A temperatura nas negociações para reestruturar o passivo da InterCement aumentou diante da ausência de um consenso entre a Mover, que controla a companhia, a CSN e os bancos credores em torno de um plano que minimamente seja palatável a todos. Como resultado, a cimenteira ajuizou nesta noite de terça-feira, 3, pedido de recuperação judicial na 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca da Capital do Estado de São Paulo.
As dívidas a serem reestruturadas somam R$ 14,2 bilhões, incluindo os passivos da controladora, a Mover. A InterCement Brasil confirmou por meio de fato relevante o pedido, feito em conjunto com suas controladoras indiretas, InterCement Participações (ICP) e Mover Participações, e outras sociedades do grupo econômico. A informação foi antecipada pelo Estadão/Broadcast.
No comunicado, o grupo diz ainda que sob a coordenação e a liderança de sua controladora indireta ICP e seus assessores financeiros e legais, a companhia e outras sociedades do seu grupo econômico vêm empreendendo esforços na busca da reestruturação e equacionamento de suas obrigações financeiras. Mas que, para prosseguir nas negociações de equacionamento das dívidas e readequação da estrutura de capital da companhia e das demais sociedades de seu grupo econômico, foi necessário o ajuizamento do pedido de recuperação judicial.
A companhia informou também que o acordo de exclusividade para a venda de ações representativas de 100% do capital social da ICP não se encontra mais vigente. A CSN, em comunicado na manhã desta quarta-feira, 4, que em razão da ação da InterCement ficou automaticamente encerrado o período de negociação exclusiva para aquisição da cimenteira e que não está mais engajada nesse processo.
Na nota, a InterCement reforçou que “mantém e reafirma a confiança em sua solidez operacional, sendo certo que a recuperação judicial auxiliará na construção de uma solução definitiva para o estabelecimento do seu equilíbrio econômico-financeiro”. A empresa é a terceira maior fabricante de cimento no País, com participação na casa de 13% a 14% das vendas. Opera um portfólio de 15 fábricas, sendo que cinco se encontram hibernadas. Na Argentina, com 52% do capital, é controladora da Loma Negra, líder no país.
A cimenteira havia entrado com um pedido de recuperação extrajudicial em setembro, cujo prazo para conclusão do plano final e adesão de 50% mais um dos credores terminaria no dia 16 de dezembro.
Diante de idas e vindas nas conversas e que se arrastam havia mais de um ano e um acordo de exclusividade com a CSN renovado diversas vezes desde 1° de maio, a recuperação judicial ficou premente. Na sexta-feira, 29, a saída de Ronnie Vaz Moreira da presidência do conselho de administração da InterCement Participações, que tem a InterCement Brasil e a argentina Loma Negra entre suas empresas, já sinalizava esse desfecho.
Moreira chegou à InterCement em maio do ano passado, por meio da Houlihan Lockey, contratada pelo grupo como assessor financeiro na reestruturação da companhia, e seu contrato previa que deixaria a companhia caso a solução fosse a recuperação judicial.
O impasse na negociação
Segundo Eduardo Munhoz, do escritório Munhoz Advogados, assessor jurídico da companhia, além da falta de acordo entre a CSN e os credores, pesaram as divergências nas tratativas com Mover, controladora da cimenteira, sobre as garantias para contingências diversas, de mais de R$ 8 bilhões no final do ano passado. A Mover se comprometeu a arcar com R$ 2,75 bilhões e entregaria ações correspondentes a quase 5% do capital da CCR, da qual é uma das acionistas controladoras. ACSN queria bem mais que isso, disse uma fonte próxima dos controladores da cimenteira.
De acordo com o advogado, agora começa tudo do zero. “Nos próximos 180 dias o foco deixa de ser a venda da empresa na forma como vinha sendo feito até agora. A InterCement vai se concentrar na reestruturação financeira, negociando com seus credores e podendo fazer potenciais vendas de alguns ativos”.
Um caminho será a venda em separado da controlada argentina Loma Negra, da qual detém 52%. Poderão ser exploradas várias alternativas. “Até agora, o foco era a venda para a CSN. Isso deixou de existir”, afirmou o advogado.
Munhoz disse que a ação de proteção dará garantia mais efetiva à InterCement contra seus credores para uma dívida financeira na casa dos R$ 10 bilhões, incluindo as debêntures com Bradesco, Itaú e Banco do Brasil e os títulos estrangeiros com bondholders, que estão, ambos, vencidos desde maio e julho.
Qual é o impacto para os credores
Para os detentores de títulos de dívida da companhia, a recuperação judicial pode ser uma solução melhor, já que esse grupo esteve até agora isolado das negociações. De acordo com uma pessoa a par do assunto, a empresa, em recuperação judicial, deve continuar gerando caixa e esse grupo entrará passará a ter voz nas negociações dentro desse novo perfil de reestruturação.
As conversas azedaram diante da pressão exercida contra bancos e a CSN para que fossem assumidas contingências não só da InterCement, mas também da Mover, que controla da InterCement. De acordo com pessoas a par das negociações, as garantias oferecidas para a CSN pela Mover, que teria obrigação de honrar essas contingências, não eram suficientes para cobrir um ônus que potencialmente poderiam recair sobre a CSN.
Como consequência, as condições para renovação das dívidas dos bancos com a CSN foram apertando, ou seja, o valor oferecido pela aquisição da InterCement foi ficando insuficiente para a recuperação dos créditos pelas instituições financeiras que têm uma dívida de R$ 5,9 bilhões contra as empresas.
Pesaram ainda as ações movidas na Justiça norte-americana, holandesa e brasileira pelos detentores de mais de R$ 3 bilhões em títulos de dívida emitidos pela empresa no exterior. Essas disputas judiciais também estavam sendo empurradas para dentro das contingências que a CSN teria de assumir.
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Pessoas que participam das negociações disseram que a InterCement havia levado o pedido de recuperação extrajudicial a tribunais estrangeiros e que, no caso da Holandesa, o último dia para apreciação expirou em 30 de novembro.
A empresa pediu extensão por três meses, mas o pedido foi imediatamente rejeitado, e o juiz holandês iria decidir sobre o caso no dia 5 de dezembro, próxima quinta-feira.
As dívidas no plano de recuperação extrajudicial somavam R$ 22 bilhões, dos quais R$ 12 bilhões entre as companhias do grupo. No processo de recuperação judicial, com a perda da exclusividade por parte da CSN para negociação do ativo, outros interessados locais irão aparecer se for definida uma venda em processo de fatiamento de ativos, disseram pessoas que acompanharam as negociações.