Depois de décadas de expansão, as maiores redes de farmácias dos Estados Unidos estão fechando centenas de lojas à medida que reorientam suas operações contra a concorrência crescente, um grande número de processos judiciais por opióides e outras forças - relegando muitas comunidades já vulneráveis a desertos farmacêuticos.
Nos últimos dois anos, a Rite Aid - que entrou com pedido de proteção contra falência de acordo com o Capítulo 11 na semana passada -, a CVS e a Walgreens anunciaram fechamento de, pelo menos, 1.500 lojas.
Especialistas em saúde pública já perceberam as consequências, observando que os primeiros bairros a perderem suas farmácias costumam ser predominantemente os de negros, latinos e de baixa renda. “De acordo com nossas estimativas, cerca de um em cada quatro bairros estão com falta de farmácias em todo o país”, disse Dima Qato, professor associado da University of Southern California que estuda o acesso às farmácias e a equidade na saúde. “Esses fechamentos estão afetando desproporcionalmente as comunidades que mais precisam de farmácias.”
As farmácias podem ser a salvação em áreas rurais ou de baixa renda, especialmente em desertos alimentares - áreas que têm acesso limitado a alimentos saudáveis e acessíveis. Os farmacêuticos geralmente são os profissionais de saúde mais acessíveis para essas comunidades, disse Lorece Edwards, professora de saúde pública da Morgan State University, que se concentra em disparidades de saúde.
No entanto, para as redes nacionais de farmácias, a retração já vem de longa data, dizem os analistas de varejo, à medida que o aumento da concorrência, as mudanças no comportamento dos consumidores, os crimes no varejo, a escassez de pessoal e o investimento mínimo nas lojas se tornam mais evidentes. Eles também estão sentindo a queda nas vendas de vacinas contra o coronavírus, kits de testes caseiros e outros produtos da era da pandemia.
“A economia da administração dessas lojas simplesmente se desfez, e elas não são mais tão lucrativas quanto antes”, disse Neil Saunders, diretor administrativo da empresa de análise GlobalData Retail. “Os varejistas estão procurando se desfazer delas.”
Farmácias enfrentando um choque
Em uma época diferente, a drogaria da esquina era o modelo de conveniência, o lugar não só para aviar receitas médicas, mas também para comprar lanches, cartões de aniversário e produtos básicos para a casa. Na década de 1990 e no início dos anos 2000, a CVS e a Walgreens começaram a criar raízes em todo o país, superando as independentes. Hoje, as duas maiores redes de farmácias do país têm mais de 9.000 e 8.700 estabelecimentos, respectivamente, e um total de US$ 455,2 bilhões em vendas em 2022.
Mas agora os consumidores têm mais opções, dizem os analistas, muitas das quais são mais baratas e mais convenientes. Eles também estão mais cautelosos, pois a inflação - que atingiu o maior nível em 40 anos em 2022 e continua elevada - pesa sobre os gastos discricionários.
“Agora temos empresas que se mudaram para cá, como a Dollar General; temos a expansão dos supermercados; e o Walmart como mais um destino em muitas dessas áreas. Portanto, isso realmente eliminou parte do comércio dessas lojas”, disse Saunders.
E o fato de colocar mais mercadorias atrás de barreiras de plexiglass para desencorajar o roubo e a violência deu um ar distópico a alguns locais. As vendas na frente da loja da Rite Aid caíram 4,4% no último trimestre. A CVS registrou um declínio de quase 2% nas vendas.
Enquanto isso, gigantes do varejo, como a Amazon e o Walmart, aumentaram suas ofertas de farmácias e tratamentos médicos e, normalmente, oferecem preços mais competitivos em itens domésticos essenciais, como pasta de dente, papel toalha e sabão em pó.
O setor também não ficou imune à agitação trabalhista que desencadeou um frenesi de ativismo, desde os escritores de Hollywood até os trabalhadores das fábricas de automóveis de Detroit. Os funcionários das farmácias CVS e Walgreens fizeram greves, alegando que as más condições de trabalho os colocam em risco, assim como aos pacientes. Farmacêuticos, técnicos e pessoal de apoio alegam que as demandas crescentes sobre equipes com pouco pessoal - como a administração de vacinas enquanto lutam contra centenas de prescrições em atraso - tornaram-se insustentáveis e estão impedindo sua capacidade de realizar seu trabalho com responsabilidade.
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As redes de farmácias estão “dando um tiro no próprio pé” ao deixar de investir em pessoal de farmácia, disse Saunders, porque a farmácia é a única coisa nessas redes que as diferencia de outros concorrentes do varejo. Se o serviço for ruim ou as receitas atrasarem, os clientes ficarão ainda mais desanimados, disse ele.
As gigantes do setor farmacêutico têm procurado reforçar suas posições por meio da consolidação e da sincronização com as seguradoras de forma a direcionar os pacientes para elas. Os pacientes da Aetna podem ir a qualquer farmácia, mas terão um melhor negócio na CVS, que adquiriu a seguradora em 2018. Os clientes da Blue Cross Blue Shield têm uma configuração semelhante com a Walgreens. A Rite Aid não tem esse tipo de relacionamento com uma seguradora.
Mais fechamentos estão chegando
Os varejistas também enfrentaram uma onda de processos judiciais relacionados à epidemia de opióides, que já causou mais de 300 mil mortes nos Estados Unidos desde 2000.
A Walgreens e a CVS chegaram a acordos de US$ 10 bilhões com vários Estados, e a Kroger concordou em pagar US$ 1,2 bilhão. A Rite Aid chegou a um acordo sobre opióides de US$ 30 milhões em 2022 com o gabinete do procurador-geral da Virgínia, mas enfrenta vários casos consolidados no Tibunal Distrital dos EUA para o Distrito Norte de Ohio e com o Departamento de Justiça.
A Rite Aid, que disse ter perdido US$ 1 bilhão nos meses que antecederam seu pedido de falência em 15 de outubro, está fechando 154 locais de suas 2.100 lojas restantes, de acordo com um pedido feito na quinta-feira, no Tribunal de Falências dos EUA, em Nova Jersey. Isso inclui 39 locais na Pensilvânia, 31 na Califórnia, 20 em Nova York, 19 em Michigan e 6 em Maryland. Isso se soma a mais de 200 lojas que o varejista com sede na Filadélfia fechou nos últimos dois anos.
Em uma declaração ao The Post, a Rite Aid disse que está comprometida em melhorar o acesso a serviços essenciais de saúde em seus mercados. “Nosso piloto de lojas de pequeno formato foi projetado especificamente para fornecer acesso a serviços farmacêuticos em ‘desertos farmacêuticos’ e comunidades carentes”.
Como parte do fechamento de lojas supervisionado pelo tribunal de falências, a empresa “conduziu pesquisas adicionais para ajudar a garantir que não criemos desertos farmacêuticos nas comunidades que atendemos”.
A Walgreens, que anunciou em junho que 150 lojas nos EUA seriam fechadas até o final do próximo verão, disse em um comunicado que está comprometida em promover o acesso equitativo aos seus cuidados farmacêuticos e que utiliza serviços farmacêuticos direcionados, como a entrega de receitas no mesmo dia, para ajudar áreas carentes.
“Também nos envolvemos em alianças importantes para alcançar populações vulneráveis, pois temos uma longa história de trabalho com igrejas locais, grupos cívicos e organizações nacionais de serviço público para fornecer vacinas que salvam vidas a populações medicamente carentes.”
Em 2021, a CVS anunciou que fecharia aproximadamente 900 lojas. De 2018 a 2020, fechou 244 locais. A CVS não respondeu ao pedido de comentário do The Post.
As farmácias independentes também estão sob pressão, devido a muitas das mesmas forças que afetam seus concorrentes corporativos. Uma pesquisa recente da National Community Pharmacists Association mostra que as farmácias independentes relataram as menores margens de lucro desde que a organização começou a coletar esses dados, há 10 anos.
As próximas mudanças na forma como o governo lida com os pagamentos do Medicare podem piorar a situação, diz Ronna Hauser, vice-presidente sênior do grupo comercial. Espera-se que uma regra que entrará em vigor em 1º de janeiro reduza os pagamentos às farmácias, disse ela.
“O fluxo de caixa será uma preocupação real” nos primeiros três a seis meses de 2024, disse Hauser. “Estamos preocupados com a possibilidade de fechamento de farmácias devido a essa crise de fluxo de caixa... e estamos muito preocupados com os pontos de acesso para os pacientes.” /COLABOROU DAVID OVALLE