‘O Bolsonaro nos leva ao abismo, o Lula nos deixa parados’, diz Horácio Lafer Piva


Acionista da Klabin e ex-presidente da Fiesp, empresário classifica bolsonarismo como ‘elitista, egoísta e assustador’; sobre reação do presidente à carta pela democracia: ‘pela primeira vez, não me incomodo em ser chamado de mau-caráter’

Por Fernando Scheller e Lucas Agrela
Atualização:

Acionista da gigante de papel e celulose Klabin e ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horácio Lafer Piva foi um dos primeiros empresários a aderir à carta de apoio à democracia, elaborada com o apoio de múltiplas instituições, após o presidente Jair Bolsonaro ter criticado o sistema eleitoral brasileiro em uma reunião com embaixadores. Sobre a reação do presidente após diversos empresários terem aderido ao texto, o executivo afirmou ao Estadão: “Pela primeira vez, não me incomodo em ser chamado de mau-caráter.”

Crítico não só a Bolsonaro, mas também a Lula, Lafer Piva está no grupo de empresários que ainda vê uma pequena chance de a candidatura de Simone Tebet (PMDB) decolar. Segundo ele, Lula e Bolsonaro representam não só a polarização política, mas também têm poucas chances de levar o País adiante. “O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços”, disse Lafer Piva.

Horácio Lafer Piva, acionista da Klabin e ex-presidente da Fiesp Foto: Silvana Garzaro/Estadão
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Durante a conversa, ele também falou sobre a necessidade de pensar o Brasil de forma estruturada, sobre o papel da indústria na economia e classificou o bolsonarismo como “elitista, egoísta e assustador”.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

A carta de apoio à democracia foi importante para marcar que essa é uma questão inegociável?

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A carta é um sinal da sociedade com relação ao que de fato importa. Democracia, liberdade e limites são inegociáveis, e a carta mostrou isso. Ela é mais do que a defesa de uma ideia. É um documento de valores comuns, de modo de viver e de respeito mútuo. Honestamente, acredito que é hora de vencer a apatia e lutar pelo que nos une. Fiquei muito impressionado com a capacidade que a carta teve de unir os diferentes documentos em meio a tanta polarização. Tem uma perspectiva de que essas eleições vão ser brutais. Vamos ver muitos discursos verborrágicos, tentativas de enfraquecimento de instituições e teremos muita promessa e soberba dos dois lados. Tudo tem muito jogo de interesse. Não vai ter fim da democracia nem ditadura, mas o Brasil vai sofrer nesse embate entre egos. O Brasil está muito rachado e sofrido. A carta vem para mostrar que, apesar de divididos, podemos nos unir naquelas coisas nas quais todos acreditamos, como a liberdade e a democracia. Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.

Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.”

Horácio Lafer Piva

O presidente reagiu à carta na semana passada, chamando os signatários de mau-caráter. Como o sr. reage à declaração de Bolsonaro?

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Pela primeira vez, não me incomodo de ser chamado de mau-caráter. Temos compromissos inegociáveis e inabaláveis. Desde o início, antes de ele ser eleito, eu dizia que o Bolsonaro era um atraso civilizatório. Temos demonstrações muito claras de uma atitude boquirrota, de enfrentamento. Me incomoda como cidadão, mas não posso levar a sério esse tipo de ataque que não está sendo feito só a quem assinou a carta, mas ao Brasil. Como pano de fundo, há certamente a questão das eleições, que ganharam uma importância que o levam a um certo desespero. Incomoda? Sim, mas não me ofende, nem atinge. E acho que isso acontece com muita gente. Alguns empresários já passaram do espanto (com Bolsonaro) para um certo desprezo.

O sr. acredita na tese do voto útil nas eleições presidenciais?

Eu tenho sido patrulhado para fazer um voto útil. Se acredito na democracia, o meu voto útil me algema em relação ao que realmente desejo. Então, eu não entro nessa conversa. No primeiro turno, eu voto em quem eu acredito.

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Qual sua visão sobre Lula?

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora. Me agradaria muito mais a ideia de que o PT arrumasse a casa, até porque é um partido importante, e ficasse na oposição, e não o poder. Eu gostaria de vê-lo primeiro como um personagem importante da história, e não nessa aventura meio custosa. (Em uma eventual eleição), ele fatalmente fará menos do que na primeira gestão, por questões que até não dependem dele. Ele não vai ser perdoado por quem o condenou. Ele precisa se abrir para o novo. O Lula está mais preso à militância do PT do que a ele mesmo. Eu acho que o Lula é melhor do que seu entorno.

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora.”

Horácio Lafer Piva

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E quanto ao Bolsonaro?

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro). E não de pessoas com déficit de educação, mas das pessoas que pretensamente são letradas, mas não querem ver o que está acontecendo. O Bolsonaro tem nos isolado do mundo.

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro).”

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Vemos empresários aguerridos na possibilidade da terceira via. O sr. ainda acredita na terceira via nas eleições presidenciais?

Sim. Há várias dezenas de razões pelas quais eu luto pela Simone (Tebet). Mas eu centralizo na pacificação, já que eu acho que (na eleição de) qualquer um dos outros dois candidatos, vamos manter a polarização agressiva. A Simone tem capacidade convocatória de trazer o que há de melhor no País. Basta as pessoas se disporem a escutá-la para ver que ela tem motivos corretos. Se eu acredito na terceira via? Sim, mas é claro que é muito difícil. Mas lutar pelo menos ruim é continuar no mau. Eu me legitimo lutando pelo que acredito. As pessoas falam que 60 dias é pouco tempo, mas pode ser muito na política. Embora o programa de governo não ganhe eleição, faz com que muita gente ouça e gera uma contaminação positiva.

O que o sr. achou da escolha da Mara Gabrilli como vice?

A escolha foi muito interessante. Ela navega bem nas redes sociais, é mulher, é cadeirante e fala muito bem com as pessoas. Eu a conheço há muito tempo. Ouvi comentários de ela se apresentando na Fiesp e muita gente dizendo que não a conhecia. Quando ela fala, muita gente presta atenção. Mas seu João e dona Mariazinha vão entender, eu não sei. Vamos ver daqui a pouco.

Qual é a visão do sr. sobre os demais candidatos à presidência?

O Ciro (Gomes) é uma pessoa articulada, mas ele é intempestivo, é volátil. Tem um projeto bem apresentado, mas ele é voluntarioso, é frágil. Eu também aprecio a precisão do diagnóstico e a sofisticação de pensamento do Luiz Felipe D’Ávila, mas ele é um cara fora do tempo dele.

Já está claro em quem o sr. votará no segundo turno?

Não quero nem pensar no segundo turno. Acho que isso vai me distrair. O Lula e o Bolsonaro não podem ser colocados no mesmo saco. Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula, nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços. E a Simone, ou outro candidato do centro que fosse, não é que vai conseguir virar o Brasil nesses quatro anos, mas poderia começar a apontar para uma rota para que, a partir de 2026, houvesse um novo vigor para recuperar a economia brasileira que está numa situação dificílima.

Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços.”

Então, precisamos de um presidente com perspectiva de aderência ao plano de governo?

Precisamos de alguém que consiga pensar no médio e longo prazo, com um projeto de país e de gestão. Parece que o Brasil não sabe o que quer ser quando crescer. Queremos ser líderes na economia verde, na biodiversidade e no baixo carbono, mas não conseguimos desenhar um projeto de país. O Brasil fica preso na inflação. A inflação é uma falha de governo. Temos uma política monetária subindo a taxa (de juros) e temos uma política fiscal gastando. E isso traz a volta do rentismo – e não podemos nem criticar isso porque é uma consequência, e não a causa. Concentra-se a renda e gera-se um ciclo vicioso. Precisamos de um candidato que pacifique, tenha um projeto, mas que não tenha a soberba de achar que vamos consertar o País em quatro anos. Podemos melhorar questões mais urgentes a apontar para uma direção de médio e longo prazo. Não dá para ficar nessas promessas fantasiosas.

Existe uma dificuldade de entender o momento ambiental do mundo?

Sem dúvidas. Basta ver o que o Brasil faz nesses eventos globais, como a COP. Fazemos o que os americanos chamam de damage control (controle de danos). O País tem todas as condições de criar novos produtos através de biotecnologia florestal e das bio-oportunidades da Amazônia. E vai exatamente para o lado contrário, o da destruição. Não sei como as pessoas não veem o que está acontecendo no tempo, no inverno brasileiro, no Alaska, na Europa. Não sei como olham isso e não percebem. É um profundo egoísmo para com nossos filhos e netos. Mas tudo isso está muito no campo da percepção. Se o próximo presidente conseguir estancar o problema e começar a tratar do assunto, rapidamente se cria uma percepção positiva.

O Brasil se contentou em ser uma potência do agronegócio? A indústria, setor do qual a Klabin faz parte, pode voltar a ser competitiva?

É uma tragédia o retrocesso industrial do Brasil. A porcentagem no PIB praticamente caiu à metade nas últimas décadas. Mas a indústria de transformação ainda é responsável por 70% dos investimentos privados de pesquisa e desenvolvimento, e mais de 50% das exportações. As relações de trabalho são majoritariamente formais. A indústria tem um papel absolutamente fundamental, apesar de ter perdido muito espaço. Mas não é a mesma indústria de antes. A gente precisa tirar da cabeça a ideia do subsídio, das porteiras fechadas, das escolhas de vencedores. É uma outra indústria: 4.0, tecnológica. É isso que vemos no resto do mundo: muitos países tentando revitalizar suas indústrias. Aqui, a gente não está fazendo nada. Não adianta pensar que vamos chegar lá sendo só exportadores de produtos primários. Precisamos vender toneladas de soja para comprar um notebook estrangeiro. Precisamos incorporar tecnologia, vender marcas, vender muito mais serviços. E não podemos negar que os industriais defenderam proteções e fronteiras, achando que o mercado interno era suficiente. Por isso, é necessário mudar a mentalidade dos industriais.

Acionista da gigante de papel e celulose Klabin e ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horácio Lafer Piva foi um dos primeiros empresários a aderir à carta de apoio à democracia, elaborada com o apoio de múltiplas instituições, após o presidente Jair Bolsonaro ter criticado o sistema eleitoral brasileiro em uma reunião com embaixadores. Sobre a reação do presidente após diversos empresários terem aderido ao texto, o executivo afirmou ao Estadão: “Pela primeira vez, não me incomodo em ser chamado de mau-caráter.”

Crítico não só a Bolsonaro, mas também a Lula, Lafer Piva está no grupo de empresários que ainda vê uma pequena chance de a candidatura de Simone Tebet (PMDB) decolar. Segundo ele, Lula e Bolsonaro representam não só a polarização política, mas também têm poucas chances de levar o País adiante. “O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços”, disse Lafer Piva.

Horácio Lafer Piva, acionista da Klabin e ex-presidente da Fiesp Foto: Silvana Garzaro/Estadão

Durante a conversa, ele também falou sobre a necessidade de pensar o Brasil de forma estruturada, sobre o papel da indústria na economia e classificou o bolsonarismo como “elitista, egoísta e assustador”.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

A carta de apoio à democracia foi importante para marcar que essa é uma questão inegociável?

A carta é um sinal da sociedade com relação ao que de fato importa. Democracia, liberdade e limites são inegociáveis, e a carta mostrou isso. Ela é mais do que a defesa de uma ideia. É um documento de valores comuns, de modo de viver e de respeito mútuo. Honestamente, acredito que é hora de vencer a apatia e lutar pelo que nos une. Fiquei muito impressionado com a capacidade que a carta teve de unir os diferentes documentos em meio a tanta polarização. Tem uma perspectiva de que essas eleições vão ser brutais. Vamos ver muitos discursos verborrágicos, tentativas de enfraquecimento de instituições e teremos muita promessa e soberba dos dois lados. Tudo tem muito jogo de interesse. Não vai ter fim da democracia nem ditadura, mas o Brasil vai sofrer nesse embate entre egos. O Brasil está muito rachado e sofrido. A carta vem para mostrar que, apesar de divididos, podemos nos unir naquelas coisas nas quais todos acreditamos, como a liberdade e a democracia. Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.

Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.”

Horácio Lafer Piva

O presidente reagiu à carta na semana passada, chamando os signatários de mau-caráter. Como o sr. reage à declaração de Bolsonaro?

Pela primeira vez, não me incomodo de ser chamado de mau-caráter. Temos compromissos inegociáveis e inabaláveis. Desde o início, antes de ele ser eleito, eu dizia que o Bolsonaro era um atraso civilizatório. Temos demonstrações muito claras de uma atitude boquirrota, de enfrentamento. Me incomoda como cidadão, mas não posso levar a sério esse tipo de ataque que não está sendo feito só a quem assinou a carta, mas ao Brasil. Como pano de fundo, há certamente a questão das eleições, que ganharam uma importância que o levam a um certo desespero. Incomoda? Sim, mas não me ofende, nem atinge. E acho que isso acontece com muita gente. Alguns empresários já passaram do espanto (com Bolsonaro) para um certo desprezo.

O sr. acredita na tese do voto útil nas eleições presidenciais?

Eu tenho sido patrulhado para fazer um voto útil. Se acredito na democracia, o meu voto útil me algema em relação ao que realmente desejo. Então, eu não entro nessa conversa. No primeiro turno, eu voto em quem eu acredito.

Qual sua visão sobre Lula?

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora. Me agradaria muito mais a ideia de que o PT arrumasse a casa, até porque é um partido importante, e ficasse na oposição, e não o poder. Eu gostaria de vê-lo primeiro como um personagem importante da história, e não nessa aventura meio custosa. (Em uma eventual eleição), ele fatalmente fará menos do que na primeira gestão, por questões que até não dependem dele. Ele não vai ser perdoado por quem o condenou. Ele precisa se abrir para o novo. O Lula está mais preso à militância do PT do que a ele mesmo. Eu acho que o Lula é melhor do que seu entorno.

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora.”

Horácio Lafer Piva

E quanto ao Bolsonaro?

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro). E não de pessoas com déficit de educação, mas das pessoas que pretensamente são letradas, mas não querem ver o que está acontecendo. O Bolsonaro tem nos isolado do mundo.

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro).”

Vemos empresários aguerridos na possibilidade da terceira via. O sr. ainda acredita na terceira via nas eleições presidenciais?

Sim. Há várias dezenas de razões pelas quais eu luto pela Simone (Tebet). Mas eu centralizo na pacificação, já que eu acho que (na eleição de) qualquer um dos outros dois candidatos, vamos manter a polarização agressiva. A Simone tem capacidade convocatória de trazer o que há de melhor no País. Basta as pessoas se disporem a escutá-la para ver que ela tem motivos corretos. Se eu acredito na terceira via? Sim, mas é claro que é muito difícil. Mas lutar pelo menos ruim é continuar no mau. Eu me legitimo lutando pelo que acredito. As pessoas falam que 60 dias é pouco tempo, mas pode ser muito na política. Embora o programa de governo não ganhe eleição, faz com que muita gente ouça e gera uma contaminação positiva.

O que o sr. achou da escolha da Mara Gabrilli como vice?

A escolha foi muito interessante. Ela navega bem nas redes sociais, é mulher, é cadeirante e fala muito bem com as pessoas. Eu a conheço há muito tempo. Ouvi comentários de ela se apresentando na Fiesp e muita gente dizendo que não a conhecia. Quando ela fala, muita gente presta atenção. Mas seu João e dona Mariazinha vão entender, eu não sei. Vamos ver daqui a pouco.

Qual é a visão do sr. sobre os demais candidatos à presidência?

O Ciro (Gomes) é uma pessoa articulada, mas ele é intempestivo, é volátil. Tem um projeto bem apresentado, mas ele é voluntarioso, é frágil. Eu também aprecio a precisão do diagnóstico e a sofisticação de pensamento do Luiz Felipe D’Ávila, mas ele é um cara fora do tempo dele.

Já está claro em quem o sr. votará no segundo turno?

Não quero nem pensar no segundo turno. Acho que isso vai me distrair. O Lula e o Bolsonaro não podem ser colocados no mesmo saco. Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula, nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços. E a Simone, ou outro candidato do centro que fosse, não é que vai conseguir virar o Brasil nesses quatro anos, mas poderia começar a apontar para uma rota para que, a partir de 2026, houvesse um novo vigor para recuperar a economia brasileira que está numa situação dificílima.

Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços.”

Então, precisamos de um presidente com perspectiva de aderência ao plano de governo?

Precisamos de alguém que consiga pensar no médio e longo prazo, com um projeto de país e de gestão. Parece que o Brasil não sabe o que quer ser quando crescer. Queremos ser líderes na economia verde, na biodiversidade e no baixo carbono, mas não conseguimos desenhar um projeto de país. O Brasil fica preso na inflação. A inflação é uma falha de governo. Temos uma política monetária subindo a taxa (de juros) e temos uma política fiscal gastando. E isso traz a volta do rentismo – e não podemos nem criticar isso porque é uma consequência, e não a causa. Concentra-se a renda e gera-se um ciclo vicioso. Precisamos de um candidato que pacifique, tenha um projeto, mas que não tenha a soberba de achar que vamos consertar o País em quatro anos. Podemos melhorar questões mais urgentes a apontar para uma direção de médio e longo prazo. Não dá para ficar nessas promessas fantasiosas.

Existe uma dificuldade de entender o momento ambiental do mundo?

Sem dúvidas. Basta ver o que o Brasil faz nesses eventos globais, como a COP. Fazemos o que os americanos chamam de damage control (controle de danos). O País tem todas as condições de criar novos produtos através de biotecnologia florestal e das bio-oportunidades da Amazônia. E vai exatamente para o lado contrário, o da destruição. Não sei como as pessoas não veem o que está acontecendo no tempo, no inverno brasileiro, no Alaska, na Europa. Não sei como olham isso e não percebem. É um profundo egoísmo para com nossos filhos e netos. Mas tudo isso está muito no campo da percepção. Se o próximo presidente conseguir estancar o problema e começar a tratar do assunto, rapidamente se cria uma percepção positiva.

O Brasil se contentou em ser uma potência do agronegócio? A indústria, setor do qual a Klabin faz parte, pode voltar a ser competitiva?

É uma tragédia o retrocesso industrial do Brasil. A porcentagem no PIB praticamente caiu à metade nas últimas décadas. Mas a indústria de transformação ainda é responsável por 70% dos investimentos privados de pesquisa e desenvolvimento, e mais de 50% das exportações. As relações de trabalho são majoritariamente formais. A indústria tem um papel absolutamente fundamental, apesar de ter perdido muito espaço. Mas não é a mesma indústria de antes. A gente precisa tirar da cabeça a ideia do subsídio, das porteiras fechadas, das escolhas de vencedores. É uma outra indústria: 4.0, tecnológica. É isso que vemos no resto do mundo: muitos países tentando revitalizar suas indústrias. Aqui, a gente não está fazendo nada. Não adianta pensar que vamos chegar lá sendo só exportadores de produtos primários. Precisamos vender toneladas de soja para comprar um notebook estrangeiro. Precisamos incorporar tecnologia, vender marcas, vender muito mais serviços. E não podemos negar que os industriais defenderam proteções e fronteiras, achando que o mercado interno era suficiente. Por isso, é necessário mudar a mentalidade dos industriais.

Acionista da gigante de papel e celulose Klabin e ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horácio Lafer Piva foi um dos primeiros empresários a aderir à carta de apoio à democracia, elaborada com o apoio de múltiplas instituições, após o presidente Jair Bolsonaro ter criticado o sistema eleitoral brasileiro em uma reunião com embaixadores. Sobre a reação do presidente após diversos empresários terem aderido ao texto, o executivo afirmou ao Estadão: “Pela primeira vez, não me incomodo em ser chamado de mau-caráter.”

Crítico não só a Bolsonaro, mas também a Lula, Lafer Piva está no grupo de empresários que ainda vê uma pequena chance de a candidatura de Simone Tebet (PMDB) decolar. Segundo ele, Lula e Bolsonaro representam não só a polarização política, mas também têm poucas chances de levar o País adiante. “O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços”, disse Lafer Piva.

Horácio Lafer Piva, acionista da Klabin e ex-presidente da Fiesp Foto: Silvana Garzaro/Estadão

Durante a conversa, ele também falou sobre a necessidade de pensar o Brasil de forma estruturada, sobre o papel da indústria na economia e classificou o bolsonarismo como “elitista, egoísta e assustador”.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

A carta de apoio à democracia foi importante para marcar que essa é uma questão inegociável?

A carta é um sinal da sociedade com relação ao que de fato importa. Democracia, liberdade e limites são inegociáveis, e a carta mostrou isso. Ela é mais do que a defesa de uma ideia. É um documento de valores comuns, de modo de viver e de respeito mútuo. Honestamente, acredito que é hora de vencer a apatia e lutar pelo que nos une. Fiquei muito impressionado com a capacidade que a carta teve de unir os diferentes documentos em meio a tanta polarização. Tem uma perspectiva de que essas eleições vão ser brutais. Vamos ver muitos discursos verborrágicos, tentativas de enfraquecimento de instituições e teremos muita promessa e soberba dos dois lados. Tudo tem muito jogo de interesse. Não vai ter fim da democracia nem ditadura, mas o Brasil vai sofrer nesse embate entre egos. O Brasil está muito rachado e sofrido. A carta vem para mostrar que, apesar de divididos, podemos nos unir naquelas coisas nas quais todos acreditamos, como a liberdade e a democracia. Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.

Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.”

Horácio Lafer Piva

O presidente reagiu à carta na semana passada, chamando os signatários de mau-caráter. Como o sr. reage à declaração de Bolsonaro?

Pela primeira vez, não me incomodo de ser chamado de mau-caráter. Temos compromissos inegociáveis e inabaláveis. Desde o início, antes de ele ser eleito, eu dizia que o Bolsonaro era um atraso civilizatório. Temos demonstrações muito claras de uma atitude boquirrota, de enfrentamento. Me incomoda como cidadão, mas não posso levar a sério esse tipo de ataque que não está sendo feito só a quem assinou a carta, mas ao Brasil. Como pano de fundo, há certamente a questão das eleições, que ganharam uma importância que o levam a um certo desespero. Incomoda? Sim, mas não me ofende, nem atinge. E acho que isso acontece com muita gente. Alguns empresários já passaram do espanto (com Bolsonaro) para um certo desprezo.

O sr. acredita na tese do voto útil nas eleições presidenciais?

Eu tenho sido patrulhado para fazer um voto útil. Se acredito na democracia, o meu voto útil me algema em relação ao que realmente desejo. Então, eu não entro nessa conversa. No primeiro turno, eu voto em quem eu acredito.

Qual sua visão sobre Lula?

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora. Me agradaria muito mais a ideia de que o PT arrumasse a casa, até porque é um partido importante, e ficasse na oposição, e não o poder. Eu gostaria de vê-lo primeiro como um personagem importante da história, e não nessa aventura meio custosa. (Em uma eventual eleição), ele fatalmente fará menos do que na primeira gestão, por questões que até não dependem dele. Ele não vai ser perdoado por quem o condenou. Ele precisa se abrir para o novo. O Lula está mais preso à militância do PT do que a ele mesmo. Eu acho que o Lula é melhor do que seu entorno.

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora.”

Horácio Lafer Piva

E quanto ao Bolsonaro?

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro). E não de pessoas com déficit de educação, mas das pessoas que pretensamente são letradas, mas não querem ver o que está acontecendo. O Bolsonaro tem nos isolado do mundo.

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro).”

Vemos empresários aguerridos na possibilidade da terceira via. O sr. ainda acredita na terceira via nas eleições presidenciais?

Sim. Há várias dezenas de razões pelas quais eu luto pela Simone (Tebet). Mas eu centralizo na pacificação, já que eu acho que (na eleição de) qualquer um dos outros dois candidatos, vamos manter a polarização agressiva. A Simone tem capacidade convocatória de trazer o que há de melhor no País. Basta as pessoas se disporem a escutá-la para ver que ela tem motivos corretos. Se eu acredito na terceira via? Sim, mas é claro que é muito difícil. Mas lutar pelo menos ruim é continuar no mau. Eu me legitimo lutando pelo que acredito. As pessoas falam que 60 dias é pouco tempo, mas pode ser muito na política. Embora o programa de governo não ganhe eleição, faz com que muita gente ouça e gera uma contaminação positiva.

O que o sr. achou da escolha da Mara Gabrilli como vice?

A escolha foi muito interessante. Ela navega bem nas redes sociais, é mulher, é cadeirante e fala muito bem com as pessoas. Eu a conheço há muito tempo. Ouvi comentários de ela se apresentando na Fiesp e muita gente dizendo que não a conhecia. Quando ela fala, muita gente presta atenção. Mas seu João e dona Mariazinha vão entender, eu não sei. Vamos ver daqui a pouco.

Qual é a visão do sr. sobre os demais candidatos à presidência?

O Ciro (Gomes) é uma pessoa articulada, mas ele é intempestivo, é volátil. Tem um projeto bem apresentado, mas ele é voluntarioso, é frágil. Eu também aprecio a precisão do diagnóstico e a sofisticação de pensamento do Luiz Felipe D’Ávila, mas ele é um cara fora do tempo dele.

Já está claro em quem o sr. votará no segundo turno?

Não quero nem pensar no segundo turno. Acho que isso vai me distrair. O Lula e o Bolsonaro não podem ser colocados no mesmo saco. Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula, nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços. E a Simone, ou outro candidato do centro que fosse, não é que vai conseguir virar o Brasil nesses quatro anos, mas poderia começar a apontar para uma rota para que, a partir de 2026, houvesse um novo vigor para recuperar a economia brasileira que está numa situação dificílima.

Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços.”

Então, precisamos de um presidente com perspectiva de aderência ao plano de governo?

Precisamos de alguém que consiga pensar no médio e longo prazo, com um projeto de país e de gestão. Parece que o Brasil não sabe o que quer ser quando crescer. Queremos ser líderes na economia verde, na biodiversidade e no baixo carbono, mas não conseguimos desenhar um projeto de país. O Brasil fica preso na inflação. A inflação é uma falha de governo. Temos uma política monetária subindo a taxa (de juros) e temos uma política fiscal gastando. E isso traz a volta do rentismo – e não podemos nem criticar isso porque é uma consequência, e não a causa. Concentra-se a renda e gera-se um ciclo vicioso. Precisamos de um candidato que pacifique, tenha um projeto, mas que não tenha a soberba de achar que vamos consertar o País em quatro anos. Podemos melhorar questões mais urgentes a apontar para uma direção de médio e longo prazo. Não dá para ficar nessas promessas fantasiosas.

Existe uma dificuldade de entender o momento ambiental do mundo?

Sem dúvidas. Basta ver o que o Brasil faz nesses eventos globais, como a COP. Fazemos o que os americanos chamam de damage control (controle de danos). O País tem todas as condições de criar novos produtos através de biotecnologia florestal e das bio-oportunidades da Amazônia. E vai exatamente para o lado contrário, o da destruição. Não sei como as pessoas não veem o que está acontecendo no tempo, no inverno brasileiro, no Alaska, na Europa. Não sei como olham isso e não percebem. É um profundo egoísmo para com nossos filhos e netos. Mas tudo isso está muito no campo da percepção. Se o próximo presidente conseguir estancar o problema e começar a tratar do assunto, rapidamente se cria uma percepção positiva.

O Brasil se contentou em ser uma potência do agronegócio? A indústria, setor do qual a Klabin faz parte, pode voltar a ser competitiva?

É uma tragédia o retrocesso industrial do Brasil. A porcentagem no PIB praticamente caiu à metade nas últimas décadas. Mas a indústria de transformação ainda é responsável por 70% dos investimentos privados de pesquisa e desenvolvimento, e mais de 50% das exportações. As relações de trabalho são majoritariamente formais. A indústria tem um papel absolutamente fundamental, apesar de ter perdido muito espaço. Mas não é a mesma indústria de antes. A gente precisa tirar da cabeça a ideia do subsídio, das porteiras fechadas, das escolhas de vencedores. É uma outra indústria: 4.0, tecnológica. É isso que vemos no resto do mundo: muitos países tentando revitalizar suas indústrias. Aqui, a gente não está fazendo nada. Não adianta pensar que vamos chegar lá sendo só exportadores de produtos primários. Precisamos vender toneladas de soja para comprar um notebook estrangeiro. Precisamos incorporar tecnologia, vender marcas, vender muito mais serviços. E não podemos negar que os industriais defenderam proteções e fronteiras, achando que o mercado interno era suficiente. Por isso, é necessário mudar a mentalidade dos industriais.

Acionista da gigante de papel e celulose Klabin e ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horácio Lafer Piva foi um dos primeiros empresários a aderir à carta de apoio à democracia, elaborada com o apoio de múltiplas instituições, após o presidente Jair Bolsonaro ter criticado o sistema eleitoral brasileiro em uma reunião com embaixadores. Sobre a reação do presidente após diversos empresários terem aderido ao texto, o executivo afirmou ao Estadão: “Pela primeira vez, não me incomodo em ser chamado de mau-caráter.”

Crítico não só a Bolsonaro, mas também a Lula, Lafer Piva está no grupo de empresários que ainda vê uma pequena chance de a candidatura de Simone Tebet (PMDB) decolar. Segundo ele, Lula e Bolsonaro representam não só a polarização política, mas também têm poucas chances de levar o País adiante. “O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços”, disse Lafer Piva.

Horácio Lafer Piva, acionista da Klabin e ex-presidente da Fiesp Foto: Silvana Garzaro/Estadão

Durante a conversa, ele também falou sobre a necessidade de pensar o Brasil de forma estruturada, sobre o papel da indústria na economia e classificou o bolsonarismo como “elitista, egoísta e assustador”.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

A carta de apoio à democracia foi importante para marcar que essa é uma questão inegociável?

A carta é um sinal da sociedade com relação ao que de fato importa. Democracia, liberdade e limites são inegociáveis, e a carta mostrou isso. Ela é mais do que a defesa de uma ideia. É um documento de valores comuns, de modo de viver e de respeito mútuo. Honestamente, acredito que é hora de vencer a apatia e lutar pelo que nos une. Fiquei muito impressionado com a capacidade que a carta teve de unir os diferentes documentos em meio a tanta polarização. Tem uma perspectiva de que essas eleições vão ser brutais. Vamos ver muitos discursos verborrágicos, tentativas de enfraquecimento de instituições e teremos muita promessa e soberba dos dois lados. Tudo tem muito jogo de interesse. Não vai ter fim da democracia nem ditadura, mas o Brasil vai sofrer nesse embate entre egos. O Brasil está muito rachado e sofrido. A carta vem para mostrar que, apesar de divididos, podemos nos unir naquelas coisas nas quais todos acreditamos, como a liberdade e a democracia. Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.

Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.”

Horácio Lafer Piva

O presidente reagiu à carta na semana passada, chamando os signatários de mau-caráter. Como o sr. reage à declaração de Bolsonaro?

Pela primeira vez, não me incomodo de ser chamado de mau-caráter. Temos compromissos inegociáveis e inabaláveis. Desde o início, antes de ele ser eleito, eu dizia que o Bolsonaro era um atraso civilizatório. Temos demonstrações muito claras de uma atitude boquirrota, de enfrentamento. Me incomoda como cidadão, mas não posso levar a sério esse tipo de ataque que não está sendo feito só a quem assinou a carta, mas ao Brasil. Como pano de fundo, há certamente a questão das eleições, que ganharam uma importância que o levam a um certo desespero. Incomoda? Sim, mas não me ofende, nem atinge. E acho que isso acontece com muita gente. Alguns empresários já passaram do espanto (com Bolsonaro) para um certo desprezo.

O sr. acredita na tese do voto útil nas eleições presidenciais?

Eu tenho sido patrulhado para fazer um voto útil. Se acredito na democracia, o meu voto útil me algema em relação ao que realmente desejo. Então, eu não entro nessa conversa. No primeiro turno, eu voto em quem eu acredito.

Qual sua visão sobre Lula?

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora. Me agradaria muito mais a ideia de que o PT arrumasse a casa, até porque é um partido importante, e ficasse na oposição, e não o poder. Eu gostaria de vê-lo primeiro como um personagem importante da história, e não nessa aventura meio custosa. (Em uma eventual eleição), ele fatalmente fará menos do que na primeira gestão, por questões que até não dependem dele. Ele não vai ser perdoado por quem o condenou. Ele precisa se abrir para o novo. O Lula está mais preso à militância do PT do que a ele mesmo. Eu acho que o Lula é melhor do que seu entorno.

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora.”

Horácio Lafer Piva

E quanto ao Bolsonaro?

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro). E não de pessoas com déficit de educação, mas das pessoas que pretensamente são letradas, mas não querem ver o que está acontecendo. O Bolsonaro tem nos isolado do mundo.

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro).”

Vemos empresários aguerridos na possibilidade da terceira via. O sr. ainda acredita na terceira via nas eleições presidenciais?

Sim. Há várias dezenas de razões pelas quais eu luto pela Simone (Tebet). Mas eu centralizo na pacificação, já que eu acho que (na eleição de) qualquer um dos outros dois candidatos, vamos manter a polarização agressiva. A Simone tem capacidade convocatória de trazer o que há de melhor no País. Basta as pessoas se disporem a escutá-la para ver que ela tem motivos corretos. Se eu acredito na terceira via? Sim, mas é claro que é muito difícil. Mas lutar pelo menos ruim é continuar no mau. Eu me legitimo lutando pelo que acredito. As pessoas falam que 60 dias é pouco tempo, mas pode ser muito na política. Embora o programa de governo não ganhe eleição, faz com que muita gente ouça e gera uma contaminação positiva.

O que o sr. achou da escolha da Mara Gabrilli como vice?

A escolha foi muito interessante. Ela navega bem nas redes sociais, é mulher, é cadeirante e fala muito bem com as pessoas. Eu a conheço há muito tempo. Ouvi comentários de ela se apresentando na Fiesp e muita gente dizendo que não a conhecia. Quando ela fala, muita gente presta atenção. Mas seu João e dona Mariazinha vão entender, eu não sei. Vamos ver daqui a pouco.

Qual é a visão do sr. sobre os demais candidatos à presidência?

O Ciro (Gomes) é uma pessoa articulada, mas ele é intempestivo, é volátil. Tem um projeto bem apresentado, mas ele é voluntarioso, é frágil. Eu também aprecio a precisão do diagnóstico e a sofisticação de pensamento do Luiz Felipe D’Ávila, mas ele é um cara fora do tempo dele.

Já está claro em quem o sr. votará no segundo turno?

Não quero nem pensar no segundo turno. Acho que isso vai me distrair. O Lula e o Bolsonaro não podem ser colocados no mesmo saco. Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula, nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços. E a Simone, ou outro candidato do centro que fosse, não é que vai conseguir virar o Brasil nesses quatro anos, mas poderia começar a apontar para uma rota para que, a partir de 2026, houvesse um novo vigor para recuperar a economia brasileira que está numa situação dificílima.

Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços.”

Então, precisamos de um presidente com perspectiva de aderência ao plano de governo?

Precisamos de alguém que consiga pensar no médio e longo prazo, com um projeto de país e de gestão. Parece que o Brasil não sabe o que quer ser quando crescer. Queremos ser líderes na economia verde, na biodiversidade e no baixo carbono, mas não conseguimos desenhar um projeto de país. O Brasil fica preso na inflação. A inflação é uma falha de governo. Temos uma política monetária subindo a taxa (de juros) e temos uma política fiscal gastando. E isso traz a volta do rentismo – e não podemos nem criticar isso porque é uma consequência, e não a causa. Concentra-se a renda e gera-se um ciclo vicioso. Precisamos de um candidato que pacifique, tenha um projeto, mas que não tenha a soberba de achar que vamos consertar o País em quatro anos. Podemos melhorar questões mais urgentes a apontar para uma direção de médio e longo prazo. Não dá para ficar nessas promessas fantasiosas.

Existe uma dificuldade de entender o momento ambiental do mundo?

Sem dúvidas. Basta ver o que o Brasil faz nesses eventos globais, como a COP. Fazemos o que os americanos chamam de damage control (controle de danos). O País tem todas as condições de criar novos produtos através de biotecnologia florestal e das bio-oportunidades da Amazônia. E vai exatamente para o lado contrário, o da destruição. Não sei como as pessoas não veem o que está acontecendo no tempo, no inverno brasileiro, no Alaska, na Europa. Não sei como olham isso e não percebem. É um profundo egoísmo para com nossos filhos e netos. Mas tudo isso está muito no campo da percepção. Se o próximo presidente conseguir estancar o problema e começar a tratar do assunto, rapidamente se cria uma percepção positiva.

O Brasil se contentou em ser uma potência do agronegócio? A indústria, setor do qual a Klabin faz parte, pode voltar a ser competitiva?

É uma tragédia o retrocesso industrial do Brasil. A porcentagem no PIB praticamente caiu à metade nas últimas décadas. Mas a indústria de transformação ainda é responsável por 70% dos investimentos privados de pesquisa e desenvolvimento, e mais de 50% das exportações. As relações de trabalho são majoritariamente formais. A indústria tem um papel absolutamente fundamental, apesar de ter perdido muito espaço. Mas não é a mesma indústria de antes. A gente precisa tirar da cabeça a ideia do subsídio, das porteiras fechadas, das escolhas de vencedores. É uma outra indústria: 4.0, tecnológica. É isso que vemos no resto do mundo: muitos países tentando revitalizar suas indústrias. Aqui, a gente não está fazendo nada. Não adianta pensar que vamos chegar lá sendo só exportadores de produtos primários. Precisamos vender toneladas de soja para comprar um notebook estrangeiro. Precisamos incorporar tecnologia, vender marcas, vender muito mais serviços. E não podemos negar que os industriais defenderam proteções e fronteiras, achando que o mercado interno era suficiente. Por isso, é necessário mudar a mentalidade dos industriais.

Acionista da gigante de papel e celulose Klabin e ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horácio Lafer Piva foi um dos primeiros empresários a aderir à carta de apoio à democracia, elaborada com o apoio de múltiplas instituições, após o presidente Jair Bolsonaro ter criticado o sistema eleitoral brasileiro em uma reunião com embaixadores. Sobre a reação do presidente após diversos empresários terem aderido ao texto, o executivo afirmou ao Estadão: “Pela primeira vez, não me incomodo em ser chamado de mau-caráter.”

Crítico não só a Bolsonaro, mas também a Lula, Lafer Piva está no grupo de empresários que ainda vê uma pequena chance de a candidatura de Simone Tebet (PMDB) decolar. Segundo ele, Lula e Bolsonaro representam não só a polarização política, mas também têm poucas chances de levar o País adiante. “O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços”, disse Lafer Piva.

Horácio Lafer Piva, acionista da Klabin e ex-presidente da Fiesp Foto: Silvana Garzaro/Estadão

Durante a conversa, ele também falou sobre a necessidade de pensar o Brasil de forma estruturada, sobre o papel da indústria na economia e classificou o bolsonarismo como “elitista, egoísta e assustador”.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

A carta de apoio à democracia foi importante para marcar que essa é uma questão inegociável?

A carta é um sinal da sociedade com relação ao que de fato importa. Democracia, liberdade e limites são inegociáveis, e a carta mostrou isso. Ela é mais do que a defesa de uma ideia. É um documento de valores comuns, de modo de viver e de respeito mútuo. Honestamente, acredito que é hora de vencer a apatia e lutar pelo que nos une. Fiquei muito impressionado com a capacidade que a carta teve de unir os diferentes documentos em meio a tanta polarização. Tem uma perspectiva de que essas eleições vão ser brutais. Vamos ver muitos discursos verborrágicos, tentativas de enfraquecimento de instituições e teremos muita promessa e soberba dos dois lados. Tudo tem muito jogo de interesse. Não vai ter fim da democracia nem ditadura, mas o Brasil vai sofrer nesse embate entre egos. O Brasil está muito rachado e sofrido. A carta vem para mostrar que, apesar de divididos, podemos nos unir naquelas coisas nas quais todos acreditamos, como a liberdade e a democracia. Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.

Fico incomodado com os empresários que não estão assinando essa carta. Daqui um tempo olharemos para isso, porque é algo absurdamente assustador. Me pergunto como essas pessoas e entidades não assinaram.”

Horácio Lafer Piva

O presidente reagiu à carta na semana passada, chamando os signatários de mau-caráter. Como o sr. reage à declaração de Bolsonaro?

Pela primeira vez, não me incomodo de ser chamado de mau-caráter. Temos compromissos inegociáveis e inabaláveis. Desde o início, antes de ele ser eleito, eu dizia que o Bolsonaro era um atraso civilizatório. Temos demonstrações muito claras de uma atitude boquirrota, de enfrentamento. Me incomoda como cidadão, mas não posso levar a sério esse tipo de ataque que não está sendo feito só a quem assinou a carta, mas ao Brasil. Como pano de fundo, há certamente a questão das eleições, que ganharam uma importância que o levam a um certo desespero. Incomoda? Sim, mas não me ofende, nem atinge. E acho que isso acontece com muita gente. Alguns empresários já passaram do espanto (com Bolsonaro) para um certo desprezo.

O sr. acredita na tese do voto útil nas eleições presidenciais?

Eu tenho sido patrulhado para fazer um voto útil. Se acredito na democracia, o meu voto útil me algema em relação ao que realmente desejo. Então, eu não entro nessa conversa. No primeiro turno, eu voto em quem eu acredito.

Qual sua visão sobre Lula?

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora. Me agradaria muito mais a ideia de que o PT arrumasse a casa, até porque é um partido importante, e ficasse na oposição, e não o poder. Eu gostaria de vê-lo primeiro como um personagem importante da história, e não nessa aventura meio custosa. (Em uma eventual eleição), ele fatalmente fará menos do que na primeira gestão, por questões que até não dependem dele. Ele não vai ser perdoado por quem o condenou. Ele precisa se abrir para o novo. O Lula está mais preso à militância do PT do que a ele mesmo. Eu acho que o Lula é melhor do que seu entorno.

Eu gosto do Lula, tenho bom relacionamento com ele, reconheço conquistas, não há quem saiba mais da alma do brasileiro. Mas isso não significa que ele seja o melhor (para o País) agora.”

Horácio Lafer Piva

E quanto ao Bolsonaro?

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro). E não de pessoas com déficit de educação, mas das pessoas que pretensamente são letradas, mas não querem ver o que está acontecendo. O Bolsonaro tem nos isolado do mundo.

O Bolsonaro é o que é, basta olhar para ele. Eu acho inacreditável pessoas que eu conheço aprovarem esse incumbente. É um olhar egoísta, elitista, centrado em tudo que é menos republicano, é assustador. Mas meu espanto vem dessas pessoas (que apoiam o Bolsonaro).”

Vemos empresários aguerridos na possibilidade da terceira via. O sr. ainda acredita na terceira via nas eleições presidenciais?

Sim. Há várias dezenas de razões pelas quais eu luto pela Simone (Tebet). Mas eu centralizo na pacificação, já que eu acho que (na eleição de) qualquer um dos outros dois candidatos, vamos manter a polarização agressiva. A Simone tem capacidade convocatória de trazer o que há de melhor no País. Basta as pessoas se disporem a escutá-la para ver que ela tem motivos corretos. Se eu acredito na terceira via? Sim, mas é claro que é muito difícil. Mas lutar pelo menos ruim é continuar no mau. Eu me legitimo lutando pelo que acredito. As pessoas falam que 60 dias é pouco tempo, mas pode ser muito na política. Embora o programa de governo não ganhe eleição, faz com que muita gente ouça e gera uma contaminação positiva.

O que o sr. achou da escolha da Mara Gabrilli como vice?

A escolha foi muito interessante. Ela navega bem nas redes sociais, é mulher, é cadeirante e fala muito bem com as pessoas. Eu a conheço há muito tempo. Ouvi comentários de ela se apresentando na Fiesp e muita gente dizendo que não a conhecia. Quando ela fala, muita gente presta atenção. Mas seu João e dona Mariazinha vão entender, eu não sei. Vamos ver daqui a pouco.

Qual é a visão do sr. sobre os demais candidatos à presidência?

O Ciro (Gomes) é uma pessoa articulada, mas ele é intempestivo, é volátil. Tem um projeto bem apresentado, mas ele é voluntarioso, é frágil. Eu também aprecio a precisão do diagnóstico e a sofisticação de pensamento do Luiz Felipe D’Ávila, mas ele é um cara fora do tempo dele.

Já está claro em quem o sr. votará no segundo turno?

Não quero nem pensar no segundo turno. Acho que isso vai me distrair. O Lula e o Bolsonaro não podem ser colocados no mesmo saco. Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula, nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços. E a Simone, ou outro candidato do centro que fosse, não é que vai conseguir virar o Brasil nesses quatro anos, mas poderia começar a apontar para uma rota para que, a partir de 2026, houvesse um novo vigor para recuperar a economia brasileira que está numa situação dificílima.

Acho que o Lula, embora seja mais humanista e tenha outra compreensão (dos problemas do Brasil), traz um programa muito datado para um Brasil muito mais complicado. O Bolsonaro nos leva para o abismo. O Lula nos deixaria parados, talvez com pequenos avanços, em um país que precisava de grandes avanços.”

Então, precisamos de um presidente com perspectiva de aderência ao plano de governo?

Precisamos de alguém que consiga pensar no médio e longo prazo, com um projeto de país e de gestão. Parece que o Brasil não sabe o que quer ser quando crescer. Queremos ser líderes na economia verde, na biodiversidade e no baixo carbono, mas não conseguimos desenhar um projeto de país. O Brasil fica preso na inflação. A inflação é uma falha de governo. Temos uma política monetária subindo a taxa (de juros) e temos uma política fiscal gastando. E isso traz a volta do rentismo – e não podemos nem criticar isso porque é uma consequência, e não a causa. Concentra-se a renda e gera-se um ciclo vicioso. Precisamos de um candidato que pacifique, tenha um projeto, mas que não tenha a soberba de achar que vamos consertar o País em quatro anos. Podemos melhorar questões mais urgentes a apontar para uma direção de médio e longo prazo. Não dá para ficar nessas promessas fantasiosas.

Existe uma dificuldade de entender o momento ambiental do mundo?

Sem dúvidas. Basta ver o que o Brasil faz nesses eventos globais, como a COP. Fazemos o que os americanos chamam de damage control (controle de danos). O País tem todas as condições de criar novos produtos através de biotecnologia florestal e das bio-oportunidades da Amazônia. E vai exatamente para o lado contrário, o da destruição. Não sei como as pessoas não veem o que está acontecendo no tempo, no inverno brasileiro, no Alaska, na Europa. Não sei como olham isso e não percebem. É um profundo egoísmo para com nossos filhos e netos. Mas tudo isso está muito no campo da percepção. Se o próximo presidente conseguir estancar o problema e começar a tratar do assunto, rapidamente se cria uma percepção positiva.

O Brasil se contentou em ser uma potência do agronegócio? A indústria, setor do qual a Klabin faz parte, pode voltar a ser competitiva?

É uma tragédia o retrocesso industrial do Brasil. A porcentagem no PIB praticamente caiu à metade nas últimas décadas. Mas a indústria de transformação ainda é responsável por 70% dos investimentos privados de pesquisa e desenvolvimento, e mais de 50% das exportações. As relações de trabalho são majoritariamente formais. A indústria tem um papel absolutamente fundamental, apesar de ter perdido muito espaço. Mas não é a mesma indústria de antes. A gente precisa tirar da cabeça a ideia do subsídio, das porteiras fechadas, das escolhas de vencedores. É uma outra indústria: 4.0, tecnológica. É isso que vemos no resto do mundo: muitos países tentando revitalizar suas indústrias. Aqui, a gente não está fazendo nada. Não adianta pensar que vamos chegar lá sendo só exportadores de produtos primários. Precisamos vender toneladas de soja para comprar um notebook estrangeiro. Precisamos incorporar tecnologia, vender marcas, vender muito mais serviços. E não podemos negar que os industriais defenderam proteções e fronteiras, achando que o mercado interno era suficiente. Por isso, é necessário mudar a mentalidade dos industriais.

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