A divulgação do Relatório de Receitas e Despesas do governo federal decepcionou os investidores. O relatório, que indicou um corte e contingenciamento de despesas de R$ 15 bilhões, acima das expectativas que apontavam para algo mais próximo a R$ 10 bilhões, trouxe também a indicação de que o governo não deverá perseguir a meta de déficit zero em 2024, mas que está satisfeito se conseguir cumprir o limite inferior do intervalo de metas que indica um déficit primário de -0,25% do PIB, ou R$ 28,9 bilhões no ano.
Ao adotar o limite inferior do intervalo como meta, por um lado, o governo se arrisca a não cumprir a meta caso ocorra alguma imprevisibilidade ou que alguma previsão de receita ou de despesa não se cumpra. Neste caso, a expectativa é que o governo mude a meta. Ou seja, voltamos à estaca zero na questão fiscal. Por outro lado, a tendência é que a trajetória de dívida cresça a taxas mais elevadas no futuro próximo, o que tende a aumentar os prêmios de risco do País e as taxas de juros demandadas pelos investidores para financiar a dívida do Brasil.
A esses fatores junta-se o fato de que existe consenso entre analistas de que o arcabouço fiscal, da forma como está desenhado hoje, é insustentável no longo prazo. Primeiro, por causa do impasse entre Legislativo e Executivo em torno da necessidade de aprovar legislação para aumentar a carga tributária, indispensável para aumentar as receitas de impostos para financiar os aumentos de gastos já projetados.
Segundo, por causa do aumento dos gastos com previdência (INSS) e assistência social (BPC) decorrente da política de reajuste real do salário mínimo, que indexa os pisos desses programas, e dos mínimos constitucionais de saúde e educação, que são vinculados às receitas tributárias.
As projeções mostram que o arcabouço fiscal não será capaz de estabilizar a relação dívida/PIB no horizonte relevante, ao mesmo tempo que as despesas obrigatórias descritas acima vão comprimir as despesas voluntárias e inviabilizar o funcionamento do governo.
Finalmente, a transição da presidência e da diretoria do Banco Central do Brasil, com o fim do mandato do presidente Roberto Campos Neto, cria uma incerteza adicional quanto à trajetória da política monetária a partir de 2025, o que contribui para a desancoragem das expectativas para a inflação no horizonte relevante da política monetária. O comportamento negativo dos preços dos ativos financeiros no Brasil reflete esta ausência de âncora fiscal e monetária.