IPOs devem voltar em 2024, após dois anos de seca; veja as principais candidatas a abrir o capital


Segundo estimativa do Bank of America, mercado de capitais pode movimentar até R$ 120 bilhões no Brasil em um período de 18 meses

Por Carlos Eduardo Valim
Atualização:

Depois de uma seca de mais de dois anos de aberturas de capital na B3, a maior desde 1998, o ano de 2024 deve ficar marcado por novas entradas de empresas na bolsa brasileira, segundo analistas.

Com o represamento dessas transações terminando, as captações em bolsa podem atingir até R$ 120 bilhões em um período de 18 meses, com forte potencial de se iniciar ainda no primeiro semestre. Essa conta considera IPOs (sigla em inglês para oferta pública inicial de ações), follow-ons (as ofertas de ações de empresas já listadas na bolsa e que já abriram o capital anteriormente) e negociações em bloco, segundo projeção do Bank of America.

“Estamos estimando um mercado de mais de R$ 100 bilhões e que pode chegar até a R$ 120 bilhões em captações, se vier a tempestade perfeita, com o corte de juros do Fed (Federal Reserve, o banco central americano)”, diz o corresponsável pela área de banco de investimentos do Bank of America no Brasil, Hans Lin.

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Apenas em três anos o total de IPOs e follow-ons superou a marca de R$ 100 bilhões no Brasil: em 2010, 2020 e 2021. O recorde foram os R$ 149 bilhões de 2010, segundo levantamento da SulAmérica Vida, Previdência e Investimentos, com dados da B3.

B3 está há mais de dois anos sem ver uma abertura de capital Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Nos últimos dois anos, diversas previsões projetaram o retorno dos IPOs, mas incertezas constantes atrasaram os planos das empresas, como as guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, o risco fiscal no Brasil e a mudança de governo. Mas o desestímulo maior, segundo os analistas, eram os juros altos por todo o mundo, em especial nos Estados Unidos.

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Adotadas para controlar a inflação que se espalhou pelas grandes economias, as taxas tiraram o apetite para o risco dos investidores, e desincentivaram as empresas a estrearem nas bolsas de valores. “Toda vez que existe um aperto monetário, cresce a volatilidade. Quando há uma distensão, tira a volatilidade e aumenta a propensão a risco por parte do investidor”, diz o CEO da SulAmérica Vida, Previdência e Investimentos, Marcelo Mello.

Os últimos IPOs realizados no Brasil aconteceram no início de agosto de 2021, quando chegaram ao mercado a Raízen e a Oncoclínicas, e depois a dupla listagem do Nubank em dezembro, na B3 e na Bolsa de Valores de Nova York - mas o banco decidiu deixar a bolsa brasileira menos de um ano depois.

Em evento realizado pelo Estadão em outubro, o presidente da B3, Gilson Finkelsztain, afirmou que mais de 50 empresas tinham se preparado durante os últimos dois anos para ter ações cotadas no mercado público. Mesmo que algumas delas possam ter mudado de planos nesse período e buscado financiamento por outras formas, como por meio de emissão de dívidas ou venda de participações para outras empresas, elas podem ser substituídas por novas candidatas ao IPO.

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Dessa forma, o mercado conta com dezenas de empresas atentas à oportunidade de chegar à B3 nos próximos meses, logo que as condições se comprovarem favoráveis. Entre elas estão diversas incorporadoras imobiliárias, como Pacaembu, Tegra, Kallas e Diagonal, as empresas de saneamento Aegea e Iguá, a subsidiária da gigante de energia chinesa CTG Brasil, as farmacêuticas Cimed, Eurofarma e União Química, além de Flora, Oba Hortifruti, Kalunga, Nadir Figueiredo, Rio Energy, Rio Alto, 2W Energia, V.tal e Automob, do grupo Simpar, entre outras (veja aqui cards com informações sobre as principais empresas que podem chegar à Bolsa).

“Nossa análise mostra entre 50 e 80 transações acontecendo entre IPOs, venda de blocos de ações e follow-ons, num período de 18 meses, a partir do ano que vem”, diz Lin. “Devem ser mais do que o dobro deste ano, que, apesar da falta de IPOs, trouxe quase 30 transações - sendo 21 follow-ons.” O ano de 2023 movimentou R$ 31 bilhões em follow-ons, uma queda representativa em relação aos R$ 58 bilhões de 2022, que foi muito beneficiado pela privatização da Eletrobras, responsável sozinha por movimentar R$ 33,7 bilhões.

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Em 2024, um efeito similar pode ocorrer com a venda de ações da estatal de saneamento Sabesp, planejada pelo governo do Estado de São Paulo, contribuindo com até R$ 20 bilhões do saldo final.

Contando apenas IPOs, o banco Itaú trabalha com um cenário-base mais conservador, de chegada a mercado de em torno cinco empresas no ano. A expectativa é de 25 a 35 transações ao todo no ano, contando follow-ons, e movimentando entre R$ 50 bilhões e R$ 70 bilhões.

Usina Hidrelétrica Ilha Solteira, operada pela CTG Brasil, empresa chinesa de energia que é uma forte candidata a abrir capital na B3 Foto: Divulgação/ CTG Brasil
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“Num cenário mais otimista, o número subiria para entre 35 e 45 transações, incluindo entre cinco a dez IPOs”, afirma o chefe global da área de banco de investimentos do Itaú BBA, Roderick Greenlees. “Vemos 60% de chances de se realizar esse cenário base e de cerca de 25% de um mais otimista. Há poucas razões para projetarmos uma piora de mercado.”

Abertura da janela

Se as expectativas para 2024 já eram de mais estabilidade do que nos últimos anos – o elemento essencial para as empresas planejarem fazer IPO –, o mês de dezembro trouxe a notícia que faltava, e que criou uma onda de otimismo. O presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, revelou uma virada nas expectativas de trajetória dos juros americanos.

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O mercado já espera agora três baixas de juros nos Estados Unidos em 2024, com quase 80% de chances de começarem já em março, à medida que a inflação no país indica estar ficando, enfim, sob controle. Esse clima de otimismo pode contribuir com quedas de juros por todo o mundo. O Bank of America prevê que os bancos centrais irão realizar mais de 150 cortes de juros no próximo ano.

“Foi um pivô até que inesperado do Fed, um presente para 2024″, ´diz o economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala. “O empurrão final vai acontecer quando a Selic baixar de 10%, uma marca até simbólica. Não faz grande diferença se ela está em 9,5% ou em 10%, mas estimula IPOs e uma migração da renda fixa, à medida que fundos de pensão vão em busca de manter a rentabilidade.” Hoje, a Selic está em 11,75% ao ano.

Como resultado dessa mudança de expectativas, um rali na B3 levou o Ibovespa para mais de 130 mil pontos este mês. E há quem preveja que os IPOs, esperados mais para o fim do primeiro semestre, possam voltar até um pouco antes. Afinal, o investidor estrangeiro já começou a ver o mercado brasileiro como de forte potencial dentre as economias emergentes, ao lado de Índia e de México.

A China, a grande estrela do mundo em desenvolvimento pelas últimas décadas, não atrai mais tanta atenção, principalmente por conta de riscos geopolíticos, segundo analistas.

Utilizando os dados financeiros dos balanços do primeiro trimestre de 2024, as empresas poderiam precificar as suas ações até o fim de julho e começo de agosto, diz Greenlees, do Itaú BBA. Mas, se o mercado se mostrar melhor do que o esperado, as empresas podem buscar o IPO já com os dados do quarto trimestre ou até do terceiro trimestre de 2023, o que poderia trazer aberturas de capital já em fevereiro.

“Vai depender dos follow-ons do começo do ano, que devem acontecer em janeiro”, diz Greenlees. “Se eles forem bem, pavimentam o caminho para os IPOs no primeiro semestre.”

A volta das aberturas de capital segue um roteiro comum, diz o diretor de relação com clientes da B3, Rogério Santana. Primeiramente, o investidor procura oportunidades na própria bolsa, o que leva a um aumento do patamar de preço das ações, que é o que está acontecendo nas últimas semanas. “Depois, aparecem mais captações no mercado, como os follow-ons, de empresas já listadas. E, então, se sobra dinheiro, o investidor vai em busca de novas empresas”, diz o executivo.

Para finalizar o processo, a partir do momento que anunciam a oficialização do IPO, as empresas levam em torno de dois meses. É o tempo para entregar a documentação para a Bolsa e para a Comissão de Valores Mobiliários, e organizar a transação com os investidores. “Se alguém começar em janeiro, com os números do terceiro trimestre de 2023, pode chegar ao mercado já entre março e maio”, afirma Santana.

Setores mais promissores

Outra expectativa está em saber qual o perfil das ofertas que vão puxar a fila. As apostas maiores estão em empresas de grande porte, com capacidade de ofertas de ações acima de R$ 2,5 bilhões e com valor de mercado de mais de R$ 10 bilhões. Também estão cotadas as participantes de setores mais consolidados, de receita recorrente, como de infraestrutura, incluindo saneamento básico e energia.

Na última janela de IPOs, entre 2020 e 2021, quando aconteceram 54 aberturas de capital, foi comum a chegada de empresas com poucos anos de existência e de setores que prometem crescimento forte, como startups de tecnologia. Agora, os investidores devem preferir companhias mais consolidadas. “O mercado está mais seletivo. O juro terminal esperado para a Selic está em 9%. Ainda não é algo pujante. Saímos do patamar dos 14%, mas também não estaremos na casa dos 7%, que estimula muito o investidor a riscos”, diz Mello, da SulAmérica.

Mas, mesmo assim, pode haver espaço para surpresas, segundo o sócio sênior da assessoria financeira Seneca Evercore e ex-chefe de investment banking do Goldman Sachs no Brasil, Daniel Wainstein. “Empresas grandes e que já demonstraram capacidade de valorizar o dinheiro do investidor, com governança legal e com boas margens de rentabilidade podem aparecer na bolsa, mesmo se forem de setores menos cotados”, afirma. “Sempre aparecem nas janelas de IPO companhias de varejo, do setor imobiliário e de tecnologia.”

Uma dica dele é observar as empresas que fazem parte de portfólios de fundos de private equity, que podem querer aproveitar o momento para rentabilizar os investimentos passados. “E elas são interessantes para o mercado por já terem passado pelo crivo da diligência e de governança dos fundos. É uma espécie de selo de qualidade de muita força”, diz.

Tudo isso não significa que o cenário para 2024 esteja completamente livre de riscos. “O grande temor é se o discurso do presidente do Fed vai se efetuar, na prática. Mas também é preciso ver se o discurso do presidente Lula pode influenciar na política fiscal, e levar a uma descrença do mercado. E, por fim, a China tem os seus problemas econômicos, que podem afetar o mundo”, analisa. “Mas estamos passando por um momento mágico.”

No começo deste ano, a expectativa era de PIB crescendo 1%, a Selic era de 14% e o Brasil atravessava a maior crise de crédito que Wainstein diz ter “visto em 25 anos de carreira”, após a revelação da fraude na varejista Americanas. Agora, o PIB deve fechar 2023 em torno dos 3%, os juros estão com perspectivas de queda em todo o mundo e o Brasil voltou a ter expectativas de voltar ao grau de investimento, na nota das agências internacionais de rating - uma receita perfeita para a volta dos IPOs.

Depois de uma seca de mais de dois anos de aberturas de capital na B3, a maior desde 1998, o ano de 2024 deve ficar marcado por novas entradas de empresas na bolsa brasileira, segundo analistas.

Com o represamento dessas transações terminando, as captações em bolsa podem atingir até R$ 120 bilhões em um período de 18 meses, com forte potencial de se iniciar ainda no primeiro semestre. Essa conta considera IPOs (sigla em inglês para oferta pública inicial de ações), follow-ons (as ofertas de ações de empresas já listadas na bolsa e que já abriram o capital anteriormente) e negociações em bloco, segundo projeção do Bank of America.

“Estamos estimando um mercado de mais de R$ 100 bilhões e que pode chegar até a R$ 120 bilhões em captações, se vier a tempestade perfeita, com o corte de juros do Fed (Federal Reserve, o banco central americano)”, diz o corresponsável pela área de banco de investimentos do Bank of America no Brasil, Hans Lin.

Apenas em três anos o total de IPOs e follow-ons superou a marca de R$ 100 bilhões no Brasil: em 2010, 2020 e 2021. O recorde foram os R$ 149 bilhões de 2010, segundo levantamento da SulAmérica Vida, Previdência e Investimentos, com dados da B3.

B3 está há mais de dois anos sem ver uma abertura de capital Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Nos últimos dois anos, diversas previsões projetaram o retorno dos IPOs, mas incertezas constantes atrasaram os planos das empresas, como as guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, o risco fiscal no Brasil e a mudança de governo. Mas o desestímulo maior, segundo os analistas, eram os juros altos por todo o mundo, em especial nos Estados Unidos.

Adotadas para controlar a inflação que se espalhou pelas grandes economias, as taxas tiraram o apetite para o risco dos investidores, e desincentivaram as empresas a estrearem nas bolsas de valores. “Toda vez que existe um aperto monetário, cresce a volatilidade. Quando há uma distensão, tira a volatilidade e aumenta a propensão a risco por parte do investidor”, diz o CEO da SulAmérica Vida, Previdência e Investimentos, Marcelo Mello.

Os últimos IPOs realizados no Brasil aconteceram no início de agosto de 2021, quando chegaram ao mercado a Raízen e a Oncoclínicas, e depois a dupla listagem do Nubank em dezembro, na B3 e na Bolsa de Valores de Nova York - mas o banco decidiu deixar a bolsa brasileira menos de um ano depois.

Em evento realizado pelo Estadão em outubro, o presidente da B3, Gilson Finkelsztain, afirmou que mais de 50 empresas tinham se preparado durante os últimos dois anos para ter ações cotadas no mercado público. Mesmo que algumas delas possam ter mudado de planos nesse período e buscado financiamento por outras formas, como por meio de emissão de dívidas ou venda de participações para outras empresas, elas podem ser substituídas por novas candidatas ao IPO.

Dessa forma, o mercado conta com dezenas de empresas atentas à oportunidade de chegar à B3 nos próximos meses, logo que as condições se comprovarem favoráveis. Entre elas estão diversas incorporadoras imobiliárias, como Pacaembu, Tegra, Kallas e Diagonal, as empresas de saneamento Aegea e Iguá, a subsidiária da gigante de energia chinesa CTG Brasil, as farmacêuticas Cimed, Eurofarma e União Química, além de Flora, Oba Hortifruti, Kalunga, Nadir Figueiredo, Rio Energy, Rio Alto, 2W Energia, V.tal e Automob, do grupo Simpar, entre outras (veja aqui cards com informações sobre as principais empresas que podem chegar à Bolsa).

“Nossa análise mostra entre 50 e 80 transações acontecendo entre IPOs, venda de blocos de ações e follow-ons, num período de 18 meses, a partir do ano que vem”, diz Lin. “Devem ser mais do que o dobro deste ano, que, apesar da falta de IPOs, trouxe quase 30 transações - sendo 21 follow-ons.” O ano de 2023 movimentou R$ 31 bilhões em follow-ons, uma queda representativa em relação aos R$ 58 bilhões de 2022, que foi muito beneficiado pela privatização da Eletrobras, responsável sozinha por movimentar R$ 33,7 bilhões.

Em 2024, um efeito similar pode ocorrer com a venda de ações da estatal de saneamento Sabesp, planejada pelo governo do Estado de São Paulo, contribuindo com até R$ 20 bilhões do saldo final.

Contando apenas IPOs, o banco Itaú trabalha com um cenário-base mais conservador, de chegada a mercado de em torno cinco empresas no ano. A expectativa é de 25 a 35 transações ao todo no ano, contando follow-ons, e movimentando entre R$ 50 bilhões e R$ 70 bilhões.

Usina Hidrelétrica Ilha Solteira, operada pela CTG Brasil, empresa chinesa de energia que é uma forte candidata a abrir capital na B3 Foto: Divulgação/ CTG Brasil

“Num cenário mais otimista, o número subiria para entre 35 e 45 transações, incluindo entre cinco a dez IPOs”, afirma o chefe global da área de banco de investimentos do Itaú BBA, Roderick Greenlees. “Vemos 60% de chances de se realizar esse cenário base e de cerca de 25% de um mais otimista. Há poucas razões para projetarmos uma piora de mercado.”

Abertura da janela

Se as expectativas para 2024 já eram de mais estabilidade do que nos últimos anos – o elemento essencial para as empresas planejarem fazer IPO –, o mês de dezembro trouxe a notícia que faltava, e que criou uma onda de otimismo. O presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, revelou uma virada nas expectativas de trajetória dos juros americanos.

O mercado já espera agora três baixas de juros nos Estados Unidos em 2024, com quase 80% de chances de começarem já em março, à medida que a inflação no país indica estar ficando, enfim, sob controle. Esse clima de otimismo pode contribuir com quedas de juros por todo o mundo. O Bank of America prevê que os bancos centrais irão realizar mais de 150 cortes de juros no próximo ano.

“Foi um pivô até que inesperado do Fed, um presente para 2024″, ´diz o economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala. “O empurrão final vai acontecer quando a Selic baixar de 10%, uma marca até simbólica. Não faz grande diferença se ela está em 9,5% ou em 10%, mas estimula IPOs e uma migração da renda fixa, à medida que fundos de pensão vão em busca de manter a rentabilidade.” Hoje, a Selic está em 11,75% ao ano.

Como resultado dessa mudança de expectativas, um rali na B3 levou o Ibovespa para mais de 130 mil pontos este mês. E há quem preveja que os IPOs, esperados mais para o fim do primeiro semestre, possam voltar até um pouco antes. Afinal, o investidor estrangeiro já começou a ver o mercado brasileiro como de forte potencial dentre as economias emergentes, ao lado de Índia e de México.

A China, a grande estrela do mundo em desenvolvimento pelas últimas décadas, não atrai mais tanta atenção, principalmente por conta de riscos geopolíticos, segundo analistas.

Utilizando os dados financeiros dos balanços do primeiro trimestre de 2024, as empresas poderiam precificar as suas ações até o fim de julho e começo de agosto, diz Greenlees, do Itaú BBA. Mas, se o mercado se mostrar melhor do que o esperado, as empresas podem buscar o IPO já com os dados do quarto trimestre ou até do terceiro trimestre de 2023, o que poderia trazer aberturas de capital já em fevereiro.

“Vai depender dos follow-ons do começo do ano, que devem acontecer em janeiro”, diz Greenlees. “Se eles forem bem, pavimentam o caminho para os IPOs no primeiro semestre.”

A volta das aberturas de capital segue um roteiro comum, diz o diretor de relação com clientes da B3, Rogério Santana. Primeiramente, o investidor procura oportunidades na própria bolsa, o que leva a um aumento do patamar de preço das ações, que é o que está acontecendo nas últimas semanas. “Depois, aparecem mais captações no mercado, como os follow-ons, de empresas já listadas. E, então, se sobra dinheiro, o investidor vai em busca de novas empresas”, diz o executivo.

Para finalizar o processo, a partir do momento que anunciam a oficialização do IPO, as empresas levam em torno de dois meses. É o tempo para entregar a documentação para a Bolsa e para a Comissão de Valores Mobiliários, e organizar a transação com os investidores. “Se alguém começar em janeiro, com os números do terceiro trimestre de 2023, pode chegar ao mercado já entre março e maio”, afirma Santana.

Setores mais promissores

Outra expectativa está em saber qual o perfil das ofertas que vão puxar a fila. As apostas maiores estão em empresas de grande porte, com capacidade de ofertas de ações acima de R$ 2,5 bilhões e com valor de mercado de mais de R$ 10 bilhões. Também estão cotadas as participantes de setores mais consolidados, de receita recorrente, como de infraestrutura, incluindo saneamento básico e energia.

Na última janela de IPOs, entre 2020 e 2021, quando aconteceram 54 aberturas de capital, foi comum a chegada de empresas com poucos anos de existência e de setores que prometem crescimento forte, como startups de tecnologia. Agora, os investidores devem preferir companhias mais consolidadas. “O mercado está mais seletivo. O juro terminal esperado para a Selic está em 9%. Ainda não é algo pujante. Saímos do patamar dos 14%, mas também não estaremos na casa dos 7%, que estimula muito o investidor a riscos”, diz Mello, da SulAmérica.

Mas, mesmo assim, pode haver espaço para surpresas, segundo o sócio sênior da assessoria financeira Seneca Evercore e ex-chefe de investment banking do Goldman Sachs no Brasil, Daniel Wainstein. “Empresas grandes e que já demonstraram capacidade de valorizar o dinheiro do investidor, com governança legal e com boas margens de rentabilidade podem aparecer na bolsa, mesmo se forem de setores menos cotados”, afirma. “Sempre aparecem nas janelas de IPO companhias de varejo, do setor imobiliário e de tecnologia.”

Uma dica dele é observar as empresas que fazem parte de portfólios de fundos de private equity, que podem querer aproveitar o momento para rentabilizar os investimentos passados. “E elas são interessantes para o mercado por já terem passado pelo crivo da diligência e de governança dos fundos. É uma espécie de selo de qualidade de muita força”, diz.

Tudo isso não significa que o cenário para 2024 esteja completamente livre de riscos. “O grande temor é se o discurso do presidente do Fed vai se efetuar, na prática. Mas também é preciso ver se o discurso do presidente Lula pode influenciar na política fiscal, e levar a uma descrença do mercado. E, por fim, a China tem os seus problemas econômicos, que podem afetar o mundo”, analisa. “Mas estamos passando por um momento mágico.”

No começo deste ano, a expectativa era de PIB crescendo 1%, a Selic era de 14% e o Brasil atravessava a maior crise de crédito que Wainstein diz ter “visto em 25 anos de carreira”, após a revelação da fraude na varejista Americanas. Agora, o PIB deve fechar 2023 em torno dos 3%, os juros estão com perspectivas de queda em todo o mundo e o Brasil voltou a ter expectativas de voltar ao grau de investimento, na nota das agências internacionais de rating - uma receita perfeita para a volta dos IPOs.

Depois de uma seca de mais de dois anos de aberturas de capital na B3, a maior desde 1998, o ano de 2024 deve ficar marcado por novas entradas de empresas na bolsa brasileira, segundo analistas.

Com o represamento dessas transações terminando, as captações em bolsa podem atingir até R$ 120 bilhões em um período de 18 meses, com forte potencial de se iniciar ainda no primeiro semestre. Essa conta considera IPOs (sigla em inglês para oferta pública inicial de ações), follow-ons (as ofertas de ações de empresas já listadas na bolsa e que já abriram o capital anteriormente) e negociações em bloco, segundo projeção do Bank of America.

“Estamos estimando um mercado de mais de R$ 100 bilhões e que pode chegar até a R$ 120 bilhões em captações, se vier a tempestade perfeita, com o corte de juros do Fed (Federal Reserve, o banco central americano)”, diz o corresponsável pela área de banco de investimentos do Bank of America no Brasil, Hans Lin.

Apenas em três anos o total de IPOs e follow-ons superou a marca de R$ 100 bilhões no Brasil: em 2010, 2020 e 2021. O recorde foram os R$ 149 bilhões de 2010, segundo levantamento da SulAmérica Vida, Previdência e Investimentos, com dados da B3.

B3 está há mais de dois anos sem ver uma abertura de capital Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Nos últimos dois anos, diversas previsões projetaram o retorno dos IPOs, mas incertezas constantes atrasaram os planos das empresas, como as guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, o risco fiscal no Brasil e a mudança de governo. Mas o desestímulo maior, segundo os analistas, eram os juros altos por todo o mundo, em especial nos Estados Unidos.

Adotadas para controlar a inflação que se espalhou pelas grandes economias, as taxas tiraram o apetite para o risco dos investidores, e desincentivaram as empresas a estrearem nas bolsas de valores. “Toda vez que existe um aperto monetário, cresce a volatilidade. Quando há uma distensão, tira a volatilidade e aumenta a propensão a risco por parte do investidor”, diz o CEO da SulAmérica Vida, Previdência e Investimentos, Marcelo Mello.

Os últimos IPOs realizados no Brasil aconteceram no início de agosto de 2021, quando chegaram ao mercado a Raízen e a Oncoclínicas, e depois a dupla listagem do Nubank em dezembro, na B3 e na Bolsa de Valores de Nova York - mas o banco decidiu deixar a bolsa brasileira menos de um ano depois.

Em evento realizado pelo Estadão em outubro, o presidente da B3, Gilson Finkelsztain, afirmou que mais de 50 empresas tinham se preparado durante os últimos dois anos para ter ações cotadas no mercado público. Mesmo que algumas delas possam ter mudado de planos nesse período e buscado financiamento por outras formas, como por meio de emissão de dívidas ou venda de participações para outras empresas, elas podem ser substituídas por novas candidatas ao IPO.

Dessa forma, o mercado conta com dezenas de empresas atentas à oportunidade de chegar à B3 nos próximos meses, logo que as condições se comprovarem favoráveis. Entre elas estão diversas incorporadoras imobiliárias, como Pacaembu, Tegra, Kallas e Diagonal, as empresas de saneamento Aegea e Iguá, a subsidiária da gigante de energia chinesa CTG Brasil, as farmacêuticas Cimed, Eurofarma e União Química, além de Flora, Oba Hortifruti, Kalunga, Nadir Figueiredo, Rio Energy, Rio Alto, 2W Energia, V.tal e Automob, do grupo Simpar, entre outras (veja aqui cards com informações sobre as principais empresas que podem chegar à Bolsa).

“Nossa análise mostra entre 50 e 80 transações acontecendo entre IPOs, venda de blocos de ações e follow-ons, num período de 18 meses, a partir do ano que vem”, diz Lin. “Devem ser mais do que o dobro deste ano, que, apesar da falta de IPOs, trouxe quase 30 transações - sendo 21 follow-ons.” O ano de 2023 movimentou R$ 31 bilhões em follow-ons, uma queda representativa em relação aos R$ 58 bilhões de 2022, que foi muito beneficiado pela privatização da Eletrobras, responsável sozinha por movimentar R$ 33,7 bilhões.

Em 2024, um efeito similar pode ocorrer com a venda de ações da estatal de saneamento Sabesp, planejada pelo governo do Estado de São Paulo, contribuindo com até R$ 20 bilhões do saldo final.

Contando apenas IPOs, o banco Itaú trabalha com um cenário-base mais conservador, de chegada a mercado de em torno cinco empresas no ano. A expectativa é de 25 a 35 transações ao todo no ano, contando follow-ons, e movimentando entre R$ 50 bilhões e R$ 70 bilhões.

Usina Hidrelétrica Ilha Solteira, operada pela CTG Brasil, empresa chinesa de energia que é uma forte candidata a abrir capital na B3 Foto: Divulgação/ CTG Brasil

“Num cenário mais otimista, o número subiria para entre 35 e 45 transações, incluindo entre cinco a dez IPOs”, afirma o chefe global da área de banco de investimentos do Itaú BBA, Roderick Greenlees. “Vemos 60% de chances de se realizar esse cenário base e de cerca de 25% de um mais otimista. Há poucas razões para projetarmos uma piora de mercado.”

Abertura da janela

Se as expectativas para 2024 já eram de mais estabilidade do que nos últimos anos – o elemento essencial para as empresas planejarem fazer IPO –, o mês de dezembro trouxe a notícia que faltava, e que criou uma onda de otimismo. O presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, revelou uma virada nas expectativas de trajetória dos juros americanos.

O mercado já espera agora três baixas de juros nos Estados Unidos em 2024, com quase 80% de chances de começarem já em março, à medida que a inflação no país indica estar ficando, enfim, sob controle. Esse clima de otimismo pode contribuir com quedas de juros por todo o mundo. O Bank of America prevê que os bancos centrais irão realizar mais de 150 cortes de juros no próximo ano.

“Foi um pivô até que inesperado do Fed, um presente para 2024″, ´diz o economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala. “O empurrão final vai acontecer quando a Selic baixar de 10%, uma marca até simbólica. Não faz grande diferença se ela está em 9,5% ou em 10%, mas estimula IPOs e uma migração da renda fixa, à medida que fundos de pensão vão em busca de manter a rentabilidade.” Hoje, a Selic está em 11,75% ao ano.

Como resultado dessa mudança de expectativas, um rali na B3 levou o Ibovespa para mais de 130 mil pontos este mês. E há quem preveja que os IPOs, esperados mais para o fim do primeiro semestre, possam voltar até um pouco antes. Afinal, o investidor estrangeiro já começou a ver o mercado brasileiro como de forte potencial dentre as economias emergentes, ao lado de Índia e de México.

A China, a grande estrela do mundo em desenvolvimento pelas últimas décadas, não atrai mais tanta atenção, principalmente por conta de riscos geopolíticos, segundo analistas.

Utilizando os dados financeiros dos balanços do primeiro trimestre de 2024, as empresas poderiam precificar as suas ações até o fim de julho e começo de agosto, diz Greenlees, do Itaú BBA. Mas, se o mercado se mostrar melhor do que o esperado, as empresas podem buscar o IPO já com os dados do quarto trimestre ou até do terceiro trimestre de 2023, o que poderia trazer aberturas de capital já em fevereiro.

“Vai depender dos follow-ons do começo do ano, que devem acontecer em janeiro”, diz Greenlees. “Se eles forem bem, pavimentam o caminho para os IPOs no primeiro semestre.”

A volta das aberturas de capital segue um roteiro comum, diz o diretor de relação com clientes da B3, Rogério Santana. Primeiramente, o investidor procura oportunidades na própria bolsa, o que leva a um aumento do patamar de preço das ações, que é o que está acontecendo nas últimas semanas. “Depois, aparecem mais captações no mercado, como os follow-ons, de empresas já listadas. E, então, se sobra dinheiro, o investidor vai em busca de novas empresas”, diz o executivo.

Para finalizar o processo, a partir do momento que anunciam a oficialização do IPO, as empresas levam em torno de dois meses. É o tempo para entregar a documentação para a Bolsa e para a Comissão de Valores Mobiliários, e organizar a transação com os investidores. “Se alguém começar em janeiro, com os números do terceiro trimestre de 2023, pode chegar ao mercado já entre março e maio”, afirma Santana.

Setores mais promissores

Outra expectativa está em saber qual o perfil das ofertas que vão puxar a fila. As apostas maiores estão em empresas de grande porte, com capacidade de ofertas de ações acima de R$ 2,5 bilhões e com valor de mercado de mais de R$ 10 bilhões. Também estão cotadas as participantes de setores mais consolidados, de receita recorrente, como de infraestrutura, incluindo saneamento básico e energia.

Na última janela de IPOs, entre 2020 e 2021, quando aconteceram 54 aberturas de capital, foi comum a chegada de empresas com poucos anos de existência e de setores que prometem crescimento forte, como startups de tecnologia. Agora, os investidores devem preferir companhias mais consolidadas. “O mercado está mais seletivo. O juro terminal esperado para a Selic está em 9%. Ainda não é algo pujante. Saímos do patamar dos 14%, mas também não estaremos na casa dos 7%, que estimula muito o investidor a riscos”, diz Mello, da SulAmérica.

Mas, mesmo assim, pode haver espaço para surpresas, segundo o sócio sênior da assessoria financeira Seneca Evercore e ex-chefe de investment banking do Goldman Sachs no Brasil, Daniel Wainstein. “Empresas grandes e que já demonstraram capacidade de valorizar o dinheiro do investidor, com governança legal e com boas margens de rentabilidade podem aparecer na bolsa, mesmo se forem de setores menos cotados”, afirma. “Sempre aparecem nas janelas de IPO companhias de varejo, do setor imobiliário e de tecnologia.”

Uma dica dele é observar as empresas que fazem parte de portfólios de fundos de private equity, que podem querer aproveitar o momento para rentabilizar os investimentos passados. “E elas são interessantes para o mercado por já terem passado pelo crivo da diligência e de governança dos fundos. É uma espécie de selo de qualidade de muita força”, diz.

Tudo isso não significa que o cenário para 2024 esteja completamente livre de riscos. “O grande temor é se o discurso do presidente do Fed vai se efetuar, na prática. Mas também é preciso ver se o discurso do presidente Lula pode influenciar na política fiscal, e levar a uma descrença do mercado. E, por fim, a China tem os seus problemas econômicos, que podem afetar o mundo”, analisa. “Mas estamos passando por um momento mágico.”

No começo deste ano, a expectativa era de PIB crescendo 1%, a Selic era de 14% e o Brasil atravessava a maior crise de crédito que Wainstein diz ter “visto em 25 anos de carreira”, após a revelação da fraude na varejista Americanas. Agora, o PIB deve fechar 2023 em torno dos 3%, os juros estão com perspectivas de queda em todo o mundo e o Brasil voltou a ter expectativas de voltar ao grau de investimento, na nota das agências internacionais de rating - uma receita perfeita para a volta dos IPOs.

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