O próximo presidente terá de definir já nos primeiros meses de governo se mantém ou se muda a regra atual de reajuste do salário mínimo. O tema é espinhoso porque tem impacto direto nas contas públicas. Em abril, o novo governo terá de indicar qual será o mecanismo de reajuste da principal referência para trabalhadores e aposentados, ao enviar ao Congresso o projeto de lei que dá as diretrizes do Orçamento do ano seguinte.
Criada no início da década, a atual regra do mínimo prevê que o salário deve ser reajustado de acordo com a inflação dos 12 meses anteriores acrescida do crescimento da economia de dois anos antes. Apesar da previsibilidade gerada pela regra, a principal preocupação dos economistas é o peso do mínimo nas contas públicas. Cálculo feito pela equipe econômica ao anunciar o reajuste de 2018 indicava que o aumento de R$ 1 no salário gerava incremento anual de R$ 301 milhões nas despesas do governo.
Entre os candidatos à presidência, alguns querem manter a regra atual. As campanhas de Marina Silva (Rede) e do Partido dos Trabalhadores informaram que pretendem manter a regra a partir de 2020. Ciro Gomes (PDT) ainda não definiu um modelo e economistas da campanha avaliam o espaço fiscal para determinar como tratar o tema. Uma opção seria dar aumentos reais levando em conta o crescimento médio de anos anteriores e não apenas um ano específico.
Álvaro Dias (Podemos) pretende adotar regra que ofereça reposição da inflação somada ao ganho de produtividade a ser calculada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Os outros candidatos não responderam.
Embora reconheça a importância social da política de aumento do mínimo, o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente, Felipe Salto, diz que a situação fiscal exigirá que o próximo presidente tenha de decidir rapidamente sobre o tema. “Caso o teto de gastos seja atingido, o que pode acontecer em 2019 ou 2020, deverão ser interrompidas medidas que gerem aumento de gasto, inclusive no mínimo”, diz.
A emenda constitucional que criou o teto de gastos (mecanismo que impede que o crescimento dos gastos seja superior à inflação) prevê que, em caso de descumprimento, o governo fica impedido de adotar medida que “implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação”.
A economista-chefe da Rosenberg Associados, Thais Zara defende que, a partir de 2019, o Brasil volte a ter uma regra discricionária para o mínimo. Ou seja, que o governo anuncie todo ano o reajuste a partir da capacidade financeira daquele momento – sem uma regra fixa. “O governo verifica quanto será possível reajustar, pensando sempre na questão da Previdência, e anuncia”. Outros analistas do mercado financeiro compartilham dessa opinião.
O diretor do Dieese, Clemente Ganz, classifica como “retrocesso” a possibilidade de voltar a ter uma política discricionária para o valor do mínimo. “A economia será tomada de surpresa a cada anúncio”, diz. Ganz reconhece a fragilidade das contas públicas, mas diz que o trabalhador não pode arcar com todo o ajuste fiscal. Por isso, propõe uma discussão e admite que poderia ser revisto, por exemplo, o ritmo de concessão dos reajustes. / COLABOROU IDIANA TOMAZELLI