Publicidade nas favelas: o que grandes empresas têm feito para acessar um mercado de R$ 167 bilhões


Enquanto publicitários de agências tradicionais criam campanhas de olho em grandes tendências internacionais, empresas como a Nós Inteligência consegue falar a linguagem das comunidades

Por Cristiane Barbieri
Atualização:

Paulo César de Souza, de 42 anos, já foi metalúrgico, vendedor ambulante e hoje tem uma tapeçaria em Heliópolis, em que faz pufes, baús, cabeceiras de camas e outros estofados. A maior parte de sua renda, porém, tem vindo da publicidade. Souza é um dos 160 coordenadores da Nós Inteligência, que juntou várias frentes de comunicação para falar com moradores de favelas. A empresa movimentou R$ 35 milhões no ano passado e pretende chegar a R$ 50 milhões este ano. Apesar de não abrir o valor de sua receita, diz estar em negociação com um fundo de investimento para um aporte.

A Nós é uma das poucas empresas de atuação nacional que colocou os pés num mercado com potencial de consumo de R$ 167 bilhões anuais. Só que tem – literalmente – uma grande barreira de entrada. Fundadora da empresa, Emília Rabello diz ter começado o negócio em 2002 com carros e barcos de som. Mas foi só uma década depois, com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que realmente conseguiu subir o morro. Agora, passados mais 12 anos, começa a ver a imagem da favela mudar.

“Em 2012, a Claro queria fazer uma campanha com carros de som nas favelas do Rio de Janeiro, mas os motoristas não subiam de jeito nenhum, porque era muito perigoso”, diz ela. “Com as UPPs, conseguimos começar a conhecer a comunidade, a fazer os primeiros contatos e a ter ideias de como estruturar e fazer essa comunicação.”

continua após a publicidade
Paulo Cesar tem renda maior com publicidade do que com sua tapeçaria  Foto: Felipe Rau/Estadão

Isso porque, do mesmo modo que ruas e calçadas se estreitam quando se sobe em uma favela, a linguagem também muda. Boa parte dos espaços é ocupada por placas do comércio local, anúncios em paredes, faixas em postes e há barulho o tempo inteiro, seja do trânsito caótico ou de pessoas interagindo.

“As favelas brasileiras estão em regiões urbanas e têm um potencial de consumo que não é desprezível”, afirma Maurício de Almeida Prado, sócio da empresa de pesquisas Plano CDE, especializada nesse segmento. “São consumidores de classe C e, de maneira geral, as agências de propaganda não sabem falar com eles.”

continua após a publicidade

Isso porque, segundo Almeida Prado, os publicitários de agências tradicionais criam campanhas com os olhos voltados a grandes tendências de comunicação internacionais, com a ambição de ganhar destaque em Nova York ou Cannes. “São profissionais ligados em premiações feitas lá fora e pouco entendem do público evangélico ou de valores e percepções bem diferentes dos bairros ‘descolados’ das grandes cidades do Sudeste.”

Assim, a Nós conseguiu colocar marcas como Coca-Cola, Mastercard, SBP, Guaraná Antarctica e muitas campanhas do governo em 6 mil favelas espalhadas pelo País a partir de algumas estratégias. Uma delas é criar uma comunicação dirigida a esse público. “Não dá para colocar um anúncio de um ministério feito com uma mulher urbana para o metrô dentro da favela”, diz Emília. “Quando essa comunicação é ‘trazida’ até você pela linguagem e imagem, ela é humanizada e fala mais ao coração.”

Coca-Cola ganhou Cannes com imagens da marca pintadas por amadores ao redor do mundo, como em Heliópolis  Foto: Felipe Rau/Estadão
continua após a publicidade

Assim, nessas campanhas feitas para a favela, grafites das marcas são pintados por artistas ou a própria comunidade - só o logotipo da marca ganha uma aparência mais “oficial”. Os chamados Dooh (digital out of home, as telas que geralmente aparecem em elevadores, mas que nas favelas estão em bares, restaurantes, farmácias e pequenos comércios) mostram campanhas e avisos feitos para as próprias comunidades.

Os influenciadores digitais também são de lá - e gravam conteúdos, seja batendo papo nas calçadas, com a exploração visual da estética da favela, ou dando dicas de como fazer seus próprios vídeos, como faz o Luizão, o @cineastafavelado. “A gente trabalha no dia a dia dos influenciadores, para ajudá-los a dar certo”, diz Mayara Marley, diretora de relações institucionais da Nós. “Temos casos com Avon, Oracle e conectamos conteúdos institucionais com os criadores, para quem também damos consultorias sobre como ser mais efetivo na mensagem.”

Nesse caso, a Agência Chega Junto, que faz parte da Nós, lançada este ano e que reúne centenas de micro e nano criadores periféricos. Outra novidade é a Nós-Povos Originários, área da empresa que chega a aldeias indígenas urbanas. Na área de Dooh, hoje são 125 telas, nas cinco maiores favelas do País em Rio, São Paulo, Salvador e Brasília, com previsão de chegar a 1 mil até o fim do próximo ano.

continua após a publicidade

Segundo Almeida Prado, foi a digitalização e as redes sociais que permitiram não só a visibilidade até então inexistente a essa população, como fizeram com que a favela passasse lançar tendências e cultura em maior escala e de maneira mais rápida. “Foi dessa maneira que surgiram fenômenos como KondZilla (que tem a série mais assistida fora das de língua inglesa do Netflix, entre outros recordes) e o sucesso do funk e do trap brasileiros (sempre entre os mais ouvidos do Spotify).”

Mayara Marley diz que ajuda os influenciadores da favela a dar certo Foto: Felipe Rau/Estadão
continua após a publicidade

Mais do que abrir as brechas para explorar esse caldeirão, outra estratégia da Nós foi erguer a empresa com impacto social. Os moradores que cedem suas paredes para propaganda ganham entre R$ 75 (minioutdoors) a R$ 150 (no caso do Dooh) por campanha, pagos por meio de um cartão pré-pago.

Foi dessa maneira que o tapeceiro Souza teve contato com a empresa. Ele recebia um dinheirinho para exibir os minioutdoors na parede externa de sua loja. “Ajuda com uma conta de luz, a internet e, o melhor, o pagamento nunca falha”, diz ele. “Na pandemia, foi a salvação.” Hoje, ele coordena a colocação e a retirada dos minioutdoors e demais campanhas em Heliópolis e outras favelas, assim que começam a rodar.

Segundo a empresa, em 12 anos de atuação, a Nós gerou R$ 27 milhões em renda dentro das favelas. “Temos uma agência de pesquisa e ela mostra que esse dinheiro é gasto primeiro com comida e, depois, com remédio”, diz Emília. “Sempre dentro da comunidade, o que produz o crescimento no ciclo da riqueza.” É um “nicho” com 16,6 milhões de pessoas e renda média mensal de R$ 3 mil. “O mais importante é mostrar algo diferente da dor e do tiroteio, que já está muito presente no imaginário da população”, diz ela.

Paulo César de Souza, de 42 anos, já foi metalúrgico, vendedor ambulante e hoje tem uma tapeçaria em Heliópolis, em que faz pufes, baús, cabeceiras de camas e outros estofados. A maior parte de sua renda, porém, tem vindo da publicidade. Souza é um dos 160 coordenadores da Nós Inteligência, que juntou várias frentes de comunicação para falar com moradores de favelas. A empresa movimentou R$ 35 milhões no ano passado e pretende chegar a R$ 50 milhões este ano. Apesar de não abrir o valor de sua receita, diz estar em negociação com um fundo de investimento para um aporte.

A Nós é uma das poucas empresas de atuação nacional que colocou os pés num mercado com potencial de consumo de R$ 167 bilhões anuais. Só que tem – literalmente – uma grande barreira de entrada. Fundadora da empresa, Emília Rabello diz ter começado o negócio em 2002 com carros e barcos de som. Mas foi só uma década depois, com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que realmente conseguiu subir o morro. Agora, passados mais 12 anos, começa a ver a imagem da favela mudar.

“Em 2012, a Claro queria fazer uma campanha com carros de som nas favelas do Rio de Janeiro, mas os motoristas não subiam de jeito nenhum, porque era muito perigoso”, diz ela. “Com as UPPs, conseguimos começar a conhecer a comunidade, a fazer os primeiros contatos e a ter ideias de como estruturar e fazer essa comunicação.”

Paulo Cesar tem renda maior com publicidade do que com sua tapeçaria  Foto: Felipe Rau/Estadão

Isso porque, do mesmo modo que ruas e calçadas se estreitam quando se sobe em uma favela, a linguagem também muda. Boa parte dos espaços é ocupada por placas do comércio local, anúncios em paredes, faixas em postes e há barulho o tempo inteiro, seja do trânsito caótico ou de pessoas interagindo.

“As favelas brasileiras estão em regiões urbanas e têm um potencial de consumo que não é desprezível”, afirma Maurício de Almeida Prado, sócio da empresa de pesquisas Plano CDE, especializada nesse segmento. “São consumidores de classe C e, de maneira geral, as agências de propaganda não sabem falar com eles.”

Isso porque, segundo Almeida Prado, os publicitários de agências tradicionais criam campanhas com os olhos voltados a grandes tendências de comunicação internacionais, com a ambição de ganhar destaque em Nova York ou Cannes. “São profissionais ligados em premiações feitas lá fora e pouco entendem do público evangélico ou de valores e percepções bem diferentes dos bairros ‘descolados’ das grandes cidades do Sudeste.”

Assim, a Nós conseguiu colocar marcas como Coca-Cola, Mastercard, SBP, Guaraná Antarctica e muitas campanhas do governo em 6 mil favelas espalhadas pelo País a partir de algumas estratégias. Uma delas é criar uma comunicação dirigida a esse público. “Não dá para colocar um anúncio de um ministério feito com uma mulher urbana para o metrô dentro da favela”, diz Emília. “Quando essa comunicação é ‘trazida’ até você pela linguagem e imagem, ela é humanizada e fala mais ao coração.”

Coca-Cola ganhou Cannes com imagens da marca pintadas por amadores ao redor do mundo, como em Heliópolis  Foto: Felipe Rau/Estadão

Assim, nessas campanhas feitas para a favela, grafites das marcas são pintados por artistas ou a própria comunidade - só o logotipo da marca ganha uma aparência mais “oficial”. Os chamados Dooh (digital out of home, as telas que geralmente aparecem em elevadores, mas que nas favelas estão em bares, restaurantes, farmácias e pequenos comércios) mostram campanhas e avisos feitos para as próprias comunidades.

Os influenciadores digitais também são de lá - e gravam conteúdos, seja batendo papo nas calçadas, com a exploração visual da estética da favela, ou dando dicas de como fazer seus próprios vídeos, como faz o Luizão, o @cineastafavelado. “A gente trabalha no dia a dia dos influenciadores, para ajudá-los a dar certo”, diz Mayara Marley, diretora de relações institucionais da Nós. “Temos casos com Avon, Oracle e conectamos conteúdos institucionais com os criadores, para quem também damos consultorias sobre como ser mais efetivo na mensagem.”

Nesse caso, a Agência Chega Junto, que faz parte da Nós, lançada este ano e que reúne centenas de micro e nano criadores periféricos. Outra novidade é a Nós-Povos Originários, área da empresa que chega a aldeias indígenas urbanas. Na área de Dooh, hoje são 125 telas, nas cinco maiores favelas do País em Rio, São Paulo, Salvador e Brasília, com previsão de chegar a 1 mil até o fim do próximo ano.

Segundo Almeida Prado, foi a digitalização e as redes sociais que permitiram não só a visibilidade até então inexistente a essa população, como fizeram com que a favela passasse lançar tendências e cultura em maior escala e de maneira mais rápida. “Foi dessa maneira que surgiram fenômenos como KondZilla (que tem a série mais assistida fora das de língua inglesa do Netflix, entre outros recordes) e o sucesso do funk e do trap brasileiros (sempre entre os mais ouvidos do Spotify).”

Mayara Marley diz que ajuda os influenciadores da favela a dar certo Foto: Felipe Rau/Estadão

Mais do que abrir as brechas para explorar esse caldeirão, outra estratégia da Nós foi erguer a empresa com impacto social. Os moradores que cedem suas paredes para propaganda ganham entre R$ 75 (minioutdoors) a R$ 150 (no caso do Dooh) por campanha, pagos por meio de um cartão pré-pago.

Foi dessa maneira que o tapeceiro Souza teve contato com a empresa. Ele recebia um dinheirinho para exibir os minioutdoors na parede externa de sua loja. “Ajuda com uma conta de luz, a internet e, o melhor, o pagamento nunca falha”, diz ele. “Na pandemia, foi a salvação.” Hoje, ele coordena a colocação e a retirada dos minioutdoors e demais campanhas em Heliópolis e outras favelas, assim que começam a rodar.

Segundo a empresa, em 12 anos de atuação, a Nós gerou R$ 27 milhões em renda dentro das favelas. “Temos uma agência de pesquisa e ela mostra que esse dinheiro é gasto primeiro com comida e, depois, com remédio”, diz Emília. “Sempre dentro da comunidade, o que produz o crescimento no ciclo da riqueza.” É um “nicho” com 16,6 milhões de pessoas e renda média mensal de R$ 3 mil. “O mais importante é mostrar algo diferente da dor e do tiroteio, que já está muito presente no imaginário da população”, diz ela.

Paulo César de Souza, de 42 anos, já foi metalúrgico, vendedor ambulante e hoje tem uma tapeçaria em Heliópolis, em que faz pufes, baús, cabeceiras de camas e outros estofados. A maior parte de sua renda, porém, tem vindo da publicidade. Souza é um dos 160 coordenadores da Nós Inteligência, que juntou várias frentes de comunicação para falar com moradores de favelas. A empresa movimentou R$ 35 milhões no ano passado e pretende chegar a R$ 50 milhões este ano. Apesar de não abrir o valor de sua receita, diz estar em negociação com um fundo de investimento para um aporte.

A Nós é uma das poucas empresas de atuação nacional que colocou os pés num mercado com potencial de consumo de R$ 167 bilhões anuais. Só que tem – literalmente – uma grande barreira de entrada. Fundadora da empresa, Emília Rabello diz ter começado o negócio em 2002 com carros e barcos de som. Mas foi só uma década depois, com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que realmente conseguiu subir o morro. Agora, passados mais 12 anos, começa a ver a imagem da favela mudar.

“Em 2012, a Claro queria fazer uma campanha com carros de som nas favelas do Rio de Janeiro, mas os motoristas não subiam de jeito nenhum, porque era muito perigoso”, diz ela. “Com as UPPs, conseguimos começar a conhecer a comunidade, a fazer os primeiros contatos e a ter ideias de como estruturar e fazer essa comunicação.”

Paulo Cesar tem renda maior com publicidade do que com sua tapeçaria  Foto: Felipe Rau/Estadão

Isso porque, do mesmo modo que ruas e calçadas se estreitam quando se sobe em uma favela, a linguagem também muda. Boa parte dos espaços é ocupada por placas do comércio local, anúncios em paredes, faixas em postes e há barulho o tempo inteiro, seja do trânsito caótico ou de pessoas interagindo.

“As favelas brasileiras estão em regiões urbanas e têm um potencial de consumo que não é desprezível”, afirma Maurício de Almeida Prado, sócio da empresa de pesquisas Plano CDE, especializada nesse segmento. “São consumidores de classe C e, de maneira geral, as agências de propaganda não sabem falar com eles.”

Isso porque, segundo Almeida Prado, os publicitários de agências tradicionais criam campanhas com os olhos voltados a grandes tendências de comunicação internacionais, com a ambição de ganhar destaque em Nova York ou Cannes. “São profissionais ligados em premiações feitas lá fora e pouco entendem do público evangélico ou de valores e percepções bem diferentes dos bairros ‘descolados’ das grandes cidades do Sudeste.”

Assim, a Nós conseguiu colocar marcas como Coca-Cola, Mastercard, SBP, Guaraná Antarctica e muitas campanhas do governo em 6 mil favelas espalhadas pelo País a partir de algumas estratégias. Uma delas é criar uma comunicação dirigida a esse público. “Não dá para colocar um anúncio de um ministério feito com uma mulher urbana para o metrô dentro da favela”, diz Emília. “Quando essa comunicação é ‘trazida’ até você pela linguagem e imagem, ela é humanizada e fala mais ao coração.”

Coca-Cola ganhou Cannes com imagens da marca pintadas por amadores ao redor do mundo, como em Heliópolis  Foto: Felipe Rau/Estadão

Assim, nessas campanhas feitas para a favela, grafites das marcas são pintados por artistas ou a própria comunidade - só o logotipo da marca ganha uma aparência mais “oficial”. Os chamados Dooh (digital out of home, as telas que geralmente aparecem em elevadores, mas que nas favelas estão em bares, restaurantes, farmácias e pequenos comércios) mostram campanhas e avisos feitos para as próprias comunidades.

Os influenciadores digitais também são de lá - e gravam conteúdos, seja batendo papo nas calçadas, com a exploração visual da estética da favela, ou dando dicas de como fazer seus próprios vídeos, como faz o Luizão, o @cineastafavelado. “A gente trabalha no dia a dia dos influenciadores, para ajudá-los a dar certo”, diz Mayara Marley, diretora de relações institucionais da Nós. “Temos casos com Avon, Oracle e conectamos conteúdos institucionais com os criadores, para quem também damos consultorias sobre como ser mais efetivo na mensagem.”

Nesse caso, a Agência Chega Junto, que faz parte da Nós, lançada este ano e que reúne centenas de micro e nano criadores periféricos. Outra novidade é a Nós-Povos Originários, área da empresa que chega a aldeias indígenas urbanas. Na área de Dooh, hoje são 125 telas, nas cinco maiores favelas do País em Rio, São Paulo, Salvador e Brasília, com previsão de chegar a 1 mil até o fim do próximo ano.

Segundo Almeida Prado, foi a digitalização e as redes sociais que permitiram não só a visibilidade até então inexistente a essa população, como fizeram com que a favela passasse lançar tendências e cultura em maior escala e de maneira mais rápida. “Foi dessa maneira que surgiram fenômenos como KondZilla (que tem a série mais assistida fora das de língua inglesa do Netflix, entre outros recordes) e o sucesso do funk e do trap brasileiros (sempre entre os mais ouvidos do Spotify).”

Mayara Marley diz que ajuda os influenciadores da favela a dar certo Foto: Felipe Rau/Estadão

Mais do que abrir as brechas para explorar esse caldeirão, outra estratégia da Nós foi erguer a empresa com impacto social. Os moradores que cedem suas paredes para propaganda ganham entre R$ 75 (minioutdoors) a R$ 150 (no caso do Dooh) por campanha, pagos por meio de um cartão pré-pago.

Foi dessa maneira que o tapeceiro Souza teve contato com a empresa. Ele recebia um dinheirinho para exibir os minioutdoors na parede externa de sua loja. “Ajuda com uma conta de luz, a internet e, o melhor, o pagamento nunca falha”, diz ele. “Na pandemia, foi a salvação.” Hoje, ele coordena a colocação e a retirada dos minioutdoors e demais campanhas em Heliópolis e outras favelas, assim que começam a rodar.

Segundo a empresa, em 12 anos de atuação, a Nós gerou R$ 27 milhões em renda dentro das favelas. “Temos uma agência de pesquisa e ela mostra que esse dinheiro é gasto primeiro com comida e, depois, com remédio”, diz Emília. “Sempre dentro da comunidade, o que produz o crescimento no ciclo da riqueza.” É um “nicho” com 16,6 milhões de pessoas e renda média mensal de R$ 3 mil. “O mais importante é mostrar algo diferente da dor e do tiroteio, que já está muito presente no imaginário da população”, diz ela.

Paulo César de Souza, de 42 anos, já foi metalúrgico, vendedor ambulante e hoje tem uma tapeçaria em Heliópolis, em que faz pufes, baús, cabeceiras de camas e outros estofados. A maior parte de sua renda, porém, tem vindo da publicidade. Souza é um dos 160 coordenadores da Nós Inteligência, que juntou várias frentes de comunicação para falar com moradores de favelas. A empresa movimentou R$ 35 milhões no ano passado e pretende chegar a R$ 50 milhões este ano. Apesar de não abrir o valor de sua receita, diz estar em negociação com um fundo de investimento para um aporte.

A Nós é uma das poucas empresas de atuação nacional que colocou os pés num mercado com potencial de consumo de R$ 167 bilhões anuais. Só que tem – literalmente – uma grande barreira de entrada. Fundadora da empresa, Emília Rabello diz ter começado o negócio em 2002 com carros e barcos de som. Mas foi só uma década depois, com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que realmente conseguiu subir o morro. Agora, passados mais 12 anos, começa a ver a imagem da favela mudar.

“Em 2012, a Claro queria fazer uma campanha com carros de som nas favelas do Rio de Janeiro, mas os motoristas não subiam de jeito nenhum, porque era muito perigoso”, diz ela. “Com as UPPs, conseguimos começar a conhecer a comunidade, a fazer os primeiros contatos e a ter ideias de como estruturar e fazer essa comunicação.”

Paulo Cesar tem renda maior com publicidade do que com sua tapeçaria  Foto: Felipe Rau/Estadão

Isso porque, do mesmo modo que ruas e calçadas se estreitam quando se sobe em uma favela, a linguagem também muda. Boa parte dos espaços é ocupada por placas do comércio local, anúncios em paredes, faixas em postes e há barulho o tempo inteiro, seja do trânsito caótico ou de pessoas interagindo.

“As favelas brasileiras estão em regiões urbanas e têm um potencial de consumo que não é desprezível”, afirma Maurício de Almeida Prado, sócio da empresa de pesquisas Plano CDE, especializada nesse segmento. “São consumidores de classe C e, de maneira geral, as agências de propaganda não sabem falar com eles.”

Isso porque, segundo Almeida Prado, os publicitários de agências tradicionais criam campanhas com os olhos voltados a grandes tendências de comunicação internacionais, com a ambição de ganhar destaque em Nova York ou Cannes. “São profissionais ligados em premiações feitas lá fora e pouco entendem do público evangélico ou de valores e percepções bem diferentes dos bairros ‘descolados’ das grandes cidades do Sudeste.”

Assim, a Nós conseguiu colocar marcas como Coca-Cola, Mastercard, SBP, Guaraná Antarctica e muitas campanhas do governo em 6 mil favelas espalhadas pelo País a partir de algumas estratégias. Uma delas é criar uma comunicação dirigida a esse público. “Não dá para colocar um anúncio de um ministério feito com uma mulher urbana para o metrô dentro da favela”, diz Emília. “Quando essa comunicação é ‘trazida’ até você pela linguagem e imagem, ela é humanizada e fala mais ao coração.”

Coca-Cola ganhou Cannes com imagens da marca pintadas por amadores ao redor do mundo, como em Heliópolis  Foto: Felipe Rau/Estadão

Assim, nessas campanhas feitas para a favela, grafites das marcas são pintados por artistas ou a própria comunidade - só o logotipo da marca ganha uma aparência mais “oficial”. Os chamados Dooh (digital out of home, as telas que geralmente aparecem em elevadores, mas que nas favelas estão em bares, restaurantes, farmácias e pequenos comércios) mostram campanhas e avisos feitos para as próprias comunidades.

Os influenciadores digitais também são de lá - e gravam conteúdos, seja batendo papo nas calçadas, com a exploração visual da estética da favela, ou dando dicas de como fazer seus próprios vídeos, como faz o Luizão, o @cineastafavelado. “A gente trabalha no dia a dia dos influenciadores, para ajudá-los a dar certo”, diz Mayara Marley, diretora de relações institucionais da Nós. “Temos casos com Avon, Oracle e conectamos conteúdos institucionais com os criadores, para quem também damos consultorias sobre como ser mais efetivo na mensagem.”

Nesse caso, a Agência Chega Junto, que faz parte da Nós, lançada este ano e que reúne centenas de micro e nano criadores periféricos. Outra novidade é a Nós-Povos Originários, área da empresa que chega a aldeias indígenas urbanas. Na área de Dooh, hoje são 125 telas, nas cinco maiores favelas do País em Rio, São Paulo, Salvador e Brasília, com previsão de chegar a 1 mil até o fim do próximo ano.

Segundo Almeida Prado, foi a digitalização e as redes sociais que permitiram não só a visibilidade até então inexistente a essa população, como fizeram com que a favela passasse lançar tendências e cultura em maior escala e de maneira mais rápida. “Foi dessa maneira que surgiram fenômenos como KondZilla (que tem a série mais assistida fora das de língua inglesa do Netflix, entre outros recordes) e o sucesso do funk e do trap brasileiros (sempre entre os mais ouvidos do Spotify).”

Mayara Marley diz que ajuda os influenciadores da favela a dar certo Foto: Felipe Rau/Estadão

Mais do que abrir as brechas para explorar esse caldeirão, outra estratégia da Nós foi erguer a empresa com impacto social. Os moradores que cedem suas paredes para propaganda ganham entre R$ 75 (minioutdoors) a R$ 150 (no caso do Dooh) por campanha, pagos por meio de um cartão pré-pago.

Foi dessa maneira que o tapeceiro Souza teve contato com a empresa. Ele recebia um dinheirinho para exibir os minioutdoors na parede externa de sua loja. “Ajuda com uma conta de luz, a internet e, o melhor, o pagamento nunca falha”, diz ele. “Na pandemia, foi a salvação.” Hoje, ele coordena a colocação e a retirada dos minioutdoors e demais campanhas em Heliópolis e outras favelas, assim que começam a rodar.

Segundo a empresa, em 12 anos de atuação, a Nós gerou R$ 27 milhões em renda dentro das favelas. “Temos uma agência de pesquisa e ela mostra que esse dinheiro é gasto primeiro com comida e, depois, com remédio”, diz Emília. “Sempre dentro da comunidade, o que produz o crescimento no ciclo da riqueza.” É um “nicho” com 16,6 milhões de pessoas e renda média mensal de R$ 3 mil. “O mais importante é mostrar algo diferente da dor e do tiroteio, que já está muito presente no imaginário da população”, diz ela.

Paulo César de Souza, de 42 anos, já foi metalúrgico, vendedor ambulante e hoje tem uma tapeçaria em Heliópolis, em que faz pufes, baús, cabeceiras de camas e outros estofados. A maior parte de sua renda, porém, tem vindo da publicidade. Souza é um dos 160 coordenadores da Nós Inteligência, que juntou várias frentes de comunicação para falar com moradores de favelas. A empresa movimentou R$ 35 milhões no ano passado e pretende chegar a R$ 50 milhões este ano. Apesar de não abrir o valor de sua receita, diz estar em negociação com um fundo de investimento para um aporte.

A Nós é uma das poucas empresas de atuação nacional que colocou os pés num mercado com potencial de consumo de R$ 167 bilhões anuais. Só que tem – literalmente – uma grande barreira de entrada. Fundadora da empresa, Emília Rabello diz ter começado o negócio em 2002 com carros e barcos de som. Mas foi só uma década depois, com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que realmente conseguiu subir o morro. Agora, passados mais 12 anos, começa a ver a imagem da favela mudar.

“Em 2012, a Claro queria fazer uma campanha com carros de som nas favelas do Rio de Janeiro, mas os motoristas não subiam de jeito nenhum, porque era muito perigoso”, diz ela. “Com as UPPs, conseguimos começar a conhecer a comunidade, a fazer os primeiros contatos e a ter ideias de como estruturar e fazer essa comunicação.”

Paulo Cesar tem renda maior com publicidade do que com sua tapeçaria  Foto: Felipe Rau/Estadão

Isso porque, do mesmo modo que ruas e calçadas se estreitam quando se sobe em uma favela, a linguagem também muda. Boa parte dos espaços é ocupada por placas do comércio local, anúncios em paredes, faixas em postes e há barulho o tempo inteiro, seja do trânsito caótico ou de pessoas interagindo.

“As favelas brasileiras estão em regiões urbanas e têm um potencial de consumo que não é desprezível”, afirma Maurício de Almeida Prado, sócio da empresa de pesquisas Plano CDE, especializada nesse segmento. “São consumidores de classe C e, de maneira geral, as agências de propaganda não sabem falar com eles.”

Isso porque, segundo Almeida Prado, os publicitários de agências tradicionais criam campanhas com os olhos voltados a grandes tendências de comunicação internacionais, com a ambição de ganhar destaque em Nova York ou Cannes. “São profissionais ligados em premiações feitas lá fora e pouco entendem do público evangélico ou de valores e percepções bem diferentes dos bairros ‘descolados’ das grandes cidades do Sudeste.”

Assim, a Nós conseguiu colocar marcas como Coca-Cola, Mastercard, SBP, Guaraná Antarctica e muitas campanhas do governo em 6 mil favelas espalhadas pelo País a partir de algumas estratégias. Uma delas é criar uma comunicação dirigida a esse público. “Não dá para colocar um anúncio de um ministério feito com uma mulher urbana para o metrô dentro da favela”, diz Emília. “Quando essa comunicação é ‘trazida’ até você pela linguagem e imagem, ela é humanizada e fala mais ao coração.”

Coca-Cola ganhou Cannes com imagens da marca pintadas por amadores ao redor do mundo, como em Heliópolis  Foto: Felipe Rau/Estadão

Assim, nessas campanhas feitas para a favela, grafites das marcas são pintados por artistas ou a própria comunidade - só o logotipo da marca ganha uma aparência mais “oficial”. Os chamados Dooh (digital out of home, as telas que geralmente aparecem em elevadores, mas que nas favelas estão em bares, restaurantes, farmácias e pequenos comércios) mostram campanhas e avisos feitos para as próprias comunidades.

Os influenciadores digitais também são de lá - e gravam conteúdos, seja batendo papo nas calçadas, com a exploração visual da estética da favela, ou dando dicas de como fazer seus próprios vídeos, como faz o Luizão, o @cineastafavelado. “A gente trabalha no dia a dia dos influenciadores, para ajudá-los a dar certo”, diz Mayara Marley, diretora de relações institucionais da Nós. “Temos casos com Avon, Oracle e conectamos conteúdos institucionais com os criadores, para quem também damos consultorias sobre como ser mais efetivo na mensagem.”

Nesse caso, a Agência Chega Junto, que faz parte da Nós, lançada este ano e que reúne centenas de micro e nano criadores periféricos. Outra novidade é a Nós-Povos Originários, área da empresa que chega a aldeias indígenas urbanas. Na área de Dooh, hoje são 125 telas, nas cinco maiores favelas do País em Rio, São Paulo, Salvador e Brasília, com previsão de chegar a 1 mil até o fim do próximo ano.

Segundo Almeida Prado, foi a digitalização e as redes sociais que permitiram não só a visibilidade até então inexistente a essa população, como fizeram com que a favela passasse lançar tendências e cultura em maior escala e de maneira mais rápida. “Foi dessa maneira que surgiram fenômenos como KondZilla (que tem a série mais assistida fora das de língua inglesa do Netflix, entre outros recordes) e o sucesso do funk e do trap brasileiros (sempre entre os mais ouvidos do Spotify).”

Mayara Marley diz que ajuda os influenciadores da favela a dar certo Foto: Felipe Rau/Estadão

Mais do que abrir as brechas para explorar esse caldeirão, outra estratégia da Nós foi erguer a empresa com impacto social. Os moradores que cedem suas paredes para propaganda ganham entre R$ 75 (minioutdoors) a R$ 150 (no caso do Dooh) por campanha, pagos por meio de um cartão pré-pago.

Foi dessa maneira que o tapeceiro Souza teve contato com a empresa. Ele recebia um dinheirinho para exibir os minioutdoors na parede externa de sua loja. “Ajuda com uma conta de luz, a internet e, o melhor, o pagamento nunca falha”, diz ele. “Na pandemia, foi a salvação.” Hoje, ele coordena a colocação e a retirada dos minioutdoors e demais campanhas em Heliópolis e outras favelas, assim que começam a rodar.

Segundo a empresa, em 12 anos de atuação, a Nós gerou R$ 27 milhões em renda dentro das favelas. “Temos uma agência de pesquisa e ela mostra que esse dinheiro é gasto primeiro com comida e, depois, com remédio”, diz Emília. “Sempre dentro da comunidade, o que produz o crescimento no ciclo da riqueza.” É um “nicho” com 16,6 milhões de pessoas e renda média mensal de R$ 3 mil. “O mais importante é mostrar algo diferente da dor e do tiroteio, que já está muito presente no imaginário da população”, diz ela.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.