Depois de ser arrematada em um leilão por R$ 27,5 milhões, a antiga mansão de Edemar Cid Ferreira, ex-dono do Banco Santos, na rua Gália, no Morumbi, poderá ser demolida para dar lugar a um condomínio de casas de luxo, conforme apurou o Estadão. Desde 2020, o imóvel pertence ao empresário Janguiê Diniz, fundador do grupo Ser Educacional. O projeto passará agora por um estudo de viabilidade para a construção do empreendimento de luxo.
Conforme divulgado, o proprietário do imóvel contratou um escritório de arquitetura de São Paulo que ficará encarregado de analisar o processo e dialogar diretamente com a associação de moradores do bairro para tirar o projeto do papel.
A possível construção de casas de alto padrão ocorre após a Associação de Moradores do Morumbi frustrar os planos do empresário de construir uma uma instituição de ensino de alto padrão na propriedade. “Como a legislação municipal exige a anuência de um certo porcentual de moradores da vizinhança para a instalação de escolas no bairro, a Associação de Moradores do Morumbi não foi favorável à instalação da escola, basicamente por receio do aumento do trânsito no local”, explicou, em nota, Diniz.
Ainda no comunicado, o fundador do grupo comentou sobre os rumores de que o imóvel estaria em vias de ser demolido. O empresário alegou que, dado ao tempo em desuso de 15 anos, a mansão da rua Gália estaria “se deteriorando” com o passar dos anos, porém, ele negou que haja planos concretos de que o imóvel deva ser posto a baixo.
“Em virtude da inviabilidade da instalação da tão sonhada escola, o proprietário contratou um escritório de arquitetura renomado para estudar, nos termos da legislação vigente, a viabilidade da instalação de um condomínio horizontal de casas de alto padrão”, afirmou. “Após a conclusão do estudo e aprovação do município, será dada ciência ao bairro e à sociedade.”
Escola que não deu certo
Diniz chegou a divulgar que tinha planos de transformar o imóvel em uma instituição de ensino de alto padrão na região que abriga parte do PIB paulistano, mas não conseguiu seguir com os seus planos. À época, Diniz havia informado que a pandemia de covid-19 o teria feito mudar de ideia. Na ocasião, ele colocou o imóvel novamente à venda, que chegou a ser anunciado em uma imobiliária por R$ 70 milhões, quase o triplo do valor desembolsado pelo empresário quando arrematou a casa.
Desde que foi anunciada para o mercado, toda a transação de oferta do imóvel foi gerenciada pela imobiliária MBras, que detinha o direito a exclusividade na negociação.
Ao Estadão, um representante da imobiliária afirmou que a mansão havia sido vendida e, ainda este ano, deveria ser demolida para dar lugar ao empreendimento de altíssimo padrão. Contudo, o próprio Janguiê Diniz negou que teria se desfeito do bem arrematado em leilão. Na mesma rua da mansão, um imóvel bem mais “singelo”, com meros 1,3 mil metros quadrados não sai por menos de R$ 12 milhões, conforme anúncios de imobiliária de alto padrão.
História da mansão do Morumbi
Com projeto arquitetônico de Ruy Ohtake e paisagismo de Roberto Burle Marx, a mansão foi construída entre 2000 e 2004, ao custo de R$ 120 milhões. No entanto, o imóvel ficou pronto justamente na época em que o Banco Central decretou a falência do Banco Santos. À medida que os bens da instituição financeira e de seu dono passaram a ser confiscados para fazer frente às obrigações com o órgão regulador, de cerca de R$ 3 bilhões, a mansão também entrou no alvo da Justiça. Em 2011, o ex-banqueiro, que chegou a ser preso, foi obrigado a deixar o imóvel.
Veja como era a antiga mansão antes de ser vendida.
A antiga mansão milionária de Edemar Cid Ferreira
‘Dou-lhe uma, dou-lhe duas...’
À época do leilão, o imóvel havia sido avaliado em aproximadamente R$ 78 milhões, mas, após 16 lances no leilão, foi arrematado por apenas R$ 27 milhões.
A reportagem do Estadão visitou o imóvel, em 2017, em uma das tentativas de venda, em 2017. Instalada em terreno de 12 mil m², a residência tem 4,5 mil m² de área construída e inclui facilidades como duas piscinas – uma coberta e outra ao ar livre –, uma adega para cinco mil garrafas de vinho, duas bibliotecas (com coleção de livros de arte incluída). Alguns objetos de arte e móveis ainda restam na casa. Só a mesa de jantar de 24 lugares teria custado, na época da aquisição, US$ 350 mil (mais de R$ 1 milhão).
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Manter um imóvel dessa magnitude não é fácil nem barato. Desde a expulsão de Edemar, a residência – que, em um certo período, contabilizava quatro moradores e 54 empregados –, custou milhões de reais à massa falida. Isso porque o projeto do arquiteto Ruy Ohtake já incluía, 20 anos atrás, a automação de persianas e um sistema completo de ar-condicionado – luxos que elevaram a conta de luz para R$ 100 mil ao mês.
Hoje os problemas se proliferam entre corredores de mármore e escadarias suntuosas do imóvel: há pisos de madeira podres, lâmpadas caídas e portas que já não abrem e nem fecham.
Da disputa judicial para o loteamento de casas
Desde que o processo de falência do antigo Banco Santos foi iniciado, o imóvel da antiga mansão de Edemar Cid Ferreira esteve em meio a incontáveis processos judiciais. Um dos primeiros problemas foi o fato de o imóvel pertencer à Atalanta Participações, empresa da mulher de Ferreira que estava atrelado ao banco. Só depois que o pedido de extensão de falência foi aceito na Justiça é que o imóvel pode ser vendido, contudo, um contrato de locação da propriedade que durou até 2011 postergou ainda mais esse processo.
Com o fim do contrato, a Justiça pôde começar o processo de leilão da propriedade dentro da massa falida do antigo banco. Fontes ligadas ao processo judicial, ouvidas pelo Estadão, disseram que todo o processo de avaliação e conclusão do leilão foi “conturbado” diante da dificuldade dos credores de entender o rito do leilão.
O imóvel do bilionário chegou a ser avaliado no processo de leilão em R$ 110 milhões, valor esse que foi judicialmente questionado por um grupo de credores que acreditavam que a propriedade teria sido subavaliada. Mais tarde, outro inventariante avaliou a propriedade de mais de 12 mil metros quadrados em R$ 70 milhões, o que mais uma vez gerou questionamentos na Justiça sobre o preço.
No centro da disputa judicial, que tentava definir o valor do imóvel, outro bilionário acabou interessado pela propriedade. Uma fonte ouvida pela reportagem contou que, em 2017, o empresário Joesley Batista, do grupo JBS, chegou a enviar uma carta oficializando seu desejo de adquirir a mansão por R$ 120 milhões, valor da primeira avaliação do leilão, porém, logo em seguida, Batista acabou desistindo da compra, uma vez que seu nome foi parar no centro das discussões devido às acusações de corrupção. Meses mais tarde, o empresário seria indiciado e acabaria preso na operação Capitu, da Polícia Federal, um desdobramento da extinta Operação Lava jato.