Dólar em alta, fuga da Bolsa, juro pressionado: os efeitos para o Brasil do novo cenário americano


Com possibilidade de manutenção dos juros altos no EUA por mais tempo, mercado financeiro passou a se atentar sobre as fragilidades da economia brasileira, em especial para a situação das contas públicas

Por Luiz Guilherme Gerbelli
Atualização:

A crescente expectativa de que as taxas de juros nos Estados Unidos possam permanecer num patamar elevado por um período prolongado aumentou a pressão dos investidores com a economia brasileira. Nas últimas semanas, os ativos brasileiros tiveram um movimento negativo coordenado. Depois da euforia observada no fim do ano passado, a Bolsa de Valores registrou uma fuga bilionária de estrangeiros, o dólar mudou de patamar e superou a faixa de R$ 5, e os juros futuros subiram.

Nesse momento em que o cenário externo está mais difícil, o que parte dos analistas tem chamado a atenção é para o fato de que o mercado financeiro passou a se atentar com mais cuidado para as fragilidades da economia brasileira, em especial para a situação das contas públicas.

“Quanto mais tempo o Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA) leva para baixar as taxas de juros, mais pressão se coloca nos mercados emergentes como um todo, especialmente naqueles que têm mais dificuldade internas”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “O Brasil tem a questão fiscal mal resolvida e acaba sentindo essa pressão cambial.”

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Essa mudança de humor do mercado não indica que o Brasil está próximo de enfrentar uma crise severa. O País tem, por exemplo, números robustos no setor externo, mas cria um cenário que exige mais cautela e reduz a margem de erro na condução de política econômica por parte do governo. “Nesse cenário, a gente começa a discutir mais fortemente e no detalhe a parte fiscal″, diz Solange Srour, diretora de macroeconomia para o Brasil do UBS Global Wealth Management.

A expectativa para a política de juros dos Estados Unidos vem sofrendo reveses importantes ao longo de 2024. Os últimos números de atividade, mercado de trabalho e inflação dos EUA indicam que os juros terão de ficar mais altos para que o Fed consiga levar a inflação para a meta de 2%. Na virada de 2023 para 2024, o cenário era outro. Houve um grande entusiasmo no mercado financeiro com a possibilidade de que o BC americano pudesse promover até seis cortes neste ano.

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Na quarta-feira, 10, o resultado do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) dos EUA reforçou o cenário de que o Fed deve ser mais duro. No mês passado, o CPI subiu 0,4% e ficou acima das expectativas. Depois da divulgação do número, o UBS, por exemplo, alterou a projetação para o início do ciclo de corte dos juros americanos de junho para setembro e passou a prever apenas duas reduções em 2024.

Taxas americanas mais altas drenam recursos de economias emergentes e mais arriscadas, como é o caso da brasileira. É como se o investidor ficasse mais seletivo e subisse a barra para investir fora dos Estados Unidos, a principal economia do mundo, a mais segura e que atualmente oferece um retorno atrativo e sem risco – desde julho de 2023, as taxas de juros nos EUA estão no intervalo de 5,25% e 5,50% ao ano.

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No Brasil, ao contrário, esse retorno de baixo risco está menor. De agosto de 2023 a março deste ano, a Selic recuou de 13,75% para 10,75%.

Problema fiscal

Os investidores se voltam para as contas públicas nesse momento porque esse tem sido o grande nó da economia brasileira nos últimos anos. O País lida com uma dívida considerada elevada para um emergente e, no curto prazo, não há perspectiva de redução desse endividamento, o que adiciona algum risco para o investimento em ativos brasileiros.

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A evolução da dívida bruta é um dos principais pontos analisados pelas agências de classificação de risco. No relatório Focus, produzido pelo Banco Central com base na projeção de uma centena de analistas, a previsão é de que dívida bruta alcance 86,5% do PIB em 2030. No ano passado, foi de 74,3% do PIB.

“Mesmo quando o mercado estava animado com a possibilidade de cinco ou até seis cortes pelo Fed, o juro real (no Brasil) era muito alto. Agora, foi para perto de 6%, mas o nível (elevado) já era explicado pelo fiscal”, diz Solange. “A luz amarela já está acesa.”

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Nas últimas semanas, o comportamento dos papéis de mais longo prazo deixaram evidente como o investidor tem exigido maiores prêmios no Brasil. Títulos públicos que remuneram o equivalente à inflação mais uma taxa (NTN-B), com vencimento em 2045, passaram a oferecer juro real de 6% ao ano. No início de 2024, pagavam 5,5%.

“Com taxas mais elevadas nos Estados Unidos, há um efeito direto nos juros de médio e longo prazo do Brasil. Há uma correlação bem importante. Então, subiu lá sobe aqui”, diz Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências.

“Como o Brasil tem um endividamento público crescente – essa é a expectativa, o governo precisa se financiar a essas novas taxas de mercado. Quando o juro de mercado sobe, piora o nosso fiscal, porque o governo vai pagar mais caro para se financiar, o que pode potencializar a alta do endividamento público”, acrescenta Alessandra.

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A economia brasileira só vai conseguir estacar o seu endividamento se alcançar o chamado superávit primário — o resultado positivo entre receitas e despesas, sem contar o gasto com juros. Quando apresentou o arcabouço fiscal, a equipe econômica prometeu entregar um resultado primário zero já em 2024, alcançar um superávit de 0,5% do PIB no ano que vem e chegar a um resultado positivo de 1% do PIB em 2026, o que seria, nas contas do governo, suficiente para estabilizar a dívida.

Equipe econômica deve rever meta fiscal do próximo ano Foto: ESTADAO CONTEUDO / ESTADAO CONTEUDO

Mas esse plano de voo pode mudar. Parte do mercado não acredita que o governo vá cumprir e meta de resultado zero neste ano, e a própria equipe econômica já dá sinais de que pode alterar a meta de superávit primário de 2025.

“Tem um cenário internacional de que não é de crescimento forte, não é exuberante, o que coloca em risco o nosso crescimento e, consequentemente, o potencial da arrecadação. Vai ser muito difícil o governo entregar esses superávits revisados. Durante os três próximos anos, vamos viver essa tensão fiscal. A meta vai ser discutida todo ano”, afirma Vale, da MB Associados.

O arcabouço não é considerado ideal, mas conseguiu dar alguma direção para o rumo da dívida do País. A grande crítica é a de que o governo tem tentado garantir o ajuste das contas públicas com foco no aumento de arrecadação. Para turbinar a receita, a equipe econômica conseguiu a aprovação de uma série de medidas no ano passado, entre elas a taxação das offshores e dos fundos de ‘super ricos’.

“A questão (envolvendo o aumento) das receitas é mais fácil no primeiro ano de governo do que conforme o mandato vai avançando. É difícil imaginar que (a equipe econômica) vai conseguir aumentos sucessivos como conseguiu no ano passado, até porque os caminhos mais fáceis são os primeiros a serem buscados”, diz Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).

Procurado, o Ministério da Fazenda não se manifestou até a publicação dessa reportagem.

O risco da intervenção

O rumo da política fiscal conta apenas uma parte da preocupação do investidor com economia brasileira. Houve um aumento do receio de que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pudesse adotar uma postura mais intervencionista na economia depois da tentativa de emplacar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega no comando da Vale e de reter os dividendos extraordinários da Petrobras.

As investidas do Lula ampliaram uma dúvida que sempre existiu desde o início deste governo, se o presidente iria por um caminho mais parecido com o do seu primeiro mandato, quando seguiu as regras de mercado, ou se adotaria um modelo mais parecido com o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, de maior intervenção na economia.

“Há uma questão de ambiente de negócios que é um pouco difícil. A questão da Petrobrass mostra bem isso. Tudo isso é complicado e não está ajudando”, afirma Castelar.

A crescente expectativa de que as taxas de juros nos Estados Unidos possam permanecer num patamar elevado por um período prolongado aumentou a pressão dos investidores com a economia brasileira. Nas últimas semanas, os ativos brasileiros tiveram um movimento negativo coordenado. Depois da euforia observada no fim do ano passado, a Bolsa de Valores registrou uma fuga bilionária de estrangeiros, o dólar mudou de patamar e superou a faixa de R$ 5, e os juros futuros subiram.

Nesse momento em que o cenário externo está mais difícil, o que parte dos analistas tem chamado a atenção é para o fato de que o mercado financeiro passou a se atentar com mais cuidado para as fragilidades da economia brasileira, em especial para a situação das contas públicas.

“Quanto mais tempo o Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA) leva para baixar as taxas de juros, mais pressão se coloca nos mercados emergentes como um todo, especialmente naqueles que têm mais dificuldade internas”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “O Brasil tem a questão fiscal mal resolvida e acaba sentindo essa pressão cambial.”

Essa mudança de humor do mercado não indica que o Brasil está próximo de enfrentar uma crise severa. O País tem, por exemplo, números robustos no setor externo, mas cria um cenário que exige mais cautela e reduz a margem de erro na condução de política econômica por parte do governo. “Nesse cenário, a gente começa a discutir mais fortemente e no detalhe a parte fiscal″, diz Solange Srour, diretora de macroeconomia para o Brasil do UBS Global Wealth Management.

A expectativa para a política de juros dos Estados Unidos vem sofrendo reveses importantes ao longo de 2024. Os últimos números de atividade, mercado de trabalho e inflação dos EUA indicam que os juros terão de ficar mais altos para que o Fed consiga levar a inflação para a meta de 2%. Na virada de 2023 para 2024, o cenário era outro. Houve um grande entusiasmo no mercado financeiro com a possibilidade de que o BC americano pudesse promover até seis cortes neste ano.

Na quarta-feira, 10, o resultado do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) dos EUA reforçou o cenário de que o Fed deve ser mais duro. No mês passado, o CPI subiu 0,4% e ficou acima das expectativas. Depois da divulgação do número, o UBS, por exemplo, alterou a projetação para o início do ciclo de corte dos juros americanos de junho para setembro e passou a prever apenas duas reduções em 2024.

Taxas americanas mais altas drenam recursos de economias emergentes e mais arriscadas, como é o caso da brasileira. É como se o investidor ficasse mais seletivo e subisse a barra para investir fora dos Estados Unidos, a principal economia do mundo, a mais segura e que atualmente oferece um retorno atrativo e sem risco – desde julho de 2023, as taxas de juros nos EUA estão no intervalo de 5,25% e 5,50% ao ano.

No Brasil, ao contrário, esse retorno de baixo risco está menor. De agosto de 2023 a março deste ano, a Selic recuou de 13,75% para 10,75%.

Problema fiscal

Os investidores se voltam para as contas públicas nesse momento porque esse tem sido o grande nó da economia brasileira nos últimos anos. O País lida com uma dívida considerada elevada para um emergente e, no curto prazo, não há perspectiva de redução desse endividamento, o que adiciona algum risco para o investimento em ativos brasileiros.

A evolução da dívida bruta é um dos principais pontos analisados pelas agências de classificação de risco. No relatório Focus, produzido pelo Banco Central com base na projeção de uma centena de analistas, a previsão é de que dívida bruta alcance 86,5% do PIB em 2030. No ano passado, foi de 74,3% do PIB.

“Mesmo quando o mercado estava animado com a possibilidade de cinco ou até seis cortes pelo Fed, o juro real (no Brasil) era muito alto. Agora, foi para perto de 6%, mas o nível (elevado) já era explicado pelo fiscal”, diz Solange. “A luz amarela já está acesa.”

Nas últimas semanas, o comportamento dos papéis de mais longo prazo deixaram evidente como o investidor tem exigido maiores prêmios no Brasil. Títulos públicos que remuneram o equivalente à inflação mais uma taxa (NTN-B), com vencimento em 2045, passaram a oferecer juro real de 6% ao ano. No início de 2024, pagavam 5,5%.

“Com taxas mais elevadas nos Estados Unidos, há um efeito direto nos juros de médio e longo prazo do Brasil. Há uma correlação bem importante. Então, subiu lá sobe aqui”, diz Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências.

“Como o Brasil tem um endividamento público crescente – essa é a expectativa, o governo precisa se financiar a essas novas taxas de mercado. Quando o juro de mercado sobe, piora o nosso fiscal, porque o governo vai pagar mais caro para se financiar, o que pode potencializar a alta do endividamento público”, acrescenta Alessandra.

A economia brasileira só vai conseguir estacar o seu endividamento se alcançar o chamado superávit primário — o resultado positivo entre receitas e despesas, sem contar o gasto com juros. Quando apresentou o arcabouço fiscal, a equipe econômica prometeu entregar um resultado primário zero já em 2024, alcançar um superávit de 0,5% do PIB no ano que vem e chegar a um resultado positivo de 1% do PIB em 2026, o que seria, nas contas do governo, suficiente para estabilizar a dívida.

Equipe econômica deve rever meta fiscal do próximo ano Foto: ESTADAO CONTEUDO / ESTADAO CONTEUDO

Mas esse plano de voo pode mudar. Parte do mercado não acredita que o governo vá cumprir e meta de resultado zero neste ano, e a própria equipe econômica já dá sinais de que pode alterar a meta de superávit primário de 2025.

“Tem um cenário internacional de que não é de crescimento forte, não é exuberante, o que coloca em risco o nosso crescimento e, consequentemente, o potencial da arrecadação. Vai ser muito difícil o governo entregar esses superávits revisados. Durante os três próximos anos, vamos viver essa tensão fiscal. A meta vai ser discutida todo ano”, afirma Vale, da MB Associados.

O arcabouço não é considerado ideal, mas conseguiu dar alguma direção para o rumo da dívida do País. A grande crítica é a de que o governo tem tentado garantir o ajuste das contas públicas com foco no aumento de arrecadação. Para turbinar a receita, a equipe econômica conseguiu a aprovação de uma série de medidas no ano passado, entre elas a taxação das offshores e dos fundos de ‘super ricos’.

“A questão (envolvendo o aumento) das receitas é mais fácil no primeiro ano de governo do que conforme o mandato vai avançando. É difícil imaginar que (a equipe econômica) vai conseguir aumentos sucessivos como conseguiu no ano passado, até porque os caminhos mais fáceis são os primeiros a serem buscados”, diz Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).

Procurado, o Ministério da Fazenda não se manifestou até a publicação dessa reportagem.

O risco da intervenção

O rumo da política fiscal conta apenas uma parte da preocupação do investidor com economia brasileira. Houve um aumento do receio de que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pudesse adotar uma postura mais intervencionista na economia depois da tentativa de emplacar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega no comando da Vale e de reter os dividendos extraordinários da Petrobras.

As investidas do Lula ampliaram uma dúvida que sempre existiu desde o início deste governo, se o presidente iria por um caminho mais parecido com o do seu primeiro mandato, quando seguiu as regras de mercado, ou se adotaria um modelo mais parecido com o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, de maior intervenção na economia.

“Há uma questão de ambiente de negócios que é um pouco difícil. A questão da Petrobrass mostra bem isso. Tudo isso é complicado e não está ajudando”, afirma Castelar.

A crescente expectativa de que as taxas de juros nos Estados Unidos possam permanecer num patamar elevado por um período prolongado aumentou a pressão dos investidores com a economia brasileira. Nas últimas semanas, os ativos brasileiros tiveram um movimento negativo coordenado. Depois da euforia observada no fim do ano passado, a Bolsa de Valores registrou uma fuga bilionária de estrangeiros, o dólar mudou de patamar e superou a faixa de R$ 5, e os juros futuros subiram.

Nesse momento em que o cenário externo está mais difícil, o que parte dos analistas tem chamado a atenção é para o fato de que o mercado financeiro passou a se atentar com mais cuidado para as fragilidades da economia brasileira, em especial para a situação das contas públicas.

“Quanto mais tempo o Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA) leva para baixar as taxas de juros, mais pressão se coloca nos mercados emergentes como um todo, especialmente naqueles que têm mais dificuldade internas”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “O Brasil tem a questão fiscal mal resolvida e acaba sentindo essa pressão cambial.”

Essa mudança de humor do mercado não indica que o Brasil está próximo de enfrentar uma crise severa. O País tem, por exemplo, números robustos no setor externo, mas cria um cenário que exige mais cautela e reduz a margem de erro na condução de política econômica por parte do governo. “Nesse cenário, a gente começa a discutir mais fortemente e no detalhe a parte fiscal″, diz Solange Srour, diretora de macroeconomia para o Brasil do UBS Global Wealth Management.

A expectativa para a política de juros dos Estados Unidos vem sofrendo reveses importantes ao longo de 2024. Os últimos números de atividade, mercado de trabalho e inflação dos EUA indicam que os juros terão de ficar mais altos para que o Fed consiga levar a inflação para a meta de 2%. Na virada de 2023 para 2024, o cenário era outro. Houve um grande entusiasmo no mercado financeiro com a possibilidade de que o BC americano pudesse promover até seis cortes neste ano.

Na quarta-feira, 10, o resultado do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) dos EUA reforçou o cenário de que o Fed deve ser mais duro. No mês passado, o CPI subiu 0,4% e ficou acima das expectativas. Depois da divulgação do número, o UBS, por exemplo, alterou a projetação para o início do ciclo de corte dos juros americanos de junho para setembro e passou a prever apenas duas reduções em 2024.

Taxas americanas mais altas drenam recursos de economias emergentes e mais arriscadas, como é o caso da brasileira. É como se o investidor ficasse mais seletivo e subisse a barra para investir fora dos Estados Unidos, a principal economia do mundo, a mais segura e que atualmente oferece um retorno atrativo e sem risco – desde julho de 2023, as taxas de juros nos EUA estão no intervalo de 5,25% e 5,50% ao ano.

No Brasil, ao contrário, esse retorno de baixo risco está menor. De agosto de 2023 a março deste ano, a Selic recuou de 13,75% para 10,75%.

Problema fiscal

Os investidores se voltam para as contas públicas nesse momento porque esse tem sido o grande nó da economia brasileira nos últimos anos. O País lida com uma dívida considerada elevada para um emergente e, no curto prazo, não há perspectiva de redução desse endividamento, o que adiciona algum risco para o investimento em ativos brasileiros.

A evolução da dívida bruta é um dos principais pontos analisados pelas agências de classificação de risco. No relatório Focus, produzido pelo Banco Central com base na projeção de uma centena de analistas, a previsão é de que dívida bruta alcance 86,5% do PIB em 2030. No ano passado, foi de 74,3% do PIB.

“Mesmo quando o mercado estava animado com a possibilidade de cinco ou até seis cortes pelo Fed, o juro real (no Brasil) era muito alto. Agora, foi para perto de 6%, mas o nível (elevado) já era explicado pelo fiscal”, diz Solange. “A luz amarela já está acesa.”

Nas últimas semanas, o comportamento dos papéis de mais longo prazo deixaram evidente como o investidor tem exigido maiores prêmios no Brasil. Títulos públicos que remuneram o equivalente à inflação mais uma taxa (NTN-B), com vencimento em 2045, passaram a oferecer juro real de 6% ao ano. No início de 2024, pagavam 5,5%.

“Com taxas mais elevadas nos Estados Unidos, há um efeito direto nos juros de médio e longo prazo do Brasil. Há uma correlação bem importante. Então, subiu lá sobe aqui”, diz Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências.

“Como o Brasil tem um endividamento público crescente – essa é a expectativa, o governo precisa se financiar a essas novas taxas de mercado. Quando o juro de mercado sobe, piora o nosso fiscal, porque o governo vai pagar mais caro para se financiar, o que pode potencializar a alta do endividamento público”, acrescenta Alessandra.

A economia brasileira só vai conseguir estacar o seu endividamento se alcançar o chamado superávit primário — o resultado positivo entre receitas e despesas, sem contar o gasto com juros. Quando apresentou o arcabouço fiscal, a equipe econômica prometeu entregar um resultado primário zero já em 2024, alcançar um superávit de 0,5% do PIB no ano que vem e chegar a um resultado positivo de 1% do PIB em 2026, o que seria, nas contas do governo, suficiente para estabilizar a dívida.

Equipe econômica deve rever meta fiscal do próximo ano Foto: ESTADAO CONTEUDO / ESTADAO CONTEUDO

Mas esse plano de voo pode mudar. Parte do mercado não acredita que o governo vá cumprir e meta de resultado zero neste ano, e a própria equipe econômica já dá sinais de que pode alterar a meta de superávit primário de 2025.

“Tem um cenário internacional de que não é de crescimento forte, não é exuberante, o que coloca em risco o nosso crescimento e, consequentemente, o potencial da arrecadação. Vai ser muito difícil o governo entregar esses superávits revisados. Durante os três próximos anos, vamos viver essa tensão fiscal. A meta vai ser discutida todo ano”, afirma Vale, da MB Associados.

O arcabouço não é considerado ideal, mas conseguiu dar alguma direção para o rumo da dívida do País. A grande crítica é a de que o governo tem tentado garantir o ajuste das contas públicas com foco no aumento de arrecadação. Para turbinar a receita, a equipe econômica conseguiu a aprovação de uma série de medidas no ano passado, entre elas a taxação das offshores e dos fundos de ‘super ricos’.

“A questão (envolvendo o aumento) das receitas é mais fácil no primeiro ano de governo do que conforme o mandato vai avançando. É difícil imaginar que (a equipe econômica) vai conseguir aumentos sucessivos como conseguiu no ano passado, até porque os caminhos mais fáceis são os primeiros a serem buscados”, diz Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).

Procurado, o Ministério da Fazenda não se manifestou até a publicação dessa reportagem.

O risco da intervenção

O rumo da política fiscal conta apenas uma parte da preocupação do investidor com economia brasileira. Houve um aumento do receio de que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pudesse adotar uma postura mais intervencionista na economia depois da tentativa de emplacar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega no comando da Vale e de reter os dividendos extraordinários da Petrobras.

As investidas do Lula ampliaram uma dúvida que sempre existiu desde o início deste governo, se o presidente iria por um caminho mais parecido com o do seu primeiro mandato, quando seguiu as regras de mercado, ou se adotaria um modelo mais parecido com o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, de maior intervenção na economia.

“Há uma questão de ambiente de negócios que é um pouco difícil. A questão da Petrobrass mostra bem isso. Tudo isso é complicado e não está ajudando”, afirma Castelar.

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