BRASÍLIA - O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), afirmou que o projeto de lei que retoma o chamado voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) deve ser votado pela Casa na próxima terça-feira, 4. O deputado também descartou a necessidade de se retirar a urgência constitucional do texto caso haja impasse entre o relator e a equipe econômica.
O PL do Carf trancou a pauta da Câmara na semana passada, quando venceu o prazo de 45 dias para se votar propostas enviadas pelo Executivo com urgência constitucional. Ou seja, antes de analisar qualquer outra proposta, como a reforma tributária e as alterações do Senado no arcabouço fiscal, os deputados precisam votar o projeto do Carf, caso a urgência não seja retirada pelo governo.
“É a primeira matéria que nós devemos votar na terça-feira. Nós estamos negociando com o relator da matéria, o deputado Beto Pereira. O ministro Haddad está conduzindo essa discussão, vai dialogar, com a chegada do presidente Arthur Lira amanhã para ver se a gente conclui o relatório para ser divulgado ainda na sexta-feira, para que as bancadas discutam na segunda”, disse Guimarães, em coletiva de imprensa na qual fez um balanço dos seis meses de articulação política do governo na Câmara.
Leia também
“Essa é uma matéria imprescindível para o País, o voto de qualidade. O ministro Haddad não pode abrir mão disso porque toda a Câmara sabe que esse é um projeto que está dentro do esforço fiscal que o governo está fazendo de arrecadação por conta do arcabouço, da elevação das receitas. Essa matéria é decisiva para o governo”, emendou.
O voto de qualidade, que desempata julgamentos do Carf a favor da Receita Federal, havia sido extinto em 2020 pelo Congresso, mas o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, decidiu retomar o dispositivo. O relator já sinalizou que pode manter o voto de qualidade, mas com condicionantes, uma espécie de meio-termo. O Carf é o tribunal administrativo que julga conflitos tributários entre a Receita e os contribuintes.
Arcabouço fiscal
Guimarães afirmou que será melhor para o governo federal se os deputados mantiveram no arcabouço a previsão de espaço fiscal extra no Orçamento de 2024, mas disse que “não será o fim do mundo” se os deputados retirarem do texto esse dispositivo incluído pelo Senado.
“Isso nós vamos discutir com os líderes. Não tem da nossa parte nenhuma posição de impor e nem de tirar nada, o Senado mudou alguma coisa e a Câmara vai discutir. Os líderes, com a presença do Haddad, vão debater como fazer”, disse o parlamentar, em coletiva de imprensa na qual fez um balanço dos seis meses de articulação política do governo na Câmara.
“Do ponto de vista do governo, principalmente a emenda que foi feita na questão do cálculo do IPCA, se nós pudermos manter o que foi feito no Senado, para o governo é melhor. Mas isso também não é o fim do mundo. Vai depender do grau de diálogo que nós tivermos com todos os líderes”, afirmou Guimarães. “Nada nós faremos para comprometer o esforço que o governo está fazendo para estabilizar o País fiscal e financeiramente”, emendou.
Como o Estadão/Broadcast mostrou ontem, o Palácio do Planalto já admite, nos bastidores, que a Câmara deve reverter as mudanças feitas pelo Senado no arcabouço fiscal. Apesar do discurso do líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP), em defesa da emenda aprovada pelos senadores que permite a previsão de despesas condicionadas no Orçamento de 2024, aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva avaliam que a tendência é os deputados ignorarem a demanda do Ministério do Planejamento.
Apesar de Randolfe ter dito que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não teria resistência às alterações feitas pelo Senado no texto do arcabouço, o deputado alagoano não foi procurado pelo governo para tratar do assunto. Em viagem a Portugal para participar de um fórum organizado pelo Instituto de Direito Público (IDP), Lira volta ao Brasil na quinta-feira, 29.
Lira avalia que a tendência é a Câmara ignorar inovações que afrouxam a regra fiscal. O deputado alagoano tem dito a interlocutores que o texto aprovado na Câmara foi feito em acordo com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e que a emenda de Randolfe foi fruto apenas da articulação da ministra do Planejamento, Simone Tebet, com os senadores, sem consultar a Casa ao lado.
“O governo está conversando ao máximo para a manutenção, sobretudo dessa emenda, que importará de R$ 30 bilhões a R$ 40 bilhões no Orçamento da União. E estamos otimistas de que vamos conseguir. Não tem resistência por parte do presidente Lira”, afirmou Randolfe ontem, no Palácio do Itamaraty.
A emenda foi acolhida pelo relator do projeto no Senado, Omar Aziz (PSD-AM), na última quarta-feira, 21, quando o arcabouço foi aprovado pelos senadores. A pedido do Ministério do Planejamento, o dispositivo autoriza a previsão de despesas condicionadas no Orçamento de 2024, que só seriam executadas com a aprovação de crédito extraordinário pelo Legislativo.
Esse dispositivo daria ao governo uma “folga” entre R$ 32 bilhões e R$ 40 bilhões no Orçamento do ano que vem, de acordo com cálculos do Planejamento. Na prática, isso impediria que a peça orçamentária viesse com cortes em programas que terão a verba recomposta em 2024.
Ao Estadão/Broadcast, o relator do arcabouço na Câmara, Claudio Cajado (PP-BA), defendeu ignorar mudanças feitas pelos senadores no texto. “O Senado, lamentavelmente, decidiu politicamente nas suas alterações, sem qualquer amparo do ponto de vista técnico”, disse Cajado.
O limite para as despesas condicionadas, de acordo com a emenda de Randolfe, seria a diferença entre o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do País, acumulado nos 12 meses até junho e o realizado até dezembro do ano anterior.
Tebet defendeu ativamente a emenda no Congresso, assim como o ministro da Integração e Desenvolvimento Regional, Waldez Góes. Os dois estiveram no plenário do Senado na hora da votação do arcabouço, e Tebet disse que o dispositivo abriria espaço fiscal para a implementação do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Reforma tributária
O líder do governo na Câmara afirmou que o desejo do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), é votar a reforma tributária na semana que vem, mas ponderou que os deputados têm até o dia 15 para analisar a proposta no plenário, antes do início do recesso parlamentar.
“Tem uma decisão dos líderes com o presidente Arthur de que nós vamos votar a proposta neste semestre”, disse Guimarães, em coletiva de imprensa na qual fez um balanço dos seis meses de articulação política do governo na Câmara. “Todo o diálogo está sendo feito com os entes federados. Nós queremos fortalecer os entes federativos. Portanto, a opinião do governo é votar a reforma tributária até o dia 15. Se der, na próxima semana, que é o desejo dos líderes e do presidente Lira”, emendou.
Guimarães afirmou que não é possível agradar a todo mundo na reforma tributária e que o governo trabalha para votar a proposta mesmo que não haja consenso com todos os atores envolvidos. O relator da proposta, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), ainda negocia com os Estados alguns pontos como o valor do repasse ao Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) e ao fundo para compensar empresas que hoje têm benefícios fiscais do ICMS.