O primeiro ciclo de investimentos da Sabesp pós-privatização deve deixar parte da região metropolitana de São Paulo em obras, na corrida contra o tempo para a universalização dos serviços de água e esgoto em apenas cinco anos. A empresa vai investir R$ 69 bilhões no período, o que representa, em média, R$ 13,8 bilhões de investimentos por ano - mais que o dobro do registrado no ano passado (de cerca de R$ 6 bilhões).
Na primeira fase, 2025-2028, serão investidos R$ 8,5 bilhões destinados ao programa Integra Tietê e outros R$ 6,5 bilhões às demais áreas da concessão. Serão incluídas 8 milhões de pessoas no sistema de tratamento de água e esgoto, ao fim dos primeiros três anos. “Não é uma corrida de 100 metros, mas uma maratona”, diz Carlos Piani, presidente da Sabesp. “A ideia é dar transparência a toda essa caminhada rumo à universalização, com a população a par de tudo.”
Para se ter uma ideia do volume de recursos envolvido, no ano passado, a Sabesp respondeu por 30% de todos os investimentos feitos no País no setor, com um valor de R$ 6 bilhões de investimentos. Agora, colocando mais do que o dobro, será uma das maiores investidoras corporativas no Brasil, com exceção das empresas petrolíferas.
Na frente de obras do Integra Tietê, programa de despoluição do rio coordenado pelo governo estadual, serão ampliadas e modernizadas cinco grandes Estações de Tratamentos de Esgotos (ETEs) e construídas três novas de médio porte (em Caieiras, Perus e Francisco Morato). Simultaneamente, serão feitas obras para interligar casas hoje desconectadas ao sistema de transporte e tratamento de esgotos. Serão 1,5 milhão de moradias conectadas, nas quais vivem 4 milhões de pessoas.
“Vamos conectar essas casas, mas precisamos ao mesmo tempo ampliar a capacidade das estações de tratamento porque algumas delas operam no limite”, afirma Roberval Tavares, diretor de engenharia e inovação da Sabesp. “Haverá obras nas periferias onde a conexão ao sistema é menor, mas também precisarão ser feitas intervenções em grandes vias urbanas, para receber esses novos usuários.”
No fim do período de investimentos, a expectativa é que a capacidade de tratamento de esgotos do sistema cresça quase 80%. Ela irá de 23,5 m³ por segundo para 41,8 m³ por segundo.
O sistema do Integra Tietê tinha no ano de sua criação, em 1992, 70% da população com acesso à água tratada e 24% com coleta de esgoto. Em 2024, os indicadores mostravam 93% com acesso à água e 85% com coleta de esgoto. A previsão de término e universalização é 2029, antes da meta determinada no Marco do Saneamento, de 2033.
“Ainda é muita gente para ser incluída porque, agora, também temos a obrigação de atender a áreas rurais e fazer ligações até então informais”, diz Piani.
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Nas demais áreas de concessão, que incluem a Baixada Santista, o litoral e as cidades fora do eixo do Rio Tietê, a ideia é atingir mais 4 milhões de pessoas. Dos R$ 6,5 bilhões destinados a essas regiões, R$ 2 bilhões irão para o fornecimento de água e R$ 4,5 bilhões para sistemas de esgoto.
Além da expansão de capacidade física, os recursos também estão sendo utilizados em modernização tecnológica. Considerada a segunda maior ETE do mundo (atrás apenas da ETE Barueri), a estação do Parque Novo Mundo receberá uma tecnologia chamada Nereda, que usa biomassa no tratamento de esgoto. Além de mais eficiente na remoção de matéria orgânica, consome menos energia e produtos químicos, gera menos resíduos e a pegada de carbono numa operação automatizada.
Essa frente sustentável será, evidentemente, usada na captação de recursos mais baratos. “Vamos usar tudo o que estiver disponível”, afirma Piani. “A natureza do saneamento é um investimento sustentável em sua essência e esperamos muito apoio da comunidade investidora.” Num momento posterior, será decidida qual a melhor tecnologia de uso do lodo produzido como, por exemplo, geração de biometano.
Cadeia de suprimentos
Para Piani, mais do que dificuldade para conseguir financiamento ou alto endividamento, o maior risco na execução do projeto está ligado à cadeia de suprimentos. “Todo o resto está dentro do nosso controle, mas os prestadores de serviço externo, não”, diz ele. “O volume de investimentos em São Paulo está elevado, o que gera concorrência indireta pela mão de obra na construção civil e no fornecimento de insumos.”
Ao se tornar uma compradora firme de insumos e equipamentos, a ideia é dar garantia para os fornecedores assumirem investimentos para atender à demanda. “Seremos indutores de desenvolvimento e criaremos externalidades positivas”, afirma Piani.
Outro risco está ligado a autorizações para as obras. “Preciso fazer adequações à rede na Marginal Tietê, por exemplo, e dependo de autorizações de órgãos coligados”, afirma Tavares. “Essa parceria com o Estado e o município é importante para que as consigamos de maneira rápida.”
Além de traçar a primeira fase do programa de investimentos, Piani debruçou-se, nos dois meses que está à frente da Sabesp, a colocá-la para rodar como uma empresa privada e não mais estatal. Processos que dependiam de licitações foram eliminados. Pessoas foram promovidas e outros profissionais trazidos do mercado. Com cerca de 10,5 mil funcionários, a Sabesp estava há mais de dez anos sem concurso público para renovação de seus quadros.
Por outro lado, contratos de fornecimento com preços subsidiados, pagos por todos os paulistas, foram denunciados. “São em torno de 600 clientes que, por questões históricas, pagavam menos pelos serviços de água e esgoto”, diz ele. “Caso o governo queira continuar dando esses subsídios, cabe ao poder público fazê-lo e não mais à empresa, agora privada.”
Transição
Também está sendo criado um sistema de prestações de contas variadas, previstas no contrato de concessão, que incluem, além da meta de universalização, qualidade da água, seguros de execução de obras, ambientais e outros e até mesmo sobre a qualidade da pavimentação, após a prestação de serviços. Além disso, está sendo montada uma estrutura que discutirá revisões tarifárias anuais.
O Citi, que tem a Sabesp como principal escolha dentro do segmento de distribuição de saneamento, diz que, “apesar do massivo plano de investimento, espera-se que a alavancagem permaneça sob controle, pois o novo marco regulatório permite o reconhecimento anual desses investimentos na base de ativos regulatórios da Sabesp”.
Para os analistas, a transição para a gestão privada “deve desbloquear substanciais economias de custos, melhorar a aquisição de talentos e fomentar a inovação, consolidando o papel da Sabesp como um competidor chave no mercado de saneamento do Brasil”.
Uma das frentes futuras de crescimento poderão ser fusões e aquisições no setor no Estado. A Sabesp está em 375 dos 645 municípios e pode encontrar aí uma frente de crescimento e sinergias. “Vemos um enorme potencial de crescimento inorgânico no espaço de saneamento no Brasil, com várias licitações de saneamento já agendadas e muitas outras por vir”, escrevem os analistas.