Marinho quer limitar jornada de trabalhadores de apps: ‘há falso debate sobre empreendedorismo’


Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, defende que categoria se organize e passe a ter representação sindical

Por Mariana Carneiro e Bianca Lima
Atualização:

BRASÍLIA - O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, afirma que o projeto de regulamentação do trabalho por aplicativos, em discussão no governo, deverá criar limites para evitar longas jornadas diárias de serviço para entregadores e motoristas. Ele classificou como análogo à escravidão o trabalho que, segundo diz, se estende por turnos de até 18 horas.

“Eu não acredito que a sociedade queira um serviço à custa de um trabalho análogo à escravidão. (O consumidor) quer que o seu prestador de serviço esteja também satisfeito. Ele não quer sair na chuva para buscar uma pizza? Alguém que saiu na chuva por ele tem que ser remunerado adequadamente”, afirmou o ministro, em entrevista exclusiva ao Estadão.

A restrição de jornada é um tema controverso, uma vez que aproxima o segmento do modelo tradicional de contratação com carteira de trabalho. O arranjo da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) é rejeitado por boa parte da categoria dos entregadores e motoristas de aplicativos, que se enxerga mais como empreendedora do que sujeita a um regime convencional de emprego.

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A restrição de jornada é um tema controverso, uma vez que aproxima motoristas e entregadores de aplicativo do modelo tradicional de contratação com carteira de trabalho. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Como mostrou o Estadão, nove em cada dez trabalhadores desejam novos direitos desde que isso não interfira na flexibilidade atual do trabalho, segundo pesquisa feita pelo Datafolha sob encomenda do Ifood e da Uber em maio.

Marinho rejeita essa leitura e afirma que os trabalhadores buscam prioritariamente mais garantias na relação de trabalho.

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“Tem um falso debate sobre empreendedorismo. O que o pessoal não quer é trabalho precário e serviço ruim. Não é que o pessoal não quer a CLT. A briga toda é: ‘eu preciso de um trabalho mais formalizado, mais regulamentado, eu preciso de proteção, preciso de Previdência’. Agora, o formato das nomenclaturas, o autônomo também tem previsão na CLT”, afirma.

O Ministério Trabalho mediu em pesquisa, que foi a campo em agosto, que uma parte menor dos trabalhadores por aplicativos disseram esticar a jornada além de 10 horas por dia: foram 18% dos entregadores e 24% dos motoristas.

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Ainda assim, Marinho diz que a jornada, o valor mínimo de remuneração por hora de trabalho, a contribuição para a Previdência Social e outros temas, como seguro e uso de equipamentos, farão parte da regulamentação preparada pelo governo. O ministro, no entanto, não deu detalhes. A explicação é que a negociação entre empresas e trabalhadores está em curso.

A pressão é crescente sobre as empresas de aplicativos de entrega, que usam o serviço de motoqueiros e ciclistas, como o Ifood. No caso dos motoristas de transporte de passageiros, como Uber e 99, um pré-acordo foi alivanhado estabelecendo a remuneração mínima em R$ 30 a hora trabalhada, e o ministro espera receber por escrito em até 15 dias o que foi fechado pelas partes.

Marinho voltou a enfatizar que, caso não seja superado o impasse entre empresas e trabalhadores, o governo vai arbitrar. Foto: WILTON JUNIOR
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Para o caso dos entregadores, Marinho voltou a enfatizar que, caso não seja superado o impasse, o governo vai arbitrar - e sugere que será em favor dos trabalhadores.

“As empresas não têm avançado na negociação com os trabalhadores e, se nós estamos falando que é uma regulamentação para proteger o trabalho e os trabalhadores, as empresas que tratem de negociar. Se não quiserem que venha uma proposta do governo que pode deixá-las infelizes”, afirmou.


O consumidor não quer sair na chuva para buscar uma pizza? Alguém que saiu na chuva por ele tem que ser remunerado adequadamente.

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Uma proposta chegou a ser colocada na mesa pelo governo, estabelecendo a remuneração de R$ 17 a hora trabalhada, mas os valores não foram aceitos.

“Com certeza (a arbitragem) não vai desagradar aos dois lados. Números foram colocados na mesa e não deu acordo, que voltem à mesa ou o governo vai arbitrar e seguramente não será R$ 17″, afirmou Marinho, sugerindo um viés de alta para a remuneração dos motoqueiros.

Organização sindical

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O Ministério do Trabalho discute ainda como a categoria será representada, uma vez que são trabalhadores autônomos, pouco organizados e que podem atuar em cidades diferentes, o que faz com que as regras tradicionais de representação sindical por território não funcionem.

A questão prática mais imediata é quem serão os representantes desses trabalhadores em negociações futuras, como a correção anual da remuneração mínima. Para Marinho, a regulamentação que está sendo proposta pode prever o reajuste automático segundo o aumento anual do salário mínimo.

Ainda assim, ele defende que a organização sindical exista neste novo ramo de trabalho. “É um novo momento. Me dizem que esse pessoal não pode se organizar por sindicato. Tem que passar a poder, vai passar a existir (sindicato de trabalhadores autônomos por aplicativos), tem que existir. Como negociar se não tem sindicato? Sozinho?”, disse Marinho.

O tema pode se converter em ponto de atrito pelo mesmo motivo que o controle da jornada de trabalho, em razão da aversão da categoria ao modelo tradicional de representação, mais vinculado à lógica da CLT. Marinho, no entanto, minimiza o potencial conflito e diz que o governo está preparado para discutir até mesmo a reformulação da lei trabalhista para garantir que seja permitida a sindicalização desses trabalhadores.

“Se tiver que ter uma lei ou uma portaria do ministro que diga que os autônomos podem criar o sindicato, qual é o problema? Eu não vejo maiores dramas nisso”, afirmou. “O que precisamos saber é que a relação de trabalho passa por um processo de mudanças profundas. É preciso portanto alargar as possibilidades de representação.”

Na avaliação do especialista em direito do trabalho Luiz Guilherme Migliora, sócio do Veirano Advogados e professor fundador da FGV Direito-Rio, apesar de a sindicalização de autônomos não ser uma prática comum, não há um impeditivo na lei para esse tipo de associação. “O artigo 511 da CLT, sobre sindicatos, cita trabalhadores autônomos. Não há impedimento para haver um sindicato de trabalhadores não celetistas que vão se organizar para negociar com os sindicatos das empresas”, afirma.

BRASÍLIA - O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, afirma que o projeto de regulamentação do trabalho por aplicativos, em discussão no governo, deverá criar limites para evitar longas jornadas diárias de serviço para entregadores e motoristas. Ele classificou como análogo à escravidão o trabalho que, segundo diz, se estende por turnos de até 18 horas.

“Eu não acredito que a sociedade queira um serviço à custa de um trabalho análogo à escravidão. (O consumidor) quer que o seu prestador de serviço esteja também satisfeito. Ele não quer sair na chuva para buscar uma pizza? Alguém que saiu na chuva por ele tem que ser remunerado adequadamente”, afirmou o ministro, em entrevista exclusiva ao Estadão.

A restrição de jornada é um tema controverso, uma vez que aproxima o segmento do modelo tradicional de contratação com carteira de trabalho. O arranjo da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) é rejeitado por boa parte da categoria dos entregadores e motoristas de aplicativos, que se enxerga mais como empreendedora do que sujeita a um regime convencional de emprego.

A restrição de jornada é um tema controverso, uma vez que aproxima motoristas e entregadores de aplicativo do modelo tradicional de contratação com carteira de trabalho. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Como mostrou o Estadão, nove em cada dez trabalhadores desejam novos direitos desde que isso não interfira na flexibilidade atual do trabalho, segundo pesquisa feita pelo Datafolha sob encomenda do Ifood e da Uber em maio.

Marinho rejeita essa leitura e afirma que os trabalhadores buscam prioritariamente mais garantias na relação de trabalho.

“Tem um falso debate sobre empreendedorismo. O que o pessoal não quer é trabalho precário e serviço ruim. Não é que o pessoal não quer a CLT. A briga toda é: ‘eu preciso de um trabalho mais formalizado, mais regulamentado, eu preciso de proteção, preciso de Previdência’. Agora, o formato das nomenclaturas, o autônomo também tem previsão na CLT”, afirma.

O Ministério Trabalho mediu em pesquisa, que foi a campo em agosto, que uma parte menor dos trabalhadores por aplicativos disseram esticar a jornada além de 10 horas por dia: foram 18% dos entregadores e 24% dos motoristas.

Ainda assim, Marinho diz que a jornada, o valor mínimo de remuneração por hora de trabalho, a contribuição para a Previdência Social e outros temas, como seguro e uso de equipamentos, farão parte da regulamentação preparada pelo governo. O ministro, no entanto, não deu detalhes. A explicação é que a negociação entre empresas e trabalhadores está em curso.

A pressão é crescente sobre as empresas de aplicativos de entrega, que usam o serviço de motoqueiros e ciclistas, como o Ifood. No caso dos motoristas de transporte de passageiros, como Uber e 99, um pré-acordo foi alivanhado estabelecendo a remuneração mínima em R$ 30 a hora trabalhada, e o ministro espera receber por escrito em até 15 dias o que foi fechado pelas partes.

Marinho voltou a enfatizar que, caso não seja superado o impasse entre empresas e trabalhadores, o governo vai arbitrar. Foto: WILTON JUNIOR

Para o caso dos entregadores, Marinho voltou a enfatizar que, caso não seja superado o impasse, o governo vai arbitrar - e sugere que será em favor dos trabalhadores.

“As empresas não têm avançado na negociação com os trabalhadores e, se nós estamos falando que é uma regulamentação para proteger o trabalho e os trabalhadores, as empresas que tratem de negociar. Se não quiserem que venha uma proposta do governo que pode deixá-las infelizes”, afirmou.


O consumidor não quer sair na chuva para buscar uma pizza? Alguém que saiu na chuva por ele tem que ser remunerado adequadamente.

Uma proposta chegou a ser colocada na mesa pelo governo, estabelecendo a remuneração de R$ 17 a hora trabalhada, mas os valores não foram aceitos.

“Com certeza (a arbitragem) não vai desagradar aos dois lados. Números foram colocados na mesa e não deu acordo, que voltem à mesa ou o governo vai arbitrar e seguramente não será R$ 17″, afirmou Marinho, sugerindo um viés de alta para a remuneração dos motoqueiros.

Organização sindical

O Ministério do Trabalho discute ainda como a categoria será representada, uma vez que são trabalhadores autônomos, pouco organizados e que podem atuar em cidades diferentes, o que faz com que as regras tradicionais de representação sindical por território não funcionem.

A questão prática mais imediata é quem serão os representantes desses trabalhadores em negociações futuras, como a correção anual da remuneração mínima. Para Marinho, a regulamentação que está sendo proposta pode prever o reajuste automático segundo o aumento anual do salário mínimo.

Ainda assim, ele defende que a organização sindical exista neste novo ramo de trabalho. “É um novo momento. Me dizem que esse pessoal não pode se organizar por sindicato. Tem que passar a poder, vai passar a existir (sindicato de trabalhadores autônomos por aplicativos), tem que existir. Como negociar se não tem sindicato? Sozinho?”, disse Marinho.

O tema pode se converter em ponto de atrito pelo mesmo motivo que o controle da jornada de trabalho, em razão da aversão da categoria ao modelo tradicional de representação, mais vinculado à lógica da CLT. Marinho, no entanto, minimiza o potencial conflito e diz que o governo está preparado para discutir até mesmo a reformulação da lei trabalhista para garantir que seja permitida a sindicalização desses trabalhadores.

“Se tiver que ter uma lei ou uma portaria do ministro que diga que os autônomos podem criar o sindicato, qual é o problema? Eu não vejo maiores dramas nisso”, afirmou. “O que precisamos saber é que a relação de trabalho passa por um processo de mudanças profundas. É preciso portanto alargar as possibilidades de representação.”

Na avaliação do especialista em direito do trabalho Luiz Guilherme Migliora, sócio do Veirano Advogados e professor fundador da FGV Direito-Rio, apesar de a sindicalização de autônomos não ser uma prática comum, não há um impeditivo na lei para esse tipo de associação. “O artigo 511 da CLT, sobre sindicatos, cita trabalhadores autônomos. Não há impedimento para haver um sindicato de trabalhadores não celetistas que vão se organizar para negociar com os sindicatos das empresas”, afirma.

BRASÍLIA - O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, afirma que o projeto de regulamentação do trabalho por aplicativos, em discussão no governo, deverá criar limites para evitar longas jornadas diárias de serviço para entregadores e motoristas. Ele classificou como análogo à escravidão o trabalho que, segundo diz, se estende por turnos de até 18 horas.

“Eu não acredito que a sociedade queira um serviço à custa de um trabalho análogo à escravidão. (O consumidor) quer que o seu prestador de serviço esteja também satisfeito. Ele não quer sair na chuva para buscar uma pizza? Alguém que saiu na chuva por ele tem que ser remunerado adequadamente”, afirmou o ministro, em entrevista exclusiva ao Estadão.

A restrição de jornada é um tema controverso, uma vez que aproxima o segmento do modelo tradicional de contratação com carteira de trabalho. O arranjo da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) é rejeitado por boa parte da categoria dos entregadores e motoristas de aplicativos, que se enxerga mais como empreendedora do que sujeita a um regime convencional de emprego.

A restrição de jornada é um tema controverso, uma vez que aproxima motoristas e entregadores de aplicativo do modelo tradicional de contratação com carteira de trabalho. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Como mostrou o Estadão, nove em cada dez trabalhadores desejam novos direitos desde que isso não interfira na flexibilidade atual do trabalho, segundo pesquisa feita pelo Datafolha sob encomenda do Ifood e da Uber em maio.

Marinho rejeita essa leitura e afirma que os trabalhadores buscam prioritariamente mais garantias na relação de trabalho.

“Tem um falso debate sobre empreendedorismo. O que o pessoal não quer é trabalho precário e serviço ruim. Não é que o pessoal não quer a CLT. A briga toda é: ‘eu preciso de um trabalho mais formalizado, mais regulamentado, eu preciso de proteção, preciso de Previdência’. Agora, o formato das nomenclaturas, o autônomo também tem previsão na CLT”, afirma.

O Ministério Trabalho mediu em pesquisa, que foi a campo em agosto, que uma parte menor dos trabalhadores por aplicativos disseram esticar a jornada além de 10 horas por dia: foram 18% dos entregadores e 24% dos motoristas.

Ainda assim, Marinho diz que a jornada, o valor mínimo de remuneração por hora de trabalho, a contribuição para a Previdência Social e outros temas, como seguro e uso de equipamentos, farão parte da regulamentação preparada pelo governo. O ministro, no entanto, não deu detalhes. A explicação é que a negociação entre empresas e trabalhadores está em curso.

A pressão é crescente sobre as empresas de aplicativos de entrega, que usam o serviço de motoqueiros e ciclistas, como o Ifood. No caso dos motoristas de transporte de passageiros, como Uber e 99, um pré-acordo foi alivanhado estabelecendo a remuneração mínima em R$ 30 a hora trabalhada, e o ministro espera receber por escrito em até 15 dias o que foi fechado pelas partes.

Marinho voltou a enfatizar que, caso não seja superado o impasse entre empresas e trabalhadores, o governo vai arbitrar. Foto: WILTON JUNIOR

Para o caso dos entregadores, Marinho voltou a enfatizar que, caso não seja superado o impasse, o governo vai arbitrar - e sugere que será em favor dos trabalhadores.

“As empresas não têm avançado na negociação com os trabalhadores e, se nós estamos falando que é uma regulamentação para proteger o trabalho e os trabalhadores, as empresas que tratem de negociar. Se não quiserem que venha uma proposta do governo que pode deixá-las infelizes”, afirmou.


O consumidor não quer sair na chuva para buscar uma pizza? Alguém que saiu na chuva por ele tem que ser remunerado adequadamente.

Uma proposta chegou a ser colocada na mesa pelo governo, estabelecendo a remuneração de R$ 17 a hora trabalhada, mas os valores não foram aceitos.

“Com certeza (a arbitragem) não vai desagradar aos dois lados. Números foram colocados na mesa e não deu acordo, que voltem à mesa ou o governo vai arbitrar e seguramente não será R$ 17″, afirmou Marinho, sugerindo um viés de alta para a remuneração dos motoqueiros.

Organização sindical

O Ministério do Trabalho discute ainda como a categoria será representada, uma vez que são trabalhadores autônomos, pouco organizados e que podem atuar em cidades diferentes, o que faz com que as regras tradicionais de representação sindical por território não funcionem.

A questão prática mais imediata é quem serão os representantes desses trabalhadores em negociações futuras, como a correção anual da remuneração mínima. Para Marinho, a regulamentação que está sendo proposta pode prever o reajuste automático segundo o aumento anual do salário mínimo.

Ainda assim, ele defende que a organização sindical exista neste novo ramo de trabalho. “É um novo momento. Me dizem que esse pessoal não pode se organizar por sindicato. Tem que passar a poder, vai passar a existir (sindicato de trabalhadores autônomos por aplicativos), tem que existir. Como negociar se não tem sindicato? Sozinho?”, disse Marinho.

O tema pode se converter em ponto de atrito pelo mesmo motivo que o controle da jornada de trabalho, em razão da aversão da categoria ao modelo tradicional de representação, mais vinculado à lógica da CLT. Marinho, no entanto, minimiza o potencial conflito e diz que o governo está preparado para discutir até mesmo a reformulação da lei trabalhista para garantir que seja permitida a sindicalização desses trabalhadores.

“Se tiver que ter uma lei ou uma portaria do ministro que diga que os autônomos podem criar o sindicato, qual é o problema? Eu não vejo maiores dramas nisso”, afirmou. “O que precisamos saber é que a relação de trabalho passa por um processo de mudanças profundas. É preciso portanto alargar as possibilidades de representação.”

Na avaliação do especialista em direito do trabalho Luiz Guilherme Migliora, sócio do Veirano Advogados e professor fundador da FGV Direito-Rio, apesar de a sindicalização de autônomos não ser uma prática comum, não há um impeditivo na lei para esse tipo de associação. “O artigo 511 da CLT, sobre sindicatos, cita trabalhadores autônomos. Não há impedimento para haver um sindicato de trabalhadores não celetistas que vão se organizar para negociar com os sindicatos das empresas”, afirma.

BRASÍLIA - O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, afirma que o projeto de regulamentação do trabalho por aplicativos, em discussão no governo, deverá criar limites para evitar longas jornadas diárias de serviço para entregadores e motoristas. Ele classificou como análogo à escravidão o trabalho que, segundo diz, se estende por turnos de até 18 horas.

“Eu não acredito que a sociedade queira um serviço à custa de um trabalho análogo à escravidão. (O consumidor) quer que o seu prestador de serviço esteja também satisfeito. Ele não quer sair na chuva para buscar uma pizza? Alguém que saiu na chuva por ele tem que ser remunerado adequadamente”, afirmou o ministro, em entrevista exclusiva ao Estadão.

A restrição de jornada é um tema controverso, uma vez que aproxima o segmento do modelo tradicional de contratação com carteira de trabalho. O arranjo da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) é rejeitado por boa parte da categoria dos entregadores e motoristas de aplicativos, que se enxerga mais como empreendedora do que sujeita a um regime convencional de emprego.

A restrição de jornada é um tema controverso, uma vez que aproxima motoristas e entregadores de aplicativo do modelo tradicional de contratação com carteira de trabalho. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Como mostrou o Estadão, nove em cada dez trabalhadores desejam novos direitos desde que isso não interfira na flexibilidade atual do trabalho, segundo pesquisa feita pelo Datafolha sob encomenda do Ifood e da Uber em maio.

Marinho rejeita essa leitura e afirma que os trabalhadores buscam prioritariamente mais garantias na relação de trabalho.

“Tem um falso debate sobre empreendedorismo. O que o pessoal não quer é trabalho precário e serviço ruim. Não é que o pessoal não quer a CLT. A briga toda é: ‘eu preciso de um trabalho mais formalizado, mais regulamentado, eu preciso de proteção, preciso de Previdência’. Agora, o formato das nomenclaturas, o autônomo também tem previsão na CLT”, afirma.

O Ministério Trabalho mediu em pesquisa, que foi a campo em agosto, que uma parte menor dos trabalhadores por aplicativos disseram esticar a jornada além de 10 horas por dia: foram 18% dos entregadores e 24% dos motoristas.

Ainda assim, Marinho diz que a jornada, o valor mínimo de remuneração por hora de trabalho, a contribuição para a Previdência Social e outros temas, como seguro e uso de equipamentos, farão parte da regulamentação preparada pelo governo. O ministro, no entanto, não deu detalhes. A explicação é que a negociação entre empresas e trabalhadores está em curso.

A pressão é crescente sobre as empresas de aplicativos de entrega, que usam o serviço de motoqueiros e ciclistas, como o Ifood. No caso dos motoristas de transporte de passageiros, como Uber e 99, um pré-acordo foi alivanhado estabelecendo a remuneração mínima em R$ 30 a hora trabalhada, e o ministro espera receber por escrito em até 15 dias o que foi fechado pelas partes.

Marinho voltou a enfatizar que, caso não seja superado o impasse entre empresas e trabalhadores, o governo vai arbitrar. Foto: WILTON JUNIOR

Para o caso dos entregadores, Marinho voltou a enfatizar que, caso não seja superado o impasse, o governo vai arbitrar - e sugere que será em favor dos trabalhadores.

“As empresas não têm avançado na negociação com os trabalhadores e, se nós estamos falando que é uma regulamentação para proteger o trabalho e os trabalhadores, as empresas que tratem de negociar. Se não quiserem que venha uma proposta do governo que pode deixá-las infelizes”, afirmou.


O consumidor não quer sair na chuva para buscar uma pizza? Alguém que saiu na chuva por ele tem que ser remunerado adequadamente.

Uma proposta chegou a ser colocada na mesa pelo governo, estabelecendo a remuneração de R$ 17 a hora trabalhada, mas os valores não foram aceitos.

“Com certeza (a arbitragem) não vai desagradar aos dois lados. Números foram colocados na mesa e não deu acordo, que voltem à mesa ou o governo vai arbitrar e seguramente não será R$ 17″, afirmou Marinho, sugerindo um viés de alta para a remuneração dos motoqueiros.

Organização sindical

O Ministério do Trabalho discute ainda como a categoria será representada, uma vez que são trabalhadores autônomos, pouco organizados e que podem atuar em cidades diferentes, o que faz com que as regras tradicionais de representação sindical por território não funcionem.

A questão prática mais imediata é quem serão os representantes desses trabalhadores em negociações futuras, como a correção anual da remuneração mínima. Para Marinho, a regulamentação que está sendo proposta pode prever o reajuste automático segundo o aumento anual do salário mínimo.

Ainda assim, ele defende que a organização sindical exista neste novo ramo de trabalho. “É um novo momento. Me dizem que esse pessoal não pode se organizar por sindicato. Tem que passar a poder, vai passar a existir (sindicato de trabalhadores autônomos por aplicativos), tem que existir. Como negociar se não tem sindicato? Sozinho?”, disse Marinho.

O tema pode se converter em ponto de atrito pelo mesmo motivo que o controle da jornada de trabalho, em razão da aversão da categoria ao modelo tradicional de representação, mais vinculado à lógica da CLT. Marinho, no entanto, minimiza o potencial conflito e diz que o governo está preparado para discutir até mesmo a reformulação da lei trabalhista para garantir que seja permitida a sindicalização desses trabalhadores.

“Se tiver que ter uma lei ou uma portaria do ministro que diga que os autônomos podem criar o sindicato, qual é o problema? Eu não vejo maiores dramas nisso”, afirmou. “O que precisamos saber é que a relação de trabalho passa por um processo de mudanças profundas. É preciso portanto alargar as possibilidades de representação.”

Na avaliação do especialista em direito do trabalho Luiz Guilherme Migliora, sócio do Veirano Advogados e professor fundador da FGV Direito-Rio, apesar de a sindicalização de autônomos não ser uma prática comum, não há um impeditivo na lei para esse tipo de associação. “O artigo 511 da CLT, sobre sindicatos, cita trabalhadores autônomos. Não há impedimento para haver um sindicato de trabalhadores não celetistas que vão se organizar para negociar com os sindicatos das empresas”, afirma.

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