O cenário macroeconômico desafiador e os juros altos, hoje em 13,75% ao ano, atrapalharam os resultados das empresas listadas na Bolsa de Valores do Brasil. Levantamento feito pela plataforma independente do mercado financeiro Trademap mostra que as companhias com papéis negociados na B3 registraram queda média de 18% no lucro do primeiro trimestre de 2023, em comparação a igual período do ano passado.
O estudo analisou o desempenho de 296 companhias com ações negociadas na Bolsa, excluindo apenas empresas do setor bancário e nomes como Petrobras, Vale, Braskem, Suzano, Azul e JBS. O responsável pela pesquisa, Einar Rivero, diretor comercial do TradeMap, explica que empresas com comportamento muito fora da curva em comparação ao restante são retiradas da base de análise, o que ajuda a manter os resultados mais fidedignos em relação à realidade.
Para especialistas do mercado financeiro, os resultados do levantamento do Trademap confirmam as projeções já pessimistas de analistas em relação ao desempenho das empresas, que têm sofrido para manter a capitalização em um período de crédito caro - situação agravada pelos pedidos de recuperação judicial de nomes como Americanas, Marisa e Light.
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O levantamento levou em consideração dados dos balanços financeiros das companhias listadas em Bolsa para os três primeiros meses do ano. Conforme rege a normativa da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), as empresas têm até 45 dias após o fim do período fiscal para divulgar os resultados, prazo que se encerrou na última segunda-feira, 15.
Na avaliação de Rivero, os dados analisados apontam que o lucro das companhias do mercado de capitais acabou sendo fortemente impactado principalmente pelos juros altos no País. Vale ressaltar que nas últimas semanas, o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, manteve a taxa Selic, em 13,75%, pela sexta vez consecutiva.
O mapeamento de resultados do Trademap separou as companhias em 37 setores, dos quais somente 13 tiveram aumento de lucratividade. Os resultados positivos foram registrados por setores como bebidas, exploração de imóveis e agropecuária. “Os juros altos continuam sendo um grande vilão que as empresas estão amargando em seus resultados”, diz Rivero.
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Em linhas gerais, o grupo de empresas analisadas teve aumento de 12,8% nas vendas para o primeiro trimestre do ano, em comparação com 2022, ao mesmo tempo que o custo de operação dos negócios também subiu 12,7% no período analisado. As despesas financeiras, decorrentes de empréstimos e financiamentos, cresceram R$ 16,5 bilhões, aumento de 31,8%.
Isso ajudou a reduzir o lucro das companhias para R$ 33 bilhões no período - R$ 7,8 bilhões a menos que em igual período de 2022. A dívida bruta das companhias cresceu 37,1% em comparação a 2022, para R$ 1,3 trilhão.
Sem previsão de melhora
Werner Roger, sócio e fundador da Trígono Capital, vê que a união de fatores como o patamar mais alto da Selic, queda no consumo, freada nos investimentos por parte das empresas mais as incertezas políticas do País colaboraram para desenhar o resultado de queda no faturamento médio das companhias. “Nós já estávamos vendo uma desaceleração forte no quarto trimestre. Agora no primeiro ‘tri’, essa situação só ficou mais evidente”, aponta.
Werner explica que empresas que conseguiram apresentar resultado positivo na lucratividade no primeiro período fiscal do ano são de setores com menos sensibilidade aos fatores macroeconômicos domésticos, como companhias ligadas ao saneamento, ou que trabalham diretamente com exportação, como no caso de commodities e a indústria de veículos pesados.
Com uma opinião bastante pessimista sobre os próximos trimestres, o fundador da Trígono Capital acredita que um desempenho positivo só deva ser visto nos balanços das companhias diante de uma possível queda da taxa básica de juros, que por ora, não tem previsão para ocorrer. “A situação ainda é muito nebulosa, não temos uma ‘luzinha’ no fim do túnel”, diz.
Assim como o fundador da Trígono Capital, Jennie Li, estrategista de ações da XP, classificou os resultados dos primeiros balanços contábeis das empresas como um reflexo do cenário doméstico desafiador, puxados pela inflação que vem desacelerando e a manutenção da taxa de juros a 13,75%. “O custo de capital continua sendo muito alto para essas companhias em meio ao cenário macro que tem problemas em relação ao consumo”, pontua.
Jannie acrescenta ainda que, fora a situação da economia brasileira, a queda na lucratividade das companhias foi afetada, em partes, pelo desempenho também abaixo do esperado para a economia mundial que apresentou sinais de uma recessão global, pautados por casos como a crise nos Estados Unidos e pela expectativa de que o preço das commodities pudessem subir com a retomada econômica da China, o que não se concretizou.
Sobre o cenário futuro, a analista vê uma demora em relação a possibilidade de melhora na lucratividade das companhias listadas em Bolsa, uma vez que mesmo com futuras reduções na Selic, a taxa básica de juros não deve deixar o patamar de dois dígito antes de 2025, segundo sua análise.