A revitalização de prédios antigos - chamada de retrofit pelo mercado imobiliário - vem crescendo no centro de São Paulo. O resultado dos investimentos pode ajudar a atrair mais pessoas de volta para a região.
Incorporadoras como a Planta.Inc, a Metaforma e a Somauma trabalham mapeando os prédios comerciais fechados ou desocupados e avaliam o potencial de serem reaproveitados. O foco de atuação está nos bairros da Vila Buarque, República, Anhangabaú, Campos Elíseos, Consolação e Bela Vista.
A Planta.Inc, do empreendedor Guil Blanche, está preparando uma nova leva de investimentos. A incorporadora já comprou e reformou seis prédios nos últimos anos. Entre eles está o Edifício Renata Sampaio Ferreira, construído na Vila Buarque na década de 1950 e tombado pelo seu valor histórico e arquitetônico. O antigo prédio de escritórios foi transformado em apartamentos com serviços de hotelaria e reaberto ano passado com diárias que podem passar dos R$ 1.000.
Em agosto, cinco empreendimentos da Planta.Inc foram vendidos para a multinacional canadense Brookfield - um das maiores investidores de imóveis do mundo. “Quando a Brookfield decide comprar os prédios no centro, isso funciona como um selo de qualidade para a nossa atividade”, ressalta Blanche, em entrevista para o Estadão/Broadcast.
Neste momento, a Planta.Inc analisa um total de 45 prédios sendo que um conjunto deles fará parte de uma nova rodada de aquisições para retrofit, o que demandará aporte de investidores, possivelmente via um fundo de investimento imobiliário. Os primeiros prédios foram comprados com dinheiro de um fundo constituído pela gestora Valora. Para a nova rodada, a incorporadora contratou como diretora financeira a executiva Fernanda Baccin, saída da RB Capital, justamente, para conversar com agentes do ramo e angariar mais recursos.
A prioridade para os próximos projetos da Planta.Inc é a Vila Buarque, que já se consolidou como um novo polo de bares e restaurantes renomados. Mas a companhia não pretende se restringir aí. “Queremos aumentar a nossa posição na Vila Buarque, que tem muito potencial. Mas também buscamos outras localidades onde enxergamos condições de gerar valor”, conta o empreendedor, citando interesse na Bela Vista, Jardins e Itaim.
O que está na mira da Planta.Inc são os bairros onde há um burburinho em torno da chamada “economia criativa”, isto é, comércios que têm oferecido novas opções de compras, serviços, gastronomia, lazer e cultura, tal qual já aconteceu em parte da região central.
“A revitalização da Vila Buarque já é uma realidade, mas acredito que tem outros lugares do Centro que estão passando por esse mesmo processo. A raiz que corre por baixo da terra é a economia criativa. Basta olhar para os bairros onde tem empreendedores, artistas, chefs, arquitetos. Logo na sequência desses comércios vêm a demanda por moradia. A Vila Buarque de hoje lembra a Vila Madalena dos anos 2000″, exemplifica.
Foi justamente essa a visão da Brookfield ao decidir investir em empreendimentos para locação na região central da capital paulista. Ano passado, a multinacional já havia comprado outros três prédios da incorporadora TPA.
“Gostamos do centro de São Paulo e queremos investir mais aqui. Não se trata de uma aposta. Vemos a região como uma realidade”, disse o vice-presidente sênior de investimentos da Brookfield, André Lucarelli. “O centro tem crescido como um polo cultural e gastronômico. Isso já existe. Na sequência disso, vem uma procura grande por moradia, mas ainda faltam produtos de qualidade.”
Amadurecimento do mercado
Um conjunto de fatores compõem as fundações para o novo ciclo de investimentos em retrofit na cidade de São Paulo. Isso abrange o surgimento de fontes de crédito, as novas modalidades de empreendimentos imobiliários e também o apoio de programas públicos. “Estamos vendo aí uma tempestade perfeita que colabora para novos investimentos”, afirma o fundador da incorporadora Planta.Inc, que prepara novos projetos.
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Um desses fatores favoráveis, na sua visão, é o avanço dos veículos de crédito, com a diversificação dos ativos que são alvos de investimentos dos fundos imobiliários. Essa indústria atuava, tradicionalmente, com empreendimentos comerciais, como shoppings, escritórios e galpões, mas passou a olhar também para o retrofit.
“A tendência de revitalização do centro vem crescendo fortemente nos últimos três anos”, diz Maxime Barkatz, fundador da Ilion Partners, gestora que já investiu R$ 400 milhões em 21 retrofits nos últimos dez anos em São Paulo por meio de fundos. O grupo compra os imóveis, reforma e destina os apartamentos para venda ou para locação. Atualmente, tem cerca de 500 unidades na sua carteira e apetite para mais.
No médio prazo, a Illion Partners pretende fazer de dois a quatro investimentos por ano no segmento. O que mais inibe os novos projetos é a taxa de juros alta do País, segundo Barkatz (o banco central iniciou nesta semana um novo ciclo de alta da taxa Selic, que subiu para 10,75%). Outro ponto de atenção é a concorrência crescente por imóveis no centro de São Paulo. “Os ativos estão ficando mais caros, porque tem mais gente olhando. E não tem tantos prédios ociosos assim”, pondera.
Outro pilar que deve ajudar o retrofit a crescer é o surgimento de empresas locais que desenvolvem prédios para o aluguel dos apartamentos em vez da venda. Isso abre novas oportunidades de reaproveitamento dos prédios, uma vez que muitos deles deixam de ser salas comerciais para funcionar como moradia ou hospedagem.
“Os incorporadores redescobriram o centro, e algumas regiões despontaram. A Vila Buarque, sem dúvida, deu certo”, diz Alessandro Vedrossi, sócio da Valora, gestora de recursos que montou um fundo para retrofit de seis prédios em parceria com a Planta.Inc. Na sua avaliação, o aumento nas opções de lazer, cultura e gastronomia, junto da demanda por moradias no Centro, é um ponto que chama a atenção do mercado imobiliário.
Entre os bancos, também há iniciativas começando a ganhar corpo. O Santander lançou, há três anos, uma linha de crédito específica para retrofit, com mais de R$ 60 milhões desembolsados desde então. “Entendemos que o mercado de retrofit ainda é incipiente, mas tem oportunidade de negócios enorme”, diz o diretor de negócios imobiliários do Santander, Sandro Gamba. “Além disso, contribui pelo lado da sustentabilidade, porque gera o benefício de preservação do patrimônio e revitalização das cidades”, complementa.
O representante do Santander pondera que o crédito para retrofit só não cresceu mais ao redor do País porque ainda há dificuldade de aprovação de projetos em determinadas cidades. Nesse sentido, a capital paulista tem servido de exemplo. “São Paulo tem uma demanda e mostrou que é possível”, aponta o executivo.