O cientista político Luiz Felipe D’Avila, de 60 anos, candidato do Novo à Presidência em 2022, tem pela frente uma missão espinhosa, que ele mesmo se colocou: unir a direita para disputar o pleito de 2026 com chances concretas de vencer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que deve buscar a reeleição, e tirar o PT do poder.
“Meu papel principal agora é trabalhar para tentar unir a direita”, afirma D’Avila, que lança nesta quarta-feira, 22, em São Paulo, seu novo livro Vire à direita, Siga em frente – Manifesto da direita sensata para derrotar a esquerda (Ed. Edições 70). Segundo ele, a união das correntes que fazem parte do grupo deve se dar em torno de propostas, abordadas em detalhes no livro, e a escolha do nome do candidato para enfrentar Lula deve ficar para mais adiante.
“Nós precisamos disso para o Brasil. Se a direita estiver dividida na eleição, nós vamos manter o PT no poder – e é isso que a direita não quer. Nem a direita bolsonarista nem a direita que eu chamo de ‘direita sensata’, a direita liberal”, diz. “Se o governo petista continuar a partir de 2027, vai ser um desastre.”
Nesta entrevista ao Estadão, D’Avila adianta, porém, que, ao contrário das eleições passadas, marcadas pela polarização entre Lula e o ex-presidente Jair Bolsonaro, desta vez a “direita sensata” tem vários nomes que poderão representá-la na disputa. “Na eleição de 2022, infelizmente, nós elegemos um populista para a Presidência da República. Mas, felizmente, tivemos uma das melhores safras de governadores desde a redemocratização, com foco na pauta da direita sensata”, afirma. “Tem os governadores Tarcísio (de Freitas) em São Paulo, o Ratinho Júnior, no Paraná, o (Ronaldo) Caiado em Goiás, o (Romeu) Zema, em Minas, e a (ex-ministra da Agricultura) Tereza Cristina, que está no Senado.”
D’Avila, que diz não saber ainda se disputará algum cargo em 2026, afirma também que o compromisso desse frentão que ele pretende articular para vencer a “esquerda retrógrada” é combater “os três males” que afligem o País: o populismo, o nacional-estatismo e o Estado ineficiente. Para ele, “a turma do (ex-ministro da Economia) Paulo Guedes” cabe nesse “bonde” da “direita sensata”, assim como o que chama de “esquerda inteligente”. “Se estiver de acordo com a agenda mínima que eu proponho no livro, acredito que cabe todo mundo.” Confira a seguir os principais trechos da entrevista.
O sr. apresenta seu novo livro como um manifesto do que chama de “direita sensata” e diz que o grupo precisa se unir para vencer a esquerda nas eleições de 2026. Que “direita sensata” é essa a que o sr. se refere?
A direita sensata é a direita que acredita na liberdade econômica e na liberdade individual como pilares do desenvolvimento e da prosperidade. Ela tem o compromisso de combater os três males que afligem o País, que são o populismo, o nacional-estatismo e o Estado ineficiente. A direita sensata sempre compreendeu que essas três coisas são as âncoras que impedem o Brasil de crescer de maneira sustentável. O Brasil não cresce há 40 anos por causa disso – e, se não voltar a crescer, nós estamos perdidos. Sem crescimento econômico, não há como resolver as questões da desigualdade e da miséria. Então, a nossa pauta, a pauta da direita sensata, é fazer o Brasil acreditar no mercado e deixar os empreendedores trabalharem, para a economia voltar a crescer e a gente reduzir a pobreza e melhorar as condições de vida da população.
No livro, o sr. exclui o que chama de “direita chucra” desse frentão que deve ser formado pela “direita sensata” para derrotar a esquerda. Por que a “direita chucra” não tem espaço nesse grupo?
A direita chucra é justamente a direita antiliberal que a gente contesta. Ela é igual à esquerda retrógrada. Há um denominador comum unindo os dois grupos. Ambos acreditam no nacional-estatismo, que infelizmente é uma crença nossa praticamente desde os tempos de Getúlio (Vargas), nos anos 1930. Eles acreditam que essa mistura de nacionalismo econômico, fechamento da economia, proteção à indústria nacional e subsídio do governo é o jeito de gerar o crescimento da economia. Isso não é verdade. Nós vimos que, a partir dos anos 1980, o que alavancou o crescimento e levou à redução significativa da miséria nas nações emergentes mais bem-sucedidas foi o oposto disso. Foi a abertura comercial, a concorrência internacional e os ganhos de produtividade e de competitividade – uma pauta que nós abandonamos no Brasil. Por isso, essa turma não faz parte do nosso grupo.
O sr. não está simplificando demais as coisas ao dizer que essa “direita chucra” defende as mesmas bandeiras que o grupo que chamou de “esquerda retrógrada”?
O governo que mais criou estatal foi um governo de direita, o do (general Ernesto) Geisel (1974-1979), durante o regime militar. O Geisel criou 400 estatais. Ele acreditava, por exemplo, que o Estado tinha de manter o monopólio no setor de petróleo e o oligopólio no setor elétrico. São ideias parecidas com as que o governo Lula defende hoje. Essa pauta de que o Estado precisa tutelar o mercado, regular o mercado, porque senão a ganância e a ambição do setor privado vão distorcer tudo, é uma falácia. É aí que eu vejo que há uma intersecção entre a pauta da “direita chucra” e a da “esquerda retrógrada”. Só que uma diz que é pelo nacionalismo econômico e a outra, pela desigualdade social.
Levando em conta o atual quadro político, em qual categoria o sr. enquadra o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus seguidores, que representam uma parcela considerável da direita no País?
Eu sempre digo que a turma do (ex-ministro da Economia) Paulo Guedes, que fazia parte dessa veia bolsonarista, se encaixa perfeitamente nessa direita sensata. Eles vão olhar as nossas propostas para unir esse grupo e falar “bom, isso é o que nós estávamos tentando fazer no governo”. É preciso reconhecer que muitas reformas importantes para o desenvolvimento do País avançaram no período do Bolsonaro. Nós aprovamos a reforma da Previdência, a independência do Banco Central, a Lei de Liberdade Econômica, a Lei do Gás, o novo marco do saneamento, a Lei das Startups.
No fim do governo Bolsonaro, esse grupo teve de fazer concessões. A direita chucra teve uma interferência no governo que me preocupou. A PEC-Kamikaze foi um momento absurdo. O calote dos precatórios, também. Depois, houve os furos no teto de gastos com o orçamento secreto. Outra coisa é que muita gente que faz parte desse grupo dá uma importância muito grande à pauta de costumes. Nós temos que definir prioridades. Isso não vai trazer crescimento econômico para o Brasil, não vai resolver as questões estruturantes do Estado brasileiro.
Na prática, olhando para o quadro político e partidário que a gente tem hoje no País, quem seria o grande líder dessa “direita sensata”, com força para vencer as eleições de 2026?
Na eleição de 2022, infelizmente, nós elegemos um populista para a Presidência da República. Mas, felizmente, tivemos uma das melhores safras de governadores desde a redemocratização, com foco nessa pauta da direita sensata. E aí tem vários nomes que poderiam ser candidatos. Tem os governadores Tarcísio (de Freitas) em São Paulo, o Ratinho Júnior, no Paraná, o (Ronaldo) Caiado em Goiás, o (Romeu) Zema, em Minas, e a (ex-ministra da Agricultura) Tereza Cristina, que está no Senado. Então, nome é que não falta desta vez.
Em 2022, a polarização Bolsonaro-Lula praticamente matou o surgimento de novos nomes para a disputa. Agora, não. Então, o que nós temos de fazer é trabalhar para unir a direita em torno de um único nome. O grande trabalho que nós temos agora é unir esse grupo. E, ao meu ver, a melhor forma de promover essa união é em torno de propostas, como a transformação do Brasil numa superpotência global da economia de baixo carbono e o foco em resolver a questão da educação básica. Se a direita se unir em torno de propostas, nós poderemos definir quem será o candidato mais à frente. É importante ter o mínimo denominador comum daquilo que nos une. Nós precisamos disso para o Brasil, para vencer a eleição. Se a gente não tiver uma pauta mínima para estabelecer esse diálogo, nós vamos cair na armadilha de ficar explorando as nossas diferenças. Foi exatamente o que aconteceu na eleição de 2022, e deu no que deu.
Isso já para o primeiro turno?
Sim, com certeza, já para o primeiro turno. Nós precisamos ter um único candidato. Esse é o ponto. A direita tem de estar unida em torno de um único nome. Se a direita estiver fragmentada, vai permitir que a esquerda continue no poder.
Agora, independentemente da visão que se tenha sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro, não dá para negar sua penetração popular. Até que ponto um desses possíveis candidatos que o sr. mencionou ou algum outro nome que eventualmente surja até 2026 tem força para vencer as eleições sem o apoio do Bolsonaro?
O grupo do Bolsonaro é importante. Mas hoje, sem ele ser candidato à Presidência, a direita bolsonarista não tem força para eleger um candidato próprio. Vamos dizer que o Bolsonaro queira lançar a Michelle ou alguém assim. Ela não vai conseguir chegar lá sozinha. Dividir a direita é perder a eleição. Então, é importante essa direita bolsonarista estar nessa composição, com uma pauta comum.
É por isso que o propósito desse livro é unir a direita, esquecer o que nos divide e focar no que nos une, para tirar o PT do poder. A grande vantagem de estar na oposição hoje é que todo mundo tem o mesmo objetivo, que é retomar o governo. Nós sabemos que, se o governo petista continuar a partir de 2027, vai ser um desastre. Nós vamos estar na pior situação da história do Brasil desde a redemocratização. Como eu disse, se a direita estiver dividida na eleição, nós vamos manter o PT no poder – e é isso que a direita não quer. Nem a direita bolsonarista nem a direita que eu chamo de “direita sensata”, a direita liberal.
Há uma máxima segundo a qual essa direita liberal que o sr. menciona caberia numa Kombi. Será que esse grupo tem um discurso popular para conquistar os eleitores e ganhar uma eleição para presidente no Brasil?
Bom, essa Kombi cresceu, né? Virou um bondão. As últimas pesquisas mostram que a maioria da população brasileira hoje é de direita, de centro-direita e de centro. Eu entendo que hoje, no Brasil, uma parcela grande da população é de direita, no sentido de acreditar nessas pautas da abertura econômica, do empreendedorismo, da meritocracia. O que nós precisamos é aprender com a narrativa populista a se conectar mais com as pessoas. O populismo sabe fazer isso muito bem, mas as soluções que propõe são erradas. Eles não resolvem os problemas e muitas vezes acabam por agravá-los. As soluções corretas estão nessa pauta do que eu chamo de direita democrática. Se há uma coisa que a direita democrática não aprendeu é se comunicar com as pessoas. Mas, hoje, com essa safra boa de governadores, com lideranças partidárias, senadores e deputados, nós temos pessoas que souberam traduzir esse discurso em voto. Eu vejo que um pouco dessa coisa da Kombi é uma fotografia do passado. Acho que a gente avançou muito nos últimos anos e que essa direita sensata está cada vez mais ocupando os espaços de poder.
Na Argentina, a gente teve a eleição do presidente Javier Milei, que se coloca como um libertário. Ele surgiu praticamente do nada e conseguiu derrotar a esquerda e até as forças políticas tradicionais de direita do país. Como é que o sr. vê o caso do Milei nesse contexto? O sr. acredita que pode haver um efeito Orloff (“eu sou você amanhã”) aqui no Brasil?
Não, eu não acredito que, no Brasil, nós teremos um Milei. Como eu disse há pouco, nós já temos uma safra de grandes governadores com grande potencial e, se a direita sensata se unir, será em torno de alguém que tenha mais chance agora. Ela não vai arriscar com um outsider como o Milei. Eu acho que não há mais espaço para um outsider no Brasil. Acredito que o candidato da direita no País vai sair de dentro do sistema. Agora, eu li as 14 propostas do Milei, o programa de governo dele. Tirando duas ou três medidas exóticas, como a dolarização e o fim do Banco Central, que ele parece ter deixado para trás, focando no que é fundamental, que é o combate à casta, é exatamente o que nós estamos defendendo aqui. A maior parte das pautas dele faz todo sentido.
Eu achava que o grande desafio do Milei seria aprender a navegar nas águas políticas, ou seja, criar consenso em torno de suas propostas para aprová-las no Congresso. Ele começou mal e sofreu duras derrotas, mas está aprendendo rapidamente. Já aprovou o “pacote ônibus” na Câmara e agora tem de aprová-lo no Senado. Se ele aprovar o “pacote ônibus”, acredito que vai conseguir entregar muita coisa para a Argentina. Vai transformar o país da esquerda populista, do peronismo, numa economia mais liberal. Isso vai ter efeito não só no Brasil, mas na América Latina como um todo. A grande questão é se ele vai continuar firme e forte na defesa dessas pautas ou se vai ceder ao populismo. Acho que essa será sua prova de fogo.
Nesse “bonde” da “direita sensata” que o sr. propõe, há espaço também para as forças de centro e de centro-esquerda?
Com certeza. Aliás, se estiver de acordo com a agenda mínima que eu proponho no livro, acredito que cabe todo mundo. Cabem as pessoas sensatas da esquerda e da direita. O ponto principal, mais uma vez, é o seguinte: o que nos une, o que une essa direita sensata é a necessidade imperiosa de vencer as eleições de 2026 e tirar o PT do poder. Eu digo no livro que tem uma esquerda inteligente, que era a antiga esquerda do PSDB, do Fernando Henrique. Ela quebrou o monopólio da Petrobras, fez a privatização das telecomunicações e da Vale, começou um programa importante de reformas, nos anos 1990. Nós temos uma liderança de centro-esquerda que entende a importância da economia de mercado para gerar riqueza. Então, se houver esse diálogo da esquerda inteligente com a direita sensata, o Brasil só tem a ganhar com isso.
A ficha dessa turma caiu com o Felipe González, na Espanha, nos anos 1980 e 1990. Ele foi o primeiro grande líder da social-democracia a encampar as propostas liberais na economia. Depois veio uma leva de pessoas atrás: o Tony Blair, no Reino Unido, o Bill Clinton, nos Estados Unidos, o (Carlos) Menem, na Argentina, e o próprio Fernando Henrique, no Brasil. Só que essa esquerda morreu no País. O retrato mais cabal disso é o fim do PSDB. Onde é que está essa esquerda inteligente hoje? A esquerda inteligente no Brasil desapareceu. Num mundo polarizado como o que a gente vive hoje, não tem cor cinza. Você tem que se posicionar como de direita. Nós somos de direita, dessa direita sensata. É importante deixar isso claro. O eleitor, hoje, não quer saber de incerteza, da indefinição do cinza.
Há também o grupo dos autodenominados “liberais progressistas”, que votaram em Lula “pela democracia” em 2022, acreditando que desta vez seria diferente, mas estão decepcionados com os rumos do governo e abandonando o barco. Essa turma também tem lugar no “bonde” da “direita sensata”?
Com certeza. Eu escrevi muito sobre isso no Estadão, sobre a armadilha do mal menor, como a (filósofa) Hanna Arendt sempre falava, de achar que há um mal que é menor que outro. Isso é o que eu chamo de autoengano. Entender que o Lula era um mal menor foi um absurdo total. Estava na cara que seu objetivo era dilapidar toda essa pauta que nós consideramos prioritária. O governo dele mostra isso. O Lula não aprendeu nada com os erros do passado e não esqueceu nada do que lhe aconteceu, do que aconteceu com o PT. Então, ele vem com essa coisa vingativa, revanchista, com uma pauta absolutamente antiga. Ao invés de ser o Lula 1, está sendo a Dilma. Na verdade, essa coisa de que o primeiro mandato do Lula foi muito bom é um mito. Não foi, não. O momento de sensatez do Lula 1 durou dois anos. Depois veio o Mensalão e tudo mudou. Dos 16 anos que o PT ficou no poder, houve dois anos de sensatez e não quatro. Mesmo assim, muita gente achou que aqueles dois anos de sensatez, no começo do Lula 1, é que iriam voltar agora e não os 14 anos de insensatez. Isso foi um absurdo.
No livro, o sr. defende essas ideias da direita liberal, da “direita sensata”, de maior abertura econômica, mas o mundo caminha para um cenário oposto, de ‘desglobalização’, de mais protecionismo, de maior intervenção estatal. Será que, neste cenário, o crescimento dessa “direita sensata” no Brasil está de acordo com o espírito do tempo?
Eu vejo que a desglobalização, a rigor, é um realinhamento de forças. Não é o fim da globalização. É que agora as empresas estão buscando novos parceiros comerciais fora da China, em países amigos, mais perto de casa.
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Agora, a taxa de crescimento do comércio internacional vai ser mais lenta. A China também deverá crescer menos do que cresceu até agora.
É verdade, mas quanto vai cair o comércio entre a China e os Estados Unidos? 10%? Hoje, a economia dos Estados Unidos depende 70% da China e isso não será possível, porque significará o empobrecimento automático da sociedade americana. Então, eu entendo que hoje o comércio mundial já está muito interligado. No caso do Brasil, eu entendo que, por ser um país com uma das economias mais fechadas do mundo, não há outro caminho a não ser o ser o aumento do comércio internacional. O Brasil é a nona economia mundial, mas nós exportamos menos que Taiwan. Nós somos o 29º país em importação e o 27º em exportação. Isso não existe. Nós somos nanicos no comércio exterior. Então, essa pauta pode ser repensada por alguns países avançados, mas nunca por um país emergente como o Brasil. Nenhum país cresceu de forma robusta sem abrir sua economia. Precisamos ter isso como uma meta de Estado e não de governo.
Além disso, o Brasil tem que deixar de ser um mero exportador de commodities e exportar produtos de maior valor agregado. Isso é algo que só vai acontecer com uma abertura comercial. Por exemplo, nós exportamos grãos de café quando nós poderíamos estar exportando cápsula de café Nespresso. Então, tem um caminho aqui, principalmente naquilo em que nós já somos bons, como no agronegócio. Isso vai trazer riqueza para o Brasil. Foi um salto que todos os países emergentes asiáticos deram, com a inserção nas cadeias de suprimentos globais e não por meio de uma carteirada de Brasília. Eles até tentaram, mas não funcionou. Os campeões nacionais não existem. Isso não leva a lugar algum.
No livro, o sr. afirma também que a Constituição de 1988, chamada de “Constituição Cidadã”, é uma “utopia do nacional-estatismo”. Isso não é um exagero?
Não, não é. Eu me lembro dos artigos do (economista e ex-senador) Roberto Campos no Estadão, na época da Constituinte, mostrando que o Brasil estava indo na contramão da história. Eu convivi muito com o (ex-deputado federal e presidente da Constituinte) Ulisses (Guimarães), por causa do meu avô, João Pacheco Chaves, que também foi deputado e era seu melhor amigo, e me lembro das conversas que tive com ele e um grupo próximo. Eu ficava estarrecido om a ignorância econômica deles. Os autores da Constituição de 1988 eram absolutamente ignorantes em matéria econômica. Ficava chocado. Essa geração não tinha nenhum apreço pela economia. O negócio deles era salvar a democracia, era a política. A economia era delegada para os técnicos e para os burocratas. Foi assim durante muito tempo. Não é possível imaginar que esse sistema vai fazer o Brasil voltar a crescer.
Todas as reformas do Estado brasileiro desde então foram para acabar com questões incluídas na Constituição de 1988, como o monopólio do petróleo, o tabelamento dos juros em 12% e outras coisas do gênero. Todo o arcabouço econômico da Constituição tinha o Estado como indutor do crescimento, da justiça social. Por que? Fiquei pensando nisso depois, durante muito tempo. Era uma geração que se criou no êxito do nacional-estatismo do Getúlio Vargas. Eles se formaram politicamente nesse período, quando o nacional-estatismo e o Juscelino (Kubitschek) deram esse empurrão no País. Só que as coisas mudaram nos anos 1980, a chave virou, mas a gente ficou com a pauta antiga. De lá pra cá, foi ladeira abaixo.
No capítulo das questões sociais, como o sr. avalia a Constituição de 1988?
Nas questões sociais, é sempre o Estado ajudando, a burocratização da miséria, da desigualdade. Nós sabemos, por evidência, que o maior programa contra a desigualdade social e contra a miséria é o crescimento econômico sustentável. Mas o Brasil vem com voos de galinha desde 1985. Assim, não vamos resolver a questão da desigualdade social, da miséria, da igualdade de oportunidade, principalmente na educação.
Para terminar, o sr. fala no livro que o Brasil está numa encruzilhada e que nosso futuro dependerá de quais serão os próximos passos. Em sua visão, a “direita sensata” seria a saída para levar a gente para uma situação melhor. O que o leva a acreditar que esse será o caminho que vamos trilhar agora?
Desde 1985 até hoje, exceto em breves períodos, nos anos Fernando Henrique, Michel Temer e nesse pedaço do Bolsonaro/Paulo Guedes, a direita sensata vive a reboque da pauta nacional estatista e populista, e o que ela tentou fazer foram melhorias incrementais. E por que eu acredito que a gente está numa encruzilhada? Porque eu acho que 2026 a direita sensata pode se tornar protagonista. Daí a importância de uni-la, primeiro em torno de determinados valores, ideias e propostas. Porque se ela estiver unida, pela primeira vez desde a Primeira República (1889-1930), desde os meus amigos antigos, como eu brinco, que são o Prudente de Moraes, o Campos Salles e Rodrigues Alves, nós poderemos ter o protagonismo de uma direita sensata no poder. Então, é uma encruzilhada que traz a melhor oportunidade para a direita sensata deixar de ter um papel secundário e assumir um papel de protagonista no País.