de dois cortes este ano. Mas há outras razões para achar que o Fed vá manter a opção pelo corte em setembro. Haverá mais três relatórios de emprego antes dessa reunião, e esperamos ver mais ganhos abaixo de 200 mil que reduzam a média móvel trimestral. No entanto, a força relatada na sexta-feira pode alimentar a preocupação de que o mercado de trabalho forte possa impedir o Fed de alcançar suas metas de inflação. Isso é uma receita para potencialmente retomar os aumentos de juros em 2025.

Quais dados mudaram o humor do mercado em relação ao que se previa no início do ano?

Foram os dados de inflação do primeiro trimestre: de janeiro, fevereiro e março. Os números mensais do final de 2023 estavam rodando com uma inflação de 2%, e parecia, na época, que o Fed teria muita facilidade em descer a taxa anual para próximo de 2% ou 2,5%. Mas, depois, o que se viu foi um progresso muito mais lento. A reunião desta semana será decisiva para se saber o que fará o Fed no restante do ano.

Esta reunião traz as projeções feitas por cada um dos membros do Comitê. Como isso funciona?

Todos os 19 membros do Fed apresentarão suas previsões econômicas: PIB, taxa de desemprego, inflação cheia, inflação subjacente. E, então, eles descrevem o que consideram ser a política monetária apropriada para esse cenário. Com isso, é possível saber quantos dos 19 enxergam um ou dois cortes de juros no final do ano. Se a maioria entender que haverá apenas um corte, então não haverá tempo para que eles mudem de ideia até a reunião de setembro, porque não há tantos dados para serem divulgados até lá. Essa é uma informação muito importante, porque o dot plot (gráfico de pontos) pode fechar as portas para um corte em setembro e empurrar para dezembro.

Por que a inflação continua elevada? Há influência do mercado de trabalho, com desemprego tão baixo?

Parte se explica pelo aumento nominal dos salários. Mas esse crescimento está desacelerando rapidamente –devido, em parte, à imigração adicional que houve este ano. Se olharmos para o que separa o atual nível de inflação subjacente da meta de 2%, mais de metade são os aluguéis. Há desinflação nos bens e inflação nos serviços. Mas o maior obstáculo de fato são os aluguéis.

Por que eles estão elevados?

A complicação é que os aluguéis, no mercado, já desaceleraram bastante, mas isso não está aparecendo no índice do CPI (o IPCA americano). Isso é uma complicação grande porque o presidente do Fed, Jerome Powell, vem falando que a queda dos aluguéis é um fator importante para a queda da inflação. Quando a gente fala com grandes construtoras, fora de Nova York e Miami, os aluguéis estão desacelerando fortemente, mas há uma defasagem em relação ao CPI, essa queda não aparece no índice. Entendemos que isso vai começar a acontecer no verão (a partir deste mês no Hemisfério Norte).

Além disso, daqui a setembro, quais os principais indicadores que serão determinantes para a queda dos juros?

Os dados do mercado de trabalho são muito importantes, porque se os EUA estiverem criando menos de 200 mil vagas por mês, por exemplo, 175 mil, ainda é bom, mas deixa o Fed mais confortável para cortar os juros do que uma criação de 250 mil. Os componentes da inflação também serão importantes, eles querem ter certeza que a política monetária está fazendo o seu trabalho e desacelerando a economia.

O governo americano tem tido déficits primários elevados. Qual o peso da política fiscal sobre a inflação no país?

Há um grande debate sobre isso. Especialmente, se houve um choque de demanda ou um choque de oferta. Na nossa visão, a maior parte do problema foi por oferta. E estamos vendo isso diminuir, com o aumento da imigração. Também tivemos grande problema com as cadeias de produção, que pressionou os preços. Mas é claro que o fiscal não ajudou. O PIB cresceu 3%, e entendemos que 1 ponto percentual aconteceu por causa de estímulos fiscais. Mas o grande ponto agora é que esse efeito está diminuindo. Os programas do governo Biden já atingiram uma espécie de platô. Os gastos diretos do governo e os investimentos estão desacelerando, então parte da desaceleração do PIB que estamos vendo agora é graças ao fiscal. Isso fará com que a política monetária pareça mais restritiva.

Os gastos com duas guerras influenciam esse cenário?

É um pouco problemático. Não temos uma métrica precisa para isso, mas pode ser que metade da despesa com a guerra da Ucrânia seja gasto domesticamente com produção de bens que depois são enviados à Ucrânia. Mas acho que é uma pequena parte da expansão fiscal. O principal mesmo para o fiscal são gastos com construção de fábricas, suportes para veículos elétricos, créditos fiscais. São volumes de dólares muito maiores.

Teremos eleições presidenciais nos EUA este ano. O que muda com Trump ou Biden?

Acho que o cenário depende não só da eleição presidencial, mas do controle do Congresso. Se os republicanos controlarem a Casa Branca, a Câmara e o Senado, poderão aprovar mais medidas de expansão fiscal. E teremos também medidas de contenção de imigração. Isso tudo provavelmente terá impacto na inflação. Já com um governo dividido, você terá maiores restrições fiscais. Na imigração, haverá medidas para aumentar o controle na fronteira Sul do país, seja com democratas ou republicanos, mas a diferença será na severidade. Os republicanos querem um sistema mais rigoroso com aumento de deportações. Os democratas querem refinar o sistema atual. Mas, em termos do impacto global sobre a inflação, depende mais de quem controla a Câmara e o Senado, porque isso vai determinar se teremos dificuldades orçamentais ou expansão fiscal.

Ou seja, independentemente do vencedor, do ponto de vista fiscal, é melhor o Congresso dividido?

Sim.

Que conselhos o sr. daria para países emergentes como o Brasil?

Há uma possibilidade real, se a inflação parar de cair, de o crescimento continuar forte; há um cenário em que os juros tenham de voltar a subir em 2025. Há muita incerteza neste momento, nós não sabemos o que vai acontecer. Não tenho bola de cristal, tenho cenários de previsões, mas com muitas incertezas para o cenário econômico. Então, acho que o conselho seria, estejam preparados para as incertezas e o inesperado.

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Entrevista por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

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