Após finalizar 2022 com um resultado que decepcionou o mercado financeiro e depois de rumores de que o CEO, Thiago Maffra, e o presidente do banco, José Berenguer, deixariam o grupo, a XP esclareceu sua estratégia para voltar a crescer a um ritmo mais robusto. Em março, o fundador da companhia, Guilherme Benchimol, se encontrou com analistas do mercado pela primeira vez desde 2017, garantiu que não haverá mudanças no comando do grupo e admitiu que contratou demais nos últimos anos, que o modelo de trabalho à distância prejudicou o desempenho da empresa e que faltou eficiência em 2022.
Benchimol afirmou que o lucro líquido deverá chegar a pelo menos R$ 3,8 bilhões em 2023, o que significaria um crescimento de 6% em relação a 2022. O número é baixo, quando comparado à média de crescimento de 99% registrada entre 2019 e 2021. E, ainda assim, o mercado está reticente. Hoje, as ações da XP são negociadas a 40,7% do que valiam em dezembro de 2019, quando a empresa abriu o capital na Nasdaq.
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Após a reunião com Benchimol, os analistas Henrique Navarro, Arnon Shirazi e Anahy Rios, do Santander, escreveram em relatório que permaneciam “cautelosos” em relação à companhia por considerar que há um risco de que o volume previsto não seja atingido. Isso porque o ambiente está mais competitivo e a taxa de juros, mais elevada.
Eduardo Rosman, Thiago Paura e Ricardo Buchpiguel, do BTG Pactual, afirmaram, também em relatório, estimar que a XP tenha um lucro de R$ 3,5 bilhões neste ano. O valor é 8% inferior ao que a empresa projeta.
De acordo com analistas que estiveram na reunião com o fundador da XP – da qual também participaram Maffra, Berenguer e o diretor financeiro, Bruno Constantino –, o grupo pretende continuar crescendo com a fórmula de sempre: “roubando” clientes dos bancos tradicionais.
A empresa tem hoje 11% de participação no mercado de investimentos, enquanto os grandes bancos, 82% – o que indica que há muito espaço para a XP avançar, segundo os executivos do grupo. Na avaliação deles, o serviço prestado pelas instituições financeiras tradicionais tem melhorado, mas a XP ainda estaria mais bem posicionada.
Nos últimos meses, no entanto, a empresa teve dificuldade para atrair recursos que estão aplicados nos bancões. Entre outubro e dezembro de 2022, a XP registrou uma captação líquida de R$ 31 bilhões, queda de 36% na comparação com o mesmo período de 2021.
Uma das principais explicações para essa retração seria o menor número de dias úteis nos três últimos meses do ano passado por causa da Copa do Mundo e das eleições. No início de 2023, já haveria uma recuperação na captação.
Segundo os executivos disseram na reunião, em momentos de incerteza, com juro elevado, é mais difícil convencer os investidores a retirarem os recursos dos bancos tradicionais mesmo quando o risco é ínfimo e a XP oferece taxas de retorno maiores. A taxa básica de juros mais alta no mercado brasileiro também torna o investidor menos interessado em produtos de risco mais elevado.
Há analistas que dizem acreditar que a desaceleração da empresa decorre justamente desses fatores cíclicos. As equipes do Goldman Sachs e do Citi, por exemplo, estão entre as que projetam que a XP conseguirá atingir o lucro de R$ 3,8 bilhões neste ano.
Apesar disso, os profissionais do Goldman afirmam que o crescimento do total de ativos sob custódia da XP deve perder força. A expectativa é que, entre 2022 e 2025, eles avancem a uma taxa composta anual de 17%. Entre 2016 e 2022, esse número foi de 56%.
As análises apontam que apenas segmentos em que a XP ainda é nova devem crescer de forma acelerada, como cartão de crédito e seguro de vida. A empresa reconhece que o momento é de consolidação dessas novas áreas.
Além das estratégias de consolidação dos novos segmentos e de tirar clientes dos bancos tradicionais, a companhia vem trabalhando para cortar custos. Apenas em janeiro, 379 empregados foram demitidos. Hoje, são 6.549 funcionários, uma redução de 6,1% na comparação com os 6.948 do fim do terceiro trimestre de 2022.
Entre os analistas, há uma crítica de que o lucro projetado pela XP para este ano deve ser decorrente sobretudo de uma redução de custos, e não de uma alta mais forte das receitas. “Note que a expansão dos ganhos deve ser impulsionada pelo corte de custos”, afirmou, em relatório, a equipe do UBS BB. Os profissionais do Credit Suisse escreveram que “muito da visão (da XP) de melhoria futura está ancorada na redução da taxa de juros (a Selic) e no gerenciamento de custos”.
Em geral, permanece a percepção de que os desafios para a companhia são maiores agora, no ambiente de juro alto, e foram subestimados no ano passado. Se a XP será capaz de acelerar o crescimento a partir do patamar em que se encontra hoje, também há desconfiança. Ainda assim, fontes do mercado têm reconhecido que o grupo voltou a mostrar inquietação, o que, dizem, será bem-vindo para enfrentar um 2023 e um 2024 de Selic ainda superior a 10%.
Procurada, a XP não quis comentar.