O cenário competitivo no setor bancário está bastante definido, na avaliação do presidente do C6 Bank, Marcelo Kalim. “A competição está mais ou menos dada, e é bastante grande”, diz. “A grande verdade é que, no Brasil, os consumidores estão bem servidos de serviços bancários.” A avaliação do banco é que hoje não existe uma distinção entre as instituições tradicionais, com um legado de atendimento via canais físicos, e as 100% digitais surgidas nos últimos anos. Para o cliente, todos são bancos, e o desafio é o mesmo: fidelizar o consumidor.
“No fundo, o cliente olha para o celular e é absolutamente irrelevante, para ele, se o banco é classificado como digital ou incumbente”, diz Kalim. “O importante é o que está por trás, a estrutura de custos. E é aí que achamos que ganhamos essa maratona no longo prazo.”
Com a alta dos juros no Brasil e no mundo, os últimos dois anos marcaram o fim da primeira era dos bancos digitais e fintechs. O dinheiro barato para financiar modelos de negócio deficitários rareou, e muitos agentes deixaram o mercado ou passaram por um ajuste significativo. O maior dos bancos digitais, o Nubank, mudou alavancas de negócio para atingir a rentabilidade, consolidada ao longo do ano passado e deste.
O C6 acaba de chegar a este grupo. Em novembro, teve o primeiro lucro mensal da história, de cerca de R$ 15 milhões, após quase dois anos de concessão de crédito mais conservadora e de mudanças na estrutura interna para controlar os custos. O banco, que tem o JPMorgan Chase como acionista, com 46% do capital, espera que este resultado se mantenha e cresça. A chave para isso é o terceiro pilar do modelo de negócio: o aumento de receita.
Para que essa curva continue apontando para cima, o C6 busca uma maior fidelidade dos clientes, o que passa por segmentá-los de forma mais específica. Voltado à alta renda desde sua criação, em 2019, o banco fez uma divisão mais clara dos clientes por patamares de renda e investimentos neste ano, e passou a oferecer atendimento humano aos estratos mais altos. Um dos objetivos é apresentar aos clientes os mais de 90 produtos que a instituição oferece, para evitar que os usuários procurem por eles na concorrência.
“É o nosso esforço de todo dia, de como aumentar o engajamento com o cliente. Essa é uma batalha diária, mas que não só nós temos”, disse Kalim. “O Bradesco tem, o Banco do Brasil tem, o Itaú tem.”
Carteira de crédito
Ao longo de 2022, o banco fez um ajuste considerável na concessão de crédito diante do aumento da inadimplência entre pessoas físicas, segmento que foi o motor de seu crescimento. O fenômeno não afetou apenas ao C6, mas obrigou o banco a mexer em suas alavancas.
Kalim disse que, durante a pandemia, houve uma queda considerável nas provisões associadas ao crédito a pessoas físicas, que exibiu uma qualidade inesperada pelos bancos. “Isso fez com que muitos players aumentassem o apetite para crédito. Esse número (das provisões) começou a voltar de uma forma muito forte já no final de 2021, mas principalmente no começo de 2022, e ainda não parou.”
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Essa revisão fez com que o banco desacelerasse, mas não com que deixasse de crescer. A carteira de crédito do C6 deve encerrar o ano com saldo de mais de R$ 45 bilhões, um crescimento de R$ 16 bilhões ao longo de 2023. A inadimplência, que fechou 2022 em 5,3%, considerados os atrasos acima de 90 dias, deve chegar a 3,5% no final de dezembro. Em junho, havia caído para 4,3%. O banco tem mais de 25 milhões de clientes.
O resultado do quarto trimestre, que considera os meses de outubro, novembro e dezembro, ainda deve ser negativo por causa do prejuízo de outubro. Em dezembro, porém, o C6 também espera ter lucro. Segundo Kalim, a expectativa é chegar ao primeiro lucro trimestral no primeiro trimestre do ano que vem.
Rotativo do cartão
Em relação às discussões sobre o cartão de crédito, a avaliação do C6 Bank é que as taxas de juros de linhas associadas ao cartão podem ser mais baixas. Segundo Kalim, um modelo de negócios ancorado em taxas altas não é saudável, e é possível baixar os juros do rotativo sem mudar o parcelado sem juros. Cerca de 22% da carteira de crédito do banco, que deve fechar o ano acima de R$ 45 bilhões, está em cartões.
Kalim não entrou na polêmica formada no setor financeiro sobre o parcelado sem juros, mas afirmou que é possível manter o parcelado e baixar os juros do rotativo. “A questão é de adequar a carteira. Para nós, é possível”, disse.
O parcelado e sua relação com os juros do crédito rotativo são um grande ponto de discórdia. Grandes bancos, representados pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), argumentam que o parcelado sem juros é o responsável pelas taxas altas, que seriam um subsídio cruzado ao parcelamento de compras sem juros. Fintechs e credenciadoras independentes rejeitam essa tese.
O setor financeiro tem debatido os juros do rotativo desde o começo deste ano, e corre para apresentar, nas próximas semanas, uma proposta de autorregulação para o produto que evite a entrada em vigor do dispositivo da lei do Desenrola que estabelece um teto de 100% do valor da dívida original para a modalidade, que hoje tem juros acima de 400% em dados anualizados. Agentes do setor bancário admitem que essa proposta deve incluir os juros de 100%, mas buscam um consenso para tornar mais claras as condições de aplicação do teto.
O CEO do C6 disse que cobrar juros altos em uma modalidade de crédito gera um modelo de negócio pouco saudável. Segundo ele, é preferível manter taxas mais baixas, o que tem um efeito positivo sobre a inadimplência.
“Eu não acredito em um negócio com uma taxa tão grande. Acho que um negócio mais saudável é com taxas menores, em que se tenha uma inadimplência menor como um todo”, afirmou. “Em todos os negócios buscamos isso, e no cartão de crédito não é diferente.” O banco não revela quantos cartões emitiu.