Economista e ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, Luís Eduardo Assis escreve quinzenalmente

Opinião|Repercussão desastrosa do ajuste fiscal deu espaço a um longo desfile de ideias equivocadas


Movimento recente do dólar foi predominantemente comandado pelo mercado futuro

Por Luís Eduardo Assis

A repercussão desastrosa após a divulgação das medidas de ajuste fiscal deu espaço a um longo desfile de ideias equivocadas. A puxar a fila, a tese petista de que o mercado quer desestabilizar o governo através da manipulação do preço da moeda americana é tão tola quanto inconsistente. É fato, documentado em pesquisa recente, que operadores nutrem pelo presidente Lula algo que oscila entre o desprezo e o ódio ressentido. Mas daí não segue que estejam dispostos a orquestrar movimentos que provoquem perdas financeiras significativas dentro do próprio mercado.

Isso contraria o objetivo de todos os traders, que é ganhar dinheiro – todo o resto é secundário. O movimento recente do dólar foi predominantemente comandado pelo mercado futuro, o que significa dizer que cada posição ganhadora (daqueles que estavam comprados) tem contrapartida em uma posição perdedora (daqueles que estavam vendidos em dólar e tiveram que sair correndo para estancar as perdas, comprando a moeda, o que fez o dólar subir mais ainda). A repulsa ao PT se subordina ao amor pelo dinheiro.

O movimento recente do dólar foi predominantemente comandado pelo mercado futuro Foto: Fabio Motta/Estadão
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Mais ainda, a alta de dezembro não foi inusitada. Volatilidade é uma medida estatística de dispersão ardilosa, já que ela não pode ser aferida intuitivamente. É preciso medi-la através de uma formuleta pouco amigável, que inclui o uso de logaritmo neperiano, algo um pouco hostil para quem não gosta de números. A volatilidade de 21 dias subiu bastante e superou 14% nos dias 5 e 6 de dezembro. Muito parecida com a média da volatilidade desse ativo nos últimos dez anos, 14,1%.

Nos últimos dias, ela voltou a cair abaixo de 12%. Mesmo a desvalorização nos últimos tempos pode ser explicada em grande parte por fatores externos, já que esteve praticamente em linha com outras moedas de países emergentes com quem o real guarda maior correlação (essa é uma longa história).

O nível absoluto também não deveria assustar. Se ajustado pelo IPCA (uma conta simplória, mas que dá conta do impacto psicológico), o valor do dólar, quando ficou claro que Lula seria eleito no fim de 2002, seria hoje de R$ 14,32. Se ajustarmos pela diferença entre a inflação brasileira e a americana, estamos falando de R$ 8,21. Já passamos susto antes.

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Claro, nada disso reduz o impacto provável sobre a inflação daqui a alguns meses, o que deve ter inspirado o Banco Central a anunciar um inesperado choque nos juros.

Disso tudo, fica apenas a dúvida a respeito das expectativas do mercado, que acreditou em algum momento, sabe-se lá a razão, que esse governo poderia ter compromisso com uma política fiscal austera. A surpresa foi a própria surpresa.

A repercussão desastrosa após a divulgação das medidas de ajuste fiscal deu espaço a um longo desfile de ideias equivocadas. A puxar a fila, a tese petista de que o mercado quer desestabilizar o governo através da manipulação do preço da moeda americana é tão tola quanto inconsistente. É fato, documentado em pesquisa recente, que operadores nutrem pelo presidente Lula algo que oscila entre o desprezo e o ódio ressentido. Mas daí não segue que estejam dispostos a orquestrar movimentos que provoquem perdas financeiras significativas dentro do próprio mercado.

Isso contraria o objetivo de todos os traders, que é ganhar dinheiro – todo o resto é secundário. O movimento recente do dólar foi predominantemente comandado pelo mercado futuro, o que significa dizer que cada posição ganhadora (daqueles que estavam comprados) tem contrapartida em uma posição perdedora (daqueles que estavam vendidos em dólar e tiveram que sair correndo para estancar as perdas, comprando a moeda, o que fez o dólar subir mais ainda). A repulsa ao PT se subordina ao amor pelo dinheiro.

O movimento recente do dólar foi predominantemente comandado pelo mercado futuro Foto: Fabio Motta/Estadão

Mais ainda, a alta de dezembro não foi inusitada. Volatilidade é uma medida estatística de dispersão ardilosa, já que ela não pode ser aferida intuitivamente. É preciso medi-la através de uma formuleta pouco amigável, que inclui o uso de logaritmo neperiano, algo um pouco hostil para quem não gosta de números. A volatilidade de 21 dias subiu bastante e superou 14% nos dias 5 e 6 de dezembro. Muito parecida com a média da volatilidade desse ativo nos últimos dez anos, 14,1%.

Nos últimos dias, ela voltou a cair abaixo de 12%. Mesmo a desvalorização nos últimos tempos pode ser explicada em grande parte por fatores externos, já que esteve praticamente em linha com outras moedas de países emergentes com quem o real guarda maior correlação (essa é uma longa história).

O nível absoluto também não deveria assustar. Se ajustado pelo IPCA (uma conta simplória, mas que dá conta do impacto psicológico), o valor do dólar, quando ficou claro que Lula seria eleito no fim de 2002, seria hoje de R$ 14,32. Se ajustarmos pela diferença entre a inflação brasileira e a americana, estamos falando de R$ 8,21. Já passamos susto antes.

Claro, nada disso reduz o impacto provável sobre a inflação daqui a alguns meses, o que deve ter inspirado o Banco Central a anunciar um inesperado choque nos juros.

Disso tudo, fica apenas a dúvida a respeito das expectativas do mercado, que acreditou em algum momento, sabe-se lá a razão, que esse governo poderia ter compromisso com uma política fiscal austera. A surpresa foi a própria surpresa.

A repercussão desastrosa após a divulgação das medidas de ajuste fiscal deu espaço a um longo desfile de ideias equivocadas. A puxar a fila, a tese petista de que o mercado quer desestabilizar o governo através da manipulação do preço da moeda americana é tão tola quanto inconsistente. É fato, documentado em pesquisa recente, que operadores nutrem pelo presidente Lula algo que oscila entre o desprezo e o ódio ressentido. Mas daí não segue que estejam dispostos a orquestrar movimentos que provoquem perdas financeiras significativas dentro do próprio mercado.

Isso contraria o objetivo de todos os traders, que é ganhar dinheiro – todo o resto é secundário. O movimento recente do dólar foi predominantemente comandado pelo mercado futuro, o que significa dizer que cada posição ganhadora (daqueles que estavam comprados) tem contrapartida em uma posição perdedora (daqueles que estavam vendidos em dólar e tiveram que sair correndo para estancar as perdas, comprando a moeda, o que fez o dólar subir mais ainda). A repulsa ao PT se subordina ao amor pelo dinheiro.

O movimento recente do dólar foi predominantemente comandado pelo mercado futuro Foto: Fabio Motta/Estadão

Mais ainda, a alta de dezembro não foi inusitada. Volatilidade é uma medida estatística de dispersão ardilosa, já que ela não pode ser aferida intuitivamente. É preciso medi-la através de uma formuleta pouco amigável, que inclui o uso de logaritmo neperiano, algo um pouco hostil para quem não gosta de números. A volatilidade de 21 dias subiu bastante e superou 14% nos dias 5 e 6 de dezembro. Muito parecida com a média da volatilidade desse ativo nos últimos dez anos, 14,1%.

Nos últimos dias, ela voltou a cair abaixo de 12%. Mesmo a desvalorização nos últimos tempos pode ser explicada em grande parte por fatores externos, já que esteve praticamente em linha com outras moedas de países emergentes com quem o real guarda maior correlação (essa é uma longa história).

O nível absoluto também não deveria assustar. Se ajustado pelo IPCA (uma conta simplória, mas que dá conta do impacto psicológico), o valor do dólar, quando ficou claro que Lula seria eleito no fim de 2002, seria hoje de R$ 14,32. Se ajustarmos pela diferença entre a inflação brasileira e a americana, estamos falando de R$ 8,21. Já passamos susto antes.

Claro, nada disso reduz o impacto provável sobre a inflação daqui a alguns meses, o que deve ter inspirado o Banco Central a anunciar um inesperado choque nos juros.

Disso tudo, fica apenas a dúvida a respeito das expectativas do mercado, que acreditou em algum momento, sabe-se lá a razão, que esse governo poderia ter compromisso com uma política fiscal austera. A surpresa foi a própria surpresa.

Opinião por Luís Eduardo Assis

Economista. Autor de 'O Poder das Ideias Erradas' (Ed.Almedina). Foi diretor de Política Monetária do Banco Central e professor de Economia da PUC-SP e FGV-SP

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