Em pesquisa recente da Genial-Quaest, 41% dos pesquisados apontam a crise econômica como o principal problema do País e apenas 10% elegeram a corrupção como a preocupação mais importante. Ainda assim, é provável que o debate eleitoral tenha a corrupção como o tema principal.
O Brasil é um país muito corrupto? Difícil saber com certeza. Não há uma medida objetiva de corrupção; o que se faz é apenas medir a percepção da população a respeito dela. Esse índice, chamado CPI, é publicado desde 1995 pela Transparência Internacional. Na edição de 2020 foram pesquisados 178 países e não, não somos campeões mundiais. O Brasil ficou na 94.ª posição. Estamos entre o Equador e a Etiópia. Na ponta, considerados menos corruptos, temos Dinamarca, Nova Zelândia, Finlândia e Cingapura. Na rabeira, temos Sudão do Sul, Somália, Síria e Iêmen. O primeiro grupo é, claramente, constituído por países mais ricos que o segundo. O coeficiente de correlação do CPI desses 180 países com os respectivos índices de desenvolvimento humano, medido pelas Nações Unidas, é de 76%, o que indica uma correlação positiva relativamente forte.
Mas é importante resistir à tentação de concluir que um menor índice de corrupção leve automaticamente a maior desenvolvimento. O mais provável é que as duas variáveis sejam correlacionadas, porque ambas dependem simultaneamente de uma terceira, que deve ser o grau de maturidade das instituições que moldam a governança de um país.
Mas é sempre mais conveniente atribuir um peso crucial à corrupção nas explicações de todos os nossos males. Por que isso? Porque a corrupção está alheia ao embate que envolve os vários segmentos da sociedade. Os corruptos são uma ínfima minoria da população e atribuir a eles um papel fundamental nos exime de uma discussão inconveniente sobre ajustes que nos afetam. São terceiros, o que nos permite pensar que não pagaremos a conta. Não é conosco. Ao contrário, a solução da crise fiscal, que está na raiz de nossa estagnação econômica, nos envolve a todos.
Uma reforma tributária que promova um sistema mais progressivo significa que os ricos vão pagar mais impostos e os subsídios vão ser reduzidos. Mudanças na estrutura de gastos do setor público implica que segmentos organizados perderão privilégios. Tudo isso gera conflitos. É mais conveniente acreditarmos que a corrupção explica tudo. Não é verdade, mas dói menos.
* ECONOMISTA. FOI DIRETOR DE POLÍTICA MONETÁRIA DO BANCO CENTRAL E PROFESSOR DE ECONOMIA DA PUC-SP E FGV-SP