O presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou como uma “excrescência” o patamar atual dos juros, em 13,75% ao ano. Embora tenha prometido não falar sobre a política monetária, o chefe do Executivo dedicou parte de seu discurso na Fiesp para atacar novamente o trabalho do Banco Central (BC), tomando, no entanto, o cuidado de não mencionar desta vez o chefe da autarquia, Roberto Campos Neto.
“O País não merece isso”, declarou Lula para, após criticar os juros atuais, lembrar do papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na recuperação de empresas na crise de 2008, quando o presidente estava em seu segundo mandato. Ao fechar o evento do Dia da Indústria na Fiesp, o presidente disse que é preciso colocar dinheiro no mercado. “Como vai sobreviver a pequena e média empresa se não tiver crédito?”, questionou.
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Ao cobrar posicionamento do empresariado, Lula lembrou que, quando era ele quem indicava o presidente do BC, a Fiesp aparecia na manchete criticando decisões de juros em toda reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). “Nesse País, que o mercado financeiro tomou conta, o presidente da República não pode criticar presidente do BC”, ironizou Lula.
Ele manteve o discurso que faz desde a campanha eleitoral sobre a necessidade de o País voltar a se reindustrializar. Citando o seu assessor para assuntos internacionais, o seu ex-ministro de Relações Exteriores Celso Amorim, Lula disse que o Brasil precisa uma política industrial ativa e altiva.
“Temos de compreender que precisamos de uma política industrial ativa e altiva, como costuma dizer o Celso Amorim”, disse o presidente. O País, diz Lula, tem de voltar a crescer com uma indústria forte, experimentando tecnologias de ponta e que leve em conta a transição energética. Mas acima de tudo, de acordo com ele, o povo tem de voltar a ter condições para ter três refeições por dia, mais universidades e mais escolas técnicas. “Não vejo isso como gasto. Vejo como investimento”, reiterou.
O presidente disse ainda que a mudança na Medida Provisória (MP) que estabeleceu organização da Esplanada e que esvaziou o Ministério do Meio Ambiente é normal.
Reforma tributária
Com a reforma tributária no topo da lista de reivindicações do setor, o Dia da Indústria, celebrado nesta quinta-feira, 25, terminou com manifestações de otimismo do governo sobre mudanças no modelo de recolhimento de impostos, considerado anacrônico e disfuncional, além de um pedido público do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de pressa na votação das matérias encaminhadas ao Legislativo.
O apelo foi feito por Lula ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, no encerramento de evento na sede da Fiesp que reuniu especialistas, representantes do setor público e empresários para discutir os caminhos da reindustrialização do País. “O Brasil precisa de tudo. E nós voltamos para fazer esse `quase tudo’. E só temos 1.200 dias de governo. Pacheco, por favor, apressa as votações porque o trem está apitando”, declarou o chefe do Executivo ao presidente do Senado.
Antes de Lula, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já havia considerado o Congresso “maduro” para votar a reforma tributária, e o vice-presidente, Geraldo Alckmin, falou de uma “construção coletiva” que já permitiu uma votação expressiva a favor do arcabouço fiscal e deve, agora, atuar na reforma dos impostos que recaem sobre o consumo.
A plateia era formada por empresários da indústria, mas Lula aproveitou a oportunidade para aliviar tensões com setores do agronegócio. “A gente quer que a indústria cresça, mas a gente também quer que o agronegócio continue crescendo [...] O Brasil precisa cada vez mais ser exportador de grãos e de carnes”, disse Lula, acrescentando que o crescimento do agronegócio não atrapalha a indústria, até porque, para ser mais produtivo, o campo precisa investir em máquinas e equipamentos.
Primeiro a discursar no encerramento, o presidente da Fiesp, Josué Gomes da Silva, já tinha reforçado a urgência de aprovação da reforma tributária para corrigir as distorções de um sistema que “pune a indústria e o crescimento nacional”. A solução para desonerar investimentos e exportações, defendeu, está na criação de um imposto sobre valor agregado, em substituição a cinco tributos atuais.
O empresário da indústria têxtil, herdeiro da Coteminas, distribuiu elogios a Pacheco, a quem parabenizou pelo encontro com empresários na terça-feira que “deixou todos otimistas”, ao BNDES, que pela manhã lançou linhas de financiamento que demonstram o compromisso do banco de voltar a ser uma instituição de desenvolvimento e industrialização, e ao próprio Lula, pelo artigo, em parceria com Alckmin, sobre neoindustrialização publicado hoje pelo Estadão.
Os ataques do presidente ao Banco Central também tiveram ressonância nas declarações de Josué. “Em 30 anos, o juro real do Brasil sempre esteve acima de seus pares [...] Resolvido arcabouço fiscal, reforma tributária e juros, parte do trabalho para recuperar a indústria estará feito”, assinalou o presidente da Fiesp, para quem a reindustrialização é “fundamental” para fortalecer a classe média e a democracia.