MP que beneficia irmãos Batista encarece conta de luz para Norte e Nordeste, baixa renda e indústria


Estudo aponta que parte do valor devido pela Amazonas Energia a empresários será bancada por famílias que recebem a tarifa social; ministério diz que valores são ‘irrisórios’, e a empresa favorecida, a Âmbar, que desequilíbrio financeiro era ‘amplamente conhecido’

Por Alvaro Gribel e Mariana Carneiro
Atualização:

BRASÍLIA – A medida provisória (MP) que beneficiou a Âmbar, empresa de energia do Grupo J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista, vai encarecer a conta de luz de famílias de baixa renda no País, além de aumentar as tarifas para todos os consumidores das regiões Norte e Nordeste e também ter impacto sobre a indústria, que tende a repassá-lo para o preço dos produtos. Essa é a conclusão de um estudo da TR Soluções, empresa de tecnologia especializada em tarifas de energia, e de entidades do setor elétrico.

Procurados pelo Estadão, o Ministério de Minas e Energia (MME) argumenta que se trata de um “rearranjo de pagadores”, com a inclusão de grandes indústrias e com um rateio diferente para os consumidores de diferentes regiões do País e que os valores são “irrisórios”, enquanto a Âmbar diz que os desequilíbrios financeiros da Amazonas Energia eram amplamente conhecidos pelo setor e que o governo já havia informado que havia estudos em busca de uma solução (veja mais abaixo).

A autora do estudo, a TR Soluções, é uma empresa de tecnologia especializada em tarifas de energia do País. Criada em 2011, presta serviços a empresas de toda a cadeia, como grandes consumidores, distribuidoras e comercializadoras. Sem vínculo com nenhum grupo econômico, possui uma plataforma de projeções que reproduz cálculos tarifários a partir das premissas e regras estabelecidas pelo órgão regulador do setor.

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Hoje, as famílias de baixa renda em todo o País que possuem o benefício da tarifa social não pagam pelos encargos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), cobrança na conta de luz que banca subsídios para o setor elétrico. Mas participam do rateio do Encargo de Energia de Reserva (EER), que cobre todos os custos relacionados à contratação da energia de reserva quando há aumento expressivo de demanda. A MP publicada em 13 de junho transfere as dívidas da Amazonas Energia com a contratação de energia de termoelétricas da CDE para o EER. Por trás dessa transição entre as duas siglas, há um impacto em contas de luz.

“O que aconteceu (com a MP) é que, quando você tira elementos e custos da CDE e os transfere para o EER, você muda a forma de rateio desse custo — e isso impacta as famílias que hoje têm o desconto por meio da tarifa social”, explicou o diretor de Regulação da TR Soluções, Helder Sousa.

Em junho, a Âmbar comprou usinas termoelétricas da Eletrobras que vendem energia para a Amazonas Energia, a distribuidora do Estado do Amazonas. A empresa, no entanto, é deficitária, e desde novembro passado não pagava por essa energia. A MP editada pelo governo cobre essa dívida com recursos bancados pelas contas de luz.

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Pelos cálculos da TR, as famílias de baixa renda terão um custo adicional em suas tarifas de energia entre R$ 3,64 por Megawatt-hora (MWh) e R$ 5,71 por MWh, a depender do custo da energia negociada no mercado livre, que influencia o cálculo dos encargos que recaem sobre a conta.

A tarifa social de energia elétrica é um desconto na conta de luz concedido às famílias de baixa renda inscritas no Cadastro Único ou que tenham entre seus membros alguém que receba o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. O desconto é dado de acordo com o consumo mensal de cada família, que varia de 10% a 65%, até o limite de consumo de 220 kWh.

Para o presidente da Abrace, Paulo Pedrosa, o impacto maior da medida provisória ocorrerá sobre os consumidores da alta tensão, principalmente a indústria. E isso será transformado em custos para produtos que depois serão consumidos pelas famílias.

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“Haverá impacto sobre a indústria, as regiões Norte e Nordeste e também sobre os consumidores de baixa renda, que hoje não pagam pela CDE e vão pagar o EER. Mas o efeito será maior sobre a indústria”, disse. “Temos procurado o diálogo com o MME para mostrar que o consumidor brasileiro paga duas vezes mais energia naquilo que consome do que na conta de luz. Esse efeito não é benéfico para o consumidor residencial.”

Ao Estadão o MME informou que os custos com a usina de Mauá 3, uma das térmicas compradas pela Âmbar, não serão transferidos para essa conta de encargos, um ponto que vinha causando dúvidas no setor. Ainda assim, há efeito sobre as famílias de baixa renda.“Se a dúvida era se manter Mauá 3 na CDE aliviaria totalmente para o consumidor de baixa renda, a resposta é não. Ainda atinge, mas com um pouco menos de intensidade”, disse a TR Soluções em nota.

Como a MP mexe na tarifa

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Em junho, o governo Lula editou uma medida provisória que beneficiou a Âmbar ao socorrer o caixa da Amazonas Energia. Antes, como mostrou o Estadão, executivos da Âmbar Energia foram recebidos 17 vezes no Ministério de Minas e Energia fora da agenda oficial.

A empresa de distribuição do Estado do Amazonas compra energia de termoelétricas adquiridas pelos irmãos Batista. A MP foi publicada três dias após o negócio ser fechado. Desde novembro passado, essas térmicas estavam sem receber pelo fornecimento de energia. Mas, por força da MP, toda essa despesa — que parte ficava com a Amazonas e parte ia para a CDE — foi integralmente transferida para o EER. Ou seja, a conta será paga pelos consumidores do País pelos próximos 15 anos.

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O presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Luiz Barata, questiona a transferência. “Essa energia não é uma energia de reserva; é uma energia para o atendimento de consumidores normais”, diz Barata. “Energia de reserva é para reserva; energia contratada através de leilões ou por distribuidoras não é energia de reserva.”

Segundo ele, a operação é mais um “puxadinho” no emaranhado de soluções criadas para conter as crises de curto prazo no setor de energia e que acabam se transformando em mais custo na conta de luz.

“Quando cai na conta de energia de reserva, também são os consumidores que pagam. É o conjunto dos consumidores do Brasil inteiro, em proporções diferentes. Muda o perfil dos pagadores, mas todo mundo paga, livres e regulados”, disse. “É preciso que a gente coloque as coisas no lugar certo, esses puxadinhos que temos o costume de fazer não dão certo. Em uma determinada hora, eles cobram um preço”.

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Um dos argumentos do Ministério de Minas e Energia é que a transferência para a conta de energia de reserva tem fundamento técnico, porque a geração feita por essas usinas atende a todo o Sistema Integrado Nacional, e não só o Estado do Amazonas.

Além disso, a mudança retira os encargos com a contratação de térmicas exclusivamente da CDE, cobrada apenas de consumidores domésticos e de pequenos comércios e indústrias (os pequenos consumidores). E que, no EER, há um rearranjo de pagadores, fazendo com que os consumidores da alta tensão (grandes empresas) também arquem com a conta, fazendo um rateio mais equilibrado.

O efeito adverso é que também recairá sobre os consumidores de baixa renda atendidos pela tarifa social e pelos consumidores do Norte e do Nordeste.

Em defesa da MP, o ministro Alexandre Silveira negou que o custo seria bancado pelas contas de luz. “Nenhum centavo será repassado ao consumidor brasileiro, o que está sendo feito é o contrário disso”, afirmou, em entrevista à GloboNews no último dia 12. O MME nega que tenha editado a MP para beneficiar a empresa dos irmãos Batista.

Mapa

A TR afirma que o impacto na conta de luz será percebido de forma diferente segundo as regiões, uma vez que o EER tem seus custos distribuídos de forma desigual pelo País.

Com a MP, consumidores de todos os tipos de tensão (baixa, média e alta) das regiões Norte e Nordeste vão pagar mais em comparação com consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Em especial, os consumidores “eletrointensivos” em energia, como as grandes indústrias.

“Os mais afetados são os consumidores eletrointensivos das regiões Norte e Nordeste. No EER, eles são cobrados pelo consumo da energia mesmo, e menos pela transmissão (transporte da energia). Todos vão pagar mais: siderúrgicas, mineração, alumínio, indústrias de gases industriais, hospitais, tudo acaba se refletindo no custo final do produto”, afirmou Sousa.

O impacto nas tarifas vai variar de acordo com o chamado Preço de Liquidação de Diferenças (PLD), que negocia energia no mercado livre. Quando o PLD está elevado, os encargos sobre a conta de luz diminuem. A TR simulou três cenários de PLD, com resultados distintos. Em todos eles, a direção é a mesma: Norte e Nordeste pagam mais, enquanto Sul, Sudeste e Centro-Oeste pagam menos.

Pelo cenário-base, os consumidores de baixa tensão do Sul, do Sudeste e do Centro-Oeste terão redução de custos de R$ 3,84 por MWh. Ou seja, consumidores residenciais, comércio e até pequenas empresas com consumo mais baixo terão esse benefício nas contas de luz. Já os mesmos consumidores das regiões Norte e Nordeste pagarão mais R$ 0,38 por MWh.

Na média tensão, que engloba indústrias maiores, há queda de R$ 2,07 para as três regiões, e alta de R$ 1,30 para as outras duas regiões. Na alta tensão, com indústrias mais intensivas em energia, há aumento de R$ 0,32 no Sul, Sudeste e Centro Oeste, e aumento de R$ 2,56 no Norte e Nordeste.

Âmbar: ‘Mercado tinha conhecimento’

Procurada pelo Estadão, a Âmbar disse que os desequilíbrios financeiros da Amazonas Energia eram amplamente conhecidos pelo setor, e que o governo já havia informado que havia estudos em busca de uma solução.

“Todos os agentes do mercado elétrico tinham conhecimento, inclusive pela imprensa, de que uma solução para a sustentabilidade econômica da Amazonas Energia era urgente e iminente. O risco de crédito da distribuidora perante as usinas geradoras, portanto, era temporário”, disse a empresa.

Ainda segundo a Âmbar, a compra das usinas termoelétricas foi uma negociação “privada”, que ocorreu após “acirrado processo competitivo”.

“Todas as alternativas possíveis para solucionar a situação da Amazonas Energia foram desenhadas por um grupo de trabalho formado pelo MME e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), cujo relatório foi publicado em fevereiro de 2024. Qualquer dessas soluções, inclusive a adotada pela MP, resolveria os riscos de crédito perante as usinas envolvidas na aquisição pela Âmbar”, diz a empresa.

BRASÍLIA – A medida provisória (MP) que beneficiou a Âmbar, empresa de energia do Grupo J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista, vai encarecer a conta de luz de famílias de baixa renda no País, além de aumentar as tarifas para todos os consumidores das regiões Norte e Nordeste e também ter impacto sobre a indústria, que tende a repassá-lo para o preço dos produtos. Essa é a conclusão de um estudo da TR Soluções, empresa de tecnologia especializada em tarifas de energia, e de entidades do setor elétrico.

Procurados pelo Estadão, o Ministério de Minas e Energia (MME) argumenta que se trata de um “rearranjo de pagadores”, com a inclusão de grandes indústrias e com um rateio diferente para os consumidores de diferentes regiões do País e que os valores são “irrisórios”, enquanto a Âmbar diz que os desequilíbrios financeiros da Amazonas Energia eram amplamente conhecidos pelo setor e que o governo já havia informado que havia estudos em busca de uma solução (veja mais abaixo).

A autora do estudo, a TR Soluções, é uma empresa de tecnologia especializada em tarifas de energia do País. Criada em 2011, presta serviços a empresas de toda a cadeia, como grandes consumidores, distribuidoras e comercializadoras. Sem vínculo com nenhum grupo econômico, possui uma plataforma de projeções que reproduz cálculos tarifários a partir das premissas e regras estabelecidas pelo órgão regulador do setor.

Hoje, as famílias de baixa renda em todo o País que possuem o benefício da tarifa social não pagam pelos encargos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), cobrança na conta de luz que banca subsídios para o setor elétrico. Mas participam do rateio do Encargo de Energia de Reserva (EER), que cobre todos os custos relacionados à contratação da energia de reserva quando há aumento expressivo de demanda. A MP publicada em 13 de junho transfere as dívidas da Amazonas Energia com a contratação de energia de termoelétricas da CDE para o EER. Por trás dessa transição entre as duas siglas, há um impacto em contas de luz.

“O que aconteceu (com a MP) é que, quando você tira elementos e custos da CDE e os transfere para o EER, você muda a forma de rateio desse custo — e isso impacta as famílias que hoje têm o desconto por meio da tarifa social”, explicou o diretor de Regulação da TR Soluções, Helder Sousa.

Em junho, a Âmbar comprou usinas termoelétricas da Eletrobras que vendem energia para a Amazonas Energia, a distribuidora do Estado do Amazonas. A empresa, no entanto, é deficitária, e desde novembro passado não pagava por essa energia. A MP editada pelo governo cobre essa dívida com recursos bancados pelas contas de luz.

Pelos cálculos da TR, as famílias de baixa renda terão um custo adicional em suas tarifas de energia entre R$ 3,64 por Megawatt-hora (MWh) e R$ 5,71 por MWh, a depender do custo da energia negociada no mercado livre, que influencia o cálculo dos encargos que recaem sobre a conta.

A tarifa social de energia elétrica é um desconto na conta de luz concedido às famílias de baixa renda inscritas no Cadastro Único ou que tenham entre seus membros alguém que receba o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. O desconto é dado de acordo com o consumo mensal de cada família, que varia de 10% a 65%, até o limite de consumo de 220 kWh.

Para o presidente da Abrace, Paulo Pedrosa, o impacto maior da medida provisória ocorrerá sobre os consumidores da alta tensão, principalmente a indústria. E isso será transformado em custos para produtos que depois serão consumidos pelas famílias.

“Haverá impacto sobre a indústria, as regiões Norte e Nordeste e também sobre os consumidores de baixa renda, que hoje não pagam pela CDE e vão pagar o EER. Mas o efeito será maior sobre a indústria”, disse. “Temos procurado o diálogo com o MME para mostrar que o consumidor brasileiro paga duas vezes mais energia naquilo que consome do que na conta de luz. Esse efeito não é benéfico para o consumidor residencial.”

Ao Estadão o MME informou que os custos com a usina de Mauá 3, uma das térmicas compradas pela Âmbar, não serão transferidos para essa conta de encargos, um ponto que vinha causando dúvidas no setor. Ainda assim, há efeito sobre as famílias de baixa renda.“Se a dúvida era se manter Mauá 3 na CDE aliviaria totalmente para o consumidor de baixa renda, a resposta é não. Ainda atinge, mas com um pouco menos de intensidade”, disse a TR Soluções em nota.

Como a MP mexe na tarifa

Em junho, o governo Lula editou uma medida provisória que beneficiou a Âmbar ao socorrer o caixa da Amazonas Energia. Antes, como mostrou o Estadão, executivos da Âmbar Energia foram recebidos 17 vezes no Ministério de Minas e Energia fora da agenda oficial.

A empresa de distribuição do Estado do Amazonas compra energia de termoelétricas adquiridas pelos irmãos Batista. A MP foi publicada três dias após o negócio ser fechado. Desde novembro passado, essas térmicas estavam sem receber pelo fornecimento de energia. Mas, por força da MP, toda essa despesa — que parte ficava com a Amazonas e parte ia para a CDE — foi integralmente transferida para o EER. Ou seja, a conta será paga pelos consumidores do País pelos próximos 15 anos.

O presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Luiz Barata, questiona a transferência. “Essa energia não é uma energia de reserva; é uma energia para o atendimento de consumidores normais”, diz Barata. “Energia de reserva é para reserva; energia contratada através de leilões ou por distribuidoras não é energia de reserva.”

Segundo ele, a operação é mais um “puxadinho” no emaranhado de soluções criadas para conter as crises de curto prazo no setor de energia e que acabam se transformando em mais custo na conta de luz.

“Quando cai na conta de energia de reserva, também são os consumidores que pagam. É o conjunto dos consumidores do Brasil inteiro, em proporções diferentes. Muda o perfil dos pagadores, mas todo mundo paga, livres e regulados”, disse. “É preciso que a gente coloque as coisas no lugar certo, esses puxadinhos que temos o costume de fazer não dão certo. Em uma determinada hora, eles cobram um preço”.

Um dos argumentos do Ministério de Minas e Energia é que a transferência para a conta de energia de reserva tem fundamento técnico, porque a geração feita por essas usinas atende a todo o Sistema Integrado Nacional, e não só o Estado do Amazonas.

Além disso, a mudança retira os encargos com a contratação de térmicas exclusivamente da CDE, cobrada apenas de consumidores domésticos e de pequenos comércios e indústrias (os pequenos consumidores). E que, no EER, há um rearranjo de pagadores, fazendo com que os consumidores da alta tensão (grandes empresas) também arquem com a conta, fazendo um rateio mais equilibrado.

O efeito adverso é que também recairá sobre os consumidores de baixa renda atendidos pela tarifa social e pelos consumidores do Norte e do Nordeste.

Em defesa da MP, o ministro Alexandre Silveira negou que o custo seria bancado pelas contas de luz. “Nenhum centavo será repassado ao consumidor brasileiro, o que está sendo feito é o contrário disso”, afirmou, em entrevista à GloboNews no último dia 12. O MME nega que tenha editado a MP para beneficiar a empresa dos irmãos Batista.

Mapa

A TR afirma que o impacto na conta de luz será percebido de forma diferente segundo as regiões, uma vez que o EER tem seus custos distribuídos de forma desigual pelo País.

Com a MP, consumidores de todos os tipos de tensão (baixa, média e alta) das regiões Norte e Nordeste vão pagar mais em comparação com consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Em especial, os consumidores “eletrointensivos” em energia, como as grandes indústrias.

“Os mais afetados são os consumidores eletrointensivos das regiões Norte e Nordeste. No EER, eles são cobrados pelo consumo da energia mesmo, e menos pela transmissão (transporte da energia). Todos vão pagar mais: siderúrgicas, mineração, alumínio, indústrias de gases industriais, hospitais, tudo acaba se refletindo no custo final do produto”, afirmou Sousa.

O impacto nas tarifas vai variar de acordo com o chamado Preço de Liquidação de Diferenças (PLD), que negocia energia no mercado livre. Quando o PLD está elevado, os encargos sobre a conta de luz diminuem. A TR simulou três cenários de PLD, com resultados distintos. Em todos eles, a direção é a mesma: Norte e Nordeste pagam mais, enquanto Sul, Sudeste e Centro-Oeste pagam menos.

Pelo cenário-base, os consumidores de baixa tensão do Sul, do Sudeste e do Centro-Oeste terão redução de custos de R$ 3,84 por MWh. Ou seja, consumidores residenciais, comércio e até pequenas empresas com consumo mais baixo terão esse benefício nas contas de luz. Já os mesmos consumidores das regiões Norte e Nordeste pagarão mais R$ 0,38 por MWh.

Na média tensão, que engloba indústrias maiores, há queda de R$ 2,07 para as três regiões, e alta de R$ 1,30 para as outras duas regiões. Na alta tensão, com indústrias mais intensivas em energia, há aumento de R$ 0,32 no Sul, Sudeste e Centro Oeste, e aumento de R$ 2,56 no Norte e Nordeste.

Âmbar: ‘Mercado tinha conhecimento’

Procurada pelo Estadão, a Âmbar disse que os desequilíbrios financeiros da Amazonas Energia eram amplamente conhecidos pelo setor, e que o governo já havia informado que havia estudos em busca de uma solução.

“Todos os agentes do mercado elétrico tinham conhecimento, inclusive pela imprensa, de que uma solução para a sustentabilidade econômica da Amazonas Energia era urgente e iminente. O risco de crédito da distribuidora perante as usinas geradoras, portanto, era temporário”, disse a empresa.

Ainda segundo a Âmbar, a compra das usinas termoelétricas foi uma negociação “privada”, que ocorreu após “acirrado processo competitivo”.

“Todas as alternativas possíveis para solucionar a situação da Amazonas Energia foram desenhadas por um grupo de trabalho formado pelo MME e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), cujo relatório foi publicado em fevereiro de 2024. Qualquer dessas soluções, inclusive a adotada pela MP, resolveria os riscos de crédito perante as usinas envolvidas na aquisição pela Âmbar”, diz a empresa.

BRASÍLIA – A medida provisória (MP) que beneficiou a Âmbar, empresa de energia do Grupo J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista, vai encarecer a conta de luz de famílias de baixa renda no País, além de aumentar as tarifas para todos os consumidores das regiões Norte e Nordeste e também ter impacto sobre a indústria, que tende a repassá-lo para o preço dos produtos. Essa é a conclusão de um estudo da TR Soluções, empresa de tecnologia especializada em tarifas de energia, e de entidades do setor elétrico.

Procurados pelo Estadão, o Ministério de Minas e Energia (MME) argumenta que se trata de um “rearranjo de pagadores”, com a inclusão de grandes indústrias e com um rateio diferente para os consumidores de diferentes regiões do País e que os valores são “irrisórios”, enquanto a Âmbar diz que os desequilíbrios financeiros da Amazonas Energia eram amplamente conhecidos pelo setor e que o governo já havia informado que havia estudos em busca de uma solução (veja mais abaixo).

A autora do estudo, a TR Soluções, é uma empresa de tecnologia especializada em tarifas de energia do País. Criada em 2011, presta serviços a empresas de toda a cadeia, como grandes consumidores, distribuidoras e comercializadoras. Sem vínculo com nenhum grupo econômico, possui uma plataforma de projeções que reproduz cálculos tarifários a partir das premissas e regras estabelecidas pelo órgão regulador do setor.

Hoje, as famílias de baixa renda em todo o País que possuem o benefício da tarifa social não pagam pelos encargos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), cobrança na conta de luz que banca subsídios para o setor elétrico. Mas participam do rateio do Encargo de Energia de Reserva (EER), que cobre todos os custos relacionados à contratação da energia de reserva quando há aumento expressivo de demanda. A MP publicada em 13 de junho transfere as dívidas da Amazonas Energia com a contratação de energia de termoelétricas da CDE para o EER. Por trás dessa transição entre as duas siglas, há um impacto em contas de luz.

“O que aconteceu (com a MP) é que, quando você tira elementos e custos da CDE e os transfere para o EER, você muda a forma de rateio desse custo — e isso impacta as famílias que hoje têm o desconto por meio da tarifa social”, explicou o diretor de Regulação da TR Soluções, Helder Sousa.

Em junho, a Âmbar comprou usinas termoelétricas da Eletrobras que vendem energia para a Amazonas Energia, a distribuidora do Estado do Amazonas. A empresa, no entanto, é deficitária, e desde novembro passado não pagava por essa energia. A MP editada pelo governo cobre essa dívida com recursos bancados pelas contas de luz.

Pelos cálculos da TR, as famílias de baixa renda terão um custo adicional em suas tarifas de energia entre R$ 3,64 por Megawatt-hora (MWh) e R$ 5,71 por MWh, a depender do custo da energia negociada no mercado livre, que influencia o cálculo dos encargos que recaem sobre a conta.

A tarifa social de energia elétrica é um desconto na conta de luz concedido às famílias de baixa renda inscritas no Cadastro Único ou que tenham entre seus membros alguém que receba o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. O desconto é dado de acordo com o consumo mensal de cada família, que varia de 10% a 65%, até o limite de consumo de 220 kWh.

Para o presidente da Abrace, Paulo Pedrosa, o impacto maior da medida provisória ocorrerá sobre os consumidores da alta tensão, principalmente a indústria. E isso será transformado em custos para produtos que depois serão consumidos pelas famílias.

“Haverá impacto sobre a indústria, as regiões Norte e Nordeste e também sobre os consumidores de baixa renda, que hoje não pagam pela CDE e vão pagar o EER. Mas o efeito será maior sobre a indústria”, disse. “Temos procurado o diálogo com o MME para mostrar que o consumidor brasileiro paga duas vezes mais energia naquilo que consome do que na conta de luz. Esse efeito não é benéfico para o consumidor residencial.”

Ao Estadão o MME informou que os custos com a usina de Mauá 3, uma das térmicas compradas pela Âmbar, não serão transferidos para essa conta de encargos, um ponto que vinha causando dúvidas no setor. Ainda assim, há efeito sobre as famílias de baixa renda.“Se a dúvida era se manter Mauá 3 na CDE aliviaria totalmente para o consumidor de baixa renda, a resposta é não. Ainda atinge, mas com um pouco menos de intensidade”, disse a TR Soluções em nota.

Como a MP mexe na tarifa

Em junho, o governo Lula editou uma medida provisória que beneficiou a Âmbar ao socorrer o caixa da Amazonas Energia. Antes, como mostrou o Estadão, executivos da Âmbar Energia foram recebidos 17 vezes no Ministério de Minas e Energia fora da agenda oficial.

A empresa de distribuição do Estado do Amazonas compra energia de termoelétricas adquiridas pelos irmãos Batista. A MP foi publicada três dias após o negócio ser fechado. Desde novembro passado, essas térmicas estavam sem receber pelo fornecimento de energia. Mas, por força da MP, toda essa despesa — que parte ficava com a Amazonas e parte ia para a CDE — foi integralmente transferida para o EER. Ou seja, a conta será paga pelos consumidores do País pelos próximos 15 anos.

O presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Luiz Barata, questiona a transferência. “Essa energia não é uma energia de reserva; é uma energia para o atendimento de consumidores normais”, diz Barata. “Energia de reserva é para reserva; energia contratada através de leilões ou por distribuidoras não é energia de reserva.”

Segundo ele, a operação é mais um “puxadinho” no emaranhado de soluções criadas para conter as crises de curto prazo no setor de energia e que acabam se transformando em mais custo na conta de luz.

“Quando cai na conta de energia de reserva, também são os consumidores que pagam. É o conjunto dos consumidores do Brasil inteiro, em proporções diferentes. Muda o perfil dos pagadores, mas todo mundo paga, livres e regulados”, disse. “É preciso que a gente coloque as coisas no lugar certo, esses puxadinhos que temos o costume de fazer não dão certo. Em uma determinada hora, eles cobram um preço”.

Um dos argumentos do Ministério de Minas e Energia é que a transferência para a conta de energia de reserva tem fundamento técnico, porque a geração feita por essas usinas atende a todo o Sistema Integrado Nacional, e não só o Estado do Amazonas.

Além disso, a mudança retira os encargos com a contratação de térmicas exclusivamente da CDE, cobrada apenas de consumidores domésticos e de pequenos comércios e indústrias (os pequenos consumidores). E que, no EER, há um rearranjo de pagadores, fazendo com que os consumidores da alta tensão (grandes empresas) também arquem com a conta, fazendo um rateio mais equilibrado.

O efeito adverso é que também recairá sobre os consumidores de baixa renda atendidos pela tarifa social e pelos consumidores do Norte e do Nordeste.

Em defesa da MP, o ministro Alexandre Silveira negou que o custo seria bancado pelas contas de luz. “Nenhum centavo será repassado ao consumidor brasileiro, o que está sendo feito é o contrário disso”, afirmou, em entrevista à GloboNews no último dia 12. O MME nega que tenha editado a MP para beneficiar a empresa dos irmãos Batista.

Mapa

A TR afirma que o impacto na conta de luz será percebido de forma diferente segundo as regiões, uma vez que o EER tem seus custos distribuídos de forma desigual pelo País.

Com a MP, consumidores de todos os tipos de tensão (baixa, média e alta) das regiões Norte e Nordeste vão pagar mais em comparação com consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Em especial, os consumidores “eletrointensivos” em energia, como as grandes indústrias.

“Os mais afetados são os consumidores eletrointensivos das regiões Norte e Nordeste. No EER, eles são cobrados pelo consumo da energia mesmo, e menos pela transmissão (transporte da energia). Todos vão pagar mais: siderúrgicas, mineração, alumínio, indústrias de gases industriais, hospitais, tudo acaba se refletindo no custo final do produto”, afirmou Sousa.

O impacto nas tarifas vai variar de acordo com o chamado Preço de Liquidação de Diferenças (PLD), que negocia energia no mercado livre. Quando o PLD está elevado, os encargos sobre a conta de luz diminuem. A TR simulou três cenários de PLD, com resultados distintos. Em todos eles, a direção é a mesma: Norte e Nordeste pagam mais, enquanto Sul, Sudeste e Centro-Oeste pagam menos.

Pelo cenário-base, os consumidores de baixa tensão do Sul, do Sudeste e do Centro-Oeste terão redução de custos de R$ 3,84 por MWh. Ou seja, consumidores residenciais, comércio e até pequenas empresas com consumo mais baixo terão esse benefício nas contas de luz. Já os mesmos consumidores das regiões Norte e Nordeste pagarão mais R$ 0,38 por MWh.

Na média tensão, que engloba indústrias maiores, há queda de R$ 2,07 para as três regiões, e alta de R$ 1,30 para as outras duas regiões. Na alta tensão, com indústrias mais intensivas em energia, há aumento de R$ 0,32 no Sul, Sudeste e Centro Oeste, e aumento de R$ 2,56 no Norte e Nordeste.

Âmbar: ‘Mercado tinha conhecimento’

Procurada pelo Estadão, a Âmbar disse que os desequilíbrios financeiros da Amazonas Energia eram amplamente conhecidos pelo setor, e que o governo já havia informado que havia estudos em busca de uma solução.

“Todos os agentes do mercado elétrico tinham conhecimento, inclusive pela imprensa, de que uma solução para a sustentabilidade econômica da Amazonas Energia era urgente e iminente. O risco de crédito da distribuidora perante as usinas geradoras, portanto, era temporário”, disse a empresa.

Ainda segundo a Âmbar, a compra das usinas termoelétricas foi uma negociação “privada”, que ocorreu após “acirrado processo competitivo”.

“Todas as alternativas possíveis para solucionar a situação da Amazonas Energia foram desenhadas por um grupo de trabalho formado pelo MME e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), cujo relatório foi publicado em fevereiro de 2024. Qualquer dessas soluções, inclusive a adotada pela MP, resolveria os riscos de crédito perante as usinas envolvidas na aquisição pela Âmbar”, diz a empresa.

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