BRASÍLIA – As medidas de compensação avaliadas pelo Senado para cobrir os custos da desoneração da folha de empresas e municípios devem render quase R$ 10 bilhões a menos do que o esperado pela equipe econômica.
Segundo estudo do economista da XP Investimentos Tiago Sbardelotto, obtido pelo Estadão, as seis ideias anunciadas pelo líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), poderão render R$ 16,9 bilhões aos cofres públicos até o final do ano – R$ 9,5 bilhões a menos do que os R$ 26,3 bilhões que a Fazenda afirma serem necessários para cobrir a desoneração da folha em 2024.
O número, no entanto, se aproxima do cálculo feito pelo Senado sobre os custos do benefício, que seriam de R$ 17,1 bilhões. Procurada sobre a disparidade do cálculo do Senado em relação ao feito pela Fazenda, a pasta não se manifestou.
Na lista das medidas em estudo pelo Senado estão um Refis para débitos de empresas com agências reguladoras; a atualização de ativos no Imposto de Renda; a utilização de dinheiro esquecido em contas; o uso de recursos em contas judiciais de pessoas que ganharam ações na Justiça e não retiraram os valores; repatriação de recursos no exterior com regularização dos valores; e a taxação de compras internacionais de até de US$ 50 – aprovada pelo Congresso nesta semana e encaminhada para a sanção de Lula.
“O número das prefeituras é oficial, porque já foi apurado no primeiro quadrimestre deste ano. Deu R$ 2,7 bilhões. Se multiplicar por três, dá R$ 8,1 bilhões para o ano. O outro, dos setores, o número de 2023 teria dado pouco mais de R$ 8 bilhões – e a projeção para este ano é de que seja de R$ 9 bilhões”, explicou Jaques Wagner em conversa com jornalistas no Senado.
Sbardelotto avalia que o número do Senado parece mais factível do que o da Fazenda. “O demonstrativo de gastos tributários da Receita estimou uma renúncia de R$ 9,3 bilhões em 2023 para a desoneração da folha dos 17 setores. Salvo engano, houve apenas uma inclusão de setor quando houve a renovação de 2024; mas, ainda assim, não justificaria uma elevação tão significativa”, afirmou o economista.
Sbardelotto, no entanto, pondera que o uso dos valores a receber pelo Tesouro e Refis de multas, na sua avaliação, não se enquadram nas medida que poderiam compensar a renúncia com a desoneração da folha.
“A Lei de Responsabilidade Fiscal fala que a compensação de renúncia de receitas precisa ser realizada por meio do aumento de receita proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição. Receita de multas e de depósitos não resgatados não se enquadram nesse critério. Os demais passam com ressalvas”, afirmou o economista.
A necessidade de se encontrar uma nova solução para bancar a desoneração surgiu após o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), devolver a parte da medida provisória que restringia o uso de crédito de PIS/Cofins pelas empresas.
Mais cedo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que todas as propostas do Senado serão processadas pela equipe econômica e avaliou que os Poderes vão chegar a um denominador rápido sobre o assunto. Ele disse também que, a partir da semana que vem, irá colocar “algumas propostas” na mesa, mas ressaltou que o foco será analisar o impacto dos projetos sugeridos pelos senadores.
Jogos de azar de fora
Wagner relatou que o projeto que prevê a legalização dos jogos de azar no País não entrará como possível medida de compensação porque não há garantias de que será aprovado no Congresso. Já a taxação das compras internacionais até US$ 50 pode entrar.
“Jogo não posso incluir, porque sequer foi votado e é impossível saber quanto isso vai render. Mas as compras internacionais, as blusinhas, podem entrar. A prioridade é chegar em R$ 17 bilhões ou R$ 18 bilhões, tudo que vier ao encontro disso é prioridade”, disse.
Ele afirmou que, em reunião de líderes nesta quinta-feira, houve um compromisso firmado entre os senadores com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, para que todos busquem medidas de compensação. Ele entende que, assim que o número for obtido, não haverá dificuldades de aprovação na Casa.
O líder do União Brasil no Senado, Efraim Filho (União-PB) explicou que, como a desoneração da folha tem prazo para terminar, o Congresso poderá usar como medida de compensação receitas extraordinárias, que vão acontecer uma única vez.
“Há uma compreensão jurídica de que não precisam ser receitas recorrentes, porque há um prazo para acabar a desoneração. É entendimento técnico de que, se a desoneração tem prazo para acabar em 2028, precisa ter compensação para esse período. Se, por exemplo, conseguir R$ 50 bilhões este ano, que cobrisse todo o período, o problema já estaria resolvido.
O que é a desoneração da folha de pagamentos
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em 2011 para setores intensivos em mão de obra. Juntos, eles incluem milhares de empresas que empregam 9 milhões de pessoas. A medida substitui a contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de salários por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Ela resulta, na prática, em redução da carga tributária da contribuição previdenciária devida pelas empresas. No caso dos municípios, o benefício reduz a tributação de 20% para 8%.
Por decisão do Congresso, em votações expressivas, a política foi prorrogada até 2027 pelo Congresso Nacional, mas acabou suspensa por uma decisão liminar do STF em ação movida pelo governo federal. A alegação é que o Congresso não previu uma fonte de receitas para bancar o programa e não estimou o impacto do benefício nas contas públicas. O Legislativo, porém, argumenta que medidas foram aprovadas para aumentar as receitas da União e que a estimativa de impacto estava descrita na proposta aprovada.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou, em entrevista ao Estadão, um acordo para manter a desoneração em 2024 e negociar uma cobrança gradual a partir do ano que vem. Segundo o Desonera Brasil, os 17 setores beneficiados empregam 9,3 milhões de pessoas, e criou 151 mil empregos nos dois primeiros meses do ano. O movimento menciona ainda que o salário médio nestes setores é 12,7% maior ao dos setores que não são desonerados, dados que comprovariam os benefícios da medida.