Mondelez busca empresas no Brasil para crescer em chocolates e biscoitos, diz presidente


Gigante dos alimentos planeja dobrar seu faturamento global até 2030, e crescimento no Brasil, seja por via orgânica ou por aquisições é parte importante desse projeto, diz executivo

Por Lucas Agrela e Wesley Gonsalves
Atualização:
Foto: TABA BENEDICTO
Entrevista comLiel Miranda Presidente da Mondelez no Brasil

A multinacional de alimentos Mondelez traçou um plano de crescimento ousado: dobrar o faturamento até 2030. Para isso, o mercado brasileiro será essencial, de acordo com Liel Miranda, presidente da empresa no País. Miranda afirma que a Mondelez vê potencial para dobrar, ou até triplicar a venda per capita de chocolate no Brasil. Além do crescimento da própria operação, a companhia deixa claro que tem apetite, e dinheiro em caixa, para ampliar o faturamento por meio de aquisições de empresas por aqui, especialmente nos segmentos de chocolate e biscoitos. “Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo no País, só precisamos de alguém que queira vender a empresa”, diz o executivo.

Dona de marcas como Lacta, Bis, Sonho de Valsa, Oreo e Club Social, a gigante de alimentos pretende ampliar a compra de cacau cultivado no Brasil até 2025, por meio do programa Cocoa Life, que estimula práticas sustentáveis de plantio para evitar problemas sociais, como o trabalho infantil.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

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Liel Miranda, presidente da Mondelez, diz que há potencial de ampliar o consumo de chocolate per capita no Brasil. Foto: Taba Benedicto/Estadão

A inflação do chocolate foi cinco vezes maior do que a do índice geral nos últimos 12 meses. O que causou esse descolamento? Isso atrapalha as vendas de Páscoa?

O índice tem uma série de preços que não necessariamente refletem a inflação de oferta e demanda. A expectativa para a Páscoa é positiva. Tivemos anos muito positivos na categoria de chocolate, mas também em biscoitos e gomas e balas. Só que o chocolate cresceu consistentemente, a dois dígitos, nos últimos três anos. Para a Páscoa, não vai ser diferente.

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Ainda há espaço para ampliar o consumo do chocolate no País?

Sim. O consumo per capita anual ainda é de 2,5 kg no Brasil. Nos Estados Unidos é de 6 kg e, na Europa, é de 8 kg. O mercado de chocolate é uma área que nós acreditamos ter muito espaço para crescer.

No cenário econômico atual, vale mais a pena uma estratégia de crescimento inorgânico, baseado em aquisições de outras empresas?

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No mundo, o plano da Mondelez é dobrar o tamanho da empresa até 2030, indo de um faturamento anual de US$ 30 bilhões, em 2022, para US$ 60 bilhões. Temos de crescer organicamente cerca de 5% ao ano em nossa operação global. Mas isso não fará a empresa dobrar de tamanho. Então, uma parte desse crescimento será inorgânico (com aquisições). Nós estamos buscando oportunidades para consolidação, principalmente nos segmentos de chocolate e biscoito, que são os dois que queremos dar mais foco.

Nós compramos uma empresa no México, de US$ 600 milhões de faturamento, e compramos também uma marca de barras de cereal nos Estados Unidos, em 2022. Na Europa, compramos uma empresa de croissants, que tem faturamento de US$ 700 milhões. Então, só no ano passado, nós compramos (empresas com) quase US$ 2 bilhões de faturamento nos três continentes, e nós ainda temos uma agenda de aquisições para continuar nessa jornada. No Brasil, não será diferente, estamos olhando o mercado. Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo, só precisamos de alguém que queira vender a empresa.

Qual é a importância do Brasil nessa estratégia global de crescimento da Mondelez?

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Brasil, China, Índia, o sul do Vietnã e a Indonésia são os mercados que chamamos de emergentes. Esses países têm responsabilidade de manter o nosso crescimento anual de dígito duplo (acima de 10%), enquanto os mercados maduros crescem entre 2% e 3%. O Brasil tem de continuar crescendo a duplo dígito pelos próximos sete anos, até 2030. Então, confiamos que o mercado deve abrir oportunidades para fazer investimentos inorgânicos.

Como a empresa lida com o aumento de custos de ingredientes?

O que nós fizemos primeiro foi entender melhor o consumidor e lançar formatos diferentes dos nossos produtos. Antigamente, você comprava a bolacha Oreo em basicamente um só formato. Agora, você tem diferentes tamanhos, ou seja, são embalagens para todos os tamanhos de bolso. A segunda estratégia para conviver com os aumentos de custo foi que nós buscamos aumentar a nossa produtividade.

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Há uma expectativa de quando o mercado deve acalmar e essa pressão de custos arrefecer?

O pior já passou. O último grande problema que nós enfrentamos foi o fechamento da China (por causa da pandemia). Teve a desvalorização cambial, depois a covid-19 desequilibrando a cadeia de suprimentos no mundo todo, o aumento do custo do frete, e, agora, por fim, os fechamentos das cidades da China. Com relação à matéria-prima, até o final de 2022 tínhamos ainda alguma dificuldade, mas a cadeia está totalmente normalizada. Sentindo a menor pressão de custo, a indústria vai poder repassar menos o preço.

A troca de governo no Brasil representou alguma mudança para o negócio da Mondelez?

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Para nós, é indiferente. Como o nosso produto é de consumo frequente, por impulso, com marcas muito fortes, somos muito impactados pela condição econômica. Se a condição econômica não se altera, nosso ambiente de investimento em crescimento permanece o mesmo. Foi exatamente isso que aconteceu. No Brasil, a situação econômica está razoavelmente equilibrada. O dólar a R$ 5 varia pouco, a taxa de juros está alta, mas já incorporada no custo. A inflação chegou a 10% e agora está com a previsão de cair para 5%. O desemprego está caindo. Então, o ambiente econômico é difícil, mas não é volátil.

Para a marca, qual foi o impacto da mudança na lei das embalagens, que agora pede comunicação mais clara sobre quantidade de açúcares e gorduras?

Segundo nossas pesquisas, as pessoas já liam a tabela nutricional mesmo antes da lei. Nós temos nas nossas embalagens a informação da quantidade de calorias por porção. Nós já fazíamos questão de comunicar para o consumidor a quantidade de calorias dos nossos produtos. A comunicação na embalagem faz todo sentido porque é uma maneira de informar o consumidor ainda mais. Não acredito que isso terá impacto nas vendas.

O consumo excessivo de produtos como chocolates e biscoitos é sempre apontado como vilão da saúde dos consumidores. Como lidar com isso?

Hoje, mais de 25% do nosso volume é de unidades com menos de 200 calorias, porque nós partimos da ideia do consumo consciente dos nossos produtos. Obviamente, você quer comer chocolate porque ele é um impulso, uma indulgência, o que é importante. Durante a pandemia, uma pesquisa mostrou que 70% dos consumidores afirmaram que essa indulgência era fundamental para a saúde mental. É importante que as pessoas tenham acesso a esse prazer, mas com moderação.

Em vez de abrir uma barra e comer 80g de chocolate, você tem uma versão com 34g. Em vez de abrir um pacote de Oreo de 90g e comer os 10 biscoitos, você tem um pacote com quatro unidades e satisfaz a sua vontade sem comer excessivamente. A estratégia de diminuir o tamanho da embalagem cumpre esse papel também. Tem um problema de ‘reduflação’, mas a pessoa, às vezes, só quer comer um pedacinho.

Há planos para ampliar a produção de cacau no Brasil?

Atualmente, a nossa grande fonte de cacau é a África. O Brasil já foi o maior exportador de cacau do mundo, mas tivemos a praga “vassoura de bruxa”, nos anos 1990, que se alastrou na Bahia. Hoje, cerca de 25% do cacau que compramos no Brasil é produzido localmente. Até 2025, queremos comprar 100% do cacau produzido pelo programa Cocoa Life (de estímulo à produção sustentável), idealmente aqui no País. Essa meta de produzir aqui traz três benefícios. É ecologicamente bom porque o cacau é uma cultura nativa, não precisa desmatar para plantar. Em segundo lugar, vem o impacto social. Os produtores de cacau são normalmente famílias que trabalham com o cultivo da fruta. O Cocoa Life consegue dar para essas pessoas condições de vida porque nós investimos em tecnologia. Então, eles passam a ser produtores sustentáveis economicamente também. Por fim, há o impacto ambiental de trazer um cacau da África para cá, que é muito maior do que o de produzir localmente. Produzindo localmente, temos mais resiliência, porque sofremos menos com o risco de variação do preço do cacau global na Bolsa. O objetivo é claro, nós temos um investimento global de US$ 1 bilhão para produção de cacau sustentável.

A Mondelez tem a meta de comprar 100% do cacau vindo do programa Cocoa Life até 2025. Como está o progresso dessa meta?

Agora, o ganho de escala do programa até 2025 será mais fácil. A grande dificuldade foi cadastrar esses produtores rurais, treiná-los, fornecer o pacote tecnológico e eles começarem a produzir o cacau, que é uma cultura muito longa, que demora de quatro a cinco anos para dar frutos. Neste momento, nós estamos chegando no ponto em que vamos materializar esse projeto. Com isso, os produtores rurais terão a condição de fornecer uma quantidade maior de cacau que nós precisamos.

Esse programa também ajuda a combater, por exemplo casos de trabalho infantil, que são comuns na cadeia mundial de cacau?

Com certeza. Parte da essência do programa é que não tem desmatamento, respeita todas as legislações ambientais e as famílias de produtores têm uma renda mínima para que possam trabalhar e colocar as crianças na escola. Também temos parcerias com ONGs que investem na educação das comunidades que produzem cacau.

A multinacional de alimentos Mondelez traçou um plano de crescimento ousado: dobrar o faturamento até 2030. Para isso, o mercado brasileiro será essencial, de acordo com Liel Miranda, presidente da empresa no País. Miranda afirma que a Mondelez vê potencial para dobrar, ou até triplicar a venda per capita de chocolate no Brasil. Além do crescimento da própria operação, a companhia deixa claro que tem apetite, e dinheiro em caixa, para ampliar o faturamento por meio de aquisições de empresas por aqui, especialmente nos segmentos de chocolate e biscoitos. “Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo no País, só precisamos de alguém que queira vender a empresa”, diz o executivo.

Dona de marcas como Lacta, Bis, Sonho de Valsa, Oreo e Club Social, a gigante de alimentos pretende ampliar a compra de cacau cultivado no Brasil até 2025, por meio do programa Cocoa Life, que estimula práticas sustentáveis de plantio para evitar problemas sociais, como o trabalho infantil.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Liel Miranda, presidente da Mondelez, diz que há potencial de ampliar o consumo de chocolate per capita no Brasil. Foto: Taba Benedicto/Estadão

A inflação do chocolate foi cinco vezes maior do que a do índice geral nos últimos 12 meses. O que causou esse descolamento? Isso atrapalha as vendas de Páscoa?

O índice tem uma série de preços que não necessariamente refletem a inflação de oferta e demanda. A expectativa para a Páscoa é positiva. Tivemos anos muito positivos na categoria de chocolate, mas também em biscoitos e gomas e balas. Só que o chocolate cresceu consistentemente, a dois dígitos, nos últimos três anos. Para a Páscoa, não vai ser diferente.

Ainda há espaço para ampliar o consumo do chocolate no País?

Sim. O consumo per capita anual ainda é de 2,5 kg no Brasil. Nos Estados Unidos é de 6 kg e, na Europa, é de 8 kg. O mercado de chocolate é uma área que nós acreditamos ter muito espaço para crescer.

No cenário econômico atual, vale mais a pena uma estratégia de crescimento inorgânico, baseado em aquisições de outras empresas?

No mundo, o plano da Mondelez é dobrar o tamanho da empresa até 2030, indo de um faturamento anual de US$ 30 bilhões, em 2022, para US$ 60 bilhões. Temos de crescer organicamente cerca de 5% ao ano em nossa operação global. Mas isso não fará a empresa dobrar de tamanho. Então, uma parte desse crescimento será inorgânico (com aquisições). Nós estamos buscando oportunidades para consolidação, principalmente nos segmentos de chocolate e biscoito, que são os dois que queremos dar mais foco.

Nós compramos uma empresa no México, de US$ 600 milhões de faturamento, e compramos também uma marca de barras de cereal nos Estados Unidos, em 2022. Na Europa, compramos uma empresa de croissants, que tem faturamento de US$ 700 milhões. Então, só no ano passado, nós compramos (empresas com) quase US$ 2 bilhões de faturamento nos três continentes, e nós ainda temos uma agenda de aquisições para continuar nessa jornada. No Brasil, não será diferente, estamos olhando o mercado. Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo, só precisamos de alguém que queira vender a empresa.

Qual é a importância do Brasil nessa estratégia global de crescimento da Mondelez?

Brasil, China, Índia, o sul do Vietnã e a Indonésia são os mercados que chamamos de emergentes. Esses países têm responsabilidade de manter o nosso crescimento anual de dígito duplo (acima de 10%), enquanto os mercados maduros crescem entre 2% e 3%. O Brasil tem de continuar crescendo a duplo dígito pelos próximos sete anos, até 2030. Então, confiamos que o mercado deve abrir oportunidades para fazer investimentos inorgânicos.

Como a empresa lida com o aumento de custos de ingredientes?

O que nós fizemos primeiro foi entender melhor o consumidor e lançar formatos diferentes dos nossos produtos. Antigamente, você comprava a bolacha Oreo em basicamente um só formato. Agora, você tem diferentes tamanhos, ou seja, são embalagens para todos os tamanhos de bolso. A segunda estratégia para conviver com os aumentos de custo foi que nós buscamos aumentar a nossa produtividade.

Há uma expectativa de quando o mercado deve acalmar e essa pressão de custos arrefecer?

O pior já passou. O último grande problema que nós enfrentamos foi o fechamento da China (por causa da pandemia). Teve a desvalorização cambial, depois a covid-19 desequilibrando a cadeia de suprimentos no mundo todo, o aumento do custo do frete, e, agora, por fim, os fechamentos das cidades da China. Com relação à matéria-prima, até o final de 2022 tínhamos ainda alguma dificuldade, mas a cadeia está totalmente normalizada. Sentindo a menor pressão de custo, a indústria vai poder repassar menos o preço.

A troca de governo no Brasil representou alguma mudança para o negócio da Mondelez?

Para nós, é indiferente. Como o nosso produto é de consumo frequente, por impulso, com marcas muito fortes, somos muito impactados pela condição econômica. Se a condição econômica não se altera, nosso ambiente de investimento em crescimento permanece o mesmo. Foi exatamente isso que aconteceu. No Brasil, a situação econômica está razoavelmente equilibrada. O dólar a R$ 5 varia pouco, a taxa de juros está alta, mas já incorporada no custo. A inflação chegou a 10% e agora está com a previsão de cair para 5%. O desemprego está caindo. Então, o ambiente econômico é difícil, mas não é volátil.

Para a marca, qual foi o impacto da mudança na lei das embalagens, que agora pede comunicação mais clara sobre quantidade de açúcares e gorduras?

Segundo nossas pesquisas, as pessoas já liam a tabela nutricional mesmo antes da lei. Nós temos nas nossas embalagens a informação da quantidade de calorias por porção. Nós já fazíamos questão de comunicar para o consumidor a quantidade de calorias dos nossos produtos. A comunicação na embalagem faz todo sentido porque é uma maneira de informar o consumidor ainda mais. Não acredito que isso terá impacto nas vendas.

O consumo excessivo de produtos como chocolates e biscoitos é sempre apontado como vilão da saúde dos consumidores. Como lidar com isso?

Hoje, mais de 25% do nosso volume é de unidades com menos de 200 calorias, porque nós partimos da ideia do consumo consciente dos nossos produtos. Obviamente, você quer comer chocolate porque ele é um impulso, uma indulgência, o que é importante. Durante a pandemia, uma pesquisa mostrou que 70% dos consumidores afirmaram que essa indulgência era fundamental para a saúde mental. É importante que as pessoas tenham acesso a esse prazer, mas com moderação.

Em vez de abrir uma barra e comer 80g de chocolate, você tem uma versão com 34g. Em vez de abrir um pacote de Oreo de 90g e comer os 10 biscoitos, você tem um pacote com quatro unidades e satisfaz a sua vontade sem comer excessivamente. A estratégia de diminuir o tamanho da embalagem cumpre esse papel também. Tem um problema de ‘reduflação’, mas a pessoa, às vezes, só quer comer um pedacinho.

Há planos para ampliar a produção de cacau no Brasil?

Atualmente, a nossa grande fonte de cacau é a África. O Brasil já foi o maior exportador de cacau do mundo, mas tivemos a praga “vassoura de bruxa”, nos anos 1990, que se alastrou na Bahia. Hoje, cerca de 25% do cacau que compramos no Brasil é produzido localmente. Até 2025, queremos comprar 100% do cacau produzido pelo programa Cocoa Life (de estímulo à produção sustentável), idealmente aqui no País. Essa meta de produzir aqui traz três benefícios. É ecologicamente bom porque o cacau é uma cultura nativa, não precisa desmatar para plantar. Em segundo lugar, vem o impacto social. Os produtores de cacau são normalmente famílias que trabalham com o cultivo da fruta. O Cocoa Life consegue dar para essas pessoas condições de vida porque nós investimos em tecnologia. Então, eles passam a ser produtores sustentáveis economicamente também. Por fim, há o impacto ambiental de trazer um cacau da África para cá, que é muito maior do que o de produzir localmente. Produzindo localmente, temos mais resiliência, porque sofremos menos com o risco de variação do preço do cacau global na Bolsa. O objetivo é claro, nós temos um investimento global de US$ 1 bilhão para produção de cacau sustentável.

A Mondelez tem a meta de comprar 100% do cacau vindo do programa Cocoa Life até 2025. Como está o progresso dessa meta?

Agora, o ganho de escala do programa até 2025 será mais fácil. A grande dificuldade foi cadastrar esses produtores rurais, treiná-los, fornecer o pacote tecnológico e eles começarem a produzir o cacau, que é uma cultura muito longa, que demora de quatro a cinco anos para dar frutos. Neste momento, nós estamos chegando no ponto em que vamos materializar esse projeto. Com isso, os produtores rurais terão a condição de fornecer uma quantidade maior de cacau que nós precisamos.

Esse programa também ajuda a combater, por exemplo casos de trabalho infantil, que são comuns na cadeia mundial de cacau?

Com certeza. Parte da essência do programa é que não tem desmatamento, respeita todas as legislações ambientais e as famílias de produtores têm uma renda mínima para que possam trabalhar e colocar as crianças na escola. Também temos parcerias com ONGs que investem na educação das comunidades que produzem cacau.

A multinacional de alimentos Mondelez traçou um plano de crescimento ousado: dobrar o faturamento até 2030. Para isso, o mercado brasileiro será essencial, de acordo com Liel Miranda, presidente da empresa no País. Miranda afirma que a Mondelez vê potencial para dobrar, ou até triplicar a venda per capita de chocolate no Brasil. Além do crescimento da própria operação, a companhia deixa claro que tem apetite, e dinheiro em caixa, para ampliar o faturamento por meio de aquisições de empresas por aqui, especialmente nos segmentos de chocolate e biscoitos. “Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo no País, só precisamos de alguém que queira vender a empresa”, diz o executivo.

Dona de marcas como Lacta, Bis, Sonho de Valsa, Oreo e Club Social, a gigante de alimentos pretende ampliar a compra de cacau cultivado no Brasil até 2025, por meio do programa Cocoa Life, que estimula práticas sustentáveis de plantio para evitar problemas sociais, como o trabalho infantil.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Liel Miranda, presidente da Mondelez, diz que há potencial de ampliar o consumo de chocolate per capita no Brasil. Foto: Taba Benedicto/Estadão

A inflação do chocolate foi cinco vezes maior do que a do índice geral nos últimos 12 meses. O que causou esse descolamento? Isso atrapalha as vendas de Páscoa?

O índice tem uma série de preços que não necessariamente refletem a inflação de oferta e demanda. A expectativa para a Páscoa é positiva. Tivemos anos muito positivos na categoria de chocolate, mas também em biscoitos e gomas e balas. Só que o chocolate cresceu consistentemente, a dois dígitos, nos últimos três anos. Para a Páscoa, não vai ser diferente.

Ainda há espaço para ampliar o consumo do chocolate no País?

Sim. O consumo per capita anual ainda é de 2,5 kg no Brasil. Nos Estados Unidos é de 6 kg e, na Europa, é de 8 kg. O mercado de chocolate é uma área que nós acreditamos ter muito espaço para crescer.

No cenário econômico atual, vale mais a pena uma estratégia de crescimento inorgânico, baseado em aquisições de outras empresas?

No mundo, o plano da Mondelez é dobrar o tamanho da empresa até 2030, indo de um faturamento anual de US$ 30 bilhões, em 2022, para US$ 60 bilhões. Temos de crescer organicamente cerca de 5% ao ano em nossa operação global. Mas isso não fará a empresa dobrar de tamanho. Então, uma parte desse crescimento será inorgânico (com aquisições). Nós estamos buscando oportunidades para consolidação, principalmente nos segmentos de chocolate e biscoito, que são os dois que queremos dar mais foco.

Nós compramos uma empresa no México, de US$ 600 milhões de faturamento, e compramos também uma marca de barras de cereal nos Estados Unidos, em 2022. Na Europa, compramos uma empresa de croissants, que tem faturamento de US$ 700 milhões. Então, só no ano passado, nós compramos (empresas com) quase US$ 2 bilhões de faturamento nos três continentes, e nós ainda temos uma agenda de aquisições para continuar nessa jornada. No Brasil, não será diferente, estamos olhando o mercado. Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo, só precisamos de alguém que queira vender a empresa.

Qual é a importância do Brasil nessa estratégia global de crescimento da Mondelez?

Brasil, China, Índia, o sul do Vietnã e a Indonésia são os mercados que chamamos de emergentes. Esses países têm responsabilidade de manter o nosso crescimento anual de dígito duplo (acima de 10%), enquanto os mercados maduros crescem entre 2% e 3%. O Brasil tem de continuar crescendo a duplo dígito pelos próximos sete anos, até 2030. Então, confiamos que o mercado deve abrir oportunidades para fazer investimentos inorgânicos.

Como a empresa lida com o aumento de custos de ingredientes?

O que nós fizemos primeiro foi entender melhor o consumidor e lançar formatos diferentes dos nossos produtos. Antigamente, você comprava a bolacha Oreo em basicamente um só formato. Agora, você tem diferentes tamanhos, ou seja, são embalagens para todos os tamanhos de bolso. A segunda estratégia para conviver com os aumentos de custo foi que nós buscamos aumentar a nossa produtividade.

Há uma expectativa de quando o mercado deve acalmar e essa pressão de custos arrefecer?

O pior já passou. O último grande problema que nós enfrentamos foi o fechamento da China (por causa da pandemia). Teve a desvalorização cambial, depois a covid-19 desequilibrando a cadeia de suprimentos no mundo todo, o aumento do custo do frete, e, agora, por fim, os fechamentos das cidades da China. Com relação à matéria-prima, até o final de 2022 tínhamos ainda alguma dificuldade, mas a cadeia está totalmente normalizada. Sentindo a menor pressão de custo, a indústria vai poder repassar menos o preço.

A troca de governo no Brasil representou alguma mudança para o negócio da Mondelez?

Para nós, é indiferente. Como o nosso produto é de consumo frequente, por impulso, com marcas muito fortes, somos muito impactados pela condição econômica. Se a condição econômica não se altera, nosso ambiente de investimento em crescimento permanece o mesmo. Foi exatamente isso que aconteceu. No Brasil, a situação econômica está razoavelmente equilibrada. O dólar a R$ 5 varia pouco, a taxa de juros está alta, mas já incorporada no custo. A inflação chegou a 10% e agora está com a previsão de cair para 5%. O desemprego está caindo. Então, o ambiente econômico é difícil, mas não é volátil.

Para a marca, qual foi o impacto da mudança na lei das embalagens, que agora pede comunicação mais clara sobre quantidade de açúcares e gorduras?

Segundo nossas pesquisas, as pessoas já liam a tabela nutricional mesmo antes da lei. Nós temos nas nossas embalagens a informação da quantidade de calorias por porção. Nós já fazíamos questão de comunicar para o consumidor a quantidade de calorias dos nossos produtos. A comunicação na embalagem faz todo sentido porque é uma maneira de informar o consumidor ainda mais. Não acredito que isso terá impacto nas vendas.

O consumo excessivo de produtos como chocolates e biscoitos é sempre apontado como vilão da saúde dos consumidores. Como lidar com isso?

Hoje, mais de 25% do nosso volume é de unidades com menos de 200 calorias, porque nós partimos da ideia do consumo consciente dos nossos produtos. Obviamente, você quer comer chocolate porque ele é um impulso, uma indulgência, o que é importante. Durante a pandemia, uma pesquisa mostrou que 70% dos consumidores afirmaram que essa indulgência era fundamental para a saúde mental. É importante que as pessoas tenham acesso a esse prazer, mas com moderação.

Em vez de abrir uma barra e comer 80g de chocolate, você tem uma versão com 34g. Em vez de abrir um pacote de Oreo de 90g e comer os 10 biscoitos, você tem um pacote com quatro unidades e satisfaz a sua vontade sem comer excessivamente. A estratégia de diminuir o tamanho da embalagem cumpre esse papel também. Tem um problema de ‘reduflação’, mas a pessoa, às vezes, só quer comer um pedacinho.

Há planos para ampliar a produção de cacau no Brasil?

Atualmente, a nossa grande fonte de cacau é a África. O Brasil já foi o maior exportador de cacau do mundo, mas tivemos a praga “vassoura de bruxa”, nos anos 1990, que se alastrou na Bahia. Hoje, cerca de 25% do cacau que compramos no Brasil é produzido localmente. Até 2025, queremos comprar 100% do cacau produzido pelo programa Cocoa Life (de estímulo à produção sustentável), idealmente aqui no País. Essa meta de produzir aqui traz três benefícios. É ecologicamente bom porque o cacau é uma cultura nativa, não precisa desmatar para plantar. Em segundo lugar, vem o impacto social. Os produtores de cacau são normalmente famílias que trabalham com o cultivo da fruta. O Cocoa Life consegue dar para essas pessoas condições de vida porque nós investimos em tecnologia. Então, eles passam a ser produtores sustentáveis economicamente também. Por fim, há o impacto ambiental de trazer um cacau da África para cá, que é muito maior do que o de produzir localmente. Produzindo localmente, temos mais resiliência, porque sofremos menos com o risco de variação do preço do cacau global na Bolsa. O objetivo é claro, nós temos um investimento global de US$ 1 bilhão para produção de cacau sustentável.

A Mondelez tem a meta de comprar 100% do cacau vindo do programa Cocoa Life até 2025. Como está o progresso dessa meta?

Agora, o ganho de escala do programa até 2025 será mais fácil. A grande dificuldade foi cadastrar esses produtores rurais, treiná-los, fornecer o pacote tecnológico e eles começarem a produzir o cacau, que é uma cultura muito longa, que demora de quatro a cinco anos para dar frutos. Neste momento, nós estamos chegando no ponto em que vamos materializar esse projeto. Com isso, os produtores rurais terão a condição de fornecer uma quantidade maior de cacau que nós precisamos.

Esse programa também ajuda a combater, por exemplo casos de trabalho infantil, que são comuns na cadeia mundial de cacau?

Com certeza. Parte da essência do programa é que não tem desmatamento, respeita todas as legislações ambientais e as famílias de produtores têm uma renda mínima para que possam trabalhar e colocar as crianças na escola. Também temos parcerias com ONGs que investem na educação das comunidades que produzem cacau.

A multinacional de alimentos Mondelez traçou um plano de crescimento ousado: dobrar o faturamento até 2030. Para isso, o mercado brasileiro será essencial, de acordo com Liel Miranda, presidente da empresa no País. Miranda afirma que a Mondelez vê potencial para dobrar, ou até triplicar a venda per capita de chocolate no Brasil. Além do crescimento da própria operação, a companhia deixa claro que tem apetite, e dinheiro em caixa, para ampliar o faturamento por meio de aquisições de empresas por aqui, especialmente nos segmentos de chocolate e biscoitos. “Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo no País, só precisamos de alguém que queira vender a empresa”, diz o executivo.

Dona de marcas como Lacta, Bis, Sonho de Valsa, Oreo e Club Social, a gigante de alimentos pretende ampliar a compra de cacau cultivado no Brasil até 2025, por meio do programa Cocoa Life, que estimula práticas sustentáveis de plantio para evitar problemas sociais, como o trabalho infantil.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Liel Miranda, presidente da Mondelez, diz que há potencial de ampliar o consumo de chocolate per capita no Brasil. Foto: Taba Benedicto/Estadão

A inflação do chocolate foi cinco vezes maior do que a do índice geral nos últimos 12 meses. O que causou esse descolamento? Isso atrapalha as vendas de Páscoa?

O índice tem uma série de preços que não necessariamente refletem a inflação de oferta e demanda. A expectativa para a Páscoa é positiva. Tivemos anos muito positivos na categoria de chocolate, mas também em biscoitos e gomas e balas. Só que o chocolate cresceu consistentemente, a dois dígitos, nos últimos três anos. Para a Páscoa, não vai ser diferente.

Ainda há espaço para ampliar o consumo do chocolate no País?

Sim. O consumo per capita anual ainda é de 2,5 kg no Brasil. Nos Estados Unidos é de 6 kg e, na Europa, é de 8 kg. O mercado de chocolate é uma área que nós acreditamos ter muito espaço para crescer.

No cenário econômico atual, vale mais a pena uma estratégia de crescimento inorgânico, baseado em aquisições de outras empresas?

No mundo, o plano da Mondelez é dobrar o tamanho da empresa até 2030, indo de um faturamento anual de US$ 30 bilhões, em 2022, para US$ 60 bilhões. Temos de crescer organicamente cerca de 5% ao ano em nossa operação global. Mas isso não fará a empresa dobrar de tamanho. Então, uma parte desse crescimento será inorgânico (com aquisições). Nós estamos buscando oportunidades para consolidação, principalmente nos segmentos de chocolate e biscoito, que são os dois que queremos dar mais foco.

Nós compramos uma empresa no México, de US$ 600 milhões de faturamento, e compramos também uma marca de barras de cereal nos Estados Unidos, em 2022. Na Europa, compramos uma empresa de croissants, que tem faturamento de US$ 700 milhões. Então, só no ano passado, nós compramos (empresas com) quase US$ 2 bilhões de faturamento nos três continentes, e nós ainda temos uma agenda de aquisições para continuar nessa jornada. No Brasil, não será diferente, estamos olhando o mercado. Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo, só precisamos de alguém que queira vender a empresa.

Qual é a importância do Brasil nessa estratégia global de crescimento da Mondelez?

Brasil, China, Índia, o sul do Vietnã e a Indonésia são os mercados que chamamos de emergentes. Esses países têm responsabilidade de manter o nosso crescimento anual de dígito duplo (acima de 10%), enquanto os mercados maduros crescem entre 2% e 3%. O Brasil tem de continuar crescendo a duplo dígito pelos próximos sete anos, até 2030. Então, confiamos que o mercado deve abrir oportunidades para fazer investimentos inorgânicos.

Como a empresa lida com o aumento de custos de ingredientes?

O que nós fizemos primeiro foi entender melhor o consumidor e lançar formatos diferentes dos nossos produtos. Antigamente, você comprava a bolacha Oreo em basicamente um só formato. Agora, você tem diferentes tamanhos, ou seja, são embalagens para todos os tamanhos de bolso. A segunda estratégia para conviver com os aumentos de custo foi que nós buscamos aumentar a nossa produtividade.

Há uma expectativa de quando o mercado deve acalmar e essa pressão de custos arrefecer?

O pior já passou. O último grande problema que nós enfrentamos foi o fechamento da China (por causa da pandemia). Teve a desvalorização cambial, depois a covid-19 desequilibrando a cadeia de suprimentos no mundo todo, o aumento do custo do frete, e, agora, por fim, os fechamentos das cidades da China. Com relação à matéria-prima, até o final de 2022 tínhamos ainda alguma dificuldade, mas a cadeia está totalmente normalizada. Sentindo a menor pressão de custo, a indústria vai poder repassar menos o preço.

A troca de governo no Brasil representou alguma mudança para o negócio da Mondelez?

Para nós, é indiferente. Como o nosso produto é de consumo frequente, por impulso, com marcas muito fortes, somos muito impactados pela condição econômica. Se a condição econômica não se altera, nosso ambiente de investimento em crescimento permanece o mesmo. Foi exatamente isso que aconteceu. No Brasil, a situação econômica está razoavelmente equilibrada. O dólar a R$ 5 varia pouco, a taxa de juros está alta, mas já incorporada no custo. A inflação chegou a 10% e agora está com a previsão de cair para 5%. O desemprego está caindo. Então, o ambiente econômico é difícil, mas não é volátil.

Para a marca, qual foi o impacto da mudança na lei das embalagens, que agora pede comunicação mais clara sobre quantidade de açúcares e gorduras?

Segundo nossas pesquisas, as pessoas já liam a tabela nutricional mesmo antes da lei. Nós temos nas nossas embalagens a informação da quantidade de calorias por porção. Nós já fazíamos questão de comunicar para o consumidor a quantidade de calorias dos nossos produtos. A comunicação na embalagem faz todo sentido porque é uma maneira de informar o consumidor ainda mais. Não acredito que isso terá impacto nas vendas.

O consumo excessivo de produtos como chocolates e biscoitos é sempre apontado como vilão da saúde dos consumidores. Como lidar com isso?

Hoje, mais de 25% do nosso volume é de unidades com menos de 200 calorias, porque nós partimos da ideia do consumo consciente dos nossos produtos. Obviamente, você quer comer chocolate porque ele é um impulso, uma indulgência, o que é importante. Durante a pandemia, uma pesquisa mostrou que 70% dos consumidores afirmaram que essa indulgência era fundamental para a saúde mental. É importante que as pessoas tenham acesso a esse prazer, mas com moderação.

Em vez de abrir uma barra e comer 80g de chocolate, você tem uma versão com 34g. Em vez de abrir um pacote de Oreo de 90g e comer os 10 biscoitos, você tem um pacote com quatro unidades e satisfaz a sua vontade sem comer excessivamente. A estratégia de diminuir o tamanho da embalagem cumpre esse papel também. Tem um problema de ‘reduflação’, mas a pessoa, às vezes, só quer comer um pedacinho.

Há planos para ampliar a produção de cacau no Brasil?

Atualmente, a nossa grande fonte de cacau é a África. O Brasil já foi o maior exportador de cacau do mundo, mas tivemos a praga “vassoura de bruxa”, nos anos 1990, que se alastrou na Bahia. Hoje, cerca de 25% do cacau que compramos no Brasil é produzido localmente. Até 2025, queremos comprar 100% do cacau produzido pelo programa Cocoa Life (de estímulo à produção sustentável), idealmente aqui no País. Essa meta de produzir aqui traz três benefícios. É ecologicamente bom porque o cacau é uma cultura nativa, não precisa desmatar para plantar. Em segundo lugar, vem o impacto social. Os produtores de cacau são normalmente famílias que trabalham com o cultivo da fruta. O Cocoa Life consegue dar para essas pessoas condições de vida porque nós investimos em tecnologia. Então, eles passam a ser produtores sustentáveis economicamente também. Por fim, há o impacto ambiental de trazer um cacau da África para cá, que é muito maior do que o de produzir localmente. Produzindo localmente, temos mais resiliência, porque sofremos menos com o risco de variação do preço do cacau global na Bolsa. O objetivo é claro, nós temos um investimento global de US$ 1 bilhão para produção de cacau sustentável.

A Mondelez tem a meta de comprar 100% do cacau vindo do programa Cocoa Life até 2025. Como está o progresso dessa meta?

Agora, o ganho de escala do programa até 2025 será mais fácil. A grande dificuldade foi cadastrar esses produtores rurais, treiná-los, fornecer o pacote tecnológico e eles começarem a produzir o cacau, que é uma cultura muito longa, que demora de quatro a cinco anos para dar frutos. Neste momento, nós estamos chegando no ponto em que vamos materializar esse projeto. Com isso, os produtores rurais terão a condição de fornecer uma quantidade maior de cacau que nós precisamos.

Esse programa também ajuda a combater, por exemplo casos de trabalho infantil, que são comuns na cadeia mundial de cacau?

Com certeza. Parte da essência do programa é que não tem desmatamento, respeita todas as legislações ambientais e as famílias de produtores têm uma renda mínima para que possam trabalhar e colocar as crianças na escola. Também temos parcerias com ONGs que investem na educação das comunidades que produzem cacau.

A multinacional de alimentos Mondelez traçou um plano de crescimento ousado: dobrar o faturamento até 2030. Para isso, o mercado brasileiro será essencial, de acordo com Liel Miranda, presidente da empresa no País. Miranda afirma que a Mondelez vê potencial para dobrar, ou até triplicar a venda per capita de chocolate no Brasil. Além do crescimento da própria operação, a companhia deixa claro que tem apetite, e dinheiro em caixa, para ampliar o faturamento por meio de aquisições de empresas por aqui, especialmente nos segmentos de chocolate e biscoitos. “Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo no País, só precisamos de alguém que queira vender a empresa”, diz o executivo.

Dona de marcas como Lacta, Bis, Sonho de Valsa, Oreo e Club Social, a gigante de alimentos pretende ampliar a compra de cacau cultivado no Brasil até 2025, por meio do programa Cocoa Life, que estimula práticas sustentáveis de plantio para evitar problemas sociais, como o trabalho infantil.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Liel Miranda, presidente da Mondelez, diz que há potencial de ampliar o consumo de chocolate per capita no Brasil. Foto: Taba Benedicto/Estadão

A inflação do chocolate foi cinco vezes maior do que a do índice geral nos últimos 12 meses. O que causou esse descolamento? Isso atrapalha as vendas de Páscoa?

O índice tem uma série de preços que não necessariamente refletem a inflação de oferta e demanda. A expectativa para a Páscoa é positiva. Tivemos anos muito positivos na categoria de chocolate, mas também em biscoitos e gomas e balas. Só que o chocolate cresceu consistentemente, a dois dígitos, nos últimos três anos. Para a Páscoa, não vai ser diferente.

Ainda há espaço para ampliar o consumo do chocolate no País?

Sim. O consumo per capita anual ainda é de 2,5 kg no Brasil. Nos Estados Unidos é de 6 kg e, na Europa, é de 8 kg. O mercado de chocolate é uma área que nós acreditamos ter muito espaço para crescer.

No cenário econômico atual, vale mais a pena uma estratégia de crescimento inorgânico, baseado em aquisições de outras empresas?

No mundo, o plano da Mondelez é dobrar o tamanho da empresa até 2030, indo de um faturamento anual de US$ 30 bilhões, em 2022, para US$ 60 bilhões. Temos de crescer organicamente cerca de 5% ao ano em nossa operação global. Mas isso não fará a empresa dobrar de tamanho. Então, uma parte desse crescimento será inorgânico (com aquisições). Nós estamos buscando oportunidades para consolidação, principalmente nos segmentos de chocolate e biscoito, que são os dois que queremos dar mais foco.

Nós compramos uma empresa no México, de US$ 600 milhões de faturamento, e compramos também uma marca de barras de cereal nos Estados Unidos, em 2022. Na Europa, compramos uma empresa de croissants, que tem faturamento de US$ 700 milhões. Então, só no ano passado, nós compramos (empresas com) quase US$ 2 bilhões de faturamento nos três continentes, e nós ainda temos uma agenda de aquisições para continuar nessa jornada. No Brasil, não será diferente, estamos olhando o mercado. Estamos falando com os concorrentes diretos e queremos comprar para que nós possamos continuar crescendo, só precisamos de alguém que queira vender a empresa.

Qual é a importância do Brasil nessa estratégia global de crescimento da Mondelez?

Brasil, China, Índia, o sul do Vietnã e a Indonésia são os mercados que chamamos de emergentes. Esses países têm responsabilidade de manter o nosso crescimento anual de dígito duplo (acima de 10%), enquanto os mercados maduros crescem entre 2% e 3%. O Brasil tem de continuar crescendo a duplo dígito pelos próximos sete anos, até 2030. Então, confiamos que o mercado deve abrir oportunidades para fazer investimentos inorgânicos.

Como a empresa lida com o aumento de custos de ingredientes?

O que nós fizemos primeiro foi entender melhor o consumidor e lançar formatos diferentes dos nossos produtos. Antigamente, você comprava a bolacha Oreo em basicamente um só formato. Agora, você tem diferentes tamanhos, ou seja, são embalagens para todos os tamanhos de bolso. A segunda estratégia para conviver com os aumentos de custo foi que nós buscamos aumentar a nossa produtividade.

Há uma expectativa de quando o mercado deve acalmar e essa pressão de custos arrefecer?

O pior já passou. O último grande problema que nós enfrentamos foi o fechamento da China (por causa da pandemia). Teve a desvalorização cambial, depois a covid-19 desequilibrando a cadeia de suprimentos no mundo todo, o aumento do custo do frete, e, agora, por fim, os fechamentos das cidades da China. Com relação à matéria-prima, até o final de 2022 tínhamos ainda alguma dificuldade, mas a cadeia está totalmente normalizada. Sentindo a menor pressão de custo, a indústria vai poder repassar menos o preço.

A troca de governo no Brasil representou alguma mudança para o negócio da Mondelez?

Para nós, é indiferente. Como o nosso produto é de consumo frequente, por impulso, com marcas muito fortes, somos muito impactados pela condição econômica. Se a condição econômica não se altera, nosso ambiente de investimento em crescimento permanece o mesmo. Foi exatamente isso que aconteceu. No Brasil, a situação econômica está razoavelmente equilibrada. O dólar a R$ 5 varia pouco, a taxa de juros está alta, mas já incorporada no custo. A inflação chegou a 10% e agora está com a previsão de cair para 5%. O desemprego está caindo. Então, o ambiente econômico é difícil, mas não é volátil.

Para a marca, qual foi o impacto da mudança na lei das embalagens, que agora pede comunicação mais clara sobre quantidade de açúcares e gorduras?

Segundo nossas pesquisas, as pessoas já liam a tabela nutricional mesmo antes da lei. Nós temos nas nossas embalagens a informação da quantidade de calorias por porção. Nós já fazíamos questão de comunicar para o consumidor a quantidade de calorias dos nossos produtos. A comunicação na embalagem faz todo sentido porque é uma maneira de informar o consumidor ainda mais. Não acredito que isso terá impacto nas vendas.

O consumo excessivo de produtos como chocolates e biscoitos é sempre apontado como vilão da saúde dos consumidores. Como lidar com isso?

Hoje, mais de 25% do nosso volume é de unidades com menos de 200 calorias, porque nós partimos da ideia do consumo consciente dos nossos produtos. Obviamente, você quer comer chocolate porque ele é um impulso, uma indulgência, o que é importante. Durante a pandemia, uma pesquisa mostrou que 70% dos consumidores afirmaram que essa indulgência era fundamental para a saúde mental. É importante que as pessoas tenham acesso a esse prazer, mas com moderação.

Em vez de abrir uma barra e comer 80g de chocolate, você tem uma versão com 34g. Em vez de abrir um pacote de Oreo de 90g e comer os 10 biscoitos, você tem um pacote com quatro unidades e satisfaz a sua vontade sem comer excessivamente. A estratégia de diminuir o tamanho da embalagem cumpre esse papel também. Tem um problema de ‘reduflação’, mas a pessoa, às vezes, só quer comer um pedacinho.

Há planos para ampliar a produção de cacau no Brasil?

Atualmente, a nossa grande fonte de cacau é a África. O Brasil já foi o maior exportador de cacau do mundo, mas tivemos a praga “vassoura de bruxa”, nos anos 1990, que se alastrou na Bahia. Hoje, cerca de 25% do cacau que compramos no Brasil é produzido localmente. Até 2025, queremos comprar 100% do cacau produzido pelo programa Cocoa Life (de estímulo à produção sustentável), idealmente aqui no País. Essa meta de produzir aqui traz três benefícios. É ecologicamente bom porque o cacau é uma cultura nativa, não precisa desmatar para plantar. Em segundo lugar, vem o impacto social. Os produtores de cacau são normalmente famílias que trabalham com o cultivo da fruta. O Cocoa Life consegue dar para essas pessoas condições de vida porque nós investimos em tecnologia. Então, eles passam a ser produtores sustentáveis economicamente também. Por fim, há o impacto ambiental de trazer um cacau da África para cá, que é muito maior do que o de produzir localmente. Produzindo localmente, temos mais resiliência, porque sofremos menos com o risco de variação do preço do cacau global na Bolsa. O objetivo é claro, nós temos um investimento global de US$ 1 bilhão para produção de cacau sustentável.

A Mondelez tem a meta de comprar 100% do cacau vindo do programa Cocoa Life até 2025. Como está o progresso dessa meta?

Agora, o ganho de escala do programa até 2025 será mais fácil. A grande dificuldade foi cadastrar esses produtores rurais, treiná-los, fornecer o pacote tecnológico e eles começarem a produzir o cacau, que é uma cultura muito longa, que demora de quatro a cinco anos para dar frutos. Neste momento, nós estamos chegando no ponto em que vamos materializar esse projeto. Com isso, os produtores rurais terão a condição de fornecer uma quantidade maior de cacau que nós precisamos.

Esse programa também ajuda a combater, por exemplo casos de trabalho infantil, que são comuns na cadeia mundial de cacau?

Com certeza. Parte da essência do programa é que não tem desmatamento, respeita todas as legislações ambientais e as famílias de produtores têm uma renda mínima para que possam trabalhar e colocar as crianças na escola. Também temos parcerias com ONGs que investem na educação das comunidades que produzem cacau.

Entrevista por Lucas Agrela

Repórter de economia & negócios, pós-graduado em administração e marketing e em mídias digitais.

Wesley Gonsalves

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