‘Não há nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros cobrados hoje’, diz presidente da CNI


Robson Braga de Andrade critica o custo do dinheiro e pede uma outra visão do Banco Central sobre a economia brasileira

Por Beatriz Bulla
Atualização:
Foto: Tiago Queiroz/Estadão
Entrevista comRobson Braga de AndradePresidente da CNI

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, criticou o nível dos juros no País, em entrevista ao Estadão. “Não há no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje.” Ele diz também que, apesar de positivo, o pacote do governo para o setor automotivo terá efeito pequeno. “O que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Além disso, vemos que a população está bastante estrangulada (financeiramente)”, diz.

O dirigente também avalia que o desacerto entre Planalto e Câmara, no início deste ano, gerou derrotas para o governo porque, nos primeiros cinco meses de mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não puxou para si a articulação com os parlamentares. “Agora, a partir deste final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados e isso acaba indo por um bom caminho”, afirma Andrade.

Robson Andrade, presidente da CNI, defende a aprovação da reforma tributária Foto: José Cruz/Agência Brasil
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A articulação de Lula, diz ele, será “fundamental” para que a reforma tributária caminhe na Câmara. Otimista com a perspectiva de aprovação da reforma, Andrade diz que tem visto entre os deputados “um sentimento” favorável à aprovação e defende que o governo trabalhe para aprová-la até o fim de julho na Câmara.

Ele propõe ainda que o governo se empenhe em aprovar com celeridade o acordo comercial entre Mercosul-União Europeia, em vez de insistir em ampliar possibilidades de exceção para compras governamentais (um ponto que poderia beneficiar a indústria). “O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página”, defende Andrade.

Em artigo publicado no Estadão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin, que é também ministro da Indústria, defenderam uma neoindustrialização, como fio condutor de crescimento econômico. A leitura feita pelo presidente e pelo vice-presidente sobre os problemas e soluções para a indústria está correta, na visão do setor?

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O mais positivo de tudo é que pela primeira vez nos últimos anos, talvez décadas, você vê o vice-presidente e o presidente falarem da retomada da indústria, neoindustrialização. O nome pouco importa, o que importa é a vontade de fazer a indústria ter uma importância grande no Brasil. A direção está correta, a de que muita coisa tem que ser feita nessa parte de crédito, do financiamento para investimentos, as exportações. Tem muito conteúdo naquele artigo que foi publicado mostrando que a indústria é que é capaz de fazer o Brasil crescer num patamar adequado, de dar competitividade ao país perante o mundo. Quando se fala de crédito, é importantíssimo. Principalmente para as pequenas e médias empresas, o crédito é fundamental. Quando falamos do financiamento de exportações, é fundamental também inclusive para as grandes empresas. O Brasil precisa ter uma linha de crédito para financiamento e também as garantias que são dadas (para obter crédito). Um fundo garantidor para exportação é fundamental. Nós ficamos animados quando as duas principais autoridades têm um alinhamento de fazer com que a indústria volte a ter importância significativa no desenvolvimento do Brasil.

O sr. fala de crédito. Na semana passada, a presidente do Conselho de Administração do Magazine Luiza, Luiza Trajano, disse que “vai ter muita gente quebrada” e cobrou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pela redução da taxa de juros. À frente da CNI, o sr. tem recebido muitas demandas dos industriais com reclamações sobre o atual patamar da taxa de juros?

Todos os setores no Brasil veem essa taxa de juros extremamente elevada. Não existe no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje. Você chega a pagar entre 20% e 30% ao ano, a depender do tamanho da empresa. O Copom tem uma visão de redução da inflação, mas existem mecanismos para conter isso. O mundo inteiro está vendo que existe um processo de desaceleração da inflação e também de desaceleração da elevação das taxas de juros. Em alguns países, se aposta na sucessiva redução dessas taxas. O Brasil precisa fazer isso. O Banco Central tem de olhar outros fatores da economia brasileira. Concordo com a Luiza Trajano. Quando o varejo fala que muitas empresas vão quebrar, é prejudicial para a indústria também, porque o varejo é o nosso mercado.

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No Dia da Indústria, o governo oficializou o lançamento de um pacote para o setor automotivo. Qual avaliação o sr. faz sobre o impacto do pacote?

Positivo sempre é, mas o impacto acho que será muito pequeno, porque o que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Montadoras precisam que o financiamento tenha taxas de juros atrativas para o consumidor. Além disso, vemos que a população está, em todos os setores, bastante estrangulada com relação aos recursos financeiros. Você vê o consumo diminuindo não só na indústria automobilística, mas inclusive na indústria de alimentos. Isso está acontecendo de maneira geral, porque o Brasil precisa de crédito de médio prazo com taxas de juros condizentes com a remuneração dos trabalhadores, senão não vamos ter demanda pelos produtos industriais e também pelos serviços. A prioridade passa a ser alimentação, e mesmo alguns setores têm tido dificuldade com seus produtos. A reforma tributária é fundamental, porque hoje o custo para qualquer empresa é extremamente elevado.

O sr. está otimista com a perspectiva de aprovação de uma reforma tributária?

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Estamos otimistas. O relatório lido pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) ficou muito bom, está sendo muito bem avaliado. Existem críticas que vêm de pessoas que não leram, não analisaram o impacto que pode ter na atividade econômica do país, mesmo para as regiões do Norte e Nordeste, que têm mais consumo do que produção. E a redução da burocracia, desse emaranhado que nós temos, vai realmente melhorar bastante. Estou otimista, porque vejo um movimento na Câmara que é um sentimento de que os deputados estão compreendendo bastante a necessidade de aprovação de uma reforma tributária, e o governo está empenhado nisso também. O que o governo melhor pode fazer neste momento é trabalhar junto com a Câmara para aprovar essa reforma até o fim de julho.

Nem todos os setores estão tão satisfeitos quanto o industrial. Ainda há resistências.

A indústria brasileira representa quase 23% do PIB, mas paga 34% dos impostos federais. O setor da agropecuária - e aí estou falando de grãos e pecuária, e não da agroindústria - paga muito pouco, quase nada, e vai continuar praticamente dessa forma. O setor de serviços paga menos também. O que está sendo colocado é que determinados setores como educação, saúde não terão elevação da carga tributária. E grande parte das empresas de serviços está no simples, e também não terá impacto. O primeiro grande objetivo da reforma é a simplificação e segurança jurídica. Hoje, quase tudo acaba indo para o Judiciário, e acaba indo para o Supremo. Isso leva anos e anos, muitas vezes décadas, deixa insegurança para quem tem imposto a pagar, e a Receita, por sua vez, também não recebe. Vai reduzir enormemente a questão da sonegação, porque à medida que você simplifica, simplifica também para quem fiscaliza. O setor de serviços e o setor agropecuário não serão impactados por uma elevação que vá desestruturar o setor. As pessoas que estão fazendo esses comentários não estão olhando, por exemplo, quanto vão passar a ter de crédito. Isso tem de ser considerado.

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A articulação do Executivo com o Congresso tem se mostrado difícil neste início de governo e ameaçado pautas caras ao Planalto. O quanto isso ainda é um problema em Brasília atualmente?

Realmente, para algumas pautas importantes para o governo e para a economia, os próprios projetos que o governo tem colocado, esse desacerto entre governo e Câmara é ruim. Nesses primeiros cinco meses, faltou um pouco da articulação do próprio presidente da República, que faz isso com maestria, de entrar nessa discussão. Agora, a partir desse final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados, e isso acaba indo por um bom caminho. Temos na Câmara uma liderança bastante forte do presidente Arthur Lira (PP-AL) e isso é bom, porque precisamos de lideranças expressivas. Na democracia, os temas têm de ser discutidos, e isso é bom. O presidente entrando nessa articulação vai fortalecer as pautas importantes para o governo e que são importantes para todos nós: ajuste fiscal, reforma tributária. Agora, quando a gente coloca questões como a do Carf, a questão relativa a pagamento de impostos sobre bens no exterior, elas devem ser bem discutidas e analisadas. Temos muitas vezes posições muito próximas às do governo e outras contrárias. Isso faz parte das negociações. Tudo vai cair na reforma tributária, que vai resolver muitos dos problemas que temos hoje. A participação do presidente Lula nessa articulação é fundamental para que essas pautas caminhem na Câmara.

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O sr. falou do papel do presidente. Como tem sido a articulação do setor industrial com o vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin?

Temos tido diversos encontros. Ele tem muitas qualidades, depois de quatro mandatos no maior Estado do país, que é um Estado industrializado. Ele está muito consciente da necessidade de apoio para a neoindustrialização, que é o termo de que ele mais gosta, sabendo que nós precisamos de crédito, que nós precisamos ter um Plano Safra para a indústria, financiamento para exportações, acordos internacionais. Ele está atento e atuante, levando em todos os pronunciamentos essas ideias e propostas e é muito respeitado na Câmara.

O acordo Mercosul-União Europeia ainda está emperrado, e o governo Lula aproveita o fato de europeus terem reaberto discussões neste ano para tentar emplacar mais exceções para as chamadas compras governamentais. A questão da preferência nacional para compras públicas, defendida por Lula, em tese beneficiaria a indústria nacional, mas isso também pode atrasar mais o acordo. Qual deve ser a prioridade do governo?

Eu falei nesta semana com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que espero ver esse acordo concluído ainda neste ano. Vai colocar em um outro patamar todos os setores da economia brasileira. Nós temos a possibilidade de, com esse acordo, ter acesso a um mercado de mais de 700 milhões de pessoas. Isso é fundamental para nós. O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página. Precisamos urgentemente desse acordo. A questão das compras governamentais, que envolve principalmente a micro e pequena empresa, tem formas de desenvolvermos no Brasil sem interferência com o que está no acordo Mercosul-UE. Precisamos avançar no acordo, é fundamental para a economia toda do País. Não temos mais tempo para ficar discutindo e gastar mais anos e anos. Temos de aproveitar o momento em que a Europa está mais favorável.

Fora do País há expectativa de que o atual governo brasileiro olhe para a questão climática como uma prioridade. A indústria brasileira está preparada para entrar na jornada de descarbonização e para aproveitar oportunidades nessa área?

A questão climática não é mais uma opção (para as empresas considerarem), é uma obrigação. O mercado que consideramos no Brasil, de Europa, Estados Unidos e Canadá, exige que tenhamos ações concretas com relação à descarbonização e ao meio ambiente. Não só para exportar, mas começa a ser também uma exigência no Brasil o comprometimento com as questões ambientais. Mercado de carbono pode ser para nós um grande ativo nas negociações internacionais. Também na transição energética, o Brasil é dos que têm energia mais limpa do mundo e temos um potencial enorme de energia verde, principalmente no Nordeste. Teremos um mercado enorme na Europa.

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, criticou o nível dos juros no País, em entrevista ao Estadão. “Não há no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje.” Ele diz também que, apesar de positivo, o pacote do governo para o setor automotivo terá efeito pequeno. “O que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Além disso, vemos que a população está bastante estrangulada (financeiramente)”, diz.

O dirigente também avalia que o desacerto entre Planalto e Câmara, no início deste ano, gerou derrotas para o governo porque, nos primeiros cinco meses de mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não puxou para si a articulação com os parlamentares. “Agora, a partir deste final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados e isso acaba indo por um bom caminho”, afirma Andrade.

Robson Andrade, presidente da CNI, defende a aprovação da reforma tributária Foto: José Cruz/Agência Brasil

A articulação de Lula, diz ele, será “fundamental” para que a reforma tributária caminhe na Câmara. Otimista com a perspectiva de aprovação da reforma, Andrade diz que tem visto entre os deputados “um sentimento” favorável à aprovação e defende que o governo trabalhe para aprová-la até o fim de julho na Câmara.

Ele propõe ainda que o governo se empenhe em aprovar com celeridade o acordo comercial entre Mercosul-União Europeia, em vez de insistir em ampliar possibilidades de exceção para compras governamentais (um ponto que poderia beneficiar a indústria). “O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página”, defende Andrade.

Em artigo publicado no Estadão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin, que é também ministro da Indústria, defenderam uma neoindustrialização, como fio condutor de crescimento econômico. A leitura feita pelo presidente e pelo vice-presidente sobre os problemas e soluções para a indústria está correta, na visão do setor?

O mais positivo de tudo é que pela primeira vez nos últimos anos, talvez décadas, você vê o vice-presidente e o presidente falarem da retomada da indústria, neoindustrialização. O nome pouco importa, o que importa é a vontade de fazer a indústria ter uma importância grande no Brasil. A direção está correta, a de que muita coisa tem que ser feita nessa parte de crédito, do financiamento para investimentos, as exportações. Tem muito conteúdo naquele artigo que foi publicado mostrando que a indústria é que é capaz de fazer o Brasil crescer num patamar adequado, de dar competitividade ao país perante o mundo. Quando se fala de crédito, é importantíssimo. Principalmente para as pequenas e médias empresas, o crédito é fundamental. Quando falamos do financiamento de exportações, é fundamental também inclusive para as grandes empresas. O Brasil precisa ter uma linha de crédito para financiamento e também as garantias que são dadas (para obter crédito). Um fundo garantidor para exportação é fundamental. Nós ficamos animados quando as duas principais autoridades têm um alinhamento de fazer com que a indústria volte a ter importância significativa no desenvolvimento do Brasil.

O sr. fala de crédito. Na semana passada, a presidente do Conselho de Administração do Magazine Luiza, Luiza Trajano, disse que “vai ter muita gente quebrada” e cobrou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pela redução da taxa de juros. À frente da CNI, o sr. tem recebido muitas demandas dos industriais com reclamações sobre o atual patamar da taxa de juros?

Todos os setores no Brasil veem essa taxa de juros extremamente elevada. Não existe no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje. Você chega a pagar entre 20% e 30% ao ano, a depender do tamanho da empresa. O Copom tem uma visão de redução da inflação, mas existem mecanismos para conter isso. O mundo inteiro está vendo que existe um processo de desaceleração da inflação e também de desaceleração da elevação das taxas de juros. Em alguns países, se aposta na sucessiva redução dessas taxas. O Brasil precisa fazer isso. O Banco Central tem de olhar outros fatores da economia brasileira. Concordo com a Luiza Trajano. Quando o varejo fala que muitas empresas vão quebrar, é prejudicial para a indústria também, porque o varejo é o nosso mercado.

No Dia da Indústria, o governo oficializou o lançamento de um pacote para o setor automotivo. Qual avaliação o sr. faz sobre o impacto do pacote?

Positivo sempre é, mas o impacto acho que será muito pequeno, porque o que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Montadoras precisam que o financiamento tenha taxas de juros atrativas para o consumidor. Além disso, vemos que a população está, em todos os setores, bastante estrangulada com relação aos recursos financeiros. Você vê o consumo diminuindo não só na indústria automobilística, mas inclusive na indústria de alimentos. Isso está acontecendo de maneira geral, porque o Brasil precisa de crédito de médio prazo com taxas de juros condizentes com a remuneração dos trabalhadores, senão não vamos ter demanda pelos produtos industriais e também pelos serviços. A prioridade passa a ser alimentação, e mesmo alguns setores têm tido dificuldade com seus produtos. A reforma tributária é fundamental, porque hoje o custo para qualquer empresa é extremamente elevado.

O sr. está otimista com a perspectiva de aprovação de uma reforma tributária?

Estamos otimistas. O relatório lido pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) ficou muito bom, está sendo muito bem avaliado. Existem críticas que vêm de pessoas que não leram, não analisaram o impacto que pode ter na atividade econômica do país, mesmo para as regiões do Norte e Nordeste, que têm mais consumo do que produção. E a redução da burocracia, desse emaranhado que nós temos, vai realmente melhorar bastante. Estou otimista, porque vejo um movimento na Câmara que é um sentimento de que os deputados estão compreendendo bastante a necessidade de aprovação de uma reforma tributária, e o governo está empenhado nisso também. O que o governo melhor pode fazer neste momento é trabalhar junto com a Câmara para aprovar essa reforma até o fim de julho.

Nem todos os setores estão tão satisfeitos quanto o industrial. Ainda há resistências.

A indústria brasileira representa quase 23% do PIB, mas paga 34% dos impostos federais. O setor da agropecuária - e aí estou falando de grãos e pecuária, e não da agroindústria - paga muito pouco, quase nada, e vai continuar praticamente dessa forma. O setor de serviços paga menos também. O que está sendo colocado é que determinados setores como educação, saúde não terão elevação da carga tributária. E grande parte das empresas de serviços está no simples, e também não terá impacto. O primeiro grande objetivo da reforma é a simplificação e segurança jurídica. Hoje, quase tudo acaba indo para o Judiciário, e acaba indo para o Supremo. Isso leva anos e anos, muitas vezes décadas, deixa insegurança para quem tem imposto a pagar, e a Receita, por sua vez, também não recebe. Vai reduzir enormemente a questão da sonegação, porque à medida que você simplifica, simplifica também para quem fiscaliza. O setor de serviços e o setor agropecuário não serão impactados por uma elevação que vá desestruturar o setor. As pessoas que estão fazendo esses comentários não estão olhando, por exemplo, quanto vão passar a ter de crédito. Isso tem de ser considerado.

A articulação do Executivo com o Congresso tem se mostrado difícil neste início de governo e ameaçado pautas caras ao Planalto. O quanto isso ainda é um problema em Brasília atualmente?

Realmente, para algumas pautas importantes para o governo e para a economia, os próprios projetos que o governo tem colocado, esse desacerto entre governo e Câmara é ruim. Nesses primeiros cinco meses, faltou um pouco da articulação do próprio presidente da República, que faz isso com maestria, de entrar nessa discussão. Agora, a partir desse final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados, e isso acaba indo por um bom caminho. Temos na Câmara uma liderança bastante forte do presidente Arthur Lira (PP-AL) e isso é bom, porque precisamos de lideranças expressivas. Na democracia, os temas têm de ser discutidos, e isso é bom. O presidente entrando nessa articulação vai fortalecer as pautas importantes para o governo e que são importantes para todos nós: ajuste fiscal, reforma tributária. Agora, quando a gente coloca questões como a do Carf, a questão relativa a pagamento de impostos sobre bens no exterior, elas devem ser bem discutidas e analisadas. Temos muitas vezes posições muito próximas às do governo e outras contrárias. Isso faz parte das negociações. Tudo vai cair na reforma tributária, que vai resolver muitos dos problemas que temos hoje. A participação do presidente Lula nessa articulação é fundamental para que essas pautas caminhem na Câmara.

O sr. falou do papel do presidente. Como tem sido a articulação do setor industrial com o vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin?

Temos tido diversos encontros. Ele tem muitas qualidades, depois de quatro mandatos no maior Estado do país, que é um Estado industrializado. Ele está muito consciente da necessidade de apoio para a neoindustrialização, que é o termo de que ele mais gosta, sabendo que nós precisamos de crédito, que nós precisamos ter um Plano Safra para a indústria, financiamento para exportações, acordos internacionais. Ele está atento e atuante, levando em todos os pronunciamentos essas ideias e propostas e é muito respeitado na Câmara.

O acordo Mercosul-União Europeia ainda está emperrado, e o governo Lula aproveita o fato de europeus terem reaberto discussões neste ano para tentar emplacar mais exceções para as chamadas compras governamentais. A questão da preferência nacional para compras públicas, defendida por Lula, em tese beneficiaria a indústria nacional, mas isso também pode atrasar mais o acordo. Qual deve ser a prioridade do governo?

Eu falei nesta semana com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que espero ver esse acordo concluído ainda neste ano. Vai colocar em um outro patamar todos os setores da economia brasileira. Nós temos a possibilidade de, com esse acordo, ter acesso a um mercado de mais de 700 milhões de pessoas. Isso é fundamental para nós. O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página. Precisamos urgentemente desse acordo. A questão das compras governamentais, que envolve principalmente a micro e pequena empresa, tem formas de desenvolvermos no Brasil sem interferência com o que está no acordo Mercosul-UE. Precisamos avançar no acordo, é fundamental para a economia toda do País. Não temos mais tempo para ficar discutindo e gastar mais anos e anos. Temos de aproveitar o momento em que a Europa está mais favorável.

Fora do País há expectativa de que o atual governo brasileiro olhe para a questão climática como uma prioridade. A indústria brasileira está preparada para entrar na jornada de descarbonização e para aproveitar oportunidades nessa área?

A questão climática não é mais uma opção (para as empresas considerarem), é uma obrigação. O mercado que consideramos no Brasil, de Europa, Estados Unidos e Canadá, exige que tenhamos ações concretas com relação à descarbonização e ao meio ambiente. Não só para exportar, mas começa a ser também uma exigência no Brasil o comprometimento com as questões ambientais. Mercado de carbono pode ser para nós um grande ativo nas negociações internacionais. Também na transição energética, o Brasil é dos que têm energia mais limpa do mundo e temos um potencial enorme de energia verde, principalmente no Nordeste. Teremos um mercado enorme na Europa.

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, criticou o nível dos juros no País, em entrevista ao Estadão. “Não há no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje.” Ele diz também que, apesar de positivo, o pacote do governo para o setor automotivo terá efeito pequeno. “O que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Além disso, vemos que a população está bastante estrangulada (financeiramente)”, diz.

O dirigente também avalia que o desacerto entre Planalto e Câmara, no início deste ano, gerou derrotas para o governo porque, nos primeiros cinco meses de mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não puxou para si a articulação com os parlamentares. “Agora, a partir deste final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados e isso acaba indo por um bom caminho”, afirma Andrade.

Robson Andrade, presidente da CNI, defende a aprovação da reforma tributária Foto: José Cruz/Agência Brasil

A articulação de Lula, diz ele, será “fundamental” para que a reforma tributária caminhe na Câmara. Otimista com a perspectiva de aprovação da reforma, Andrade diz que tem visto entre os deputados “um sentimento” favorável à aprovação e defende que o governo trabalhe para aprová-la até o fim de julho na Câmara.

Ele propõe ainda que o governo se empenhe em aprovar com celeridade o acordo comercial entre Mercosul-União Europeia, em vez de insistir em ampliar possibilidades de exceção para compras governamentais (um ponto que poderia beneficiar a indústria). “O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página”, defende Andrade.

Em artigo publicado no Estadão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin, que é também ministro da Indústria, defenderam uma neoindustrialização, como fio condutor de crescimento econômico. A leitura feita pelo presidente e pelo vice-presidente sobre os problemas e soluções para a indústria está correta, na visão do setor?

O mais positivo de tudo é que pela primeira vez nos últimos anos, talvez décadas, você vê o vice-presidente e o presidente falarem da retomada da indústria, neoindustrialização. O nome pouco importa, o que importa é a vontade de fazer a indústria ter uma importância grande no Brasil. A direção está correta, a de que muita coisa tem que ser feita nessa parte de crédito, do financiamento para investimentos, as exportações. Tem muito conteúdo naquele artigo que foi publicado mostrando que a indústria é que é capaz de fazer o Brasil crescer num patamar adequado, de dar competitividade ao país perante o mundo. Quando se fala de crédito, é importantíssimo. Principalmente para as pequenas e médias empresas, o crédito é fundamental. Quando falamos do financiamento de exportações, é fundamental também inclusive para as grandes empresas. O Brasil precisa ter uma linha de crédito para financiamento e também as garantias que são dadas (para obter crédito). Um fundo garantidor para exportação é fundamental. Nós ficamos animados quando as duas principais autoridades têm um alinhamento de fazer com que a indústria volte a ter importância significativa no desenvolvimento do Brasil.

O sr. fala de crédito. Na semana passada, a presidente do Conselho de Administração do Magazine Luiza, Luiza Trajano, disse que “vai ter muita gente quebrada” e cobrou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pela redução da taxa de juros. À frente da CNI, o sr. tem recebido muitas demandas dos industriais com reclamações sobre o atual patamar da taxa de juros?

Todos os setores no Brasil veem essa taxa de juros extremamente elevada. Não existe no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje. Você chega a pagar entre 20% e 30% ao ano, a depender do tamanho da empresa. O Copom tem uma visão de redução da inflação, mas existem mecanismos para conter isso. O mundo inteiro está vendo que existe um processo de desaceleração da inflação e também de desaceleração da elevação das taxas de juros. Em alguns países, se aposta na sucessiva redução dessas taxas. O Brasil precisa fazer isso. O Banco Central tem de olhar outros fatores da economia brasileira. Concordo com a Luiza Trajano. Quando o varejo fala que muitas empresas vão quebrar, é prejudicial para a indústria também, porque o varejo é o nosso mercado.

No Dia da Indústria, o governo oficializou o lançamento de um pacote para o setor automotivo. Qual avaliação o sr. faz sobre o impacto do pacote?

Positivo sempre é, mas o impacto acho que será muito pequeno, porque o que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Montadoras precisam que o financiamento tenha taxas de juros atrativas para o consumidor. Além disso, vemos que a população está, em todos os setores, bastante estrangulada com relação aos recursos financeiros. Você vê o consumo diminuindo não só na indústria automobilística, mas inclusive na indústria de alimentos. Isso está acontecendo de maneira geral, porque o Brasil precisa de crédito de médio prazo com taxas de juros condizentes com a remuneração dos trabalhadores, senão não vamos ter demanda pelos produtos industriais e também pelos serviços. A prioridade passa a ser alimentação, e mesmo alguns setores têm tido dificuldade com seus produtos. A reforma tributária é fundamental, porque hoje o custo para qualquer empresa é extremamente elevado.

O sr. está otimista com a perspectiva de aprovação de uma reforma tributária?

Estamos otimistas. O relatório lido pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) ficou muito bom, está sendo muito bem avaliado. Existem críticas que vêm de pessoas que não leram, não analisaram o impacto que pode ter na atividade econômica do país, mesmo para as regiões do Norte e Nordeste, que têm mais consumo do que produção. E a redução da burocracia, desse emaranhado que nós temos, vai realmente melhorar bastante. Estou otimista, porque vejo um movimento na Câmara que é um sentimento de que os deputados estão compreendendo bastante a necessidade de aprovação de uma reforma tributária, e o governo está empenhado nisso também. O que o governo melhor pode fazer neste momento é trabalhar junto com a Câmara para aprovar essa reforma até o fim de julho.

Nem todos os setores estão tão satisfeitos quanto o industrial. Ainda há resistências.

A indústria brasileira representa quase 23% do PIB, mas paga 34% dos impostos federais. O setor da agropecuária - e aí estou falando de grãos e pecuária, e não da agroindústria - paga muito pouco, quase nada, e vai continuar praticamente dessa forma. O setor de serviços paga menos também. O que está sendo colocado é que determinados setores como educação, saúde não terão elevação da carga tributária. E grande parte das empresas de serviços está no simples, e também não terá impacto. O primeiro grande objetivo da reforma é a simplificação e segurança jurídica. Hoje, quase tudo acaba indo para o Judiciário, e acaba indo para o Supremo. Isso leva anos e anos, muitas vezes décadas, deixa insegurança para quem tem imposto a pagar, e a Receita, por sua vez, também não recebe. Vai reduzir enormemente a questão da sonegação, porque à medida que você simplifica, simplifica também para quem fiscaliza. O setor de serviços e o setor agropecuário não serão impactados por uma elevação que vá desestruturar o setor. As pessoas que estão fazendo esses comentários não estão olhando, por exemplo, quanto vão passar a ter de crédito. Isso tem de ser considerado.

A articulação do Executivo com o Congresso tem se mostrado difícil neste início de governo e ameaçado pautas caras ao Planalto. O quanto isso ainda é um problema em Brasília atualmente?

Realmente, para algumas pautas importantes para o governo e para a economia, os próprios projetos que o governo tem colocado, esse desacerto entre governo e Câmara é ruim. Nesses primeiros cinco meses, faltou um pouco da articulação do próprio presidente da República, que faz isso com maestria, de entrar nessa discussão. Agora, a partir desse final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados, e isso acaba indo por um bom caminho. Temos na Câmara uma liderança bastante forte do presidente Arthur Lira (PP-AL) e isso é bom, porque precisamos de lideranças expressivas. Na democracia, os temas têm de ser discutidos, e isso é bom. O presidente entrando nessa articulação vai fortalecer as pautas importantes para o governo e que são importantes para todos nós: ajuste fiscal, reforma tributária. Agora, quando a gente coloca questões como a do Carf, a questão relativa a pagamento de impostos sobre bens no exterior, elas devem ser bem discutidas e analisadas. Temos muitas vezes posições muito próximas às do governo e outras contrárias. Isso faz parte das negociações. Tudo vai cair na reforma tributária, que vai resolver muitos dos problemas que temos hoje. A participação do presidente Lula nessa articulação é fundamental para que essas pautas caminhem na Câmara.

O sr. falou do papel do presidente. Como tem sido a articulação do setor industrial com o vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin?

Temos tido diversos encontros. Ele tem muitas qualidades, depois de quatro mandatos no maior Estado do país, que é um Estado industrializado. Ele está muito consciente da necessidade de apoio para a neoindustrialização, que é o termo de que ele mais gosta, sabendo que nós precisamos de crédito, que nós precisamos ter um Plano Safra para a indústria, financiamento para exportações, acordos internacionais. Ele está atento e atuante, levando em todos os pronunciamentos essas ideias e propostas e é muito respeitado na Câmara.

O acordo Mercosul-União Europeia ainda está emperrado, e o governo Lula aproveita o fato de europeus terem reaberto discussões neste ano para tentar emplacar mais exceções para as chamadas compras governamentais. A questão da preferência nacional para compras públicas, defendida por Lula, em tese beneficiaria a indústria nacional, mas isso também pode atrasar mais o acordo. Qual deve ser a prioridade do governo?

Eu falei nesta semana com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que espero ver esse acordo concluído ainda neste ano. Vai colocar em um outro patamar todos os setores da economia brasileira. Nós temos a possibilidade de, com esse acordo, ter acesso a um mercado de mais de 700 milhões de pessoas. Isso é fundamental para nós. O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página. Precisamos urgentemente desse acordo. A questão das compras governamentais, que envolve principalmente a micro e pequena empresa, tem formas de desenvolvermos no Brasil sem interferência com o que está no acordo Mercosul-UE. Precisamos avançar no acordo, é fundamental para a economia toda do País. Não temos mais tempo para ficar discutindo e gastar mais anos e anos. Temos de aproveitar o momento em que a Europa está mais favorável.

Fora do País há expectativa de que o atual governo brasileiro olhe para a questão climática como uma prioridade. A indústria brasileira está preparada para entrar na jornada de descarbonização e para aproveitar oportunidades nessa área?

A questão climática não é mais uma opção (para as empresas considerarem), é uma obrigação. O mercado que consideramos no Brasil, de Europa, Estados Unidos e Canadá, exige que tenhamos ações concretas com relação à descarbonização e ao meio ambiente. Não só para exportar, mas começa a ser também uma exigência no Brasil o comprometimento com as questões ambientais. Mercado de carbono pode ser para nós um grande ativo nas negociações internacionais. Também na transição energética, o Brasil é dos que têm energia mais limpa do mundo e temos um potencial enorme de energia verde, principalmente no Nordeste. Teremos um mercado enorme na Europa.

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, criticou o nível dos juros no País, em entrevista ao Estadão. “Não há no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje.” Ele diz também que, apesar de positivo, o pacote do governo para o setor automotivo terá efeito pequeno. “O que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Além disso, vemos que a população está bastante estrangulada (financeiramente)”, diz.

O dirigente também avalia que o desacerto entre Planalto e Câmara, no início deste ano, gerou derrotas para o governo porque, nos primeiros cinco meses de mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não puxou para si a articulação com os parlamentares. “Agora, a partir deste final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados e isso acaba indo por um bom caminho”, afirma Andrade.

Robson Andrade, presidente da CNI, defende a aprovação da reforma tributária Foto: José Cruz/Agência Brasil

A articulação de Lula, diz ele, será “fundamental” para que a reforma tributária caminhe na Câmara. Otimista com a perspectiva de aprovação da reforma, Andrade diz que tem visto entre os deputados “um sentimento” favorável à aprovação e defende que o governo trabalhe para aprová-la até o fim de julho na Câmara.

Ele propõe ainda que o governo se empenhe em aprovar com celeridade o acordo comercial entre Mercosul-União Europeia, em vez de insistir em ampliar possibilidades de exceção para compras governamentais (um ponto que poderia beneficiar a indústria). “O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página”, defende Andrade.

Em artigo publicado no Estadão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin, que é também ministro da Indústria, defenderam uma neoindustrialização, como fio condutor de crescimento econômico. A leitura feita pelo presidente e pelo vice-presidente sobre os problemas e soluções para a indústria está correta, na visão do setor?

O mais positivo de tudo é que pela primeira vez nos últimos anos, talvez décadas, você vê o vice-presidente e o presidente falarem da retomada da indústria, neoindustrialização. O nome pouco importa, o que importa é a vontade de fazer a indústria ter uma importância grande no Brasil. A direção está correta, a de que muita coisa tem que ser feita nessa parte de crédito, do financiamento para investimentos, as exportações. Tem muito conteúdo naquele artigo que foi publicado mostrando que a indústria é que é capaz de fazer o Brasil crescer num patamar adequado, de dar competitividade ao país perante o mundo. Quando se fala de crédito, é importantíssimo. Principalmente para as pequenas e médias empresas, o crédito é fundamental. Quando falamos do financiamento de exportações, é fundamental também inclusive para as grandes empresas. O Brasil precisa ter uma linha de crédito para financiamento e também as garantias que são dadas (para obter crédito). Um fundo garantidor para exportação é fundamental. Nós ficamos animados quando as duas principais autoridades têm um alinhamento de fazer com que a indústria volte a ter importância significativa no desenvolvimento do Brasil.

O sr. fala de crédito. Na semana passada, a presidente do Conselho de Administração do Magazine Luiza, Luiza Trajano, disse que “vai ter muita gente quebrada” e cobrou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pela redução da taxa de juros. À frente da CNI, o sr. tem recebido muitas demandas dos industriais com reclamações sobre o atual patamar da taxa de juros?

Todos os setores no Brasil veem essa taxa de juros extremamente elevada. Não existe no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje. Você chega a pagar entre 20% e 30% ao ano, a depender do tamanho da empresa. O Copom tem uma visão de redução da inflação, mas existem mecanismos para conter isso. O mundo inteiro está vendo que existe um processo de desaceleração da inflação e também de desaceleração da elevação das taxas de juros. Em alguns países, se aposta na sucessiva redução dessas taxas. O Brasil precisa fazer isso. O Banco Central tem de olhar outros fatores da economia brasileira. Concordo com a Luiza Trajano. Quando o varejo fala que muitas empresas vão quebrar, é prejudicial para a indústria também, porque o varejo é o nosso mercado.

No Dia da Indústria, o governo oficializou o lançamento de um pacote para o setor automotivo. Qual avaliação o sr. faz sobre o impacto do pacote?

Positivo sempre é, mas o impacto acho que será muito pequeno, porque o que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Montadoras precisam que o financiamento tenha taxas de juros atrativas para o consumidor. Além disso, vemos que a população está, em todos os setores, bastante estrangulada com relação aos recursos financeiros. Você vê o consumo diminuindo não só na indústria automobilística, mas inclusive na indústria de alimentos. Isso está acontecendo de maneira geral, porque o Brasil precisa de crédito de médio prazo com taxas de juros condizentes com a remuneração dos trabalhadores, senão não vamos ter demanda pelos produtos industriais e também pelos serviços. A prioridade passa a ser alimentação, e mesmo alguns setores têm tido dificuldade com seus produtos. A reforma tributária é fundamental, porque hoje o custo para qualquer empresa é extremamente elevado.

O sr. está otimista com a perspectiva de aprovação de uma reforma tributária?

Estamos otimistas. O relatório lido pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) ficou muito bom, está sendo muito bem avaliado. Existem críticas que vêm de pessoas que não leram, não analisaram o impacto que pode ter na atividade econômica do país, mesmo para as regiões do Norte e Nordeste, que têm mais consumo do que produção. E a redução da burocracia, desse emaranhado que nós temos, vai realmente melhorar bastante. Estou otimista, porque vejo um movimento na Câmara que é um sentimento de que os deputados estão compreendendo bastante a necessidade de aprovação de uma reforma tributária, e o governo está empenhado nisso também. O que o governo melhor pode fazer neste momento é trabalhar junto com a Câmara para aprovar essa reforma até o fim de julho.

Nem todos os setores estão tão satisfeitos quanto o industrial. Ainda há resistências.

A indústria brasileira representa quase 23% do PIB, mas paga 34% dos impostos federais. O setor da agropecuária - e aí estou falando de grãos e pecuária, e não da agroindústria - paga muito pouco, quase nada, e vai continuar praticamente dessa forma. O setor de serviços paga menos também. O que está sendo colocado é que determinados setores como educação, saúde não terão elevação da carga tributária. E grande parte das empresas de serviços está no simples, e também não terá impacto. O primeiro grande objetivo da reforma é a simplificação e segurança jurídica. Hoje, quase tudo acaba indo para o Judiciário, e acaba indo para o Supremo. Isso leva anos e anos, muitas vezes décadas, deixa insegurança para quem tem imposto a pagar, e a Receita, por sua vez, também não recebe. Vai reduzir enormemente a questão da sonegação, porque à medida que você simplifica, simplifica também para quem fiscaliza. O setor de serviços e o setor agropecuário não serão impactados por uma elevação que vá desestruturar o setor. As pessoas que estão fazendo esses comentários não estão olhando, por exemplo, quanto vão passar a ter de crédito. Isso tem de ser considerado.

A articulação do Executivo com o Congresso tem se mostrado difícil neste início de governo e ameaçado pautas caras ao Planalto. O quanto isso ainda é um problema em Brasília atualmente?

Realmente, para algumas pautas importantes para o governo e para a economia, os próprios projetos que o governo tem colocado, esse desacerto entre governo e Câmara é ruim. Nesses primeiros cinco meses, faltou um pouco da articulação do próprio presidente da República, que faz isso com maestria, de entrar nessa discussão. Agora, a partir desse final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados, e isso acaba indo por um bom caminho. Temos na Câmara uma liderança bastante forte do presidente Arthur Lira (PP-AL) e isso é bom, porque precisamos de lideranças expressivas. Na democracia, os temas têm de ser discutidos, e isso é bom. O presidente entrando nessa articulação vai fortalecer as pautas importantes para o governo e que são importantes para todos nós: ajuste fiscal, reforma tributária. Agora, quando a gente coloca questões como a do Carf, a questão relativa a pagamento de impostos sobre bens no exterior, elas devem ser bem discutidas e analisadas. Temos muitas vezes posições muito próximas às do governo e outras contrárias. Isso faz parte das negociações. Tudo vai cair na reforma tributária, que vai resolver muitos dos problemas que temos hoje. A participação do presidente Lula nessa articulação é fundamental para que essas pautas caminhem na Câmara.

O sr. falou do papel do presidente. Como tem sido a articulação do setor industrial com o vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin?

Temos tido diversos encontros. Ele tem muitas qualidades, depois de quatro mandatos no maior Estado do país, que é um Estado industrializado. Ele está muito consciente da necessidade de apoio para a neoindustrialização, que é o termo de que ele mais gosta, sabendo que nós precisamos de crédito, que nós precisamos ter um Plano Safra para a indústria, financiamento para exportações, acordos internacionais. Ele está atento e atuante, levando em todos os pronunciamentos essas ideias e propostas e é muito respeitado na Câmara.

O acordo Mercosul-União Europeia ainda está emperrado, e o governo Lula aproveita o fato de europeus terem reaberto discussões neste ano para tentar emplacar mais exceções para as chamadas compras governamentais. A questão da preferência nacional para compras públicas, defendida por Lula, em tese beneficiaria a indústria nacional, mas isso também pode atrasar mais o acordo. Qual deve ser a prioridade do governo?

Eu falei nesta semana com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que espero ver esse acordo concluído ainda neste ano. Vai colocar em um outro patamar todos os setores da economia brasileira. Nós temos a possibilidade de, com esse acordo, ter acesso a um mercado de mais de 700 milhões de pessoas. Isso é fundamental para nós. O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página. Precisamos urgentemente desse acordo. A questão das compras governamentais, que envolve principalmente a micro e pequena empresa, tem formas de desenvolvermos no Brasil sem interferência com o que está no acordo Mercosul-UE. Precisamos avançar no acordo, é fundamental para a economia toda do País. Não temos mais tempo para ficar discutindo e gastar mais anos e anos. Temos de aproveitar o momento em que a Europa está mais favorável.

Fora do País há expectativa de que o atual governo brasileiro olhe para a questão climática como uma prioridade. A indústria brasileira está preparada para entrar na jornada de descarbonização e para aproveitar oportunidades nessa área?

A questão climática não é mais uma opção (para as empresas considerarem), é uma obrigação. O mercado que consideramos no Brasil, de Europa, Estados Unidos e Canadá, exige que tenhamos ações concretas com relação à descarbonização e ao meio ambiente. Não só para exportar, mas começa a ser também uma exigência no Brasil o comprometimento com as questões ambientais. Mercado de carbono pode ser para nós um grande ativo nas negociações internacionais. Também na transição energética, o Brasil é dos que têm energia mais limpa do mundo e temos um potencial enorme de energia verde, principalmente no Nordeste. Teremos um mercado enorme na Europa.

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, criticou o nível dos juros no País, em entrevista ao Estadão. “Não há no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje.” Ele diz também que, apesar de positivo, o pacote do governo para o setor automotivo terá efeito pequeno. “O que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Além disso, vemos que a população está bastante estrangulada (financeiramente)”, diz.

O dirigente também avalia que o desacerto entre Planalto e Câmara, no início deste ano, gerou derrotas para o governo porque, nos primeiros cinco meses de mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não puxou para si a articulação com os parlamentares. “Agora, a partir deste final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados e isso acaba indo por um bom caminho”, afirma Andrade.

Robson Andrade, presidente da CNI, defende a aprovação da reforma tributária Foto: José Cruz/Agência Brasil

A articulação de Lula, diz ele, será “fundamental” para que a reforma tributária caminhe na Câmara. Otimista com a perspectiva de aprovação da reforma, Andrade diz que tem visto entre os deputados “um sentimento” favorável à aprovação e defende que o governo trabalhe para aprová-la até o fim de julho na Câmara.

Ele propõe ainda que o governo se empenhe em aprovar com celeridade o acordo comercial entre Mercosul-União Europeia, em vez de insistir em ampliar possibilidades de exceção para compras governamentais (um ponto que poderia beneficiar a indústria). “O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página”, defende Andrade.

Em artigo publicado no Estadão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin, que é também ministro da Indústria, defenderam uma neoindustrialização, como fio condutor de crescimento econômico. A leitura feita pelo presidente e pelo vice-presidente sobre os problemas e soluções para a indústria está correta, na visão do setor?

O mais positivo de tudo é que pela primeira vez nos últimos anos, talvez décadas, você vê o vice-presidente e o presidente falarem da retomada da indústria, neoindustrialização. O nome pouco importa, o que importa é a vontade de fazer a indústria ter uma importância grande no Brasil. A direção está correta, a de que muita coisa tem que ser feita nessa parte de crédito, do financiamento para investimentos, as exportações. Tem muito conteúdo naquele artigo que foi publicado mostrando que a indústria é que é capaz de fazer o Brasil crescer num patamar adequado, de dar competitividade ao país perante o mundo. Quando se fala de crédito, é importantíssimo. Principalmente para as pequenas e médias empresas, o crédito é fundamental. Quando falamos do financiamento de exportações, é fundamental também inclusive para as grandes empresas. O Brasil precisa ter uma linha de crédito para financiamento e também as garantias que são dadas (para obter crédito). Um fundo garantidor para exportação é fundamental. Nós ficamos animados quando as duas principais autoridades têm um alinhamento de fazer com que a indústria volte a ter importância significativa no desenvolvimento do Brasil.

O sr. fala de crédito. Na semana passada, a presidente do Conselho de Administração do Magazine Luiza, Luiza Trajano, disse que “vai ter muita gente quebrada” e cobrou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pela redução da taxa de juros. À frente da CNI, o sr. tem recebido muitas demandas dos industriais com reclamações sobre o atual patamar da taxa de juros?

Todos os setores no Brasil veem essa taxa de juros extremamente elevada. Não existe no Brasil nenhuma atividade econômica que possa pagar os juros tão elevados como estamos vendo hoje. Você chega a pagar entre 20% e 30% ao ano, a depender do tamanho da empresa. O Copom tem uma visão de redução da inflação, mas existem mecanismos para conter isso. O mundo inteiro está vendo que existe um processo de desaceleração da inflação e também de desaceleração da elevação das taxas de juros. Em alguns países, se aposta na sucessiva redução dessas taxas. O Brasil precisa fazer isso. O Banco Central tem de olhar outros fatores da economia brasileira. Concordo com a Luiza Trajano. Quando o varejo fala que muitas empresas vão quebrar, é prejudicial para a indústria também, porque o varejo é o nosso mercado.

No Dia da Indústria, o governo oficializou o lançamento de um pacote para o setor automotivo. Qual avaliação o sr. faz sobre o impacto do pacote?

Positivo sempre é, mas o impacto acho que será muito pequeno, porque o que gera impacto no negócio de automóveis e caminhões é o crédito de prazo longo e a taxa de juros baixa. Montadoras precisam que o financiamento tenha taxas de juros atrativas para o consumidor. Além disso, vemos que a população está, em todos os setores, bastante estrangulada com relação aos recursos financeiros. Você vê o consumo diminuindo não só na indústria automobilística, mas inclusive na indústria de alimentos. Isso está acontecendo de maneira geral, porque o Brasil precisa de crédito de médio prazo com taxas de juros condizentes com a remuneração dos trabalhadores, senão não vamos ter demanda pelos produtos industriais e também pelos serviços. A prioridade passa a ser alimentação, e mesmo alguns setores têm tido dificuldade com seus produtos. A reforma tributária é fundamental, porque hoje o custo para qualquer empresa é extremamente elevado.

O sr. está otimista com a perspectiva de aprovação de uma reforma tributária?

Estamos otimistas. O relatório lido pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) ficou muito bom, está sendo muito bem avaliado. Existem críticas que vêm de pessoas que não leram, não analisaram o impacto que pode ter na atividade econômica do país, mesmo para as regiões do Norte e Nordeste, que têm mais consumo do que produção. E a redução da burocracia, desse emaranhado que nós temos, vai realmente melhorar bastante. Estou otimista, porque vejo um movimento na Câmara que é um sentimento de que os deputados estão compreendendo bastante a necessidade de aprovação de uma reforma tributária, e o governo está empenhado nisso também. O que o governo melhor pode fazer neste momento é trabalhar junto com a Câmara para aprovar essa reforma até o fim de julho.

Nem todos os setores estão tão satisfeitos quanto o industrial. Ainda há resistências.

A indústria brasileira representa quase 23% do PIB, mas paga 34% dos impostos federais. O setor da agropecuária - e aí estou falando de grãos e pecuária, e não da agroindústria - paga muito pouco, quase nada, e vai continuar praticamente dessa forma. O setor de serviços paga menos também. O que está sendo colocado é que determinados setores como educação, saúde não terão elevação da carga tributária. E grande parte das empresas de serviços está no simples, e também não terá impacto. O primeiro grande objetivo da reforma é a simplificação e segurança jurídica. Hoje, quase tudo acaba indo para o Judiciário, e acaba indo para o Supremo. Isso leva anos e anos, muitas vezes décadas, deixa insegurança para quem tem imposto a pagar, e a Receita, por sua vez, também não recebe. Vai reduzir enormemente a questão da sonegação, porque à medida que você simplifica, simplifica também para quem fiscaliza. O setor de serviços e o setor agropecuário não serão impactados por uma elevação que vá desestruturar o setor. As pessoas que estão fazendo esses comentários não estão olhando, por exemplo, quanto vão passar a ter de crédito. Isso tem de ser considerado.

A articulação do Executivo com o Congresso tem se mostrado difícil neste início de governo e ameaçado pautas caras ao Planalto. O quanto isso ainda é um problema em Brasília atualmente?

Realmente, para algumas pautas importantes para o governo e para a economia, os próprios projetos que o governo tem colocado, esse desacerto entre governo e Câmara é ruim. Nesses primeiros cinco meses, faltou um pouco da articulação do próprio presidente da República, que faz isso com maestria, de entrar nessa discussão. Agora, a partir desse final de maio e início de junho, o presidente tomou consciência de que precisa participar mais dessas negociações com a Câmara dos Deputados, e isso acaba indo por um bom caminho. Temos na Câmara uma liderança bastante forte do presidente Arthur Lira (PP-AL) e isso é bom, porque precisamos de lideranças expressivas. Na democracia, os temas têm de ser discutidos, e isso é bom. O presidente entrando nessa articulação vai fortalecer as pautas importantes para o governo e que são importantes para todos nós: ajuste fiscal, reforma tributária. Agora, quando a gente coloca questões como a do Carf, a questão relativa a pagamento de impostos sobre bens no exterior, elas devem ser bem discutidas e analisadas. Temos muitas vezes posições muito próximas às do governo e outras contrárias. Isso faz parte das negociações. Tudo vai cair na reforma tributária, que vai resolver muitos dos problemas que temos hoje. A participação do presidente Lula nessa articulação é fundamental para que essas pautas caminhem na Câmara.

O sr. falou do papel do presidente. Como tem sido a articulação do setor industrial com o vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin?

Temos tido diversos encontros. Ele tem muitas qualidades, depois de quatro mandatos no maior Estado do país, que é um Estado industrializado. Ele está muito consciente da necessidade de apoio para a neoindustrialização, que é o termo de que ele mais gosta, sabendo que nós precisamos de crédito, que nós precisamos ter um Plano Safra para a indústria, financiamento para exportações, acordos internacionais. Ele está atento e atuante, levando em todos os pronunciamentos essas ideias e propostas e é muito respeitado na Câmara.

O acordo Mercosul-União Europeia ainda está emperrado, e o governo Lula aproveita o fato de europeus terem reaberto discussões neste ano para tentar emplacar mais exceções para as chamadas compras governamentais. A questão da preferência nacional para compras públicas, defendida por Lula, em tese beneficiaria a indústria nacional, mas isso também pode atrasar mais o acordo. Qual deve ser a prioridade do governo?

Eu falei nesta semana com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que espero ver esse acordo concluído ainda neste ano. Vai colocar em um outro patamar todos os setores da economia brasileira. Nós temos a possibilidade de, com esse acordo, ter acesso a um mercado de mais de 700 milhões de pessoas. Isso é fundamental para nós. O acordo já foi discutido por muitos e muitos anos, é o momento de virarmos essa página. Precisamos urgentemente desse acordo. A questão das compras governamentais, que envolve principalmente a micro e pequena empresa, tem formas de desenvolvermos no Brasil sem interferência com o que está no acordo Mercosul-UE. Precisamos avançar no acordo, é fundamental para a economia toda do País. Não temos mais tempo para ficar discutindo e gastar mais anos e anos. Temos de aproveitar o momento em que a Europa está mais favorável.

Fora do País há expectativa de que o atual governo brasileiro olhe para a questão climática como uma prioridade. A indústria brasileira está preparada para entrar na jornada de descarbonização e para aproveitar oportunidades nessa área?

A questão climática não é mais uma opção (para as empresas considerarem), é uma obrigação. O mercado que consideramos no Brasil, de Europa, Estados Unidos e Canadá, exige que tenhamos ações concretas com relação à descarbonização e ao meio ambiente. Não só para exportar, mas começa a ser também uma exigência no Brasil o comprometimento com as questões ambientais. Mercado de carbono pode ser para nós um grande ativo nas negociações internacionais. Também na transição energética, o Brasil é dos que têm energia mais limpa do mundo e temos um potencial enorme de energia verde, principalmente no Nordeste. Teremos um mercado enorme na Europa.

Entrevista por Beatriz Bulla

Repórter que cobre o poder -- economia, política e internacional. Trabalha hoje em São Paulo. Já passou por Brasília e foi correspondente em Washington (EUA). Formada em jornalismo e em direito, foi também pesquisadora visitante na Universidade Columbia, em Nova York.

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