As condições do acordo de leniência entre a J&F e o Ministério Público Federal (MPF) significam, na prática, uma redução do valor real pela metade. Com aplicações seguras em títulos do Tesouro Nacional, a companhia consegue não apenas cobrir toda a correção da multa – que foi indexada apenas pela variação do IPCA –, como ter ganhos financeiros com juros.
Cálculo feito pela equipe de analistas da gestores de recursos Quantitas mostra que, com R$ 5,158 bilhões aplicados em NTN-B – título pós-fixado do Tesouro que garante uma taxa de remuneração mais a variação do IPCA –, o grupo consegue garantir os fluxos de pagamento da dívida nos próximos 25 anos, prazo acertado com o MPF. Ou seja, na prática, o acordo de R$ 10,3 bilhões representa um comprometimento de caixa de pouco mais de R$ 5 bilhões, ou metade do valor negociado com os procuradores.
“Se o tesoureiro da J&F quiser se proteger, basta comprar NTN-B”, diz Wagner Salaverry, analista da Quantitas. A conta realizada pela gestora considera as condições finais do acordo, cujo fluxo de pagamento da multa começa com cinco parcelas semestrais de R$ 50 milhões cada, sendo a primeira em dezembro. A partir de 2020, o pagamento da dívida passa a se dar em prestações anuais, num total de mais 22 parcelas, com amortização do principal de 456,82 milhões a cada ano. O cálculo leva em conta os juros reais oferecidos pelo papel com vencimento em 2040, na última sexta-feira: 5,68%. A correção pela NTN-B considera a expectativa atual do mercado financeiro para a inflação, bem como embute um prêmio de risco.
A definição do IPCA como indexador da multa tem sido alvo de questionamentos no mercado por permitir, junto com o prazo alongado, a redução brutal, a valor presente, dos R$ 10,3 bilhões cobrados. Na prática, a J&F não precisa reservar hoje do caixa todo esse montante para pagar a punição, o que seria diferente se o indexador escolhido fosse a Selic, a exemplo do acordo de leniência fechado com a Odebrecht.