Limite a parcelas sem juros no cartão de crédito? Entenda a disputa que opõe bancos ao varejo


Equipe econômica negocia saída para taxas do rotativo diante de impasse entre instituições financeiras e varejistas; Haddad diz que solução será apresentada em até 90 dias

Por Bianca Lima
Atualização:

BRASÍLIA - A busca por uma solução para os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito, a linha de financiamento mais cara existente hoje no País, colocou em campos opostos as instituições financeiras e o comércio. Os bancos rejeitam a possibilidade de tabelamento ou teto para as taxas, e dizem que a construção de uma saída passa por algum tipo de restrição às compras parceladas sem juros. O problema é que elas são um dos motores das vendas no varejo.

O Estadão apurou que ainda não há um desenho fechado pela equipe econômica e que a negociação é considerada complexa, mas que as tratativas estão avançando, inclusive com a participação do Congresso. Nesta quarta-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que governo, bancos e varejo estão “sentados em uma mesa” para discutir saídas ao “maior problema de juro” do Brasil. Segundo ele, uma proposta será apresentada em até 90 dias.

Dados do Banco Central (BC), referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano. Ou seja: em doze meses, a dívida mais do que quintuplica. Algumas financeiras, no entanto, chegam a cobrar quase 1.000%, segundo levantamento da autoridade monetária.

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Dados do Banco Central, referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano.  Foto: Divulgação

O vice-líder do governo na Câmara, deputado Alencar Santana (PT-SP), é relator de um projeto de lei que vai receber o conteúdo do Desenrola, programa do governo federal de renegociação de dívidas, e já avisou que tratará, também, da questão do rotativo. “Fazer o Desenrola e não tratar do problema do cartão é o mesmo que não fazer nada. Você desenrola a pessoa para ela se enrolar de novo”, diz. Santana afirma que está ouvindo todos os atores da cadeia e que pretende apresentar o parecer em, no máximo, duas semanas.

Ex-presidente da Câmara e hoje à frente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Rodrigo Maia está participando das conversas no Congresso e no governo. “Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros”, argumenta. “Não adianta mexer em apenas uma das pontas”.

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Em um evento organizado pelo Bradesco BBI no início de abril, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, reforçou esse entendimento. O executivo afirmou que o modelo de tabelamento de juros, em uma indústria como a de cartão de crédito, era o “menos aconselhável possível” e citou o parcelamento sem juros como uma das razões das taxas elevadas. “Não estou defendendo o fim do parcelamento sem juros, mas temos de entender as causas”, disse Sidney, à época.

Em nota, a Febraban afirmou que as instituições financeiras têm como prioridade a redução do custo de crédito no País, mas “sem a adoção de medidas artificiais”. Disse ainda que o rotativo possui “forte subsídio cruzado” e uma inadimplência que chega a 40%.

'Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros', diz Maia, que hoje preside a Confederação Nacional das Instituições Financeiras. Foto: Sidney Lins/Liderança dos Democratas na Câmara
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‘Jabuticaba’ do mercado de crédito

O parcelado sem juros é considerado uma “jabuticaba” do mercado de crédito brasileiro – uma modalidade que só existe por aqui. Ela ocupou o espaço do cheque pré-datado e hoje é um dos motores do varejo. Trata-se, porém, de um benefício cruzado. “A pessoa que cair no rotativo vai pagar pela suposta venda sem juros”, explica a coordenadora do programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. “É uma propaganda enganosa.”

Nessa seara, uma das possibilidades em discussão é a limitação do número de parcelas, já que quanto maior o prazo, maior o risco de inadimplência. Outra opção é negociar com o comércio uma diferenciação dos preços à vista e a prazo, para desestimular as vendas parceladas.

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Segundo o Estadão apurou, também foi discutida a possibilidade de se alterar as taxas de intercâmbio – as quais as emissoras de cartão cobram dos lojistas pelo uso do meio de pagamento. A ideia seria cobrar taxas mais elevadas em financiamentos mais longos, mas, de acordo com fontes, há resistências dentro do BC. Hoje, não há limite para essa taxa no crédito, o que faz com que os bancos cobrem porcentuais considerados elevados.

Comércio mira exemplo do cheque especial

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Nas negociações com governo e Congresso, os representantes do comércio têm repetido que o cartão de crédito responde por nada menos que 80% da concessão de recursos livres a pessoas físicas no País. E que, portanto, é fundamental ao setor e à atividade econômica. “É um tipo de crédito que mexe com o dia a dia das pessoas e do varejo”, diz Fabio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

Segundo ele, limitar o parcelado sem juros pode fazer com que o tiro saia pela culatra. “Reduzir o número de parcelas pode afetar a capacidade de pagamento e levar mais consumidores ao rotativo”, afirma Bentes. “Não é que não se deva olhar para o parcelado, mas o cerne da questão é a taxa do rotativo, que hoje é estupidamente elevada.”

O economista diz que a regulamentação do cheque especial é um bom exemplo a ser seguido. No fim de 2019, uma resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) definiu que as instituições financeiras não poderiam cobrar mais do que 8% ao mês ou 151% ao ano dos clientes. A mudança passou a valer em janeiro de 2020 e permitiu uma redução de R$ 10,4 bilhões no pagamento de juros naquele ano, segundo dados do BC.

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O varejo conta com o apoio do Idec que, apesar de reconhecer as particularidades do mercado de cartões, como a questão do parcelado sem juros, ainda assim vê como necessária a fixação de um teto para a taxa do rotativo. O instituto defende que o limite seja definido de acordo com a faixa de renda do consumidor. Ou seja, quem tem renda menor, paga um juros também menor em relação aos que possuem mais recursos financeiros. A proposta já foi levada ao deputado Alencar Santana.

BRASÍLIA - A busca por uma solução para os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito, a linha de financiamento mais cara existente hoje no País, colocou em campos opostos as instituições financeiras e o comércio. Os bancos rejeitam a possibilidade de tabelamento ou teto para as taxas, e dizem que a construção de uma saída passa por algum tipo de restrição às compras parceladas sem juros. O problema é que elas são um dos motores das vendas no varejo.

O Estadão apurou que ainda não há um desenho fechado pela equipe econômica e que a negociação é considerada complexa, mas que as tratativas estão avançando, inclusive com a participação do Congresso. Nesta quarta-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que governo, bancos e varejo estão “sentados em uma mesa” para discutir saídas ao “maior problema de juro” do Brasil. Segundo ele, uma proposta será apresentada em até 90 dias.

Dados do Banco Central (BC), referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano. Ou seja: em doze meses, a dívida mais do que quintuplica. Algumas financeiras, no entanto, chegam a cobrar quase 1.000%, segundo levantamento da autoridade monetária.

Dados do Banco Central, referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano.  Foto: Divulgação

O vice-líder do governo na Câmara, deputado Alencar Santana (PT-SP), é relator de um projeto de lei que vai receber o conteúdo do Desenrola, programa do governo federal de renegociação de dívidas, e já avisou que tratará, também, da questão do rotativo. “Fazer o Desenrola e não tratar do problema do cartão é o mesmo que não fazer nada. Você desenrola a pessoa para ela se enrolar de novo”, diz. Santana afirma que está ouvindo todos os atores da cadeia e que pretende apresentar o parecer em, no máximo, duas semanas.

Ex-presidente da Câmara e hoje à frente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Rodrigo Maia está participando das conversas no Congresso e no governo. “Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros”, argumenta. “Não adianta mexer em apenas uma das pontas”.

Em um evento organizado pelo Bradesco BBI no início de abril, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, reforçou esse entendimento. O executivo afirmou que o modelo de tabelamento de juros, em uma indústria como a de cartão de crédito, era o “menos aconselhável possível” e citou o parcelamento sem juros como uma das razões das taxas elevadas. “Não estou defendendo o fim do parcelamento sem juros, mas temos de entender as causas”, disse Sidney, à época.

Em nota, a Febraban afirmou que as instituições financeiras têm como prioridade a redução do custo de crédito no País, mas “sem a adoção de medidas artificiais”. Disse ainda que o rotativo possui “forte subsídio cruzado” e uma inadimplência que chega a 40%.

'Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros', diz Maia, que hoje preside a Confederação Nacional das Instituições Financeiras. Foto: Sidney Lins/Liderança dos Democratas na Câmara

‘Jabuticaba’ do mercado de crédito

O parcelado sem juros é considerado uma “jabuticaba” do mercado de crédito brasileiro – uma modalidade que só existe por aqui. Ela ocupou o espaço do cheque pré-datado e hoje é um dos motores do varejo. Trata-se, porém, de um benefício cruzado. “A pessoa que cair no rotativo vai pagar pela suposta venda sem juros”, explica a coordenadora do programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. “É uma propaganda enganosa.”

Nessa seara, uma das possibilidades em discussão é a limitação do número de parcelas, já que quanto maior o prazo, maior o risco de inadimplência. Outra opção é negociar com o comércio uma diferenciação dos preços à vista e a prazo, para desestimular as vendas parceladas.

Segundo o Estadão apurou, também foi discutida a possibilidade de se alterar as taxas de intercâmbio – as quais as emissoras de cartão cobram dos lojistas pelo uso do meio de pagamento. A ideia seria cobrar taxas mais elevadas em financiamentos mais longos, mas, de acordo com fontes, há resistências dentro do BC. Hoje, não há limite para essa taxa no crédito, o que faz com que os bancos cobrem porcentuais considerados elevados.

Comércio mira exemplo do cheque especial

Nas negociações com governo e Congresso, os representantes do comércio têm repetido que o cartão de crédito responde por nada menos que 80% da concessão de recursos livres a pessoas físicas no País. E que, portanto, é fundamental ao setor e à atividade econômica. “É um tipo de crédito que mexe com o dia a dia das pessoas e do varejo”, diz Fabio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

Segundo ele, limitar o parcelado sem juros pode fazer com que o tiro saia pela culatra. “Reduzir o número de parcelas pode afetar a capacidade de pagamento e levar mais consumidores ao rotativo”, afirma Bentes. “Não é que não se deva olhar para o parcelado, mas o cerne da questão é a taxa do rotativo, que hoje é estupidamente elevada.”

O economista diz que a regulamentação do cheque especial é um bom exemplo a ser seguido. No fim de 2019, uma resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) definiu que as instituições financeiras não poderiam cobrar mais do que 8% ao mês ou 151% ao ano dos clientes. A mudança passou a valer em janeiro de 2020 e permitiu uma redução de R$ 10,4 bilhões no pagamento de juros naquele ano, segundo dados do BC.

O varejo conta com o apoio do Idec que, apesar de reconhecer as particularidades do mercado de cartões, como a questão do parcelado sem juros, ainda assim vê como necessária a fixação de um teto para a taxa do rotativo. O instituto defende que o limite seja definido de acordo com a faixa de renda do consumidor. Ou seja, quem tem renda menor, paga um juros também menor em relação aos que possuem mais recursos financeiros. A proposta já foi levada ao deputado Alencar Santana.

BRASÍLIA - A busca por uma solução para os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito, a linha de financiamento mais cara existente hoje no País, colocou em campos opostos as instituições financeiras e o comércio. Os bancos rejeitam a possibilidade de tabelamento ou teto para as taxas, e dizem que a construção de uma saída passa por algum tipo de restrição às compras parceladas sem juros. O problema é que elas são um dos motores das vendas no varejo.

O Estadão apurou que ainda não há um desenho fechado pela equipe econômica e que a negociação é considerada complexa, mas que as tratativas estão avançando, inclusive com a participação do Congresso. Nesta quarta-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que governo, bancos e varejo estão “sentados em uma mesa” para discutir saídas ao “maior problema de juro” do Brasil. Segundo ele, uma proposta será apresentada em até 90 dias.

Dados do Banco Central (BC), referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano. Ou seja: em doze meses, a dívida mais do que quintuplica. Algumas financeiras, no entanto, chegam a cobrar quase 1.000%, segundo levantamento da autoridade monetária.

Dados do Banco Central, referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano.  Foto: Divulgação

O vice-líder do governo na Câmara, deputado Alencar Santana (PT-SP), é relator de um projeto de lei que vai receber o conteúdo do Desenrola, programa do governo federal de renegociação de dívidas, e já avisou que tratará, também, da questão do rotativo. “Fazer o Desenrola e não tratar do problema do cartão é o mesmo que não fazer nada. Você desenrola a pessoa para ela se enrolar de novo”, diz. Santana afirma que está ouvindo todos os atores da cadeia e que pretende apresentar o parecer em, no máximo, duas semanas.

Ex-presidente da Câmara e hoje à frente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Rodrigo Maia está participando das conversas no Congresso e no governo. “Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros”, argumenta. “Não adianta mexer em apenas uma das pontas”.

Em um evento organizado pelo Bradesco BBI no início de abril, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, reforçou esse entendimento. O executivo afirmou que o modelo de tabelamento de juros, em uma indústria como a de cartão de crédito, era o “menos aconselhável possível” e citou o parcelamento sem juros como uma das razões das taxas elevadas. “Não estou defendendo o fim do parcelamento sem juros, mas temos de entender as causas”, disse Sidney, à época.

Em nota, a Febraban afirmou que as instituições financeiras têm como prioridade a redução do custo de crédito no País, mas “sem a adoção de medidas artificiais”. Disse ainda que o rotativo possui “forte subsídio cruzado” e uma inadimplência que chega a 40%.

'Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros', diz Maia, que hoje preside a Confederação Nacional das Instituições Financeiras. Foto: Sidney Lins/Liderança dos Democratas na Câmara

‘Jabuticaba’ do mercado de crédito

O parcelado sem juros é considerado uma “jabuticaba” do mercado de crédito brasileiro – uma modalidade que só existe por aqui. Ela ocupou o espaço do cheque pré-datado e hoje é um dos motores do varejo. Trata-se, porém, de um benefício cruzado. “A pessoa que cair no rotativo vai pagar pela suposta venda sem juros”, explica a coordenadora do programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. “É uma propaganda enganosa.”

Nessa seara, uma das possibilidades em discussão é a limitação do número de parcelas, já que quanto maior o prazo, maior o risco de inadimplência. Outra opção é negociar com o comércio uma diferenciação dos preços à vista e a prazo, para desestimular as vendas parceladas.

Segundo o Estadão apurou, também foi discutida a possibilidade de se alterar as taxas de intercâmbio – as quais as emissoras de cartão cobram dos lojistas pelo uso do meio de pagamento. A ideia seria cobrar taxas mais elevadas em financiamentos mais longos, mas, de acordo com fontes, há resistências dentro do BC. Hoje, não há limite para essa taxa no crédito, o que faz com que os bancos cobrem porcentuais considerados elevados.

Comércio mira exemplo do cheque especial

Nas negociações com governo e Congresso, os representantes do comércio têm repetido que o cartão de crédito responde por nada menos que 80% da concessão de recursos livres a pessoas físicas no País. E que, portanto, é fundamental ao setor e à atividade econômica. “É um tipo de crédito que mexe com o dia a dia das pessoas e do varejo”, diz Fabio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

Segundo ele, limitar o parcelado sem juros pode fazer com que o tiro saia pela culatra. “Reduzir o número de parcelas pode afetar a capacidade de pagamento e levar mais consumidores ao rotativo”, afirma Bentes. “Não é que não se deva olhar para o parcelado, mas o cerne da questão é a taxa do rotativo, que hoje é estupidamente elevada.”

O economista diz que a regulamentação do cheque especial é um bom exemplo a ser seguido. No fim de 2019, uma resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) definiu que as instituições financeiras não poderiam cobrar mais do que 8% ao mês ou 151% ao ano dos clientes. A mudança passou a valer em janeiro de 2020 e permitiu uma redução de R$ 10,4 bilhões no pagamento de juros naquele ano, segundo dados do BC.

O varejo conta com o apoio do Idec que, apesar de reconhecer as particularidades do mercado de cartões, como a questão do parcelado sem juros, ainda assim vê como necessária a fixação de um teto para a taxa do rotativo. O instituto defende que o limite seja definido de acordo com a faixa de renda do consumidor. Ou seja, quem tem renda menor, paga um juros também menor em relação aos que possuem mais recursos financeiros. A proposta já foi levada ao deputado Alencar Santana.

BRASÍLIA - A busca por uma solução para os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito, a linha de financiamento mais cara existente hoje no País, colocou em campos opostos as instituições financeiras e o comércio. Os bancos rejeitam a possibilidade de tabelamento ou teto para as taxas, e dizem que a construção de uma saída passa por algum tipo de restrição às compras parceladas sem juros. O problema é que elas são um dos motores das vendas no varejo.

O Estadão apurou que ainda não há um desenho fechado pela equipe econômica e que a negociação é considerada complexa, mas que as tratativas estão avançando, inclusive com a participação do Congresso. Nesta quarta-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que governo, bancos e varejo estão “sentados em uma mesa” para discutir saídas ao “maior problema de juro” do Brasil. Segundo ele, uma proposta será apresentada em até 90 dias.

Dados do Banco Central (BC), referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano. Ou seja: em doze meses, a dívida mais do que quintuplica. Algumas financeiras, no entanto, chegam a cobrar quase 1.000%, segundo levantamento da autoridade monetária.

Dados do Banco Central, referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano.  Foto: Divulgação

O vice-líder do governo na Câmara, deputado Alencar Santana (PT-SP), é relator de um projeto de lei que vai receber o conteúdo do Desenrola, programa do governo federal de renegociação de dívidas, e já avisou que tratará, também, da questão do rotativo. “Fazer o Desenrola e não tratar do problema do cartão é o mesmo que não fazer nada. Você desenrola a pessoa para ela se enrolar de novo”, diz. Santana afirma que está ouvindo todos os atores da cadeia e que pretende apresentar o parecer em, no máximo, duas semanas.

Ex-presidente da Câmara e hoje à frente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Rodrigo Maia está participando das conversas no Congresso e no governo. “Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros”, argumenta. “Não adianta mexer em apenas uma das pontas”.

Em um evento organizado pelo Bradesco BBI no início de abril, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, reforçou esse entendimento. O executivo afirmou que o modelo de tabelamento de juros, em uma indústria como a de cartão de crédito, era o “menos aconselhável possível” e citou o parcelamento sem juros como uma das razões das taxas elevadas. “Não estou defendendo o fim do parcelamento sem juros, mas temos de entender as causas”, disse Sidney, à época.

Em nota, a Febraban afirmou que as instituições financeiras têm como prioridade a redução do custo de crédito no País, mas “sem a adoção de medidas artificiais”. Disse ainda que o rotativo possui “forte subsídio cruzado” e uma inadimplência que chega a 40%.

'Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros', diz Maia, que hoje preside a Confederação Nacional das Instituições Financeiras. Foto: Sidney Lins/Liderança dos Democratas na Câmara

‘Jabuticaba’ do mercado de crédito

O parcelado sem juros é considerado uma “jabuticaba” do mercado de crédito brasileiro – uma modalidade que só existe por aqui. Ela ocupou o espaço do cheque pré-datado e hoje é um dos motores do varejo. Trata-se, porém, de um benefício cruzado. “A pessoa que cair no rotativo vai pagar pela suposta venda sem juros”, explica a coordenadora do programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. “É uma propaganda enganosa.”

Nessa seara, uma das possibilidades em discussão é a limitação do número de parcelas, já que quanto maior o prazo, maior o risco de inadimplência. Outra opção é negociar com o comércio uma diferenciação dos preços à vista e a prazo, para desestimular as vendas parceladas.

Segundo o Estadão apurou, também foi discutida a possibilidade de se alterar as taxas de intercâmbio – as quais as emissoras de cartão cobram dos lojistas pelo uso do meio de pagamento. A ideia seria cobrar taxas mais elevadas em financiamentos mais longos, mas, de acordo com fontes, há resistências dentro do BC. Hoje, não há limite para essa taxa no crédito, o que faz com que os bancos cobrem porcentuais considerados elevados.

Comércio mira exemplo do cheque especial

Nas negociações com governo e Congresso, os representantes do comércio têm repetido que o cartão de crédito responde por nada menos que 80% da concessão de recursos livres a pessoas físicas no País. E que, portanto, é fundamental ao setor e à atividade econômica. “É um tipo de crédito que mexe com o dia a dia das pessoas e do varejo”, diz Fabio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

Segundo ele, limitar o parcelado sem juros pode fazer com que o tiro saia pela culatra. “Reduzir o número de parcelas pode afetar a capacidade de pagamento e levar mais consumidores ao rotativo”, afirma Bentes. “Não é que não se deva olhar para o parcelado, mas o cerne da questão é a taxa do rotativo, que hoje é estupidamente elevada.”

O economista diz que a regulamentação do cheque especial é um bom exemplo a ser seguido. No fim de 2019, uma resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) definiu que as instituições financeiras não poderiam cobrar mais do que 8% ao mês ou 151% ao ano dos clientes. A mudança passou a valer em janeiro de 2020 e permitiu uma redução de R$ 10,4 bilhões no pagamento de juros naquele ano, segundo dados do BC.

O varejo conta com o apoio do Idec que, apesar de reconhecer as particularidades do mercado de cartões, como a questão do parcelado sem juros, ainda assim vê como necessária a fixação de um teto para a taxa do rotativo. O instituto defende que o limite seja definido de acordo com a faixa de renda do consumidor. Ou seja, quem tem renda menor, paga um juros também menor em relação aos que possuem mais recursos financeiros. A proposta já foi levada ao deputado Alencar Santana.

BRASÍLIA - A busca por uma solução para os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito, a linha de financiamento mais cara existente hoje no País, colocou em campos opostos as instituições financeiras e o comércio. Os bancos rejeitam a possibilidade de tabelamento ou teto para as taxas, e dizem que a construção de uma saída passa por algum tipo de restrição às compras parceladas sem juros. O problema é que elas são um dos motores das vendas no varejo.

O Estadão apurou que ainda não há um desenho fechado pela equipe econômica e que a negociação é considerada complexa, mas que as tratativas estão avançando, inclusive com a participação do Congresso. Nesta quarta-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que governo, bancos e varejo estão “sentados em uma mesa” para discutir saídas ao “maior problema de juro” do Brasil. Segundo ele, uma proposta será apresentada em até 90 dias.

Dados do Banco Central (BC), referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano. Ou seja: em doze meses, a dívida mais do que quintuplica. Algumas financeiras, no entanto, chegam a cobrar quase 1.000%, segundo levantamento da autoridade monetária.

Dados do Banco Central, referentes a junho, apontam que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano.  Foto: Divulgação

O vice-líder do governo na Câmara, deputado Alencar Santana (PT-SP), é relator de um projeto de lei que vai receber o conteúdo do Desenrola, programa do governo federal de renegociação de dívidas, e já avisou que tratará, também, da questão do rotativo. “Fazer o Desenrola e não tratar do problema do cartão é o mesmo que não fazer nada. Você desenrola a pessoa para ela se enrolar de novo”, diz. Santana afirma que está ouvindo todos os atores da cadeia e que pretende apresentar o parecer em, no máximo, duas semanas.

Ex-presidente da Câmara e hoje à frente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Rodrigo Maia está participando das conversas no Congresso e no governo. “Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros”, argumenta. “Não adianta mexer em apenas uma das pontas”.

Em um evento organizado pelo Bradesco BBI no início de abril, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, reforçou esse entendimento. O executivo afirmou que o modelo de tabelamento de juros, em uma indústria como a de cartão de crédito, era o “menos aconselhável possível” e citou o parcelamento sem juros como uma das razões das taxas elevadas. “Não estou defendendo o fim do parcelamento sem juros, mas temos de entender as causas”, disse Sidney, à época.

Em nota, a Febraban afirmou que as instituições financeiras têm como prioridade a redução do custo de crédito no País, mas “sem a adoção de medidas artificiais”. Disse ainda que o rotativo possui “forte subsídio cruzado” e uma inadimplência que chega a 40%.

'Para mexer no rotativo é necessário reorganizar o outro lado do produto, que é o parcelado sem juros', diz Maia, que hoje preside a Confederação Nacional das Instituições Financeiras. Foto: Sidney Lins/Liderança dos Democratas na Câmara

‘Jabuticaba’ do mercado de crédito

O parcelado sem juros é considerado uma “jabuticaba” do mercado de crédito brasileiro – uma modalidade que só existe por aqui. Ela ocupou o espaço do cheque pré-datado e hoje é um dos motores do varejo. Trata-se, porém, de um benefício cruzado. “A pessoa que cair no rotativo vai pagar pela suposta venda sem juros”, explica a coordenadora do programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. “É uma propaganda enganosa.”

Nessa seara, uma das possibilidades em discussão é a limitação do número de parcelas, já que quanto maior o prazo, maior o risco de inadimplência. Outra opção é negociar com o comércio uma diferenciação dos preços à vista e a prazo, para desestimular as vendas parceladas.

Segundo o Estadão apurou, também foi discutida a possibilidade de se alterar as taxas de intercâmbio – as quais as emissoras de cartão cobram dos lojistas pelo uso do meio de pagamento. A ideia seria cobrar taxas mais elevadas em financiamentos mais longos, mas, de acordo com fontes, há resistências dentro do BC. Hoje, não há limite para essa taxa no crédito, o que faz com que os bancos cobrem porcentuais considerados elevados.

Comércio mira exemplo do cheque especial

Nas negociações com governo e Congresso, os representantes do comércio têm repetido que o cartão de crédito responde por nada menos que 80% da concessão de recursos livres a pessoas físicas no País. E que, portanto, é fundamental ao setor e à atividade econômica. “É um tipo de crédito que mexe com o dia a dia das pessoas e do varejo”, diz Fabio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

Segundo ele, limitar o parcelado sem juros pode fazer com que o tiro saia pela culatra. “Reduzir o número de parcelas pode afetar a capacidade de pagamento e levar mais consumidores ao rotativo”, afirma Bentes. “Não é que não se deva olhar para o parcelado, mas o cerne da questão é a taxa do rotativo, que hoje é estupidamente elevada.”

O economista diz que a regulamentação do cheque especial é um bom exemplo a ser seguido. No fim de 2019, uma resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) definiu que as instituições financeiras não poderiam cobrar mais do que 8% ao mês ou 151% ao ano dos clientes. A mudança passou a valer em janeiro de 2020 e permitiu uma redução de R$ 10,4 bilhões no pagamento de juros naquele ano, segundo dados do BC.

O varejo conta com o apoio do Idec que, apesar de reconhecer as particularidades do mercado de cartões, como a questão do parcelado sem juros, ainda assim vê como necessária a fixação de um teto para a taxa do rotativo. O instituto defende que o limite seja definido de acordo com a faixa de renda do consumidor. Ou seja, quem tem renda menor, paga um juros também menor em relação aos que possuem mais recursos financeiros. A proposta já foi levada ao deputado Alencar Santana.

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