Um mês após anunciar seu plano de nacionalização da produção no Brasil, a gigante de e-commerce de moda Shein já têm 151 fábricas têxteis operando para o negócio em solo nacional. Para os próximos meses, plano da companhia é atingir de 200 unidades e em até três anos bater a marca de dois mil pontos fabris por aqui. Conforme divulgado pela empresa, a produção nacional já começou a ser vendida na plataforma.
O Brasil é o primeiro mercado - em que a Shein tem operações - a receber um modelo de produção própria das peças comercializadas na plataforma. Segundo o “chairman” da Shein para América Latina, Marcelo Claure, o mercado nacional está entre os cinco mais relevantes para o negócio. Na China, sede da companhia, mais de 6 mil fábricas são responsáveis pela confecção dos itens de vestuário comercializados pela varejista virtual em 165 países operados pelo negócio.
Para especialistas ouvidos pelo Estadão, o sucesso da nacionalização da produção da varejista de moda chinesa dependerá, principalmente, se a empresa conseguirá replicar a sua cadeia logística e conhecimentos usados na produção chinesa dentro do País.
No último mês de abril, a gigante chinesa divulgou que investirá cerca de R$ 750 milhões no setor têxtil brasileiro, o que pode gerar até 100 mil empregos indiretos no País nos próximos três anos. O anúncio se deu após discussões com membros do governo federal sobre problemas de sonegação de impostos nas compras em sites estrangeiros que exportam para o Brasil. Na ocasião, a empresa também anunciou a abertura do seu site como marketplace para vendedores brasileiros.
Claure afirmou que atualmente companhia já tem fábricas (parceiras) em 11 Estados do País, entre eles São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Ceará, Pernambuco, Bahia, Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul. A expectativa é chegar a 200 unidades ainda em julho deste ano.
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‘É mais barato do que importar?’
Responsável pelo plano de nacionalizar o negócio no Brasil, Claure, acredita que produzir as peças nos País será mais barato do que importá-las das unidades chinesas. “Quando se fabrica na China, a logística é muito cara. O custo de envio é equivalente ao custo de produzir no Brasil”, afirma. “Nosso objetivo é de que as peças tenham o mesmo preço, ou até menor com a nacionalização. Estamos em busca de eficiência.”
Desde o início da pandemia, os custos de transporte vêm pressionando principalmente os serviços de e-commerce de cross border - que importa produtos-, situação que foi agravada em 2022 com o início da guerra entre Rússia e Ucrânia. “Mandar um pacote pequeno da China para o Ceará é muito caro. Então, é mais barato eu fabricar localmente, o que compensa o valor mais caro de produção no Brasil”, analisa Claure.
O executivo pontua, no entanto, que para tirar o projeto do papel, a companhia tem de auxiliar as fábricas locais a se desenvolver em relação à tecnologia e a entender o seu modelo de negócio. Diferentemente das demais varejistas de moda, a Shein diz não operar com estoques, o que reduz a pressão de custos para a companhia, mas demanda um esquema de produção mais complexo, que leva até sete dias, entre o desenvolvimento do modelo, a produção do item nas unidades fabris e venda na plataforma. “Nós não temos estoque para liquidar, nós produzimos por demanda”, afirma.
O especialista em varejo e fundador da Varese Retail, Alberto Serrentino, lembra que os custos indiretos do País podem ser um dos principais desafios da companhia para garantir a nacionalização dos 85% dos itens vendidos nacionalmente, já que essas questões diminuem a competitividade do produto brasileiro em comparação com os itens produzidos na China. “É o tal do custo Brasil, que está embutido na carga tributária, nas ineficiências do País, como logística e segurança”, afirma.
No entanto, Claure acredita que apesar dos desafios, “investir no Brasil não é fácil, mas também não é impossível”.
‘Uberização’
Para expandir sua malha produtiva no País, a Shein pretende “uberizar” as parcerias com fábricas locais, usando a tecnologia para facilitar o processo de transferência de tecnologia, informações sobre pedidos e produção das peças de roupas que são comercializadas na sua plataforma. “As fábricas brasileiras não estão acostumadas a esse modelo de produção”, diz ele. “Nós queremos revitalizar o mercado têxtil no Brasil.”
Claure diz que muitas fábricas têm interesse em estabelecer a parceria com a varejista chinesa que investe na modernização desses negócios, através da digitalização dos fornecedores. Na avaliação do especialista em varejo da Strong Business School (SBS), Ulysses Reis, o plano nacionalização da produção da Shein no Brasil dependerá muito de como a companhia chinesa se organizará para lidar com questões típicas do mercado nacional, desde a tributação aos encargos trabalhistas.
Reis ainda pontua que o projeto de expansão pode ser impactado por questões de recessão e perda do poder de compra dos brasileiros, uma vez que o público alvo da varejista é mais sensível a oscilações de renda e inflação dos preços. “Quando eles tiverem de colocar os números na ponta do lápis, talvez eles percam o diferencial competitivo que é justamente o preço mais baixo”, afirma o especialista.
Sobre as acusações de prática de concorrência desleal, o charmain da Shein diz que a vantagem competitiva da varejista não está ligada à tributação, mas sim, a sua “eficiência de logística”. O executivo afirma que é a favor de um tributo que incida sobre os sites de compras, desde que isso não afete a capacidade de compras dos consumidores finais. “Entender os impostos no Brasil foi bem complicado”, relembra Claure.
De olho na América Latina
Se no curto prazo os planos da Shein giram em torno de nacionalizar a produção para vendê-la no mercado doméstico, segundo o executivo, no futuro - a depender dos resultados obtidos - o polo de fabricação da varejista no País pode ser responsável pela exportação de itens de moda para os países vizinhos na América Latina, e mais adiante para outros mercados globais.
Sobre a possibilidade de exportar os itens produzidos em solo nacional, Serrentino, da Varese Retail, acredita que tirar os planos do papel dependerá de como a varejista pretende organizar seu polo de fabricação no País e quais produtos têm maior capacidade de serem exportados, já que setor têxtil local tem algumas áreas de execução com maior eficiência, enquanto apresenta certas deficiências em outros segmentos.