Rio, 02/11/2023 - A polêmica alteração do estatuto social da Petrobras, que eliminou proibições explícitas para admissão de conselheiros e diretores que ocuparam cargos públicos ou partidários, foi proposta em reunião do Conselho de Administração (CA) do dia 21 de setembro. De lá para cá, passou a ser discutida nos diversos comitês do colegiado, revelam duas atas publicadas na noite de ontem, 1, pela estatal. O assunto, portanto, já preocupava a alta administração da estatal um mês antes de ser votada e a decisão vir a público, em 22 de outubro.
A primeira ata é de uma reunião do Comitê de Minoritários (Comin), em 10 de outubro. O segundo documento relata os acontecimentos da reunião do CA em 20 de outubro, que confirmou, por seis votos a quatro, as mudanças no estatuto e, por sete votos a quatro, a criação de uma reserva de capital para dividendos, placares já divulgados pelo Estadão/Broadcast. Ambas as decisões ainda têm de ser ratificadas em Assembleia Geral Extraordinária (AGE), marcada para 30 de novembro.
Em ambos os casos, os votos contrários vieram dos quatro conselheiros que representam acionistas minoritários. No Comin estão reunidos os advogados Marcelo Gasparino, Marcelo Mesquita e Francisco Petros. Fora desse comitê, o quarto minoritário é o empresário Juca Abdala. Ainda em 10 de outubro, o Comin rechaçou a proposta do Conselho, encaminhando manifestação contrária à modificação no estatuto, ou seja, à eliminação de trechos replicados da lei das estatais (13.303/ 2016) sobre vedações às indicações.
Antes, em linha com a lei, o artigo 21 do estatuto da Petrobras tinha incisos específicos restringindo indicações de conselheiros e diretores que ocupam determinados cargos públicos ou tenham atuado, nos três anos anteriores, na estrutura decisória de partido político ou na organização e na realização de campanha eleitoral.
Essa parte da lei foi suspensa liminarmente pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, em março. A decisão ainda vai ser apreciada pelo pleno do STF, que pode ou não acusar a inconstitucionalidade do texto legal.
A Petrobras, no entanto, se adiantou e eliminou o detalhamento, ainda que mantendo a previsão de acompanhamento da lei das estatais. Na prática, a mudança praticamente regulariza a situação interna de quatro dos 11 conselheiros: os secretários do Ministério de Minas e Energia (MME) Pietro Mendes, Efrain Cruz e Vitor Saback, além do dirigente do PSB e ex-ministro de Ciência e Tecnologia Sergio Rezende. Todos esses votaram pela mudança do estatuto, em causa própria.
Comin
No Comin, mostra a ata, Gasparino já havia definido como “preocupante” o fato de a modificação do estatuto se basear numa decisão liminar que pode ser revertida a qualquer momento. Ele defendeu, também, a manutenção do estatuto argumentando que a Petrobras poderia estabelecer “requisitos adicionais aos previstos na legislação como medida de boa prática de governança corporativa”.
Marcelo Mesquita, por sua vez, definiu a mudança como “açodada” e afirmou que o estatuto é o “principal instrumento de governança corporativa da companhia” para fazer frente a partidos políticos e decisões governamentais que a envolvem, devendo ser “perene, não podendo ser alterado para atender a vontades políticas”.
Notabilizado pela defesa da governança da Petrobras ante ameaças do governo de Jair Bolsonaro, o terceiro integrante do Comin, Francisco Petros, não compareceu à reunião, mas enviou recomendação por escrito recomendando troca da menção direta à lei das estatais por uma referência genérica a “normas brasileiras concernentes ao tema”, mas sem se colocar contrariamente à proposta nesse momento. O conselheiro terminou por votar contra a proposta no CA, dez dias depois.