Antes de mudar a política econômica para favorecer um ajuste fiscal, como anunciado semana passada pelo futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o governo resolveu reforçar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O Tesouro Nacional aportará R$ 30 bilhões no banco, conforme medida provisória publicada ontem.
Embora a decisão pareça contraditória com o rigor fiscal de Levy, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, foi enfático ao defender o ajuste e sinalizou mudanças para o banco conviver com menos aportes financeiros daqui para a frente. O resultado serão juros maiores para novos empréstimos, embora áreas prioritárias devam ser menos atingidas.
Dívida. O aporte entra com um empréstimo de títulos públicos, a segunda operação do tipo - e no mesmo valor - no ano, que encerrará com mais R$ 60 bilhões do Tesouro no BNDES. Pelo relatório de administração anual do banco, de 2008 a junho último, a dívida do banco com o Tesouro era de R$ 410,8 bilhões e agora vai a R$ 440,8 bilhões.
Nas negociações iniciais, conforme antecipou o Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, o governo pretendia autorizar um empréstimo de R$ 20 bilhões neste fim de ano, mas a opção foi ampliar o valor e deixar o desgaste de fazer o novo aporte para a equipe atual.
Segundo Coutinho, os R$ 30 bilhões anunciados ontem atendem a necessidade de recursos para este ano e "parte de 2015", mas mais recursos serão necessários ano que vem. "Não posso dizer ainda o quanto em relação a 2015", afirmou Coutinho, em entrevista coletiva convocada ontem mesmo, no Rio.
BNDES menor. A mudança na condução da economia resultará em um BNDES menor. Para recuperar a confiança do mercado e ajudar a reduzir juros, uma das estratégias é limitar o crescimento da dívida pública.
Um dos caminhos é aportar cada vez menos recursos no banco de fomento, enquanto se aumenta o superávit primário fiscal (o saldo positivo entre receitas e despesas do governo, sem contar juros).
O presidente do BNDES disse que o banco está preparado, mas a redução tem que ser gradual porque os empréstimos liberados atualmente foram aprovados, pelo menos, de 12 a 18 meses atrás. Ontem, o BNDES anunciou que liberou de janeiro a outubro valor parecido com o de 2013 e deverá encerrar o ano assim.
Essa moderação, explicou Coutinho, se deve às mudanças nas políticas de empréstimo introduzidas no início do ano, que deu prioridade a projetos de infraestrutura e em prol da competitividade da indústria (inovação e investimentos em maquinário). Para esse, os juros seguiram baixos.
Agora, para se adaptar ao cenário de menos recursos do Tesouro, "a política operacional terá uma rodada de ajustes bastante incisivos", que ainda não tem data de anúncio ou início de vigência, disse Coutinho. Em outras palavras, os juros do BNDES subirão mais.
Luciano Coutinho ponderou que o aumento de juros será compatível com a taxa de retorno dos projetos e as prioridades serão mantidas.
Tarifas. Segundo o economista Ernani Teixeira Torres, professor do Instituto de Economia da UFRJ e ex-superintendente de pesquisa econômica do BNDES, não há mercado suficiente para financiar projetos de infraestrutura com fontes privadas e o risco seria haver um aumento nas taxas de retorno, resultando em tarifas mais caras para a sociedade como um todo.
"Tem gente que quer ver sangue e pouco se importa com o resto da economia", disse.
Para Gabriel Leal de Barros, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o importante é que o estoque de empréstimos aos bancos estatais e de reservas cambiais fique estável como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). Alguns aportes pode haver, mas cada vez menos.