A grande mensagem do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que manteve na quarta, 1, a Selic em 13,75% ao ano, é a sinalização “bem explícita” de que enxerga um corte de juros mais tarde do que indicam as expectativas de mercado, avalia o economista-chefe da Bradesco Asset, Marcelo Toledo.
Em entrevista ao Estadão/Broadcast, ele diz que o principal ponto desse encontro era o aumento recente das previsões de inflação. “Algo que poderia fazer as expectativas caírem seria uma reafirmação das metas (de inflação) atuais no curto prazo”, considera ele, que admite que a indicação do BC coloca um viés de postergar o corte estimado no cenário da asset, que projeta a taxa básica em 12% no fim deste ano. Leia abaixo os principais trechos da entrevista:
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Qual a mensagem do Copom?
O comunicado foi bem claro em deslocar o momento de corte de juros. O ponto principal dessa reunião era o aumento das expectativas de inflação associado ao debate de uma eventual mudança de meta de inflação, que tem acontecido. O BC diz que não vai deixar de reagir a uma piora de expectativas, vai manter o foco no centro da meta e, nesse cenário, enxerga a necessidade de ter que ficar com os juros eventualmente, é condicional, mas mais tempo parado em 13,75% do que ele antevia e do que o Focus indica (12,5% no final do ano). O BC se utiliza da comunicação para reafirmar que vai perseguir as metas de uma forma mais rigorosa, com bastante aderência ao que seria o regime mais puro de metas de inflação.
Quais os principais pontos?
Quando mostra as previsões de inflação tanto com o cenário de juros do Focus quanto com a Selic parada durante todo o horizonte relevante e na conclusão do comunicado, onde ressalta que a estratégia de manter por mais tempo do que no cenário de referência seria suficiente. No cenário de referência (Focus), no terceiro trimestre de 2024, que é o horizonte relevante, a inflação chegaria a 3,6%, acima do compatível com a meta. Se juros parados durante todo o horizonte, chega em seis trimestres perto da meta e, em 2024 como um todo, um pouco abaixo da meta. Ainda haveria algum espaço para cortar juros ao logo desse horizonte, mas menor, e seria necessário mais tempo em 13,75%. Essa é a grande mensagem. Uma sinalização bem explícita de que enxerga um corte de juros mais tarde do que o mercado.
O que faria as expectativas melhorarem?
O principal é a inflação corrente. Se cai, todo o resto, que é o que está acontecendo nos Estados Unidos, vira um pouco secundário. E, no caso do Brasil, tem a discussão da meta. Algo que poderia fazer as expectativas caírem seria uma reafirmação das metas atuais no curto prazo. A princípio, a sinalização do CMN, se é que vai discutir alguma revisão de metas, é que isso aconteceria apenas no momento usual, final de junho, como normalmente acontece.
Foi precipitado levantar essa discussão no início do governo?
O próprio Ministério da Fazenda tem dito, de forma bastante reiterada, que não está com essa discussão pautada e amadurecida internamente. Tem indicado que não foi um debate que foi programado ou está em curso na Fazenda. Isso é o que temos de comunicação. Agora um ponto é que mudar é sempre extremamente complicado, uma meta já colocada, já definida. Mas talvez a gente deva reconhecer que o desafio de atingir uma meta de 3% é um desafio de certa forma duplo que o Brasil está passando. Enquanto outros BCs perseguem metas que tinham antes da pandemia, mas vamos voltar para uma meta inferior ao que tínhamos antes da pandemia. Houve uma queda da meta ao longo dos últimos três anos. É um desafio talvez mais ambicioso do que o de outros países no processo desinflacionário.
O risco fiscal justifica a sinalização do Copom?
Na questão fiscal não houve grandes mudanças. Ainda dentro do balanço de riscos constam os mesmos itens e na parte fiscal ele menciona ainda elevada incerteza, mas sem se referir mais ao risco. O principal não é a questão fiscal propriamente dita, é realmente a das expectativas de inflação, que sofreram uma piora nesse período mais recente.
E quanto ao exterior?
Há uma avaliação do BC de que há uma possível melhora da atividade global associada à reabertura da economia chinesa. A maior novidade em relação ao cenário internacional, reconhecendo que há um ambiente de inflação um pouco positivo na margem, com a atividade global um pouco melhor. Mas não parece trazer alguma grande mudança para o cenário do Copom, não parece modificar ou ser o ponto essencial aqui para a sinalização do BC.
Baseado no comunicado, pretende mudar sua projeção de Selic?
Temos 12% no final do ano. Trabalhamos com uma desinflação talvez que seja, olhando os núcleos de inflação, não tanto a cheia, um pouco mais rápida do que o Banco Central. Então, um IPCA mais baixo no núcleo nesse ano de 2023. Mas (o comunicado) coloca, sim, um viés de postergar uma queda de juros em relação ao anterior.
E qual sua avaliação do Fed, que desacelerou o ritmo?
O debate do mercado vai ficar centrado em se haverá mais um aumento de 25 pontos-base ou dois. O que o Fed indica são dois aumentos, mas deixando uma decisão condicional, possibilidade de parar, caso a desinflação seja mais rápida ou mantenha a trajetória. Não nos pareceu que foi particularmente dovish. Houve esforço na entrevista de Powell de ter uma cautela com a trajetória de desinflação da parte de serviços. A tônica foi a preocupação de que a desinflação fique restrita a bens ou sofra algum tipo de inversão pelo mercado de trabalho aquecido, com preocupação de não abortar o aperto de forma prematura, de não deixar que a desinflação seja interrompida.
Qual sua projeção para os Fed Funds?
A desinflação dos núcleos de serviços vai continuar e não mudamos a previsão de mais um aumento de 25 pb, reconhecendo a possibilidade de um adicional. Do ponto de vista mais geral, o debate mais importante mudou: não é mais até onde o Fed subirá, mas quando haverá um corte. A sinalização foi de que não enxerga neste ano, mas há na curva de juros e cortes expressivos em 2024. Daqui para frente é timing e intensidade de redução dos juros.
A discussão de timing é como no Brasil, então?
No caso do Fed, o mercado está enxergando um cenário de cortes com talvez menos dúvida do que no caso do Brasil. O BC, que tinha feito o aperto monetário, antecipadamente, para um nível mais alto, a princípio lógica apontaria para que fosse o primeiro a reduzir, mas hoje parece ter mais dúvida sobre timing de redução do Brasil do que dos EUA. As posições se inverteram um pouco. É claro que isso pode mudar, mas hoje o debate de queda parece mais difícil no Brasil do que nos EUA, pensando nas curvas de juros.