‘Acho que vai ser uma transição pacífica’, diz presidente do Bradesco sobre eleições


Octavio de Lazari diz que, independentemente de quem vença o pleito em outubro, a democracia do Brasil está consolidada: ‘Não vejo risco para o País’

Por Matheus Piovesana
Atualização:

O presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Júnior, não vê, a menos de um mês das eleições presidenciais, um risco institucional para o Brasil – qualquer que seja o resultado das eleições. O executivo afirma que, para atrair mais investimentos, é necessário que o vencedor se comprometa com alguns pilares básicos: “Tranquilidade institucional. Respeito aos contratos, disciplina fiscal, simplificação tributária, reduzir a desigualdade, criar uma melhoria da formação do trabalhador’, disse Lazari.

Embora considere o ano de 2023 como “desafiador para o crédito”, o executivo não enxerga no horizonte problemas institucionais. “Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos. À frente, é procurar não cometê-los e colocar o País no trilho para o crescimento.”

Octavio de Lazari: crescimento mais contido do crédito no ano que vem Foto: Taba Benedicto/Estadão
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Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista, em que o executivo também fala sobre a investida do Bradesco no México e o cenário de inflação e juros para o ano que vem.

Qual a importância do movimento com o BV (ex-Banco Votorantim) para a estratégia do Bradesco?

O mercado mudou muito, principalmente nos últimos cinco anos. Começou a haver uma migração de clientes procurando alternativas de investimento, principalmente quando houve uma redução acentuada de taxa de juros. E aí surgiu gente competente, como a XP, além dos agentes autônomos. Dentro desse contexto, surgiu a oportunidade de termos uma nova (asset), que tem produtos diferenciados, sócios sérios – a família Ermírio de Moraes e o Banco do Brasil –, e de comprarmos um controle (51%). Estrategistas de investimento e traders de qualidade, como a BV tem, não é algo que se ache fácil no mercado.

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Ouvimos muito (neobancos dizendo): tenho 70 milhões, 80 milhões de clientes. Mas quantos de fato operam com recorrência? 10% disso.

Octavio de Lazari

No México, parte do mercado via o Bradesco como forte candidato a comprar o Banamex. Por que faz mais sentido avançar como banco digital?

Comprar uma operação do tamanho do Banamex custa caro, algo como US$ 8 bilhões. É uma operação que tem estrutura física, agências. Isso tem um custo de manutenção caro. Olhando esse prisma, temos uma operação, a Bradescard México, que nasceu da compra do Ibi. Faz 12 anos que estamos lá, e são 3 milhões de cartões, R$ 3 bilhões em ativos. Hoje em dia, você pode ter um banco sem construir um prédio. Você não precisa ter o brick (tijolo), pode ter um banco a partir do clique. Nos pareceu muito mais inteligente comprar uma sociedade financeira popular (sofipo, a Ictineo). Já conhecemos bem o mercado mexicano e temos uma carteira de cartões estável e crescente - este ano, está crescendo em 500 mil cartões - inadimplência controlada, e que dá R$ 150 milhões em lucro ao ano. A partir da sofipo, podemos operar com todos os produtos que um banco pode operar. Nosso intuito nunca foi fazer varejo fora do Brasil, mas a oportunidade no México faz todo o sentido.

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Devemos ver o Bradesco fazendo transações parecidas no futuro?

Com certeza. Por essência, o Bradesco é um banco comprador. Com a reprecificação dos ativos, sobretudo os digitais, há vários negócios que estamos olhando. Outras empresas farão sentido, principalmente as que tragam analytics, ajudem a trazer clientes para o Bradesco ou monetizar os que já estão aqui. O custo de aquisição de cliente é muito caro, algo entre R$ 82 e R$ 87, sem saber se ele de fato vai ficar com você, porque com o mobile, ele abre uma conta quando bem entender.

Se somarmos as contas das principais fintechs e neobancos, dá um número maior que o da população brasileira. Há uma consolidação a caminho? Que papel o Bradesco teria?

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Não só uma consolidação, mas uma depuração. Qualquer pessoa, mesmo as de baixa renda, tem cinco, seis cartões, porque é fácil. Acho que vai ter uma depuração. Ouvimos muito (neobancos dizendo): tenho 70 milhões, 80 milhões de clientes. Mas quantos de fato operam com recorrência? 10% disso.

No começo do ano, falava-se na desaceleração do crédito, mas ela parece ter sido adiada. Ela ainda vem esse ano ou ficará para 2023?

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O segundo semestre será razoavelmente bom, mas a tendência é de uma redução do crescimento. Achamos que vamos crescer ao redor de 14% este ano. Primeiro por causa de uma base de comparação muito forte, e segundo, porque estamos enfrentando um problema de inadimplência. Vemos as pesquisas mostrando as famílias mais endividadas. Com a inflação alta e consequentemente a taxa de juros também, é natural que as pessoas tenham dificuldade de pagar dívidas, e que os bancos sejam mais restritivos. A tendência é de um segundo semestre mais fraco em crescimento, mas ainda acima de dois dígitos. O ano de 2023 será bem desafiador para o crédito, a não ser que cresça em grandes empresas.

Olhando para os cenários de juros após os pronunciamentos do Banco Central, esse crescimento em pessoa jurídica é mais ou menos provável do que era no final do primeiro semestre?

Menos provável, porque o sinal é de que o ciclo de juros não se encerrou, e o BC foi bem contundente de que não tem convicção do controle da inflação, não só para 2023, mas em 2024. Na melhor das hipóteses, vamos ficar com 13,75% (ao ano nos juros), podendo subir a 14% na próxima reunião do Copom. Eu acho que a inflação vai ceder, aos poucos, e isso só deve acontecer com maior incidência a partir do segundo semestre do ano que vem.

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Pode ser que o mercado de capitais volte a se movimentar. Existem boas expectativas, mas 2023 vai ser de muito desafio.

Octavio de Lazari

O aumento da inadimplência veio de quem tomou crédito na pandemia ou depois?

Diria que 60% veio de 2020, 2021, e 40% das novas operações. O consumo voltou, tanto é que o maior crescimento em todos os bancos neste ano foi no cartão de crédito, com um item importante: antes, a pessoa tinha um cartão; hoje, tem seis. Se está se endividando em todos, a tendência é de mais inadimplência. O importante a se observar é se tenho spread suficiente para pagar a provisão desse cartão e aumentar o spread líquido do banco.

Neste ano, o Bradesco está crescendo. O orçamento para 2023 é de crescimento?

Organicamente, miramos o crescimento. Acho que a inflação vai estar mais contida, vamos pagar o preço da inadimplência agora, e como os modelos estão mais restritivos desde o final do ano passado, a tendência é de safras melhores de crédito. Pode ser que o mercado de capitais volte a se movimentar. Existem boas expectativas, mas 2023 vai ser de muito desafio.

Entre os indicadores incertos para 2023, em qual a definição seria mais importante?

Inflação e taxa de juros. Esses dois vão dar o tom para a música que vamos tocar.

O que mais entra na conta, além do cenário fiscal?

Não falaria em reforma tributária, mas em simplificação. Diminuir o número de impostos, reduzir a burocracia. A simplificação vai ser um grande negócio, além da consolidação da reforma trabalhista, e a atração do investimento estrangeiro. Temos energia solar, eólica, saneamento básico, commodity. Tem muitos fatores, dentro do Brasil, de atração de investimento.

Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos.

Octavio de Lazari

O que falta para atrair mais?

Essa tranquilidade institucional. Respeito aos contratos, disciplina fiscal, simplificação tributária, reduzir a desigualdade, criar uma melhoria da formação do trabalhador. E sobretudo, (seguir) a nossa vocação para commodity e de exportador de energia limpa.

Estabilidade também inclui estabilidade política?

Também. Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos. À frente, é procurar não cometê-los e colocar o País no trilho para o crescimento. As alavancas para que isso aconteça são do conhecimento de qualquer um dos candidatos.

Como vocês veem o processo eleitoral? Tem surpresas?

Pelo que vimos nas pesquisas, parece que o quadro político está mais ou menos desenhado. Acho que vai ser uma transição pacífica como das outras vezes. Não vejo nenhum risco para o País.

Independente do governo, o que o Bradesco espera dele?

As ações a serem implementadas estão claras. Você não consegue crescer se não tiver inflação e juros menores, um dólar atrativo e equilibrado para o produtor e para o empresário brasileiro e para o estrangeiro. Não tem bala de prata.

O presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Júnior, não vê, a menos de um mês das eleições presidenciais, um risco institucional para o Brasil – qualquer que seja o resultado das eleições. O executivo afirma que, para atrair mais investimentos, é necessário que o vencedor se comprometa com alguns pilares básicos: “Tranquilidade institucional. Respeito aos contratos, disciplina fiscal, simplificação tributária, reduzir a desigualdade, criar uma melhoria da formação do trabalhador’, disse Lazari.

Embora considere o ano de 2023 como “desafiador para o crédito”, o executivo não enxerga no horizonte problemas institucionais. “Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos. À frente, é procurar não cometê-los e colocar o País no trilho para o crescimento.”

Octavio de Lazari: crescimento mais contido do crédito no ano que vem Foto: Taba Benedicto/Estadão

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista, em que o executivo também fala sobre a investida do Bradesco no México e o cenário de inflação e juros para o ano que vem.

Qual a importância do movimento com o BV (ex-Banco Votorantim) para a estratégia do Bradesco?

O mercado mudou muito, principalmente nos últimos cinco anos. Começou a haver uma migração de clientes procurando alternativas de investimento, principalmente quando houve uma redução acentuada de taxa de juros. E aí surgiu gente competente, como a XP, além dos agentes autônomos. Dentro desse contexto, surgiu a oportunidade de termos uma nova (asset), que tem produtos diferenciados, sócios sérios – a família Ermírio de Moraes e o Banco do Brasil –, e de comprarmos um controle (51%). Estrategistas de investimento e traders de qualidade, como a BV tem, não é algo que se ache fácil no mercado.

Ouvimos muito (neobancos dizendo): tenho 70 milhões, 80 milhões de clientes. Mas quantos de fato operam com recorrência? 10% disso.

Octavio de Lazari

No México, parte do mercado via o Bradesco como forte candidato a comprar o Banamex. Por que faz mais sentido avançar como banco digital?

Comprar uma operação do tamanho do Banamex custa caro, algo como US$ 8 bilhões. É uma operação que tem estrutura física, agências. Isso tem um custo de manutenção caro. Olhando esse prisma, temos uma operação, a Bradescard México, que nasceu da compra do Ibi. Faz 12 anos que estamos lá, e são 3 milhões de cartões, R$ 3 bilhões em ativos. Hoje em dia, você pode ter um banco sem construir um prédio. Você não precisa ter o brick (tijolo), pode ter um banco a partir do clique. Nos pareceu muito mais inteligente comprar uma sociedade financeira popular (sofipo, a Ictineo). Já conhecemos bem o mercado mexicano e temos uma carteira de cartões estável e crescente - este ano, está crescendo em 500 mil cartões - inadimplência controlada, e que dá R$ 150 milhões em lucro ao ano. A partir da sofipo, podemos operar com todos os produtos que um banco pode operar. Nosso intuito nunca foi fazer varejo fora do Brasil, mas a oportunidade no México faz todo o sentido.

Devemos ver o Bradesco fazendo transações parecidas no futuro?

Com certeza. Por essência, o Bradesco é um banco comprador. Com a reprecificação dos ativos, sobretudo os digitais, há vários negócios que estamos olhando. Outras empresas farão sentido, principalmente as que tragam analytics, ajudem a trazer clientes para o Bradesco ou monetizar os que já estão aqui. O custo de aquisição de cliente é muito caro, algo entre R$ 82 e R$ 87, sem saber se ele de fato vai ficar com você, porque com o mobile, ele abre uma conta quando bem entender.

Se somarmos as contas das principais fintechs e neobancos, dá um número maior que o da população brasileira. Há uma consolidação a caminho? Que papel o Bradesco teria?

Não só uma consolidação, mas uma depuração. Qualquer pessoa, mesmo as de baixa renda, tem cinco, seis cartões, porque é fácil. Acho que vai ter uma depuração. Ouvimos muito (neobancos dizendo): tenho 70 milhões, 80 milhões de clientes. Mas quantos de fato operam com recorrência? 10% disso.

No começo do ano, falava-se na desaceleração do crédito, mas ela parece ter sido adiada. Ela ainda vem esse ano ou ficará para 2023?

O segundo semestre será razoavelmente bom, mas a tendência é de uma redução do crescimento. Achamos que vamos crescer ao redor de 14% este ano. Primeiro por causa de uma base de comparação muito forte, e segundo, porque estamos enfrentando um problema de inadimplência. Vemos as pesquisas mostrando as famílias mais endividadas. Com a inflação alta e consequentemente a taxa de juros também, é natural que as pessoas tenham dificuldade de pagar dívidas, e que os bancos sejam mais restritivos. A tendência é de um segundo semestre mais fraco em crescimento, mas ainda acima de dois dígitos. O ano de 2023 será bem desafiador para o crédito, a não ser que cresça em grandes empresas.

Olhando para os cenários de juros após os pronunciamentos do Banco Central, esse crescimento em pessoa jurídica é mais ou menos provável do que era no final do primeiro semestre?

Menos provável, porque o sinal é de que o ciclo de juros não se encerrou, e o BC foi bem contundente de que não tem convicção do controle da inflação, não só para 2023, mas em 2024. Na melhor das hipóteses, vamos ficar com 13,75% (ao ano nos juros), podendo subir a 14% na próxima reunião do Copom. Eu acho que a inflação vai ceder, aos poucos, e isso só deve acontecer com maior incidência a partir do segundo semestre do ano que vem.

Pode ser que o mercado de capitais volte a se movimentar. Existem boas expectativas, mas 2023 vai ser de muito desafio.

Octavio de Lazari

O aumento da inadimplência veio de quem tomou crédito na pandemia ou depois?

Diria que 60% veio de 2020, 2021, e 40% das novas operações. O consumo voltou, tanto é que o maior crescimento em todos os bancos neste ano foi no cartão de crédito, com um item importante: antes, a pessoa tinha um cartão; hoje, tem seis. Se está se endividando em todos, a tendência é de mais inadimplência. O importante a se observar é se tenho spread suficiente para pagar a provisão desse cartão e aumentar o spread líquido do banco.

Neste ano, o Bradesco está crescendo. O orçamento para 2023 é de crescimento?

Organicamente, miramos o crescimento. Acho que a inflação vai estar mais contida, vamos pagar o preço da inadimplência agora, e como os modelos estão mais restritivos desde o final do ano passado, a tendência é de safras melhores de crédito. Pode ser que o mercado de capitais volte a se movimentar. Existem boas expectativas, mas 2023 vai ser de muito desafio.

Entre os indicadores incertos para 2023, em qual a definição seria mais importante?

Inflação e taxa de juros. Esses dois vão dar o tom para a música que vamos tocar.

O que mais entra na conta, além do cenário fiscal?

Não falaria em reforma tributária, mas em simplificação. Diminuir o número de impostos, reduzir a burocracia. A simplificação vai ser um grande negócio, além da consolidação da reforma trabalhista, e a atração do investimento estrangeiro. Temos energia solar, eólica, saneamento básico, commodity. Tem muitos fatores, dentro do Brasil, de atração de investimento.

Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos.

Octavio de Lazari

O que falta para atrair mais?

Essa tranquilidade institucional. Respeito aos contratos, disciplina fiscal, simplificação tributária, reduzir a desigualdade, criar uma melhoria da formação do trabalhador. E sobretudo, (seguir) a nossa vocação para commodity e de exportador de energia limpa.

Estabilidade também inclui estabilidade política?

Também. Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos. À frente, é procurar não cometê-los e colocar o País no trilho para o crescimento. As alavancas para que isso aconteça são do conhecimento de qualquer um dos candidatos.

Como vocês veem o processo eleitoral? Tem surpresas?

Pelo que vimos nas pesquisas, parece que o quadro político está mais ou menos desenhado. Acho que vai ser uma transição pacífica como das outras vezes. Não vejo nenhum risco para o País.

Independente do governo, o que o Bradesco espera dele?

As ações a serem implementadas estão claras. Você não consegue crescer se não tiver inflação e juros menores, um dólar atrativo e equilibrado para o produtor e para o empresário brasileiro e para o estrangeiro. Não tem bala de prata.

O presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Júnior, não vê, a menos de um mês das eleições presidenciais, um risco institucional para o Brasil – qualquer que seja o resultado das eleições. O executivo afirma que, para atrair mais investimentos, é necessário que o vencedor se comprometa com alguns pilares básicos: “Tranquilidade institucional. Respeito aos contratos, disciplina fiscal, simplificação tributária, reduzir a desigualdade, criar uma melhoria da formação do trabalhador’, disse Lazari.

Embora considere o ano de 2023 como “desafiador para o crédito”, o executivo não enxerga no horizonte problemas institucionais. “Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos. À frente, é procurar não cometê-los e colocar o País no trilho para o crescimento.”

Octavio de Lazari: crescimento mais contido do crédito no ano que vem Foto: Taba Benedicto/Estadão

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista, em que o executivo também fala sobre a investida do Bradesco no México e o cenário de inflação e juros para o ano que vem.

Qual a importância do movimento com o BV (ex-Banco Votorantim) para a estratégia do Bradesco?

O mercado mudou muito, principalmente nos últimos cinco anos. Começou a haver uma migração de clientes procurando alternativas de investimento, principalmente quando houve uma redução acentuada de taxa de juros. E aí surgiu gente competente, como a XP, além dos agentes autônomos. Dentro desse contexto, surgiu a oportunidade de termos uma nova (asset), que tem produtos diferenciados, sócios sérios – a família Ermírio de Moraes e o Banco do Brasil –, e de comprarmos um controle (51%). Estrategistas de investimento e traders de qualidade, como a BV tem, não é algo que se ache fácil no mercado.

Ouvimos muito (neobancos dizendo): tenho 70 milhões, 80 milhões de clientes. Mas quantos de fato operam com recorrência? 10% disso.

Octavio de Lazari

No México, parte do mercado via o Bradesco como forte candidato a comprar o Banamex. Por que faz mais sentido avançar como banco digital?

Comprar uma operação do tamanho do Banamex custa caro, algo como US$ 8 bilhões. É uma operação que tem estrutura física, agências. Isso tem um custo de manutenção caro. Olhando esse prisma, temos uma operação, a Bradescard México, que nasceu da compra do Ibi. Faz 12 anos que estamos lá, e são 3 milhões de cartões, R$ 3 bilhões em ativos. Hoje em dia, você pode ter um banco sem construir um prédio. Você não precisa ter o brick (tijolo), pode ter um banco a partir do clique. Nos pareceu muito mais inteligente comprar uma sociedade financeira popular (sofipo, a Ictineo). Já conhecemos bem o mercado mexicano e temos uma carteira de cartões estável e crescente - este ano, está crescendo em 500 mil cartões - inadimplência controlada, e que dá R$ 150 milhões em lucro ao ano. A partir da sofipo, podemos operar com todos os produtos que um banco pode operar. Nosso intuito nunca foi fazer varejo fora do Brasil, mas a oportunidade no México faz todo o sentido.

Devemos ver o Bradesco fazendo transações parecidas no futuro?

Com certeza. Por essência, o Bradesco é um banco comprador. Com a reprecificação dos ativos, sobretudo os digitais, há vários negócios que estamos olhando. Outras empresas farão sentido, principalmente as que tragam analytics, ajudem a trazer clientes para o Bradesco ou monetizar os que já estão aqui. O custo de aquisição de cliente é muito caro, algo entre R$ 82 e R$ 87, sem saber se ele de fato vai ficar com você, porque com o mobile, ele abre uma conta quando bem entender.

Se somarmos as contas das principais fintechs e neobancos, dá um número maior que o da população brasileira. Há uma consolidação a caminho? Que papel o Bradesco teria?

Não só uma consolidação, mas uma depuração. Qualquer pessoa, mesmo as de baixa renda, tem cinco, seis cartões, porque é fácil. Acho que vai ter uma depuração. Ouvimos muito (neobancos dizendo): tenho 70 milhões, 80 milhões de clientes. Mas quantos de fato operam com recorrência? 10% disso.

No começo do ano, falava-se na desaceleração do crédito, mas ela parece ter sido adiada. Ela ainda vem esse ano ou ficará para 2023?

O segundo semestre será razoavelmente bom, mas a tendência é de uma redução do crescimento. Achamos que vamos crescer ao redor de 14% este ano. Primeiro por causa de uma base de comparação muito forte, e segundo, porque estamos enfrentando um problema de inadimplência. Vemos as pesquisas mostrando as famílias mais endividadas. Com a inflação alta e consequentemente a taxa de juros também, é natural que as pessoas tenham dificuldade de pagar dívidas, e que os bancos sejam mais restritivos. A tendência é de um segundo semestre mais fraco em crescimento, mas ainda acima de dois dígitos. O ano de 2023 será bem desafiador para o crédito, a não ser que cresça em grandes empresas.

Olhando para os cenários de juros após os pronunciamentos do Banco Central, esse crescimento em pessoa jurídica é mais ou menos provável do que era no final do primeiro semestre?

Menos provável, porque o sinal é de que o ciclo de juros não se encerrou, e o BC foi bem contundente de que não tem convicção do controle da inflação, não só para 2023, mas em 2024. Na melhor das hipóteses, vamos ficar com 13,75% (ao ano nos juros), podendo subir a 14% na próxima reunião do Copom. Eu acho que a inflação vai ceder, aos poucos, e isso só deve acontecer com maior incidência a partir do segundo semestre do ano que vem.

Pode ser que o mercado de capitais volte a se movimentar. Existem boas expectativas, mas 2023 vai ser de muito desafio.

Octavio de Lazari

O aumento da inadimplência veio de quem tomou crédito na pandemia ou depois?

Diria que 60% veio de 2020, 2021, e 40% das novas operações. O consumo voltou, tanto é que o maior crescimento em todos os bancos neste ano foi no cartão de crédito, com um item importante: antes, a pessoa tinha um cartão; hoje, tem seis. Se está se endividando em todos, a tendência é de mais inadimplência. O importante a se observar é se tenho spread suficiente para pagar a provisão desse cartão e aumentar o spread líquido do banco.

Neste ano, o Bradesco está crescendo. O orçamento para 2023 é de crescimento?

Organicamente, miramos o crescimento. Acho que a inflação vai estar mais contida, vamos pagar o preço da inadimplência agora, e como os modelos estão mais restritivos desde o final do ano passado, a tendência é de safras melhores de crédito. Pode ser que o mercado de capitais volte a se movimentar. Existem boas expectativas, mas 2023 vai ser de muito desafio.

Entre os indicadores incertos para 2023, em qual a definição seria mais importante?

Inflação e taxa de juros. Esses dois vão dar o tom para a música que vamos tocar.

O que mais entra na conta, além do cenário fiscal?

Não falaria em reforma tributária, mas em simplificação. Diminuir o número de impostos, reduzir a burocracia. A simplificação vai ser um grande negócio, além da consolidação da reforma trabalhista, e a atração do investimento estrangeiro. Temos energia solar, eólica, saneamento básico, commodity. Tem muitos fatores, dentro do Brasil, de atração de investimento.

Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos.

Octavio de Lazari

O que falta para atrair mais?

Essa tranquilidade institucional. Respeito aos contratos, disciplina fiscal, simplificação tributária, reduzir a desigualdade, criar uma melhoria da formação do trabalhador. E sobretudo, (seguir) a nossa vocação para commodity e de exportador de energia limpa.

Estabilidade também inclui estabilidade política?

Também. Com as eleições, haverá uma continuidade ou um novo governo. A democracia no Brasil é um patrimônio, está consolidada. Independente de quem ganhar, já olhamos pelo retrovisor, sabemos os erros que cometemos. À frente, é procurar não cometê-los e colocar o País no trilho para o crescimento. As alavancas para que isso aconteça são do conhecimento de qualquer um dos candidatos.

Como vocês veem o processo eleitoral? Tem surpresas?

Pelo que vimos nas pesquisas, parece que o quadro político está mais ou menos desenhado. Acho que vai ser uma transição pacífica como das outras vezes. Não vejo nenhum risco para o País.

Independente do governo, o que o Bradesco espera dele?

As ações a serem implementadas estão claras. Você não consegue crescer se não tiver inflação e juros menores, um dólar atrativo e equilibrado para o produtor e para o empresário brasileiro e para o estrangeiro. Não tem bala de prata.

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