BRASÍLIA - A recessão causada pelos impactos da pandemia da covid-19 deve fazer o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro recuar 5% neste ano, de acordo com as projeções da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). De acordo com o Relatório Econômico de 2020 sobre o Brasil, a entidade espera um crescimento de 2,6% em 2021 e de 2,2% em 2022.
As projeções da OCDE, grupo do qual o Brasil quer fazer parte, são um pouco mais pessimistas que as do mercado e do próprio governo. A equipe econômica projeta uma retração de 4,5% no PIB deste ano, com uma recuperação de 3,20% em 2021 e de 2,50% em 2022. Já no último Relatório Focus, os analistas consultados pelo Banco Central esperam um recuo de 4,4% no PIB em 2020 e crescimentos de 3,50% em 2021 e 2,50% em 2022.
De acordo com o relatório da OCDE, o consumo privado no Brasil deve recuar 6,2% neste ano, com uma retomada de 2,7% em 2021 e de 2,2% em 2022. Já o consumo do governo deve cair 4,8% em 2020, crescer apenas 0,5% em 2021 e ficar estagnado em 2022.
Já a formação bruta de capital fixo deve ter uma recuperação mais forte após a queda de 5,1% projetada pela OCDE para este ano. Pelos cálculos da entidade, a taxa de investimentos deve acelerar nos próximos anos, chegando a um resultado positivo de 4,4% em 2021 e de 5,6% em 2022.
Ainda assim, a organização acredita que os níveis de desemprego no Brasil continuarão elevados. Depois de fechar 2020 em 13,6%, as projeções da OCDE apontam uma taxa de desemprego de 16,0% em 2021 e de 15,0% em 2022. Pelo menos a inflação deve seguir controlada, abaixo do centro das metas para os anos à frente, com as estimativas em 3,8% em 2020, 2,9% em 2021 e 3,4% em 2022.
Passado o esforço de enfrentamento da pandemia de covid-19 neste ano, a OCDE aposta na retomada do ajuste fiscal pela equipe econômica. O relatório aponta que o déficit primário (o rombo nas contas públicas) deve recuar de 10,7% do PIB em 2020 para 2,8% em 2021 e 2,3% em 2022. O Ministério da Economia enviou ontem ao Congresso uma atualização da proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2021, com uma meta de déficit primário de R$ 247 bilhões, equivalentes a 3,16% do PIB.
Mesmo com a esperada redução do déficit nas contas, a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) continuará em trajetória de crescimento. Nas estimativas da OCDE, o endividamento público alcançará 91,4% do PIB em 2020, 94,3% em 2021 e 96,6% em 2022.
Recomendações
Após a forte recessão causada pela pandemia de covid-19, o Brasil precisa melhorar as políticas macroeconômicas, a governança e a proteção social, na avaliação da OCDE. Na saída da crise, a entidade também sugere que o País adote medidas para tornar o crescimento mais “verde e sustentável”, aumentar a produtividade, e melhorar a educação e a capacidade profissional.
A OCDE publicou hoje o Relatório Econômico de 2020 sobre o Brasil, com uma análise sobre os fortes impactos deixados pelo novo coronavírus na economia brasileira e recomendações para que a retomada do crescimento se dê em bases mais sólidas. Desde o governo Michel Temer, o Brasil tem ampliado os esforços para conseguir formalizar a adesão plena à organização intergovernamental.
Embora o mercado aposte que o Comitê de Política Monetária (Copom) volte a subir a Selic – estacionada atualmente em 2% ao ano – em meados do próximo ano, os economistas da OCDE recomendam que o Banco Central mantenha as taxas de juros baixas até que as pressões inflacionárias se tornem claramente visíveis. A entidade também valoriza o projeto de independência da diretoria da autoridade monetária, que já teve aprovação pelo Senado e espera a votação na Câmara dos Deputados.
Para a OCDE, o governo também deve continuar garantindo o cumprimento das regras fiscais, incluindo o teto de gastos, a regra que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação. Para isso, a entidade sugere mais eficiência no gasto público, com revisões na estrutura de remuneração do funcionalismo e em “subsídios ineficazes”. O documento alerta para a grande quantidade de regimes especiais de tributação e o volume de desonerações. Tanto a reforma administrativa como a tributária, porém, foram apresentadas ainda de forma incompleta pelo governo e seguem paradas no Congresso.
O relatório aponta ainda na direção da redução da rigidez dos orçamentos públicos, que a equipe econômica busca endereçar no Novo Pacto Federativo, que também não tem previsão para ser votado pelo parlamento. Para a OCDE, é necessário revisar a vinculação de receitas, os pisos de gastos obrigatórios (como o salário mínimo em aposentadorias e pensões, por exemplo) e mecanismos de indexação (que obrigam o governo a dar reajustes). A organização sugere até mesmo que os benefícios da Previdência sejam atrelados à inflação, e não ao salário mínimo.
“Melhorar os resultados fiscais continua sendo um dos principais desafios do Brasil, dado o nível da dívida pública, à qual a pandemia aumentou significativamente. Os gastos públicos terão de se tornar mais eficientes, inclusive com base nos progressos anteriores na luta contra a corrupção e os crimes econômicos”, destaca a OCDE.
A entidade sugere que o Brasil aumente os benefícios e acelere a inclusão de pessoas no Bolsa Família, pelo menos no curto prazo. Para os economistas da entidade, a retirada desses aportes aos mais pobres deve ser feita apenas gradualmente.
“A proteção social pode ser fortalecida por meio de um enfoque melhor nos benefícios mais eficazes, o que poderia permitir reduções significativas na desigualdade e na pobreza”, avalia o documento. “A revisão dos arranjos de indexação atuais poderia liberar recursos para transferências mais eficientes e gerar reduções significativas da pobreza a um baixo custo fiscal”, acrescenta.
Dentro da agenda de produtividade, a OCDE recomenda uma simplificação ainda maior da burocracia para se abrir uma empresa. Além da criação de um imposto único sobre valor agregado (IVA) como já está proposto na reforma tributária, o relatório destaca a necessidade de se reduzirem barreiras tarifárias e não tarifárias, começando por bens de capital e insumos intermediários.
“Uma ampla gama de isenções e regimes especiais reduzem a justiça e o efeito de redistribuição de impostos. O investimento em infraestrutura está aquém da depreciação há anos, o que torna a logística desafiadora e cara. As cargas regulatórias domésticas e as barreiras à entrada no mercado estão entre as mais altas do mundo”, critica a organização.
Social
O documento da OCDE avança ainda em recomendações em outras áreas que podem ter impactos diretos também sobre a economia. O relatório dá importância à ampliação do acesso à educação infantil, com prioridade para famílias de baixa renda e mães solteiras. A entidade também defende a ampliação dos recursos aplicados em cursos de capacitação profissional, mas garantindo que haja um alinhamento com a demanda dos mercados locais.
A OCDE enfatiza a necessidade de se fortalecerem os esforços de combate ao desmatamento ilegal e pede a garantia de pessoal e orçamento adequado para as agências ambientais. O relatório recomenda “evitar o enfraquecimento do atual marco legal de proteção, incluindo áreas protegidas, o código florestal e enfocar o uso sustentável do potencial econômico da Amazônia”.
A organização faz ainda uma série de observações sobre o sistema judiciário brasileiro. Para a OCDE, é preciso criar uma base legal para execução de sentenças a partir da segunda instância, ou limitar a quantidade de recursos possíveis, incluindo ao Supremo Tribunal Federal (STF). A entidade recomenda a criação de uma lei específica para a proteção de denunciantes. O documento sugere até que as promoções e salários dos juízes sejam vinculados ao alinhamento das decisões com a precedência dos tribunais superiores.
“Um crescimento mais forte dependerá do aumento da produtividade, que está virtualmente estagnada há décadas. Isso requer enfrentar os desafios políticos subjacentes, incluindo melhoras no âmbito da regulação, uma reforma tributária, um sistema judiciário mais eficiente e uma integração mais forte na economia global”, conclui a OCDE.