Briga sobre a Lush segue quente na Justiça quatro anos após marca de cosméticos deixar o Brasil


Disputa societária em torno da marca, que tentou duas vezes decolar no País, se arrasta há 15 anos; responsável pela primeira ‘encarnação’ da rede de cosméticos no País, empresária Sandra Isper Rocha pede R$ 200 milhões

Por Fernanda Guimarães
Atualização:

Quando deixou o Brasil pela segunda vez, em 2018, a Lush, marca de cosméticos britânica com apelo “sustentável chique”, deixou uma legião de consumidores órfãos e provocou longas filas nos seus últimos dias de lojas abertas. No auge, teve 23 lojas, incluindo um ponto na rua mais luxuosa de São Paulo, a Oscar Freire. Por trás dessas idas e vindas da marca, no entanto, está uma briga societária que se arrasta na Justiça há 15 anos, com indenizações que podem superar os R$ 200 milhões.

Na segunda vez em que veio ao Brasil, com uma fábrica própria, a companhia britânica já tinha um histórico por aqui. Isso porque, inicialmente, o negócio chegara em 1999 por meio da empresária brasileira Sandra Isper Rocha. Depois de conhecer a Lush lá fora, ela decidiu negociar sua vinda ao País, pois achava que o negócio teria potencila no mercado brasileiro. “Fiquei fascinada pela ideia e conceito. Foram muitas ligações e insistência até sermos recebidos em Londres, pelos fundadores da Lush”, contou Sandra nesta semana, ao Estadão.

Sandra Isper Rocha, em foto de 2005, em sua antiga loja da Lush no Shopping Villa-Lobos Foto: Filipe Araújo/Estadão
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A Lush surgiu em 1995, pelas mãos do empresário Mark Constantine, que até os anos 1970 trabalhava como cabeleireiro na Inglaterra e ganhou fama ao desenvolver cosméticos para seus próprios clientes. Isso o levou a ser descoberto pela The Body Shop – outra marca de apelo sustentável, hoje parte do grupo Natura & Co. –, onde trabalhou por cerca de uma década. Depois disso, ele resolveu empreender, criando a Lush e ampliando a aposta tanto no caráter “artesanal” quanto no apelo de sustentabilidade. Hoje, a empresa tem mais de 900 lojas pelo mundo.

Foi de olho nesses diferenciais que Sandra tentou trazer a rede ao País, não muito tempo após sua fundação. A primeira reunião foi em 1997 e a estreia veio dois anos depois. Mas não demorou muito, de acordo com a empresária, para que os problemas começassem a aparecer. O primeiro alerta veio quando a Lush alterou o prazo de pagamento das matérias-primas, que eram enviadas da Inglaterra até a fábrica no Brasil, em Cajamar, interior de São Paulo. “Nosso prazo de pagamento era inicialmente de 120 dias, sendo que os produtos demoravam cerca de 60 dias para chegar à fábrica. E eles passaram a pedir pagamento à vista, o que estrangulou nosso caixa”, lembra.

Essa exigência foi apenas o presságio do que viria pela frente. O embate real teve início em 2004, quando a matriz passou a questionar a atividade da subsidiária brasileira, afirmando que desconhecia os detalhes da operação. Na época, inclusive, decidiu por passar um pente fino na operação brasileira, enviando uma equipe de contadores ingleses ao Brasil. No fim desse “pente-fino”, depois de tentativas de acordo, a relação degringolou de vez.

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Em 2006, a matriz interrompeu o fornecimento de matérias-primas e determinou o fim do acordo de licenciamento da marca, sepultando o negócio local, levando ao fechamento das lojas e ao encerramento das operações no Brasil. “Nos shoppings, meu pai e mãe eram os fiadores dos contratos. Foi um prejuízo gigantesco, além de ações trabalhistas. Tudo isso gerou um estrangulamento do nosso patrimônio.”

Pedido de indenização e documentos em mãos

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O que Sandra pede na Justiça, desde 2007, é uma indenização por conta das dívidas que teve que assumir e, ainda, pelo que deixou de ganhar com o fechamento súbito de suas lojas, em valores atualizados. Agora, anos depois, o jogo de forças pode mudar. Ao menos é o que acredita a defesa da empresária. Isso porque foi encontrado um documento em que a Lush reconhece a sociedade, que foi protocolado e autenticado no consulado brasileiro em Londres. Agora está incluído como prova no processo.

O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País

Felipe Mangini, advogado de Sandra Isper Rocha

“O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil, como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País. A nosso ver, isso comprova que a decisão de rescindir o contrato de licenciamento foi friamente calculada, porque o que eles queriam era efetivamente tomar o mercado brasileiro”, diz Felipe Mangini, sócio do escritório Mangini Leite Siegl Mermerian Advogados, que representa Sandra. Posturas semelhantes, conforme a defesa, foram identificadas em outros países onde a Lush chegou por meio de sociedades, como em Hong Kong, Alemanha e Canadá.

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Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado.”

Sandra Isper Rocha, empresária

Para a defesa da Sandra, a postura da Lush é explicada porque a empresa queria atuar no Brasil, mas sem sócios locais. Essa alegação é sustentada pelo fato de que, depois do fechamento das lojas por Sandra, a matriz inglesa decidiu, em 2014, reabrir as lojas da marca no País sem intermediários. A defesa aponta que, “curiosamente”, a principal loja aberta pela Lush funcionava exatamente em frente à antiga unidade que havia sido aberta por Sandra. “Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado”, diz Sandra.

Conforme o advogado, houve outro motivo para a Lush ter vindo ao País em 2014. O anúncio ocorreu logo depois do processo indenizatório de Sandra ter sido extinto pela Justiça. No entanto, a decisão foi revertida em 2018, quando Sandra teve de volta o direito de pedir indenização à Lush. Logo depois disso, a empresa britânica anunciou sua saída definitiva do País, sob a justificativa de que a carga tributária era impeditiva para sua atuação local. “Eles anunciaram a saída depois de um investimento gigantesco. Falar disso ainda é muito doloroso, mas agora estamos na reta final. Agora eu quero paz.”

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Procurada, a Lush não retornou o pedido de entrevista.

Quando deixou o Brasil pela segunda vez, em 2018, a Lush, marca de cosméticos britânica com apelo “sustentável chique”, deixou uma legião de consumidores órfãos e provocou longas filas nos seus últimos dias de lojas abertas. No auge, teve 23 lojas, incluindo um ponto na rua mais luxuosa de São Paulo, a Oscar Freire. Por trás dessas idas e vindas da marca, no entanto, está uma briga societária que se arrasta na Justiça há 15 anos, com indenizações que podem superar os R$ 200 milhões.

Na segunda vez em que veio ao Brasil, com uma fábrica própria, a companhia britânica já tinha um histórico por aqui. Isso porque, inicialmente, o negócio chegara em 1999 por meio da empresária brasileira Sandra Isper Rocha. Depois de conhecer a Lush lá fora, ela decidiu negociar sua vinda ao País, pois achava que o negócio teria potencila no mercado brasileiro. “Fiquei fascinada pela ideia e conceito. Foram muitas ligações e insistência até sermos recebidos em Londres, pelos fundadores da Lush”, contou Sandra nesta semana, ao Estadão.

Sandra Isper Rocha, em foto de 2005, em sua antiga loja da Lush no Shopping Villa-Lobos Foto: Filipe Araújo/Estadão

A Lush surgiu em 1995, pelas mãos do empresário Mark Constantine, que até os anos 1970 trabalhava como cabeleireiro na Inglaterra e ganhou fama ao desenvolver cosméticos para seus próprios clientes. Isso o levou a ser descoberto pela The Body Shop – outra marca de apelo sustentável, hoje parte do grupo Natura & Co. –, onde trabalhou por cerca de uma década. Depois disso, ele resolveu empreender, criando a Lush e ampliando a aposta tanto no caráter “artesanal” quanto no apelo de sustentabilidade. Hoje, a empresa tem mais de 900 lojas pelo mundo.

Foi de olho nesses diferenciais que Sandra tentou trazer a rede ao País, não muito tempo após sua fundação. A primeira reunião foi em 1997 e a estreia veio dois anos depois. Mas não demorou muito, de acordo com a empresária, para que os problemas começassem a aparecer. O primeiro alerta veio quando a Lush alterou o prazo de pagamento das matérias-primas, que eram enviadas da Inglaterra até a fábrica no Brasil, em Cajamar, interior de São Paulo. “Nosso prazo de pagamento era inicialmente de 120 dias, sendo que os produtos demoravam cerca de 60 dias para chegar à fábrica. E eles passaram a pedir pagamento à vista, o que estrangulou nosso caixa”, lembra.

Essa exigência foi apenas o presságio do que viria pela frente. O embate real teve início em 2004, quando a matriz passou a questionar a atividade da subsidiária brasileira, afirmando que desconhecia os detalhes da operação. Na época, inclusive, decidiu por passar um pente fino na operação brasileira, enviando uma equipe de contadores ingleses ao Brasil. No fim desse “pente-fino”, depois de tentativas de acordo, a relação degringolou de vez.

Em 2006, a matriz interrompeu o fornecimento de matérias-primas e determinou o fim do acordo de licenciamento da marca, sepultando o negócio local, levando ao fechamento das lojas e ao encerramento das operações no Brasil. “Nos shoppings, meu pai e mãe eram os fiadores dos contratos. Foi um prejuízo gigantesco, além de ações trabalhistas. Tudo isso gerou um estrangulamento do nosso patrimônio.”

Pedido de indenização e documentos em mãos

O que Sandra pede na Justiça, desde 2007, é uma indenização por conta das dívidas que teve que assumir e, ainda, pelo que deixou de ganhar com o fechamento súbito de suas lojas, em valores atualizados. Agora, anos depois, o jogo de forças pode mudar. Ao menos é o que acredita a defesa da empresária. Isso porque foi encontrado um documento em que a Lush reconhece a sociedade, que foi protocolado e autenticado no consulado brasileiro em Londres. Agora está incluído como prova no processo.

O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País

Felipe Mangini, advogado de Sandra Isper Rocha

“O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil, como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País. A nosso ver, isso comprova que a decisão de rescindir o contrato de licenciamento foi friamente calculada, porque o que eles queriam era efetivamente tomar o mercado brasileiro”, diz Felipe Mangini, sócio do escritório Mangini Leite Siegl Mermerian Advogados, que representa Sandra. Posturas semelhantes, conforme a defesa, foram identificadas em outros países onde a Lush chegou por meio de sociedades, como em Hong Kong, Alemanha e Canadá.

Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado.”

Sandra Isper Rocha, empresária

Para a defesa da Sandra, a postura da Lush é explicada porque a empresa queria atuar no Brasil, mas sem sócios locais. Essa alegação é sustentada pelo fato de que, depois do fechamento das lojas por Sandra, a matriz inglesa decidiu, em 2014, reabrir as lojas da marca no País sem intermediários. A defesa aponta que, “curiosamente”, a principal loja aberta pela Lush funcionava exatamente em frente à antiga unidade que havia sido aberta por Sandra. “Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado”, diz Sandra.

Conforme o advogado, houve outro motivo para a Lush ter vindo ao País em 2014. O anúncio ocorreu logo depois do processo indenizatório de Sandra ter sido extinto pela Justiça. No entanto, a decisão foi revertida em 2018, quando Sandra teve de volta o direito de pedir indenização à Lush. Logo depois disso, a empresa britânica anunciou sua saída definitiva do País, sob a justificativa de que a carga tributária era impeditiva para sua atuação local. “Eles anunciaram a saída depois de um investimento gigantesco. Falar disso ainda é muito doloroso, mas agora estamos na reta final. Agora eu quero paz.”

Procurada, a Lush não retornou o pedido de entrevista.

Quando deixou o Brasil pela segunda vez, em 2018, a Lush, marca de cosméticos britânica com apelo “sustentável chique”, deixou uma legião de consumidores órfãos e provocou longas filas nos seus últimos dias de lojas abertas. No auge, teve 23 lojas, incluindo um ponto na rua mais luxuosa de São Paulo, a Oscar Freire. Por trás dessas idas e vindas da marca, no entanto, está uma briga societária que se arrasta na Justiça há 15 anos, com indenizações que podem superar os R$ 200 milhões.

Na segunda vez em que veio ao Brasil, com uma fábrica própria, a companhia britânica já tinha um histórico por aqui. Isso porque, inicialmente, o negócio chegara em 1999 por meio da empresária brasileira Sandra Isper Rocha. Depois de conhecer a Lush lá fora, ela decidiu negociar sua vinda ao País, pois achava que o negócio teria potencila no mercado brasileiro. “Fiquei fascinada pela ideia e conceito. Foram muitas ligações e insistência até sermos recebidos em Londres, pelos fundadores da Lush”, contou Sandra nesta semana, ao Estadão.

Sandra Isper Rocha, em foto de 2005, em sua antiga loja da Lush no Shopping Villa-Lobos Foto: Filipe Araújo/Estadão

A Lush surgiu em 1995, pelas mãos do empresário Mark Constantine, que até os anos 1970 trabalhava como cabeleireiro na Inglaterra e ganhou fama ao desenvolver cosméticos para seus próprios clientes. Isso o levou a ser descoberto pela The Body Shop – outra marca de apelo sustentável, hoje parte do grupo Natura & Co. –, onde trabalhou por cerca de uma década. Depois disso, ele resolveu empreender, criando a Lush e ampliando a aposta tanto no caráter “artesanal” quanto no apelo de sustentabilidade. Hoje, a empresa tem mais de 900 lojas pelo mundo.

Foi de olho nesses diferenciais que Sandra tentou trazer a rede ao País, não muito tempo após sua fundação. A primeira reunião foi em 1997 e a estreia veio dois anos depois. Mas não demorou muito, de acordo com a empresária, para que os problemas começassem a aparecer. O primeiro alerta veio quando a Lush alterou o prazo de pagamento das matérias-primas, que eram enviadas da Inglaterra até a fábrica no Brasil, em Cajamar, interior de São Paulo. “Nosso prazo de pagamento era inicialmente de 120 dias, sendo que os produtos demoravam cerca de 60 dias para chegar à fábrica. E eles passaram a pedir pagamento à vista, o que estrangulou nosso caixa”, lembra.

Essa exigência foi apenas o presságio do que viria pela frente. O embate real teve início em 2004, quando a matriz passou a questionar a atividade da subsidiária brasileira, afirmando que desconhecia os detalhes da operação. Na época, inclusive, decidiu por passar um pente fino na operação brasileira, enviando uma equipe de contadores ingleses ao Brasil. No fim desse “pente-fino”, depois de tentativas de acordo, a relação degringolou de vez.

Em 2006, a matriz interrompeu o fornecimento de matérias-primas e determinou o fim do acordo de licenciamento da marca, sepultando o negócio local, levando ao fechamento das lojas e ao encerramento das operações no Brasil. “Nos shoppings, meu pai e mãe eram os fiadores dos contratos. Foi um prejuízo gigantesco, além de ações trabalhistas. Tudo isso gerou um estrangulamento do nosso patrimônio.”

Pedido de indenização e documentos em mãos

O que Sandra pede na Justiça, desde 2007, é uma indenização por conta das dívidas que teve que assumir e, ainda, pelo que deixou de ganhar com o fechamento súbito de suas lojas, em valores atualizados. Agora, anos depois, o jogo de forças pode mudar. Ao menos é o que acredita a defesa da empresária. Isso porque foi encontrado um documento em que a Lush reconhece a sociedade, que foi protocolado e autenticado no consulado brasileiro em Londres. Agora está incluído como prova no processo.

O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País

Felipe Mangini, advogado de Sandra Isper Rocha

“O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil, como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País. A nosso ver, isso comprova que a decisão de rescindir o contrato de licenciamento foi friamente calculada, porque o que eles queriam era efetivamente tomar o mercado brasileiro”, diz Felipe Mangini, sócio do escritório Mangini Leite Siegl Mermerian Advogados, que representa Sandra. Posturas semelhantes, conforme a defesa, foram identificadas em outros países onde a Lush chegou por meio de sociedades, como em Hong Kong, Alemanha e Canadá.

Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado.”

Sandra Isper Rocha, empresária

Para a defesa da Sandra, a postura da Lush é explicada porque a empresa queria atuar no Brasil, mas sem sócios locais. Essa alegação é sustentada pelo fato de que, depois do fechamento das lojas por Sandra, a matriz inglesa decidiu, em 2014, reabrir as lojas da marca no País sem intermediários. A defesa aponta que, “curiosamente”, a principal loja aberta pela Lush funcionava exatamente em frente à antiga unidade que havia sido aberta por Sandra. “Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado”, diz Sandra.

Conforme o advogado, houve outro motivo para a Lush ter vindo ao País em 2014. O anúncio ocorreu logo depois do processo indenizatório de Sandra ter sido extinto pela Justiça. No entanto, a decisão foi revertida em 2018, quando Sandra teve de volta o direito de pedir indenização à Lush. Logo depois disso, a empresa britânica anunciou sua saída definitiva do País, sob a justificativa de que a carga tributária era impeditiva para sua atuação local. “Eles anunciaram a saída depois de um investimento gigantesco. Falar disso ainda é muito doloroso, mas agora estamos na reta final. Agora eu quero paz.”

Procurada, a Lush não retornou o pedido de entrevista.

Quando deixou o Brasil pela segunda vez, em 2018, a Lush, marca de cosméticos britânica com apelo “sustentável chique”, deixou uma legião de consumidores órfãos e provocou longas filas nos seus últimos dias de lojas abertas. No auge, teve 23 lojas, incluindo um ponto na rua mais luxuosa de São Paulo, a Oscar Freire. Por trás dessas idas e vindas da marca, no entanto, está uma briga societária que se arrasta na Justiça há 15 anos, com indenizações que podem superar os R$ 200 milhões.

Na segunda vez em que veio ao Brasil, com uma fábrica própria, a companhia britânica já tinha um histórico por aqui. Isso porque, inicialmente, o negócio chegara em 1999 por meio da empresária brasileira Sandra Isper Rocha. Depois de conhecer a Lush lá fora, ela decidiu negociar sua vinda ao País, pois achava que o negócio teria potencila no mercado brasileiro. “Fiquei fascinada pela ideia e conceito. Foram muitas ligações e insistência até sermos recebidos em Londres, pelos fundadores da Lush”, contou Sandra nesta semana, ao Estadão.

Sandra Isper Rocha, em foto de 2005, em sua antiga loja da Lush no Shopping Villa-Lobos Foto: Filipe Araújo/Estadão

A Lush surgiu em 1995, pelas mãos do empresário Mark Constantine, que até os anos 1970 trabalhava como cabeleireiro na Inglaterra e ganhou fama ao desenvolver cosméticos para seus próprios clientes. Isso o levou a ser descoberto pela The Body Shop – outra marca de apelo sustentável, hoje parte do grupo Natura & Co. –, onde trabalhou por cerca de uma década. Depois disso, ele resolveu empreender, criando a Lush e ampliando a aposta tanto no caráter “artesanal” quanto no apelo de sustentabilidade. Hoje, a empresa tem mais de 900 lojas pelo mundo.

Foi de olho nesses diferenciais que Sandra tentou trazer a rede ao País, não muito tempo após sua fundação. A primeira reunião foi em 1997 e a estreia veio dois anos depois. Mas não demorou muito, de acordo com a empresária, para que os problemas começassem a aparecer. O primeiro alerta veio quando a Lush alterou o prazo de pagamento das matérias-primas, que eram enviadas da Inglaterra até a fábrica no Brasil, em Cajamar, interior de São Paulo. “Nosso prazo de pagamento era inicialmente de 120 dias, sendo que os produtos demoravam cerca de 60 dias para chegar à fábrica. E eles passaram a pedir pagamento à vista, o que estrangulou nosso caixa”, lembra.

Essa exigência foi apenas o presságio do que viria pela frente. O embate real teve início em 2004, quando a matriz passou a questionar a atividade da subsidiária brasileira, afirmando que desconhecia os detalhes da operação. Na época, inclusive, decidiu por passar um pente fino na operação brasileira, enviando uma equipe de contadores ingleses ao Brasil. No fim desse “pente-fino”, depois de tentativas de acordo, a relação degringolou de vez.

Em 2006, a matriz interrompeu o fornecimento de matérias-primas e determinou o fim do acordo de licenciamento da marca, sepultando o negócio local, levando ao fechamento das lojas e ao encerramento das operações no Brasil. “Nos shoppings, meu pai e mãe eram os fiadores dos contratos. Foi um prejuízo gigantesco, além de ações trabalhistas. Tudo isso gerou um estrangulamento do nosso patrimônio.”

Pedido de indenização e documentos em mãos

O que Sandra pede na Justiça, desde 2007, é uma indenização por conta das dívidas que teve que assumir e, ainda, pelo que deixou de ganhar com o fechamento súbito de suas lojas, em valores atualizados. Agora, anos depois, o jogo de forças pode mudar. Ao menos é o que acredita a defesa da empresária. Isso porque foi encontrado um documento em que a Lush reconhece a sociedade, que foi protocolado e autenticado no consulado brasileiro em Londres. Agora está incluído como prova no processo.

O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País

Felipe Mangini, advogado de Sandra Isper Rocha

“O documento não só prova que desde o início a Lush era sócia efetiva da Sandra no Brasil, como mostra que eles tinham a expectativa de aumentar a participação no País. A nosso ver, isso comprova que a decisão de rescindir o contrato de licenciamento foi friamente calculada, porque o que eles queriam era efetivamente tomar o mercado brasileiro”, diz Felipe Mangini, sócio do escritório Mangini Leite Siegl Mermerian Advogados, que representa Sandra. Posturas semelhantes, conforme a defesa, foram identificadas em outros países onde a Lush chegou por meio de sociedades, como em Hong Kong, Alemanha e Canadá.

Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado.”

Sandra Isper Rocha, empresária

Para a defesa da Sandra, a postura da Lush é explicada porque a empresa queria atuar no Brasil, mas sem sócios locais. Essa alegação é sustentada pelo fato de que, depois do fechamento das lojas por Sandra, a matriz inglesa decidiu, em 2014, reabrir as lojas da marca no País sem intermediários. A defesa aponta que, “curiosamente”, a principal loja aberta pela Lush funcionava exatamente em frente à antiga unidade que havia sido aberta por Sandra. “Eles decidiram tomar o mercado dos sócios iniciais, foi algo planejado”, diz Sandra.

Conforme o advogado, houve outro motivo para a Lush ter vindo ao País em 2014. O anúncio ocorreu logo depois do processo indenizatório de Sandra ter sido extinto pela Justiça. No entanto, a decisão foi revertida em 2018, quando Sandra teve de volta o direito de pedir indenização à Lush. Logo depois disso, a empresa britânica anunciou sua saída definitiva do País, sob a justificativa de que a carga tributária era impeditiva para sua atuação local. “Eles anunciaram a saída depois de um investimento gigantesco. Falar disso ainda é muito doloroso, mas agora estamos na reta final. Agora eu quero paz.”

Procurada, a Lush não retornou o pedido de entrevista.

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