As grandes empresas do mundo estão se preocupando mais com as mudanças climáticas e aumentaram o número de ações voltadas à sustentabilidade nos últimos dois anos, apontou um levantamento realizado pela Capgemini com executivos. Contudo, também é comum entre eles o medo de passar uma percepção errada aos consumidores, de que estariam cometendo greenwashing e as ações não seriam sinceras — o estudo aponta que esse temor tem razão de existir.
A pesquisa A World In Balance 2024 (a palavra balance, em inglês, serve tanto para balanço financeiro quanto para equilíbrio, portanto o título poderia ser lido como ”Um mundo em equilíbrio 2024″) ouviu 2.152 executivos empregados em 727 organizações, cada uma com mais de US$ 1 bilhão em receita anual, de 13 países: Austrália, Canadá, França, Alemanha, Índia, Itália, Japão, Países Baixos, Noruega, Espanha, Suécia, Reino Unido e Estados Unidos. Embora os executivos brasileiros não tenham sido ouvidos, a avaliação é de que o mercado brasileiro tem características parecidas, como a exigência do consumidor em relação às empresas.
De acordo com a pesquisa, houve um aumento de 22 pontos percentuais na adoção de práticas e iniciativas sustentáveis pelas organizações de 2022 a 2024 — de 100 pontos base em 2022 para 112 em 2023 e 122 em 2024, nos três anos em que a pesquisa foi realizada. Austrália, Espanha e Suécia são destaques positivos, enquanto Alemanha e Índia tiveram resultados ruins. Entre os setores pesquisados, o varejo e a indústria de serviços de saúde foram as que mais avançaram, enquanto os de serviços públicos (fornecimento de água ou energia, por exemplo) e aeroespacial ficaram para trás.
No total, 84% dos executivos disseram acreditar que suas organizações estão no caminho certo para cumprir as metas de reduções de emissões de gases que causam o efeito estufa, e menos de dez por cento afirmaram que há atraso. Entre outros números, 75% implementaram um programa de gestão de água, acima dos 55% em 2022; 72% afirmaram que a reciclagem é um aspecto central da produção, um crescimento de 19 pontos porcentuais em dois anos, e 69% estão redesenhando produtos para remover matérias-primas de combustíveis fósseis, acima dos 47% em 2022.
A avaliação é de que as mudanças respondem a dois fatores principais: a pressão dos consumidores e as novas leis e regulamentações, sempre mais exigentes. “É um avanço gradativo, que acompanha a quantidade dos executivos preocupados com a imagem das empresas. É importante ter ações que possam ser rastreáveis e demonstrem políticas relativas ao meio ambiente”, afirma Emanuel Queiroz, vice-presidente de Sustentabilidade na Capgemini Brasil.
Conforme o levantamento, 69% dos executivos dizem que antecipar regulamentações futuras mais rigorosas é um fator-chave para as iniciativas de sustentabilidade, contra 57% em 2023. No entanto, 66% dos entrevistados admitem que não tomariam medidas sustentáveis se não fossem obrigados, seja pela pressão popular ou pela regulamentação.
As ações visando tornar as companhias sustentáveis precisam ser auditáveis e demonstradas em relatórios disponibilizados aos investidores e ao público, e também é necessário gerar mais dinheiro. “Invariavelmente, as medidas precisam trazer resultado financeiro, se não trouxer, as empresas deixarão de fazê-lo”, cita Queiroz. Ele vê que os resultados financeiros foram os principais motores para buscar mais eficiência em processos e evitar desperdícios de água e outros recursos, assim como para buscar novas tecnologias (e biotecnologias).
A tecnologia é vista como fundamental: dois terços dos executivos concordam que suas organizações nunca serão capazes de atingir suas metas de sustentabilidade sem tecnologia climática, o que pode ser desde novas biotecnologias a outras que já estão sendo desenvolvidas, como o hidrogênio verde e biocombustíveis para a transição energética.Também pode significar a volta de outras antigas, agora mais seguras e com custos menores, como a energia nuclear.
Limites
Um dado negativo captado pela pesquisa é que em 2023, os executivos planejavam aumentar os investimentos em sustentabilidade, o que não se concretizou. O investimento médio anual em iniciativas e práticas de sustentabilidade representou 0,82% da receita total em 2024, abaixo dos 0,92% em 2023.
Para Queiroz, a explicação é um cenário geopolítico mais complicado. “As empresas ficaram mais avessas ao risco e a aumentos de custos. A incerteza geopolítica leva empresas a mudar a estratégia relativa à biodiversidade e à comunicação com consumidores e fornecedores”, explica. Segundo o líder da Capgemini Brasil, o que não trouxesse retorno financeiro imediato ficaria para trás. Outro ponto é que a pesquisa aponta ainda existir um grande espaço para crescimento da preocupação ambiental, apesar dos avanços em relação aos dois anos anteriores.
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Mensurar e reduzir as emissões de gases que causam o aquecimento global ainda é desafiador. As emissões de escopos 1 e 2, da ação direta da própria companhia e da energia que ela utiliza, já são largamente medidas, mas as de escopo 3, que contabiliza as de toda a cadeia de fornecimento, ainda não são totalmente avaliadas. Pouco mais de um terço das organizações pode calcular completamente as emissões do escopo 3, enquanto 86% já estão preparadas para o escopo 1.
É importante lembrar que os executivos ouvidos na pesquisa são de grandes empresas, que têm muito mais condições de fazer esse inventário do que as médias e pequenas, e ainda assim encontram dificuldades.
Percepção do público
O temor de que as medidas sejam vistas como “insinceras” cresceu muito entre os executivos: saltou de 11% em 2023 para 62% em 2024. E o medo precisa existir: de acordo com o levantamento, 52% dos consumidores acreditam que as companhias realizam greenwashing das suas medidas, ante 33% em 2023. A desconfiança é ainda maior entre os mais jovens, das gerações millennial (67%) e Z (76%).
A comunicação é vista como importante, assim como a divulgação de relatórios de sustentabilidade auditados e críveis, o que é cada vez mais exigido pelo mercado e por agentes reguladores em diversos países. Mas o mais importante é sempre a reação dos consumidores, que pode determinar o sucesso de uma estratégia comercial. " A diferença da estratégia é a aceitação do público. Empresas que investem em sustentabilidade têm retorno maior”, garante Queiroz, mencionando estudos anteriores da própria Capgemini.