Única empresa a apresentar proposta para ser a acionista de referência na privatização da Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp), a Equatorial se consolidou nos últimos 25 anos no setor de energia elétrica, sendo atualmente dona de 7 distribuidoras, 3 mil quilômetros (km) de linhas de transmissão e negócios na área de energias renováveis. Estreou na área de saneamento há dois anos, ao arrematar a concessão da CSA, do Amapá, por R$ 930 milhões.
A entrada da Equatorial no capital da Sabesp, como acionista de referência (pendente da conclusão do processo de privatização da estatal paulista), representa um salto gigantesco na atuação da empresa nessa área. A proposta do grupo foi de R$ 67 por ação por 15% de participação na estatal paulista (sua participação não poderá ultrapassar esse patamar). A companhia desembolsará R$ 6,869 bilhões na operação, cuja segunda etapa, com a venda de ações para outros investidores, está sendo concluída nesta quinta-feira, 18.
Como acionista de referência, a Equatorial terá direito a indicar o presidente e os diretores da Sabesp, além de ficar com três assentos no conselho de administração - o governo paulista indica outros três nomes e outros três serão independentes. Procurado para falar sobre o negócio, o grupo preferiu não se pronunciar.
Atualmente, a Equatorial é o terceiro maior grupo de distribuição de energia do País em número de clientes (atende mais de 10 milhões de consumidores). Em 2023, faturou cerca de R$ 40 bilhões e registrou lucro consolidado de R$ 2,8 bilhões. A empresa não tem um controlador definido, com capital bastante pulverizado. Seus principais acionistas são os fundos Opportunity (6,3%), Atmos (5,7%) e Capital World Investors (5,2%).
No setor de saneamento a empresa detém hoje apenas uma concessão, a da CSA. A concessionária atende a uma população de mais de 800 mil habitantes em 16 cidades do Amapá. Isso significa cerca de 3% do mercado de consumidores atendidos pela Sabesp.
A pouca experiência em saneamento, no entanto, não é vista como um problema para especialistas. A leitura inicial do mercado é de que a operação pode ser positiva tanto para a Equatorial quanto para a Sabesp. Analistas consideram as duas companhias complementares, pois a primeira é conhecida por sua capacidade de gestão, enquanto a empresa de saneamento já tem uma operação consolidada no setor.
“A Sabesp já tem uma engenharia de saneamento extremamente qualificada. Por isso, o acionista de referência não precisa ser um operador tradicional, com conhecimento aprofundado. Isto não é um problema”, afirma Percy Soares Neto, consultor e ex-diretor executivo da Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon).
Para ele, a Equatorial deve atuar em três principais frentes: gestão, governança e capital, aspectos que podem ajudar no processo de universalização. A capacidade de gestão da companhia é vista como o grande trunfo para conseguir cumprir as metas até 2029.
Os analistas do Safra, Daniel Travitzky, Carolina Carneiro e Mario Wobeto, contam que a Equatorial é uma operadora sólida e com experiência em casos de turnaround (reestruturação). Com isso, estaria qualificada para implementar medidas de eficiência também no segmento de saneamento, assim como tem feito na área de energia.
O primeiro caso de sucesso em recuperar concessões de distribuição de energia em dificuldade foi o da Cemar, distribuidora maranhense que passava por forte crise financeira. Anos depois veio a paraense Celpa, que estava em recuperação judicial. O portfólio de distribuição cresceu com a privatização de distribuidoras federalizadas administradas pelo grupo Eletrobras, em 2018, arrematando a Cepisa, do Piauí, e a Ceal, de Alagoas.
No ano passado, a Equatorial Pará (ex-Celpa) ficou em segundo lugar no ranking da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) das distribuidoras com melhor indicador de fornecimento, entre as empresas de grande porte. Já a Equatorial Maranhão foi uma das que mais evoluíram, subindo seis posições. A despeito de dificuldades ainda enfrentadas em algumas operações e pelas críticas ao atendimento, especialmente nas concessionárias mais novas, como a CEEE-D, do Rio Grande do Sul, e a Equatorial Goiás, a empresa ainda é reconhecida no mercado pela qualidade da gestão operacional.
Em um movimento de diversificação, a companhia ingressou, em 2016, no segmento de transmissão de energia, quando arrematou sete lotes. Atualmente conta com oito concessionárias que, juntas, operam cerca de 3 mil quilômetros de linhas (uma foi vendida recentemente). Em 2022, também fortaleceu sua atuação na geração de energia renovável por meio da compra da empresa Echoenergia, pela qual pagou valor semelhante ao destinado à participação da Sabesp (cerca de R$ 7 bilhões).
Venda de ativos
Para fazer frente aos compromissos da Sabesp, a Equatorial já começou a se movimentar antes mesmo do fim do processo de privatização. A empresa colocou ativos de transmissão à venda, como estratégia para fortalecer sua estrutura de capital para diversificar suas operações em saneamento, a partir da Sabesp. Os termos da privatização da estatal paulista preveem investimentos de R$ 70 bilhões até 2029 para universalização de serviços de água e esgoto.
Na semana passada, a empresa anunciou a venda dos primeiros ativos, a Equatorial SPE 7. A companhia firmou contrato com a Infraestrutura e Energia, para venda da SPE7, com um enterprise value (o valor da empresa) de até R$ 1,2 bilhão, segundo fato relevante.
“A operação não representa a saída do grupo Equatorial do segmento de transmissão, mas tão somente permite avançar na aceleração da sua trajetória de desalavancagem (redução de endividamento), adequando sua estrutura de capital a eventuais oportunidades nas avenidas de geração de valor em que atua”, afirmou a empresa.
O movimento não é inédito para a Equatorial. No ano passado, a companhia fechou a venda de 100% da Integração Transmissora de Energia S/A (Intesa), para a Infraestrutura e Energia Brasil S/A, numa operação envolvendo R$ 714 milhões, incluindo dívida.
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Analistas não descartam que a empresa teste o mercado para outros ativos, em especial no segmento de geração, no qual a Equatorial tem 12 parques eólicos em operação, com 1,2 gigawatt (GW) de capacidade, além de uma usina solar de 283 MWp também operacional e um parque em fase adiantada de construção.
Oficialmente, a empresa afirma, em documento de non deal roadshow (reuniões com investidores) divulgado na semana passada, que tem financiamento ponte garantido com prazo de 18 meses e que tem “diversas alternativas a serem exploradas para a contratação do financiamento de longo prazo para a aquisição” da Sabesp.
A empresa anunciou nesta semana uma oferta para captar R$ 5,6 bilhões em títulos (notas comerciais) com duas emissões de debêntures, por meio de suas subsidiárias em Goiás e no Pará, que somam R$ 2 bilhões.
A estrutura é semelhante à utilizada pela Iguá e pela Aegea para financiar a concessão dos serviços da Companhia Estadual de Águas e Esgoto do Rio de Janeiro (Cedae), que passou em 2021 para a iniciativa privada, disseram fontes.
Estimativas iniciais feitas pela equipe de análise do Safra indicam que a operação da Sabesp resultará em um aumento da alavancagem para 4 vezes dívida líquida/Ebitda, acima das 3,3 vezes reportadas no primeiro trimestre deste ano. A empresa tem compromissos financeiros (covenants) que limitam o indicador a 4,5 vezes. / Colaboraram Altamiro Silva Junior e Wilian Miron