O rapaz varre meticulosamente a calçada e deposita o lixo na sarjeta. Serviço feito. A calçada está limpa. Mas com a primeira chuva a sujeira será levada para o bueiro, provocando alagamentos. Ou alcançará o rio que corta a cidade, poluindo-o. Se a prefeitura multasse esse procedimento, a equação de conveniências mudaria, induzindo o rapaz a jogar o lixo no lixo.
Limpar o planeta é muito mais difícil. Começa pelo fato de que não há uma autoridade mundial capaz de definir regras a serem cumpridas. As 27 reuniões sobre o clima patrocinadas pela Organização das Nações Unidas (ONU) não conseguiram avançar muito na tentativa de forjar um consenso entre interesses divergentes.
Uma tentação clássica é que cada um dos países tenha um comportamento egoísta (emulando o problema do free rider da Teoria dos Jogos), já que, se todos os outros se preocuparem em evitar o aquecimento global, o resultado beneficiaria também o país que não colaborou (nos mesmos moldes que um vizinho pode se recusar a pagar o vigia da rua em que mora).
Também pode parecer simples argumentar que países que hoje emitem mais CO2 devam refrear seu crescimento. Mas esses países replicarão que o primeiro compromisso que têm é com a melhoria do nível de vida da população mais pobre, da mesma forma que fizeram lá atrás os países hoje ricos.
Chamar para pagar a conta quem historicamente mais emitiu CO2 também é intrincado. Afora a inexistência de uma governança mundial que torne essa coleta factível, o fato é que a culpa não é só dos países ricos.
Estudo recente publicado por Simon Evans no site britânico Carbon Brief estima o total de emissão acumulada entre 1850 e 2021. Em primeiro lugar aparecem os Estados Unidos, como é fácil adivinhar. Mas em seguida vêm China, Rússia, Brasil e Indonésia, os dois últimos por conta do desmatamento. Não vai ser fácil convencer as pessoas desses países a assumirem responsabilidades por algo feito por seus avós.
Para complicar ainda mais, há um forte lobby das indústrias cujo core business é justamente poluir. A 27.ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-27) acolheu 636 delegados da indústria de combustíveis fósseis, incluindo os presidentes da Shell e da BP.
No meio desse cipoal de interesses conflitantes, resta confiar na mobilização dos cidadãos e, quem sabe, nos dirigentes que tenham a vaidade de serem citados com louvor nos livros de História a serem escritos no futuro.