BRASÍLIA – As mudanças recentes nas regras do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro), espécie de seguro rural voltado a pequenos e médios agricultores, desagradaram ao setor produtivo. Com as novas normas, entidades do agronegócio temem que uma faixa de produtores fique desassistida de cobertura de mitigação de risco.
A revisão do programa vai desde a redução do limite de enquadramento por produtor rural, de R$ R$ 335 mil para R$ 270 mil por ano agrícola, ao modelo de indenização conforme o risco por período de plantio da cultura.
A revisão das normas foi publicada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em 8 de abril. As medidas vão gerar uma economia de R$ 2,9 bilhões ao Executivo, sendo R$ 935 milhões no segundo semestre deste ano e R$ 2 bilhões em 2025, projetou o Banco Central (BC). As mudanças entrarão em vigor em 1º de julho deste ano, quando começa o ano safra 2024/25.
O Proagro, voltado aos pequenos produtores enquadrados no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), é custeado com recursos do Tesouro Nacional e garante o pagamento de obrigações de crédito rural de custeio a agricultores que registraram perdas na produção e incapacidade de liquidação dos financiamentos por problemas climáticos, pragas ou doenças. Sua contratação concentra-se, predominantemente, na região Sul.
O programa entrou no alvo de revisões de gastos do governo federal depois de ter atingido a cifra de R$ 9,4 bilhões em 2023 em meio a suspeitas de fraudes e falhas na execução. O BC alega que as mudanças visam à maior eficiência e à menor sobreposição do Proagro com o Programa de Subvenção ao Seguro Rural (PSR). A autoridade monetária, que gere o seguro, não informou o número de produtores afetados pela medida.
Em audiência pública, o chefe de unidade do Departamento de Regulação, Supervisão e Controle das Operações do Crédito Rural e do Proagro (Derop) do BC, Claudio Filgueiras, afirmou que o novo limite de enquadramento obrigatório continua atendendo 100% da agricultura familiar e que foram excluídos da regra produtores com área próxima a 40 hectares, de médio porte.
O principal ponto de receio do setor é a redução do limite de enquadramento dos produtores, para R$ 270 mil por ano.
Guilherme Rios, assessor técnico da Comissão Nacional de Política Agrícola da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
O corte no limite veio na contramão do pedido dos representantes do setor para o Plano Safra 2024/25. A CNA pleiteava o aumento da faixa para cerca de R$ 400 mil por ano, enquanto a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) pedia ajuste para R$ 500 mil.
As entidades argumentam que o aumento do custo de produção e o maior número de produtores buscando ferramentas de gestão de risco, com fenômenos climáticos adversos mais frequentes, exigem a atualização dos valores.
A Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar) avalia que agricultores familiares com áreas abaixo de 10 hectares e renda acima de R$ 270 mil por ano não são enquadrados no Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) e, portanto, não serão contemplados com políticas públicas de mitigação de risco.
“Mesmo com a perspectiva de sobra de recursos ao seguro rural, hoje nem todos produtores pronafianos (do Pronaf) têm acesso ao PSR”, observa o economista do Sistema Ocepar, Salatiel Turra. Ele lembra que o PSR segue regras do mercado privado de seguros e parte das seguradoras não atende o público cortado do Proagro.
Outra preocupação do setor é o fato de o seguro rural tradicional não cobrir culturas menores como olerícolas e hortifruti – o que preocupa, por exemplo, produtores de Santa Catarina.
No Paraná, 86 mil produtores, o equivalente a 30% do total, acessam o Proagro. “Consideramos preocupante o governo divulgar novas regras antes de escutar as propostas do setor para a safra. Quem possui cobertura de mitigação de risco está menos vulnerável economicamente e com maior autonomia”, acrescentou.
Ministério da Agricultura refuta críticas
O Ministério da Agricultura refuta o argumento de que parte dos produtores ficará desatendida. Isso porque a ideia da pasta é remanejar recursos do Proagro para o PSR, que é mais amplo e sem limite de receita. A realocação, contudo, ainda está em fase de discussão técnica com o Ministério da Fazenda.
A expectativa da Agricultura é direcionar pelo menos R$ 2 bilhões que serão economizados no Proagro para o PSR no Plano Safra 2024/25, alcançando cerca de R$ 3 bilhões no orçamento do seguro rural.
“Não vamos precarizar o seguro rural aos produtores em hipótese nenhuma. As faixas de produtores da agricultura familiar que ultrapassem o limite do Proagro virão para o seguro rural e estarão cobertas da mesma forma. É ampliar o seguro rural sem precarizar o Proagro”, afirmou o ministro Carlos Fávaro, em entrevista recente.
Já as entidades do setor lembram que não há garantia de que realmente haverá realocação de todo montante para o Proagro e lembram que o orçamento do PSR pode sofrer cortes a qualquer momento pelo Executivo, diferentemente do Proagro, cuja despesa é obrigatória e não pode ser contingenciada.
“Aqueles que não estiverem mais enquadrados no Proagro e atuarem com grandes culturas, como soja e milho, terão que depender e concorrer com os recursos apertados do PSR. No ano passado, o número de produtores que acessaram o PSR caiu pela metade, justamente pela falta de recurso”, apontou Rios, lembrando que o orçamento do seguro rural de 2024 é de R$ 964 milhões, enquanto a demanda mensurada pelo setor é de R$ 3 bilhões.
“Se esse público não for atendido e tiver problemas na safra, o custo ao governo com renegociação de dívidas e ajuda aos produtores pode ser superior à economia prevista”, projetou.
Outro ponto que acendeu alerta no setor produtivo foi a redução do teto para pagamento da Garantia de Renda Mínima em operações do Proagro Mais – de R$ 40 mil por ano para culturas permanentes e de R$ 22 mil para demais culturas, para R$ 9 mil por ano por cultura agrícola.
A CNA afirma que o mecanismo é utilizado, sobretudo, por beneficiários do Pronaf no Nordeste e que visava à manutenção da renda da família rural ao longo do ano, em casos de perda de safra. “Famílias que possuem somente uma cultura receberão R$ 750 por mês e, portanto, ficarão desamparadas”, alega Rios.