Quando a The Economist lançou a famosa edição com o Cristo Redentor decolando na capa (14 de novembro de 2009), o Ibovespa estava em 65.000 pontos, vindo de uma espetacular recuperação de mais de 80% nos doze meses anteriores (no mesmo período, o S&P500 havia subido "só" 28%, tendo feito uma nova mínima em março e só então iniciado uma correção). Uma ação da Petrobras (PETR4) valia R$ 37, uma ação da OGX (OGXP3) valia R$ 14 e gente como Jeremy Grantham, o conservador e respeitado estrategista da gigante americana GMO, dizia que ações de mercados emergentes deveriam operar com um prêmio sobre seus pares em países desenvolvidos, para (aqui cito literalmente de uma das cartas trimestrais dele) "celebrar seu crescimento do PIB obviamente superior comparado ao de um mundo desenvolvido envelhecendo".
Hoje é fácil olhar para aquela imagem e classificá-la como "indicador contrário". Essa propriedade é frequentemente atribuída a capas de publicações, tendo por trás uma lógica bastante atraente: preços antecipam notícias, e quando um fenômeno chama atenção o bastante a ponto de virar matéria jornalística de destaque para o grande público, provavelmente já está totalmente incorporado nos preços. Nesse ponto, o próximo movimento mais provável seria na direção oposta do que aponta a mídia. O caso mais célebre (ou infame) é o do livro Dow 36.000, lançado nos Estados Unidos no final de 1999, alguns meses antes do espetacular estouro da bolha do Nasdaq. Conta a lenda que quem correu para vender ações americanas no lançamento do livro se deu bem, assim como quem fugiu da Bovespa ao ver histórias do Brasil que, finalmente, tinha dado certo.
Em ambos os casos, a anedota é mais charmosa e bem menos complexa do que a realidade. A "óbvia" bolha do Nasdaq sobreviveria por mais alguns meses, o suficiente para fazer com que dois dos maiores especuladores da história, Julian Robertson e George Soros, decidissem repensar os respectivos fundos após ficarem para trás com apostas contra a tendência de alta das ações de tecnologia. O mesmo Jeremy Grantham lembra daquela época como a mais difícil de sua carreira, vendo o dinheiro dos seus clientes deixar a GMO para apostas mais "quentes" e de retornos rápidos. No caso do Brasil, quem vendeu ações em novembro de 2009 ainda viu o Bovespa romper mais duas vezes os 70 mil pontos antes de iniciar uma tendência clara de queda, por volta de março de 2011.
Assim, talvez seja cedo para correr para ações brasileiras (ainda que, provavelmente, a margem de segurança dos preços atuais seja maior do que na euforia de 2009). A decepção expressa na última edição da The Economist, creio, pode ser estendida para a decepção geral do investimento estrangeiro no Brasil nos últimos anos. Poucas das narrativas de "país decolando" provaram-se corretas, e voltaram os conhecidos problemas de investimento em emergentes: moeda depreciando, empresas com dificuldades em entregarem lucros aos acionistas, gargalos de infraestrutura, intervenção arbitrária do governo e sensação de que o país rasgou mais um bilhete de ida para o nirvana do desenvolvimento.
Más decisões dos pilotos do foguete-Brasil e problemas com o combustível (preços de commodities) provocaram o pouso forçado recente. Se isso hoje está claro, ainda é difícil ver alguma mudança no comando ou na tecnologia de propulsão. Talvez o que estamos vendo é o fim de uma fase bipolar da relação dos mercados com o país, uma volta ao Brasil mais-ou-menos com o qual nos acostumamos por muito tempo.
Este artigo foi publicado originalmente na AE-News/Broadcast