A Ultragaz, braço de venda de botijões de gás do Grupo Ultra, anunciou nesta segunda-feira, 12, a compra de uma startup que pode marcar a jornada da empresa rumo à transição energética. O negócio adquirido foi a Stella Energia, plataforma que conecta os geradores de energia solar a residências e pequenos negócios. É uma espécie de serviço de assinatura de energia que pode reduzir a conta de energia em cerca de 15%, em média. A Ultragaz vai desembolsar R$ 63 milhões pela Stella, na qual já investia por meio de seu braço de venture capital.
O presidente da Ultragaz, Tabajara Bertelli, afirma, ao Estadão, que a aquisição está ligada à crença da companhia na transição energética – que certamente terá influência nos negócios da companhia. “De dois anos para cá estamos olhando para o futuro e rediscutindo a expectativa da empresa, que sempre foi muito focada no GLP (gás liquefeito de petróleo). Estamos acompanhando a transição energética e estudando onde mais a empresa poderia se desenvolver”, explica.
A leitura foi que a Stella poderia dar um salto se tivesse acesso aos clientes da Ultragaz, presentes em todo o País. Ou seja: a Stella passaria a contar com um contingente de vendedores e a ter contato direto com clientes em potencial. Além de atender 60 mil clientes com gás a granel, feito diretamente no ponto do cliente, a Ultragaz tem 6 mil distribuidores para domicílios.
Presidente da Ultragaz, Tabajara Bertelli
O racional por trás do negócio da Stella é dar acesso à energia renovável mesmo para quem não quer ou não pode fazer um investimento inicial em placas solares, que hoje são a alternativa mais comum, e conseguir um desconto na conta de luz. Segundo a empresa, trata-se de algo simples: o consumidor “assina” a quantidade de energia que abastecerá sua residência ou negócio. A Stella conecta essa residência ou negócio a uma usina geradora de energia renovável. Não há investimento nem multa por cancelamento.
O reforço da atuação da Ultragaz para se preparar para uma transição energética ocorre ainda em um momento em que o Grupo Ultra remanejou seu portfólio de empresas, vendendo o seu negócio de farmácias, a Extrafarma e a indústria química Oxiteno.
Projeto-piloto motivou investimento maior
O potencial da parceria com a Stella, segundo o presidente da Ultragaz, ficou evidente no projeto-piloto, que começou desde o investimento feito pela companhia no ano passado. Dos 11 mil contratos da Stella, 1,5 mil já são de clientes da Ultragaz. Isso fruto apenas de um trabalho inicial em que distribuidores da empresa, em algumas localidades, passaram a ofertar a assinatura de energia.
“Agora queremos colocar isso em uma escala maior”, afirma, sem definir, por ora, uma meta. “Queremos ser um player relevante no desenvolvimento desse mercado, aproveitando que temos uma marca de reputação elevada”, diz.
Segundo Bertelli, a ideia é deixar o negócio da Stella independente operacionalmente. Após todas as aprovações necessárias, a startup se tornará uma subsidiária da Ultragaz. “Os fundadores da Stella seguirão à frente do negócio com incentivos para se ter um plano de longo prazo para o negócio.”
Há vários indícios do crescimento do setor de energia renovável no País. Um deles são os dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), que confirmam o crescimento do mercado de energia solar no Brasil. Grande parte dessa geração distribuída tem como destino residências, com 48,5% do total. Em seguida vem o setor de comércio e serviços, que fica com 30,4%.
A Absolar aponta um crescimento de 35% desse mercado neste ano em relação ao ano passado, sendo 16% da potência instalada em Minas Gerais, que lidera o ranking nacional, seguido por São Paulo, com 13,4%.
Na avaliação do coordenador do Centro de Desenvolvimento Socioambiental da ESPM, Marcus Nakagawa, cenário de crise econômica nas startups e a necessidade de investimentos em fontes de energia limpa devem impulsionar a procura das grandes companhias por empresas menores com foco em energias renováveis. “Esse é um caminho sem volta, todas as empresas que usam matrizes mais poluentes terão que fazer isso, se movimentar rumo a fontes limpas. Buscar essas mudanças com aquisições é uma boa saída”, avalia.
Para Nakagawa, outro aspecto importante no processo de transformação energética no País vem sendo pautado pela “pressão” feita por grandes investidores estrangeiros atrás de fontes de energia limpa. “Lá fora, os fundos de investimento já estão se movimentando nesse caminho. Mas no Brasil, ainda falta uma visão governamental que impulsione essa mudança”, diz o coordenador.