Passados mais de três meses do início da epidemia da covid-19 no Brasil já está bastante claro qual será o custo econômico que teremos de enfrentar neste e nos próximos anos. O déficit primário subirá para R$ 800 bilhões em razão dos gastos com os programas de combate ao coronavírus, segundo estimativa da Secretaria do Tesouro, bem mais do que o previsto no início de 2020. Como haverá necessidade de financiamento para conter esse déficit, a dívida pública deve aumentar. Analistas já preveem uma dívida próxima dos 100% do PIB.
Depois do achatamento da curva da pandemia, é o achatamento da curva dívida/PIB o principal desafio. Quanto mais achatada estiver essa curva, maior será a capacidade de voltarmos a crescer.
Já enfrentamos cenários difíceis e conseguimos superá-los. Foi assim com a inflação, a dívida externa e os juros. Para que o Brasil superasse esses desafios houve um fator em comum, que foi a criação de um ambiente favorável à construção do que eu chamo de estado do consenso possível. Trata-se de um acordo tácito que leva o governo, o Congresso, os partidos políticos, os empresários e os trabalhadores a convergirem em torno de uma agenda mínima a ser implantada. Acredito que o País está preparado para um acordo sobre como pagar essa conta, que chegará ao final da pandemia do novo coronavírus.
A premissa central desse acordo é deixar de lado a ideia de que existe um pacote mágico de medidas. Esse tempo já passou. Será preciso pactuar os interesses, respeitar as diferenças, identificar as prioridades com bom senso, mobilizar a sociedade sobre o que será preciso ser feito. As alternativas técnicas estão sobre a mesa, o caminho será resultado de diálogo político e convergência pragmática das ideias. As diferenças e divergências políticas não podem ser maiores que o sentimento de urgência para a volta do crescimento econômico, dos investimentos e da criação de empregos.
A equipe econômica dá um exemplo concreto na direção do consenso possível ao restabelecer, no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), prioridade para a privatização ainda neste ano da Eletrobrás, Correios, Porto de Santos e Pré-Sal Petróleo S/A. Trata-se de uma informação importante, que pode dar tração à mudança de expectativas dos investidores – algo que tanto necessitamos.
Outra boa notícia vem do Congresso com o avanço do novo marco regulatório para o saneamento. Uma reforma tributária está amadurecendo, com sinalizações positivas do governo federal, de governadores, de líderes do Congresso e entidades do empresariado. É tema complexo, que exige negociações exaustivas, dedicação, paciência e tolerância de todas as partes envolvidas.
A reforma administrativa é outro exemplo de tema que deve ser encarado como prioridade. A iniciativa privada respondeu à crise da covid-19 com medidas gerenciais de aumento da eficiência. É com esse conceito que estamos conseguindo superar a brusca redução da atividade econômica. A reforma administrativa nada mais é que dotar o setor público de ferramentas para aumentar sua eficiência nesse momento de superação da crise.
Temos a nosso favor, para a retomada do crescimento econômico, juros básicos historicamente baixos. Além de um estímulo ao consumo, tão necessário para a indústria e o comércio, esses juros permitirão que pessoas e empresas se apoiem em mais crédito para a realização de projetos e invistam em novos negócios.
O que desejamos realmente é um Estado mais eficiente, moderno e que não perca de vista suas funções precípuas e compromissos com o bem-estar da sociedade. O maior deles, a responsabilidade fiscal, que é a base necessária para a reconstrução de uma economia melhor e mais justa.
A pandemia está nos dando muitas lições, entre as quais a importância da cooperação e da corresponsabilidade. Seu maior legado, porém, é a esperança de que dias melhores virão.
*PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BRADESCO.
A PARTIR DE AGORA, PASSA A ESCREVER A CADA DUAS SEMANAS