O projeto da Prefeitura de São Paulo de ter 2,6 mil ônibus elétricos em circulação na cidade até o fim de 2024 movimenta empresas do segmento. Algumas estão ampliando a capacidade produtiva, anunciaram contratações e investimentos para produção local.
Os novos ônibus não emitem CO2 e substituirão 20% da frota a diesel que fazem o transporte público hoje, mas custam quase o triplo (veja abaixo a diferença entre as duas opções). Outras cidades do País também estão testando veículos elétricos para modernizar suas frotas.
São Paulo já recebeu 50 ônibus elétricos em setembro, fruto de parcerias entre Eletra, responsável pela instalação dos sistemas elétricos de tração e integração, Mercedes-Benz e Scania (chassis) e Caio (carrocerias). A previsão inicial era de 1 mil unidades neste ano, mas a maior parte deve ficar para 2024. Um dos motivos pode ser a falta de componentes enfrentada, por exemplo, pela Caio.
A fábrica da BYD em Campinas (SP) fornecerá 400 chassis de elétricos para a capital paulista ainda este ano outro grande volume em 2024. A fábrica está em obras para aumentar a capacidade produtiva, principalmente com a aquisição de equipamentos e novo layout do prédio. Nos últimos cinco anos, a montadora já forneceu 19 ônibus a bateria para operadores do transporte público da capital paulista, a maioria feitos com carrocerias da Caio.
Para dar conta da nova demanda, que deve crescer no próximo ano, o número de funcionários na empresa passará de 60 para 150 até dezembro. “É uma quebra de paradigma trocar ônibus a diesel por elétricos”, diz Marcello Schneider, diretor institucional da BYD. Segundo ele, inicialmente havia “forças contrárias do mercado tradicional que queriam postergar o processo”.
O grupo chinês iniciou operações no País em 2016 e hoje há 100 ônibus elétricos com seus chassis rodando em Estados como São Paulo, Fortaleza, Pará, Paraná e Distrito Federal. No próximo ano, a BYD também vai começar a produzir automóveis elétricos na Bahia.
As células das baterias para os ônibus vêm da matriz da BYD na China para a filial de Manaus (AM), onde são montados os módulos, e depois seguem para Campinas, onde é feita a confecção dos packs, pacotes que agregam vários módulos em “caixas” que equiparão os veículos. A intenção do grupo é nacionalizar componentes no futuro.
O projeto de compra de modelos elétricos para São Paulo foi anunciado pelo prefeito Ricardo Nunes em outubro de 2022. Na ocasião, ele informou que não aceitaria mais veículos a diesel na renovação da frota municipal, que transporta 7,3 milhões de passageiros por dia.
106 toneladas de CO2 por ônibus
Segundo a São Paulo Transportes (SPTrans), a frota da cidade é formada por 11,9 mil ônibus, sendo 69 movidos a bateria interna (19 deles em operação a partir de 2019) e 201 trólebus (movidos a eletricidade por meio de cabos conectados a uma rede aérea de fiação elétrica ou com uma tecnologia mais moderna, sem contato com a rede).
Cada ônibus a diesel emite cerca de 106 toneladas de CO2 por ano, além de óxidos de nitrogênio e material particulado, informa a SPTrans. Quando os 2,6 mil ônibus substituírem o equivalente da frota a combustível fóssil, deixarão de ser emitidas 275,6 mil toneladas de CO2 por ano, principal responsável pelo chamado efeito-estufa.
Dados da Secretaria do Verde e Meio Ambiente de 2020 indicam que a capital paulista emite anualmente um total de 11,6 milhões de toneladas de poluentes. Se toda a frota de ônibus fosse eletrificada hoje, esse número seria reduzido em 11%.
Outras cidades paulistas, como Campinas e São José dos Campos, e capitais de outros Estados, como Curitiba (PR), Salvador (BA) e Vitória (ES) também estão iniciando projetos de descarbonização dos transportes públicos para atender a metas ambientais para os próximos anos.
Na opinião de Schneider, o País precisa de uma política nacional para o transporte público, hoje praticamente de responsabilidade dos municípios. “Há morosidade nos processos, que são muito dependentes do setor público e de financiamentos, pois o investimento inicial em elétricos é alto”. Um ônibus com essa tecnologia custa na faixa de R$ 2,5 milhões a R$ 3 milhões, ante R$ 700 mil a R$ 900 mil da versão a diesel.
Infraestrutura de recarga
Para serem fornecidos às empresas privadas que operam o transporte público para a Prefeitura e são responsáveis pela aquisição dos veículos, os ônibus precisam ser homologados, após passarem por diversos testes. A Enel X fornecerá a infraestrutura de recarga de baterias nas garagens das empresas além de outros serviços.
A Mercedes-Benz iniciou em novembro de 2022 a produção de chassis para elétricos na fábrica de São Bernardo do Campo (SP), e 25 deles estão nesse primeiro lote, que receberam sistemas elétricos da Eletra e carrocerias da Caio. Os outros 25 têm chassi da Scania.
O grupo também tem um projeto próprio, o ônibus e500U, com chassi desenvolvido localmente. Mike Munhato, gerente de Mobilidade Elétrica na Mercedes-Benz, afirma que mais de 600 funcionários foram capacitados para atuar na linha de produção. “Esses ônibus utilizam motor e baterias elétricas de 600 volts e um manuseio errado pode resultar em doenças e até óbito.”
Também com fábrica no ABC paulista, a Eletra inaugurou em junho novas instalações com capacidade para preparar 1,8 mil ônibus ao ano. Com um turno de trabalho a mais, pode aumentar o volume em 50%.
A Volvo inicia no fim deste mês testes de seu ônibus elétrico em São Paulo, o BZL que, inicialmente, utiliza chassi importado da matriz na Suécia. A montadora já tem parte da verba de R$ 1,5 bilhão do pacote de investimentos entre 2022 e 2025 comprometida com o início do processo de eletrificação de seus produtos no fim de 2024, informa Alexandre Selski, diretor de eletromobilidade da empresa.
A empresa também faz testes com seu ônibus elétrico em Curitiba (PR), onde está sua fábrica, além de Santiago (Chile) e Bogotá (Colômbia). A Urbanização de Curitiba (Urbs), responsável pelo gerenciamento do transporte na cidade, informa que a meta é ter 33% de sua frota, de 1,1 mil veículos, com zero emissões até 2030, e 100% até 2050.
Até junho do próximo ano serão integrados à frota de Curitiba 70 ônibus elétricos. Além da Volvo, BYD, Eletra e Marcopolo testam veículos na capital paranaense. A Marcopolo também aguarda a homologação para oferecer seu ônibus Attivi em São Paulo. O grupo já fornece carrocerias para os chassis da BYD e da Volvo.
A companhia terá capacidade para produzir mil ônibus por ano em Caxias do Sul (RS) a partir de 2024 e tem 130 unidades sendo testadas em várias cidades. Já a Volkswagen Caminhões e Ônibus se prepara para entrar nesse mercado em 2024, com seu e-Volksbus, feito em Resende (RJ).
BNDES libera financiamentos
No último dia 19, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou um financiamento de R$ 2,5 bilhões para projeto de eletrificação em São Paulo. Segundo a instituição, com esse dinheiro será possível adquirir entre 1 mil e 1,3 mil ônibus.
A cidade é a primeira do setor público a receber crédito por meio do BNDES Finame Direto. De acordo com a SPTrans, a Prefeitura também negocia operações de crédito com o Banco do Brasil (R$ 500 milhões), Caixa (R$ 250 milhões) e com BID e Banco Mundial (US$ 500 milhões, ou quase R$ 2,5 bilhões), esse último previsto para o final do primeiro semestre de 2024.
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Os recursos, segundo a SPTrans, serão repassados aos fornecedores dos ônibus para cobertura de parte do preço do veículo. A parcela que será subvencionada pela Prefeitura cobre, no máximo, o valor da diferença de preço entre o veículo à diesel e o elétrico.
O investimento de todas as partes envolvidas no projeto será de R$ 8 bilhões para a aquisição dos 2,6 mil veículos. São Paulo tem metas de descarbonização previstas em lei estabelecendo o fim das emissões no transporte público até 2038.