Quatro anos atrás, o BTG Pactual decidiu abandonar os planos ambiciosos que havia traçado para a rede de farmácias BR Pharma, que estava mergulhada em dívidas. Agora, uma das marcas do grupo, a Farmais, ganha vida nova. A empresa, que chegou a ter 450 unidades, foi arrematada em um leilão judicial por R$ 3,6 milhões por um grupo de 34 franqueados, que fala em retomar a trajetória de crescimento. Como próximo passo nessa estratégia, o grupo acaba de colocar na mesa um novo plano que mira multiplicar o atual faturamento, de olho em uma futura abertura de capital.
O grupo é formado, essencialmente, por antigos franqueados da marca. Eles começaram a se organizar em 2018, com os sinais de dificuldades financeiras da BR Pharma. “A gente sentia o problema da BR Pharma. Eles pararam totalmente de dar assistência ao franqueado e, por isso, começamos a nos organizar”, conta o novo presidente e sócio da Farmais, Ricardo Uemura Kunimi.
O executivo, dono de três lojas da Farmais no interior de São Paulo há 23 anos, faz parte de um grupo menor, de seis franqueados, que são majoritários na sociedade. O leilão da Farmais ocorreu no fim de 2019, mas o processo para liberar o uso da marca para os novos donos durou mais de 18 meses.
As metas para o futuro da rede são ambiciosas: até o fim deste ano, a empresa quer adicionar 50 lojas às 187 unidades atuais. Em 2024, a ideia é ter 500 pontos de venda em funcionamento. Em três anos, a meta é que o faturamento anual passe dos atuais R$ 720 milhões para mais de R$ 2 bilhões. O plano é, até lá, investir até R$ 150 milhões – para isso, a companhia já busca investidores externos. Ao fim desse período, a empresa também pretende partir para um IPO (oferta inicial de ações, na sigla em inglês).
A ideia da Farmais é “converter” as farmácias independentes – há cerca de 75 mil delas no Brasil. Para Américo José, sócio-diretor da Cherto, consultoria contratada para estruturar o processo de retorno da rede, uma bandeira reconhecida ajudaria esses pequenos negócios a brigar com as gigantes do setor, como a Raia Drogasil.
“A ideia é ajudar a farmácia a se transformar num ponto de saúde, e não só num ponto comercial”, diz José. Isso ficou evidente na pandemia, quando farmácias se tornaram pontos de vacinação e também de testagem para a covid-19.
Perto de abrir um novo escritório na avenida Paulista, em São Paulo, os novos donos querem brigar por uma fatia do segmento de saúde e bem-estar com as gigantes do ramo, que movimenta R$ 60 bilhões por ano, segundo a Associação Brasileira das Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma).
O presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo, Eduardo Terra, afirma que as “franquias por conversão” têm sido a estratégia de algumas marcas, como a Ultrafarma, para crescer. A tática tem funcionado como uma via intermediária entre as farmácias independentes e as grandes redes. “É uma forma de as farmácias que eram independentes passarem a ter escala de mídia, além de acesso a ferramentas de gestão e treinamento para ganhar competitividade”, afirma o especialista. É um modelo que, segundo Terra, costuma funcionar bem fora dos grandes centros urbanos.
Além da RD, dona das marcas Raia e Drogasil, figuram entre as gigantes desse setor a drogaria DPSP (união das redes Pacheco e São Paulo), a Pague Menos (que abriu capital ano passado e comprou neste ano a rede Extrafarma) e a Panvel, empresa gaúcha que também se capitalizou com uma oferta na Bolsa.
Histórico
Depois de a BR Pharma tentar, sem sucesso, ser a grande consolidadora de um mercado bastante pulverizado, o negócio acabou diante de um forte endividamento, resultado de uma série de aquisições.
A companhia, criada em 2009 pelo banco de André Esteves, partiu para compras de marcas regionais. Em 2010, por exemplo, levou três fortes redes no Nordeste. Em 2011, abriu capital na Bolsa brasileira em uma operação que girou mais de R$ 460 milhões. Naquele ano, o grupo tinha 288 lojas próprias e 430 franquias, conseguindo em pouquíssimo tempo estar entre as primeiras colocações no ranking do setor no País.
Pouco tempo depois, porém, a empresa começou a registrar prejuízos e a queimar caixa para manter as lojas abertas. Em 2015, o negócio começou a se esfacelar: duas marcas foram vendidas pelo BTG. Em 2017, o banco vendeu toda a rede por um valor simbólico de R$ 1 mil. O novo dono não conseguiu levantar a companhia, e o pedido de recuperação judicial veio dois anos depois, em 2019, mesmo ano em que sua falência foi decretada. Além da Farmais, ainda faziam parte da BR Pharma as marcas Sant’Ana, Mais Econômica e a distribuidora Big Ben.