Analistas vêm usando governos anteriores do PT como base preditiva para entender o novo governo. Muitos, inclusive, dizem torcer por um Lula I. Eu espero que o novo governo Lula-Alckmin não seja parecido com nenhum governo anterior do PT.
O mundo hoje é muito diferente daquele de 20 anos atrás. O centro de gravidade produtivo mudou, com a manufatura movendo-se para a Ásia e serviços sendo outsourced na Índia.
Além disso, surgem novos serviços, focados em entregas, entretenimento digital, de cuidados pessoais e de saúde. Com isso, novas relações trabalhistas emergem e demandam políticas públicas que restabeleçam a seguridade social e estimulem o aumento da produtividade em um novo ambiente.
Há também hoje uma maior preocupação com uma economia que possa incentivar atividades compatíveis com a preservação do meio ambiente – não é preciso destruir para crescer. Além disso, os grandes fluxos de capitais para países emergentes estão hoje mais escassos. Há quem diga que há uma desglobalização em curso, fruto do aumento do nacionalismo e de políticas protecionistas. Como fica o Brasil nesse contexto?
Nesse novo ambiente, as perguntas que motivam políticas públicas são outras. Como garantir seguridade social a um trabalhador alocado como motorista de aplicativo? Como estimular o crescimento de produtividade em uma economia onde os novos empregos são e serão marcadamente gerados no setor de serviços? Fixações antigas por industrialização, substituição de importações e microcontrole do Estado sobre processos produtivos ficam descasadas da atual realidade.
Esses temas poderiam ficar mais facilmente no passado se houvesse maior uso de evidências no desenho e implementação de políticas públicas. O novo governo pretende estimular o uso de evidências na avaliação de políticas públicas? Existe a intenção de criar algum grupo que tenha esse objetivo como foco?
Com a definição de Fernando Haddad como novo ministro da Fazenda e Gabriel Galípolo como seu braço direito esperam-se agora mais detalhes sobre qual será o foco da Fazenda no novo governo. Haddad sinaliza responsabilidade fiscal – apesar da dúvida do rombo contratado com a PEC de Transição. O futuro ministro da Fazenda também reconhece erros de diagnóstico e de execução nas políticas econômicas dos governos anteriores do PT – o que é um alívio. Mas, para além disso, o que Haddad acha que é fundamental para o Brasil?
Eu espero que a gente não se mantenha preso ao passado para desenhar o futuro.