‘Big Brother’ corporativo: como as empresas monitoram os funcionários no home office


Grandes companhias, incluindo bancos e consultorias, usam softwares que monitoram trabalho remoto; serviço pode capturar tela, tirar fotos e até gravar vídeos do computador do trabalhador

Por Fernanda Guimarães e Wesley Gonsalves
Atualização:

Em um momento em que a volta ao trabalho presencial se transformou em uma queda de braço entre empresas e empregados, ferramentas de monitoramento do home office, que já se disseminaram nos Estados Unidos e na Europa, vêm ganhando força rapidamente no País. Os dispositivos funcionam como uma espécie de “Big Brother” do mundo corporativo. Vale tudo para garantir a produtividade: fotografar o funcionário, sua tela ou até mesmo capturar tudo o que a pessoa digita no teclado do computador.

Para monitorar funcionários durante trabalho a distância, empresas vigiam tudo, de histórico de pesquisa à geolocalização.  Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Ao Estadão, funcionários de empresas que utilizam esse tipo de serviço de monitoramento relatam situações de surpresa diante da prática e tensão entre membros da equipe. Grande parte das companhias que atuam nesse mercado são estrangeiras, mas há startups brasileiras que estão explorando esse mercado, que teve um “boom” com a pandemia de covid-19, que direcionou milhões de pessoas para o trabalho remoto.

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Um dos negócios brasileiros que têm ferramentas para colocar em prática o “Big Brother corporativo” é a Monitoo, criada em 2019 por Murilo Rodrigues e Alexandre Cunha. De dez clientes na carteira na pré-pandemia, o número saltou hoje para 700, dos mais diversos setores.

Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade.”

Murilo Rodrigues, sócio-fundador da Monitoo

Segundo Rodrigues, a Monitoo foi criada pensando em uma demanda identificada em empresas de TI, que queriam traçar a produtividade de seus funcionários – isso ainda no tempo em que todo mundo trabalhava dentro das companhias. “Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade”, afirma.

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A ferramenta da empresa acompanha os programas e as páginas abertas pelo funcionário e as separa, por meio de algoritmos, do que pode ser considerado produtivo ou improdutivo. Essa seleção vai variando conforme o setor de atuação da empresa. “A ferramenta é usada por gestores diretos e pelo RH, mas pode ser utilizada pelo próprio funcionário para ele saber como está gastando o seu tempo. Há pessoas com mais dificuldade de manter o foco”, disse.

Mas a vigilância não para por aí. Há no mercado opções bem mais invasivas, que vão além da contabilização das horas de trabalho e produtividade. A Kickidler, com sede em Chipre, mas que atua no Brasil, faz a gravação em vídeo da tela do computador do funcionário, notifica automaticamente quando são observadas “violações do local de trabalho”, atraso ou acesso a sites classificados como proibidos.

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A empresa projeta, por exemplo, um “pop-up” de alerta para lembrar o funcionário de que ele está fazendo algo que não poderia durante o horário de trabalho. Procurada, a empresa não retornou o pedido de entrevista.

Não há no Brasil uma pesquisa que mostre a dimensão do uso desse tipo de ferramenta pelas empresas, mas há indícios é de que o seu uso vem aumentando de forma gradativa. Nos Estados Unidos, para se ter uma ideia, o cálculo é de que 6 a cada 10 empresas faça o uso de algum tipo de monitoramento, conforme pesquisa da Digital.com.

Eu era monitorada até fora de horário de trabalho.”

Atendente de marketing

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Não é difícil encontrar, nas redes sociais, relatos de trabalhadores brasileiros que foram surpreendidos ao descobrir que a empresa que trabalham vigiam todos os seus passos virtualmente. Um funcionário do Santander – que prefere não se identificar – conta que já estava acostumado com a ideia das câmeras de segurança vigiando o ambiente, mas se assustou com a notícia de que seu computador era monitorado o tempo todo.

“Uma pessoa do trabalho me disse que eles tem acesso a tudo o que vemos no computador. Fora as câmeras, porque tem uma que fica atrás do meu computador”, diz o funcionário do banco espanhol. “É um verdadeiro Big Brother”.

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Questionado sobre suas práticas de monitoramento, o Santander informou, em nota, que “monitora o uso correto das ferramentas do banco, mediante a anuência dos funcionários”. Conforme divulgado, o objetivo da prática é “garantir a segurança de informações confidenciais ou legalmente protegidas, bem como observância de comportamentos éticos e corporativos segundo as normas de Compliance.”

O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou acordo individual”

Antonio Carlos Pereira Neto, sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto

No caso da Deloitte Brasil, para monitorar o rendimento dos trabalhadores, a companhia realizava checagens periódicas da localização dos funcionários no computador institucional, conforme relatou a reportagem uma ex-funcionário da empresa, que também preferiu se manter em anonimato.

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Ele conta que os trabalhadores não podiam “bater o ponto” virtualmente fora de casa, uma vez que o endereço informado à empresa sobre o trabalho remoto precisava ser respeitado. “Teve um período que a gente precisava registrar, com geolocalização, até as pausas para o almoço e café, com entrada e saída”, lembra. “Os chefes ficavam em cima, vigiando se a gente estava trabalhando em casa mesmo.” Procurada, a Deloitte afirmou que suas relações “com seus profissionais são pautadas pela confiança”.

“Foi sob essa premissa que implementamos ainda antes da pandemia um modelo de trabalho que previa atuação remota em alguns dias da semana que evoluiu para o que chamamos de ‘Digital Workplace’, permitindo flexibilidade nos modos de trabalho de nossos profissionais”. Afirmou, ainda, que por conta dessa confiança estabelecida a empresa “não tem como objetivo o controle do local de acesso de seus profissionais ao sistema já que podem trabalhar de casa, do cliente no contexto do Digital Workplace”.

Depois de mandar funcionários para casa durante a pandemia, empresas discutem retorno ao escritório enquanto tentam vigiar a produtividade no home office Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Para uma atendente de vendas, que também preferiu não se identificar, o caso acaba gerando desgaste para os trabalhadores – apesar de, na empresa dela, as pessoas terem sido informadas de que haveria o monitoramento do celular e computador.

Durante o período que trabalhou na empresa, a funcionária relata casos de vigilância excessiva, para além do seu período de trabalho. “O celular que eu recebi tinha rastreador, monitorava ligações, mensagens e aplicativos que eu usava. Eu era monitorada até fora de horário de trabalho”, conta.

Para Carlos Eduardo Altona, sócio da consultoria Exec, o uso dessas ferramentas de monitoramento deve ser algo passageiro, que será substituído por estratégias de gerenciamento mais refinadas. Segundo ele, isso é algo que já vem sendo discutido entre empresas e o especialistas em recursos humanos.

Na avaliação do sócio da Exec, no futuro, softwares desse tipo só serão necessários para gerenciar cargos extremamente estratégicos, que continuarem a executar o trabalho de maneira 100% a distância. “Nos casos gerais, as empresas terão que estabelecer ferramentas mais sofisticadas, que consigam dimensionar o desempenho dos funcionários sem necessariamente ter de gravá-los”, afirma Altona.

Monitoramento é legal, mas tem regras

O advogado sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto, lembra que o monitoramento do trabalho remoto foi regularizado em medida provisória que regulamentou o trabalho híbrido. Esse monitoramento, que pode ser feito apenas por meio do “log in” e “log out” do computador, destaca, é dispensado quando o contrato é por produção ou por um trabalho específico.

“O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou do acordo individual”, explica. Esse monitoramento, destaca, não pode constranger o funcionário e precisa estar de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

Segundo Altona, da Exec, empresas que utilizam estratégias de monitoramento de funcionários com uso de softwares de gravação de tela, fotos e acesso a histórico de pesquisa precisam ser transparentes, sempre informando aos funcionários sobre a prática. “Quanto mais documentado, melhor para a empresa se proteger (de ações trabalhistas)”, enfatiza.

Em um momento em que a volta ao trabalho presencial se transformou em uma queda de braço entre empresas e empregados, ferramentas de monitoramento do home office, que já se disseminaram nos Estados Unidos e na Europa, vêm ganhando força rapidamente no País. Os dispositivos funcionam como uma espécie de “Big Brother” do mundo corporativo. Vale tudo para garantir a produtividade: fotografar o funcionário, sua tela ou até mesmo capturar tudo o que a pessoa digita no teclado do computador.

Para monitorar funcionários durante trabalho a distância, empresas vigiam tudo, de histórico de pesquisa à geolocalização.  Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Ao Estadão, funcionários de empresas que utilizam esse tipo de serviço de monitoramento relatam situações de surpresa diante da prática e tensão entre membros da equipe. Grande parte das companhias que atuam nesse mercado são estrangeiras, mas há startups brasileiras que estão explorando esse mercado, que teve um “boom” com a pandemia de covid-19, que direcionou milhões de pessoas para o trabalho remoto.

Um dos negócios brasileiros que têm ferramentas para colocar em prática o “Big Brother corporativo” é a Monitoo, criada em 2019 por Murilo Rodrigues e Alexandre Cunha. De dez clientes na carteira na pré-pandemia, o número saltou hoje para 700, dos mais diversos setores.

Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade.”

Murilo Rodrigues, sócio-fundador da Monitoo

Segundo Rodrigues, a Monitoo foi criada pensando em uma demanda identificada em empresas de TI, que queriam traçar a produtividade de seus funcionários – isso ainda no tempo em que todo mundo trabalhava dentro das companhias. “Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade”, afirma.

A ferramenta da empresa acompanha os programas e as páginas abertas pelo funcionário e as separa, por meio de algoritmos, do que pode ser considerado produtivo ou improdutivo. Essa seleção vai variando conforme o setor de atuação da empresa. “A ferramenta é usada por gestores diretos e pelo RH, mas pode ser utilizada pelo próprio funcionário para ele saber como está gastando o seu tempo. Há pessoas com mais dificuldade de manter o foco”, disse.

Mas a vigilância não para por aí. Há no mercado opções bem mais invasivas, que vão além da contabilização das horas de trabalho e produtividade. A Kickidler, com sede em Chipre, mas que atua no Brasil, faz a gravação em vídeo da tela do computador do funcionário, notifica automaticamente quando são observadas “violações do local de trabalho”, atraso ou acesso a sites classificados como proibidos.

A empresa projeta, por exemplo, um “pop-up” de alerta para lembrar o funcionário de que ele está fazendo algo que não poderia durante o horário de trabalho. Procurada, a empresa não retornou o pedido de entrevista.

Não há no Brasil uma pesquisa que mostre a dimensão do uso desse tipo de ferramenta pelas empresas, mas há indícios é de que o seu uso vem aumentando de forma gradativa. Nos Estados Unidos, para se ter uma ideia, o cálculo é de que 6 a cada 10 empresas faça o uso de algum tipo de monitoramento, conforme pesquisa da Digital.com.

Eu era monitorada até fora de horário de trabalho.”

Atendente de marketing

Sorria! Você está sendo filmado

Não é difícil encontrar, nas redes sociais, relatos de trabalhadores brasileiros que foram surpreendidos ao descobrir que a empresa que trabalham vigiam todos os seus passos virtualmente. Um funcionário do Santander – que prefere não se identificar – conta que já estava acostumado com a ideia das câmeras de segurança vigiando o ambiente, mas se assustou com a notícia de que seu computador era monitorado o tempo todo.

“Uma pessoa do trabalho me disse que eles tem acesso a tudo o que vemos no computador. Fora as câmeras, porque tem uma que fica atrás do meu computador”, diz o funcionário do banco espanhol. “É um verdadeiro Big Brother”.

Questionado sobre suas práticas de monitoramento, o Santander informou, em nota, que “monitora o uso correto das ferramentas do banco, mediante a anuência dos funcionários”. Conforme divulgado, o objetivo da prática é “garantir a segurança de informações confidenciais ou legalmente protegidas, bem como observância de comportamentos éticos e corporativos segundo as normas de Compliance.”

O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou acordo individual”

Antonio Carlos Pereira Neto, sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto

No caso da Deloitte Brasil, para monitorar o rendimento dos trabalhadores, a companhia realizava checagens periódicas da localização dos funcionários no computador institucional, conforme relatou a reportagem uma ex-funcionário da empresa, que também preferiu se manter em anonimato.

Ele conta que os trabalhadores não podiam “bater o ponto” virtualmente fora de casa, uma vez que o endereço informado à empresa sobre o trabalho remoto precisava ser respeitado. “Teve um período que a gente precisava registrar, com geolocalização, até as pausas para o almoço e café, com entrada e saída”, lembra. “Os chefes ficavam em cima, vigiando se a gente estava trabalhando em casa mesmo.” Procurada, a Deloitte afirmou que suas relações “com seus profissionais são pautadas pela confiança”.

“Foi sob essa premissa que implementamos ainda antes da pandemia um modelo de trabalho que previa atuação remota em alguns dias da semana que evoluiu para o que chamamos de ‘Digital Workplace’, permitindo flexibilidade nos modos de trabalho de nossos profissionais”. Afirmou, ainda, que por conta dessa confiança estabelecida a empresa “não tem como objetivo o controle do local de acesso de seus profissionais ao sistema já que podem trabalhar de casa, do cliente no contexto do Digital Workplace”.

Depois de mandar funcionários para casa durante a pandemia, empresas discutem retorno ao escritório enquanto tentam vigiar a produtividade no home office Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Para uma atendente de vendas, que também preferiu não se identificar, o caso acaba gerando desgaste para os trabalhadores – apesar de, na empresa dela, as pessoas terem sido informadas de que haveria o monitoramento do celular e computador.

Durante o período que trabalhou na empresa, a funcionária relata casos de vigilância excessiva, para além do seu período de trabalho. “O celular que eu recebi tinha rastreador, monitorava ligações, mensagens e aplicativos que eu usava. Eu era monitorada até fora de horário de trabalho”, conta.

Para Carlos Eduardo Altona, sócio da consultoria Exec, o uso dessas ferramentas de monitoramento deve ser algo passageiro, que será substituído por estratégias de gerenciamento mais refinadas. Segundo ele, isso é algo que já vem sendo discutido entre empresas e o especialistas em recursos humanos.

Na avaliação do sócio da Exec, no futuro, softwares desse tipo só serão necessários para gerenciar cargos extremamente estratégicos, que continuarem a executar o trabalho de maneira 100% a distância. “Nos casos gerais, as empresas terão que estabelecer ferramentas mais sofisticadas, que consigam dimensionar o desempenho dos funcionários sem necessariamente ter de gravá-los”, afirma Altona.

Monitoramento é legal, mas tem regras

O advogado sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto, lembra que o monitoramento do trabalho remoto foi regularizado em medida provisória que regulamentou o trabalho híbrido. Esse monitoramento, que pode ser feito apenas por meio do “log in” e “log out” do computador, destaca, é dispensado quando o contrato é por produção ou por um trabalho específico.

“O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou do acordo individual”, explica. Esse monitoramento, destaca, não pode constranger o funcionário e precisa estar de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

Segundo Altona, da Exec, empresas que utilizam estratégias de monitoramento de funcionários com uso de softwares de gravação de tela, fotos e acesso a histórico de pesquisa precisam ser transparentes, sempre informando aos funcionários sobre a prática. “Quanto mais documentado, melhor para a empresa se proteger (de ações trabalhistas)”, enfatiza.

Em um momento em que a volta ao trabalho presencial se transformou em uma queda de braço entre empresas e empregados, ferramentas de monitoramento do home office, que já se disseminaram nos Estados Unidos e na Europa, vêm ganhando força rapidamente no País. Os dispositivos funcionam como uma espécie de “Big Brother” do mundo corporativo. Vale tudo para garantir a produtividade: fotografar o funcionário, sua tela ou até mesmo capturar tudo o que a pessoa digita no teclado do computador.

Para monitorar funcionários durante trabalho a distância, empresas vigiam tudo, de histórico de pesquisa à geolocalização.  Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Ao Estadão, funcionários de empresas que utilizam esse tipo de serviço de monitoramento relatam situações de surpresa diante da prática e tensão entre membros da equipe. Grande parte das companhias que atuam nesse mercado são estrangeiras, mas há startups brasileiras que estão explorando esse mercado, que teve um “boom” com a pandemia de covid-19, que direcionou milhões de pessoas para o trabalho remoto.

Um dos negócios brasileiros que têm ferramentas para colocar em prática o “Big Brother corporativo” é a Monitoo, criada em 2019 por Murilo Rodrigues e Alexandre Cunha. De dez clientes na carteira na pré-pandemia, o número saltou hoje para 700, dos mais diversos setores.

Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade.”

Murilo Rodrigues, sócio-fundador da Monitoo

Segundo Rodrigues, a Monitoo foi criada pensando em uma demanda identificada em empresas de TI, que queriam traçar a produtividade de seus funcionários – isso ainda no tempo em que todo mundo trabalhava dentro das companhias. “Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade”, afirma.

A ferramenta da empresa acompanha os programas e as páginas abertas pelo funcionário e as separa, por meio de algoritmos, do que pode ser considerado produtivo ou improdutivo. Essa seleção vai variando conforme o setor de atuação da empresa. “A ferramenta é usada por gestores diretos e pelo RH, mas pode ser utilizada pelo próprio funcionário para ele saber como está gastando o seu tempo. Há pessoas com mais dificuldade de manter o foco”, disse.

Mas a vigilância não para por aí. Há no mercado opções bem mais invasivas, que vão além da contabilização das horas de trabalho e produtividade. A Kickidler, com sede em Chipre, mas que atua no Brasil, faz a gravação em vídeo da tela do computador do funcionário, notifica automaticamente quando são observadas “violações do local de trabalho”, atraso ou acesso a sites classificados como proibidos.

A empresa projeta, por exemplo, um “pop-up” de alerta para lembrar o funcionário de que ele está fazendo algo que não poderia durante o horário de trabalho. Procurada, a empresa não retornou o pedido de entrevista.

Não há no Brasil uma pesquisa que mostre a dimensão do uso desse tipo de ferramenta pelas empresas, mas há indícios é de que o seu uso vem aumentando de forma gradativa. Nos Estados Unidos, para se ter uma ideia, o cálculo é de que 6 a cada 10 empresas faça o uso de algum tipo de monitoramento, conforme pesquisa da Digital.com.

Eu era monitorada até fora de horário de trabalho.”

Atendente de marketing

Sorria! Você está sendo filmado

Não é difícil encontrar, nas redes sociais, relatos de trabalhadores brasileiros que foram surpreendidos ao descobrir que a empresa que trabalham vigiam todos os seus passos virtualmente. Um funcionário do Santander – que prefere não se identificar – conta que já estava acostumado com a ideia das câmeras de segurança vigiando o ambiente, mas se assustou com a notícia de que seu computador era monitorado o tempo todo.

“Uma pessoa do trabalho me disse que eles tem acesso a tudo o que vemos no computador. Fora as câmeras, porque tem uma que fica atrás do meu computador”, diz o funcionário do banco espanhol. “É um verdadeiro Big Brother”.

Questionado sobre suas práticas de monitoramento, o Santander informou, em nota, que “monitora o uso correto das ferramentas do banco, mediante a anuência dos funcionários”. Conforme divulgado, o objetivo da prática é “garantir a segurança de informações confidenciais ou legalmente protegidas, bem como observância de comportamentos éticos e corporativos segundo as normas de Compliance.”

O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou acordo individual”

Antonio Carlos Pereira Neto, sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto

No caso da Deloitte Brasil, para monitorar o rendimento dos trabalhadores, a companhia realizava checagens periódicas da localização dos funcionários no computador institucional, conforme relatou a reportagem uma ex-funcionário da empresa, que também preferiu se manter em anonimato.

Ele conta que os trabalhadores não podiam “bater o ponto” virtualmente fora de casa, uma vez que o endereço informado à empresa sobre o trabalho remoto precisava ser respeitado. “Teve um período que a gente precisava registrar, com geolocalização, até as pausas para o almoço e café, com entrada e saída”, lembra. “Os chefes ficavam em cima, vigiando se a gente estava trabalhando em casa mesmo.” Procurada, a Deloitte afirmou que suas relações “com seus profissionais são pautadas pela confiança”.

“Foi sob essa premissa que implementamos ainda antes da pandemia um modelo de trabalho que previa atuação remota em alguns dias da semana que evoluiu para o que chamamos de ‘Digital Workplace’, permitindo flexibilidade nos modos de trabalho de nossos profissionais”. Afirmou, ainda, que por conta dessa confiança estabelecida a empresa “não tem como objetivo o controle do local de acesso de seus profissionais ao sistema já que podem trabalhar de casa, do cliente no contexto do Digital Workplace”.

Depois de mandar funcionários para casa durante a pandemia, empresas discutem retorno ao escritório enquanto tentam vigiar a produtividade no home office Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Para uma atendente de vendas, que também preferiu não se identificar, o caso acaba gerando desgaste para os trabalhadores – apesar de, na empresa dela, as pessoas terem sido informadas de que haveria o monitoramento do celular e computador.

Durante o período que trabalhou na empresa, a funcionária relata casos de vigilância excessiva, para além do seu período de trabalho. “O celular que eu recebi tinha rastreador, monitorava ligações, mensagens e aplicativos que eu usava. Eu era monitorada até fora de horário de trabalho”, conta.

Para Carlos Eduardo Altona, sócio da consultoria Exec, o uso dessas ferramentas de monitoramento deve ser algo passageiro, que será substituído por estratégias de gerenciamento mais refinadas. Segundo ele, isso é algo que já vem sendo discutido entre empresas e o especialistas em recursos humanos.

Na avaliação do sócio da Exec, no futuro, softwares desse tipo só serão necessários para gerenciar cargos extremamente estratégicos, que continuarem a executar o trabalho de maneira 100% a distância. “Nos casos gerais, as empresas terão que estabelecer ferramentas mais sofisticadas, que consigam dimensionar o desempenho dos funcionários sem necessariamente ter de gravá-los”, afirma Altona.

Monitoramento é legal, mas tem regras

O advogado sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto, lembra que o monitoramento do trabalho remoto foi regularizado em medida provisória que regulamentou o trabalho híbrido. Esse monitoramento, que pode ser feito apenas por meio do “log in” e “log out” do computador, destaca, é dispensado quando o contrato é por produção ou por um trabalho específico.

“O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou do acordo individual”, explica. Esse monitoramento, destaca, não pode constranger o funcionário e precisa estar de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

Segundo Altona, da Exec, empresas que utilizam estratégias de monitoramento de funcionários com uso de softwares de gravação de tela, fotos e acesso a histórico de pesquisa precisam ser transparentes, sempre informando aos funcionários sobre a prática. “Quanto mais documentado, melhor para a empresa se proteger (de ações trabalhistas)”, enfatiza.

Em um momento em que a volta ao trabalho presencial se transformou em uma queda de braço entre empresas e empregados, ferramentas de monitoramento do home office, que já se disseminaram nos Estados Unidos e na Europa, vêm ganhando força rapidamente no País. Os dispositivos funcionam como uma espécie de “Big Brother” do mundo corporativo. Vale tudo para garantir a produtividade: fotografar o funcionário, sua tela ou até mesmo capturar tudo o que a pessoa digita no teclado do computador.

Para monitorar funcionários durante trabalho a distância, empresas vigiam tudo, de histórico de pesquisa à geolocalização.  Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Ao Estadão, funcionários de empresas que utilizam esse tipo de serviço de monitoramento relatam situações de surpresa diante da prática e tensão entre membros da equipe. Grande parte das companhias que atuam nesse mercado são estrangeiras, mas há startups brasileiras que estão explorando esse mercado, que teve um “boom” com a pandemia de covid-19, que direcionou milhões de pessoas para o trabalho remoto.

Um dos negócios brasileiros que têm ferramentas para colocar em prática o “Big Brother corporativo” é a Monitoo, criada em 2019 por Murilo Rodrigues e Alexandre Cunha. De dez clientes na carteira na pré-pandemia, o número saltou hoje para 700, dos mais diversos setores.

Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade.”

Murilo Rodrigues, sócio-fundador da Monitoo

Segundo Rodrigues, a Monitoo foi criada pensando em uma demanda identificada em empresas de TI, que queriam traçar a produtividade de seus funcionários – isso ainda no tempo em que todo mundo trabalhava dentro das companhias. “Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade”, afirma.

A ferramenta da empresa acompanha os programas e as páginas abertas pelo funcionário e as separa, por meio de algoritmos, do que pode ser considerado produtivo ou improdutivo. Essa seleção vai variando conforme o setor de atuação da empresa. “A ferramenta é usada por gestores diretos e pelo RH, mas pode ser utilizada pelo próprio funcionário para ele saber como está gastando o seu tempo. Há pessoas com mais dificuldade de manter o foco”, disse.

Mas a vigilância não para por aí. Há no mercado opções bem mais invasivas, que vão além da contabilização das horas de trabalho e produtividade. A Kickidler, com sede em Chipre, mas que atua no Brasil, faz a gravação em vídeo da tela do computador do funcionário, notifica automaticamente quando são observadas “violações do local de trabalho”, atraso ou acesso a sites classificados como proibidos.

A empresa projeta, por exemplo, um “pop-up” de alerta para lembrar o funcionário de que ele está fazendo algo que não poderia durante o horário de trabalho. Procurada, a empresa não retornou o pedido de entrevista.

Não há no Brasil uma pesquisa que mostre a dimensão do uso desse tipo de ferramenta pelas empresas, mas há indícios é de que o seu uso vem aumentando de forma gradativa. Nos Estados Unidos, para se ter uma ideia, o cálculo é de que 6 a cada 10 empresas faça o uso de algum tipo de monitoramento, conforme pesquisa da Digital.com.

Eu era monitorada até fora de horário de trabalho.”

Atendente de marketing

Sorria! Você está sendo filmado

Não é difícil encontrar, nas redes sociais, relatos de trabalhadores brasileiros que foram surpreendidos ao descobrir que a empresa que trabalham vigiam todos os seus passos virtualmente. Um funcionário do Santander – que prefere não se identificar – conta que já estava acostumado com a ideia das câmeras de segurança vigiando o ambiente, mas se assustou com a notícia de que seu computador era monitorado o tempo todo.

“Uma pessoa do trabalho me disse que eles tem acesso a tudo o que vemos no computador. Fora as câmeras, porque tem uma que fica atrás do meu computador”, diz o funcionário do banco espanhol. “É um verdadeiro Big Brother”.

Questionado sobre suas práticas de monitoramento, o Santander informou, em nota, que “monitora o uso correto das ferramentas do banco, mediante a anuência dos funcionários”. Conforme divulgado, o objetivo da prática é “garantir a segurança de informações confidenciais ou legalmente protegidas, bem como observância de comportamentos éticos e corporativos segundo as normas de Compliance.”

O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou acordo individual”

Antonio Carlos Pereira Neto, sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto

No caso da Deloitte Brasil, para monitorar o rendimento dos trabalhadores, a companhia realizava checagens periódicas da localização dos funcionários no computador institucional, conforme relatou a reportagem uma ex-funcionário da empresa, que também preferiu se manter em anonimato.

Ele conta que os trabalhadores não podiam “bater o ponto” virtualmente fora de casa, uma vez que o endereço informado à empresa sobre o trabalho remoto precisava ser respeitado. “Teve um período que a gente precisava registrar, com geolocalização, até as pausas para o almoço e café, com entrada e saída”, lembra. “Os chefes ficavam em cima, vigiando se a gente estava trabalhando em casa mesmo.” Procurada, a Deloitte afirmou que suas relações “com seus profissionais são pautadas pela confiança”.

“Foi sob essa premissa que implementamos ainda antes da pandemia um modelo de trabalho que previa atuação remota em alguns dias da semana que evoluiu para o que chamamos de ‘Digital Workplace’, permitindo flexibilidade nos modos de trabalho de nossos profissionais”. Afirmou, ainda, que por conta dessa confiança estabelecida a empresa “não tem como objetivo o controle do local de acesso de seus profissionais ao sistema já que podem trabalhar de casa, do cliente no contexto do Digital Workplace”.

Depois de mandar funcionários para casa durante a pandemia, empresas discutem retorno ao escritório enquanto tentam vigiar a produtividade no home office Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Para uma atendente de vendas, que também preferiu não se identificar, o caso acaba gerando desgaste para os trabalhadores – apesar de, na empresa dela, as pessoas terem sido informadas de que haveria o monitoramento do celular e computador.

Durante o período que trabalhou na empresa, a funcionária relata casos de vigilância excessiva, para além do seu período de trabalho. “O celular que eu recebi tinha rastreador, monitorava ligações, mensagens e aplicativos que eu usava. Eu era monitorada até fora de horário de trabalho”, conta.

Para Carlos Eduardo Altona, sócio da consultoria Exec, o uso dessas ferramentas de monitoramento deve ser algo passageiro, que será substituído por estratégias de gerenciamento mais refinadas. Segundo ele, isso é algo que já vem sendo discutido entre empresas e o especialistas em recursos humanos.

Na avaliação do sócio da Exec, no futuro, softwares desse tipo só serão necessários para gerenciar cargos extremamente estratégicos, que continuarem a executar o trabalho de maneira 100% a distância. “Nos casos gerais, as empresas terão que estabelecer ferramentas mais sofisticadas, que consigam dimensionar o desempenho dos funcionários sem necessariamente ter de gravá-los”, afirma Altona.

Monitoramento é legal, mas tem regras

O advogado sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto, lembra que o monitoramento do trabalho remoto foi regularizado em medida provisória que regulamentou o trabalho híbrido. Esse monitoramento, que pode ser feito apenas por meio do “log in” e “log out” do computador, destaca, é dispensado quando o contrato é por produção ou por um trabalho específico.

“O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou do acordo individual”, explica. Esse monitoramento, destaca, não pode constranger o funcionário e precisa estar de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

Segundo Altona, da Exec, empresas que utilizam estratégias de monitoramento de funcionários com uso de softwares de gravação de tela, fotos e acesso a histórico de pesquisa precisam ser transparentes, sempre informando aos funcionários sobre a prática. “Quanto mais documentado, melhor para a empresa se proteger (de ações trabalhistas)”, enfatiza.

Em um momento em que a volta ao trabalho presencial se transformou em uma queda de braço entre empresas e empregados, ferramentas de monitoramento do home office, que já se disseminaram nos Estados Unidos e na Europa, vêm ganhando força rapidamente no País. Os dispositivos funcionam como uma espécie de “Big Brother” do mundo corporativo. Vale tudo para garantir a produtividade: fotografar o funcionário, sua tela ou até mesmo capturar tudo o que a pessoa digita no teclado do computador.

Para monitorar funcionários durante trabalho a distância, empresas vigiam tudo, de histórico de pesquisa à geolocalização.  Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Ao Estadão, funcionários de empresas que utilizam esse tipo de serviço de monitoramento relatam situações de surpresa diante da prática e tensão entre membros da equipe. Grande parte das companhias que atuam nesse mercado são estrangeiras, mas há startups brasileiras que estão explorando esse mercado, que teve um “boom” com a pandemia de covid-19, que direcionou milhões de pessoas para o trabalho remoto.

Um dos negócios brasileiros que têm ferramentas para colocar em prática o “Big Brother corporativo” é a Monitoo, criada em 2019 por Murilo Rodrigues e Alexandre Cunha. De dez clientes na carteira na pré-pandemia, o número saltou hoje para 700, dos mais diversos setores.

Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade.”

Murilo Rodrigues, sócio-fundador da Monitoo

Segundo Rodrigues, a Monitoo foi criada pensando em uma demanda identificada em empresas de TI, que queriam traçar a produtividade de seus funcionários – isso ainda no tempo em que todo mundo trabalhava dentro das companhias. “Nosso conflito era até que ponto a gente poderia monitorar sem invadir a privacidade”, afirma.

A ferramenta da empresa acompanha os programas e as páginas abertas pelo funcionário e as separa, por meio de algoritmos, do que pode ser considerado produtivo ou improdutivo. Essa seleção vai variando conforme o setor de atuação da empresa. “A ferramenta é usada por gestores diretos e pelo RH, mas pode ser utilizada pelo próprio funcionário para ele saber como está gastando o seu tempo. Há pessoas com mais dificuldade de manter o foco”, disse.

Mas a vigilância não para por aí. Há no mercado opções bem mais invasivas, que vão além da contabilização das horas de trabalho e produtividade. A Kickidler, com sede em Chipre, mas que atua no Brasil, faz a gravação em vídeo da tela do computador do funcionário, notifica automaticamente quando são observadas “violações do local de trabalho”, atraso ou acesso a sites classificados como proibidos.

A empresa projeta, por exemplo, um “pop-up” de alerta para lembrar o funcionário de que ele está fazendo algo que não poderia durante o horário de trabalho. Procurada, a empresa não retornou o pedido de entrevista.

Não há no Brasil uma pesquisa que mostre a dimensão do uso desse tipo de ferramenta pelas empresas, mas há indícios é de que o seu uso vem aumentando de forma gradativa. Nos Estados Unidos, para se ter uma ideia, o cálculo é de que 6 a cada 10 empresas faça o uso de algum tipo de monitoramento, conforme pesquisa da Digital.com.

Eu era monitorada até fora de horário de trabalho.”

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Não é difícil encontrar, nas redes sociais, relatos de trabalhadores brasileiros que foram surpreendidos ao descobrir que a empresa que trabalham vigiam todos os seus passos virtualmente. Um funcionário do Santander – que prefere não se identificar – conta que já estava acostumado com a ideia das câmeras de segurança vigiando o ambiente, mas se assustou com a notícia de que seu computador era monitorado o tempo todo.

“Uma pessoa do trabalho me disse que eles tem acesso a tudo o que vemos no computador. Fora as câmeras, porque tem uma que fica atrás do meu computador”, diz o funcionário do banco espanhol. “É um verdadeiro Big Brother”.

Questionado sobre suas práticas de monitoramento, o Santander informou, em nota, que “monitora o uso correto das ferramentas do banco, mediante a anuência dos funcionários”. Conforme divulgado, o objetivo da prática é “garantir a segurança de informações confidenciais ou legalmente protegidas, bem como observância de comportamentos éticos e corporativos segundo as normas de Compliance.”

O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou acordo individual”

Antonio Carlos Pereira Neto, sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto

No caso da Deloitte Brasil, para monitorar o rendimento dos trabalhadores, a companhia realizava checagens periódicas da localização dos funcionários no computador institucional, conforme relatou a reportagem uma ex-funcionário da empresa, que também preferiu se manter em anonimato.

Ele conta que os trabalhadores não podiam “bater o ponto” virtualmente fora de casa, uma vez que o endereço informado à empresa sobre o trabalho remoto precisava ser respeitado. “Teve um período que a gente precisava registrar, com geolocalização, até as pausas para o almoço e café, com entrada e saída”, lembra. “Os chefes ficavam em cima, vigiando se a gente estava trabalhando em casa mesmo.” Procurada, a Deloitte afirmou que suas relações “com seus profissionais são pautadas pela confiança”.

“Foi sob essa premissa que implementamos ainda antes da pandemia um modelo de trabalho que previa atuação remota em alguns dias da semana que evoluiu para o que chamamos de ‘Digital Workplace’, permitindo flexibilidade nos modos de trabalho de nossos profissionais”. Afirmou, ainda, que por conta dessa confiança estabelecida a empresa “não tem como objetivo o controle do local de acesso de seus profissionais ao sistema já que podem trabalhar de casa, do cliente no contexto do Digital Workplace”.

Depois de mandar funcionários para casa durante a pandemia, empresas discutem retorno ao escritório enquanto tentam vigiar a produtividade no home office Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Para uma atendente de vendas, que também preferiu não se identificar, o caso acaba gerando desgaste para os trabalhadores – apesar de, na empresa dela, as pessoas terem sido informadas de que haveria o monitoramento do celular e computador.

Durante o período que trabalhou na empresa, a funcionária relata casos de vigilância excessiva, para além do seu período de trabalho. “O celular que eu recebi tinha rastreador, monitorava ligações, mensagens e aplicativos que eu usava. Eu era monitorada até fora de horário de trabalho”, conta.

Para Carlos Eduardo Altona, sócio da consultoria Exec, o uso dessas ferramentas de monitoramento deve ser algo passageiro, que será substituído por estratégias de gerenciamento mais refinadas. Segundo ele, isso é algo que já vem sendo discutido entre empresas e o especialistas em recursos humanos.

Na avaliação do sócio da Exec, no futuro, softwares desse tipo só serão necessários para gerenciar cargos extremamente estratégicos, que continuarem a executar o trabalho de maneira 100% a distância. “Nos casos gerais, as empresas terão que estabelecer ferramentas mais sofisticadas, que consigam dimensionar o desempenho dos funcionários sem necessariamente ter de gravá-los”, afirma Altona.

Monitoramento é legal, mas tem regras

O advogado sócio do escritório Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Antonio Carlos Pereira Neto, lembra que o monitoramento do trabalho remoto foi regularizado em medida provisória que regulamentou o trabalho híbrido. Esse monitoramento, que pode ser feito apenas por meio do “log in” e “log out” do computador, destaca, é dispensado quando o contrato é por produção ou por um trabalho específico.

“O monitoramento precisa ser de conhecimento do empregado e constar no contrato de trabalho ou do acordo individual”, explica. Esse monitoramento, destaca, não pode constranger o funcionário e precisa estar de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

Segundo Altona, da Exec, empresas que utilizam estratégias de monitoramento de funcionários com uso de softwares de gravação de tela, fotos e acesso a histórico de pesquisa precisam ser transparentes, sempre informando aos funcionários sobre a prática. “Quanto mais documentado, melhor para a empresa se proteger (de ações trabalhistas)”, enfatiza.

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