Entenda em 10 gráficos o que causou o pânico nos mercados globais e como isso afeta o Brasil


Nos últimos dez dias, mercado financeiro internacional passou por forte volatilidade, com piora dos ativos e uma gradual recuperação; veja a linha do tempo

Por Alvaro Gribel
Atualização:

BRASÍLIA – O mercado financeiro mundial passou por fortes turbulências nos últimos dez dias: o índice de volatilidade disparou ao maior nível desde a pandemia, um alerta de recessão nos Estados Unidos foi acionado, a bolsa de Tóquio afundou 12% em um único pregão e o dólar chegou a bater em R$ 5,86 em relação ao real no início da semana.

Nos EUA, as empresas de tecnologia perderam mais de US$ 1 trilhão em valor de mercado – entre elas a Amazon, a Apple e a Alphabet, dona do Google.

Dólar chegou a bater R$ 5,86 em meio à turbulência nos mercados globais. Foto: Agência Brasil
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A pergunta que tem rondado a cabeça de economistas, investidores e pessoas comuns por todo o globo é: o que aconteceu para provocar tamanha incerteza? E como isso afeta o Brasil?

Veja abaixo a linha do tempo com dez gráficos mostrando as causas para a instabilidade, que depois foi quase integralmente revertida.

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31 de julho: Banco Central do Japão sobe os juros

Tudo começou no último dia 31 de julho, com a “superquarta” dos mercados financeiros, quando vários bancos centrais importantes no mundo promovem reuniões de política monetária para decidir a taxa de juros. Uma decisão do banco central do Japão, ainda na madrugada do Brasil, pegou os investidores de surpresa.

Desde o colapso do sistema financeiro americanos, em 2008, que provocou um feito cascata sobre várias economias do mundo, o BC japonês mantém os juros zerados ou negativos.

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Entre janeiro de 2016 a março de de 2024, os investidores literalmente pagavam para emprestar dinheiro ao Tesouro japonês, com uma taxa de retorno de -0,1%. Em março deste ano, contudo, os juros subiram para 0,1% – e em 31 de julho, o BC elevou novamente a taxa para 0,25%, para combater uma taxa de inflação de 2,6% em junho, em relação ao mesmo mês do ano passado.

Mas por que juros de 0,25% podem causar fortes impactos na economia internacional? O problema é que isso afetou o chamado “carry trade”, um tipo de operação em que investidores internacionais captam recursos em um país e aplicam em outro.

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Com o aumento dos juros pelo BC japonês, esse fluxo foi parcialmente revertido, com capitais deixando diversas economias e ativos para buscar rentabilidade no Japão, ainda que com a taxa mínima de 0,25% ao ano.

Isso fez o iene, a moeda japonesa, se valorizar, enquanto moedas de países emergentes, como o Brasil, perderam valor. O aumento dos juros, por outro lado, tem o efeito colateral de pressionar o custo de rolagem da dívida japonesa, que passa de 200% do PIB. Isso alimentou o receio de que o risco fiscal no país possa se agravar.

Para os consumidores japoneses, a incidência de juros “tão altos” é quase uma novidade, já que isso não ocorre desde 2008. Tudo isso foi interpretado pelo mercado como risco.

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31 de agosto: BC dos EUA indica cortes, BC brasileiro fica em cima do muro

No mesmo dia 31, o banco central americano, Fed, manteve a taxa de juros no patamar entre 5,25% e 5,5% ao ano pela oitava vez seguida – mas, durante coletiva de imprensa, o presidente Jerome Powell, afirmou que o início do ciclo de cortes estava sobre a mesa na próxima reunião de setembro.

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Até então, os receios do banco central e do próprio mercado financeiro estavam focados mais na inflação americana, e menos na possibilidade de uma forte recessão.

Aqui no Brasil, o Banco Central, à noite, manteve a taxa básica de juros (Selic) em 10,5% ao ano, mas endureceu o discurso no seu comunicado. Ainda assim, a decisão do BC foi vista por parte do mercado como “dovish”, ou seja, menos preocupado com a inflação.

Alguns economistas, bancos e consultorias defendiam uma sinalização clara de alta de juros em setembro, por causa da piora das expectativas de inflação no Brasil. Isso ajudou a pressionar o dólar em relação ao real.

2 de agosto: desemprego nos EUA aciona o ‘alarme da recessão’

No dia 2 de agosto, uma sexta-feira, o quadro muda de figura. O índice payroll, que mede a criação de empregos privados formais nos EUA, referente ao mês de julho, veio abaixo do esperado. Já a taxa de desemprego subiu de 4,1% em junho para 4,3% em julho.

Embora ela permaneça baixa, o que preocupa os investidores é a rapidez do aumento – já que, em janeiro, o índice media 3,7%.

Além disso, economistas mais pessimistas com o cenário da economia americana dizem que há vários outros indicadores mostrando uma forte perda de fôlego do nível de atividade.

Um deles seria o aumento da inadimplência no cartão de crédito, que dobrou nos últimos três anos. O índice saiu de 1,54% do total de crédito concedido na modalidade, em julho de 2021, para 3,16% em julho deste ano.

O aumento do desemprego acionou o “alarme de recessão da economia americana”, medido pela “regra de Sahm”. Essa teoria foi formulada pela economista Claudia Sahm, que trabalhou no Fed entre 2007 e 2019. Ela elaborou uma tese para ajudar os governos a prever ciclos de recessão e, assim, conseguir acionar medidas de estímulo, para amenizar o impacto.

Pela “regra de Sahm”, todas as vezes em que a média móvel trimestral da taxa de desemprego nos EUA subiu 0,5 ponto percentual acima da média da taxa de desemprego dos últimos 12 meses, o país entrou em recessão.

O gráfico abaixo mostra as vezes em que isso ocorreu. As subidas do desemprego que cumpriram esse pré-requisito, foram, posteriormente, seguidas por período de recessão (faixa cinza). O receio é que isso vá se repetir agora.

5 de agosto: Bolsa do Japão afunda, índice de volatilidade dispara

Na segunda-feira, dia 5 de agosto, o pânico toma conta dos mercados com a abertura da bolsa japonesa. O índice Nikkei recuou 12%, o maior tombo em 37 anos. Houve também um efeito cascata em várias bolsas da região, como Coreia do Sul (-8,8%), Taiwan (-8,35%), Singapura (-4,07%) e Índia (-2,6%).

Um dos medos dos investidores foi que o Banco do Japão estivesse na contramão do mundo, subindo juros em época de recessão nos EUA – que se espalharia para a economia mundial. Essa desaceleração forçaria um corte mais rápido dos juros pelo Fed, o que diminuiria o diferencial de juros entre as economias dos EUA e do Japão. Com isso, o iene se valorizaria ainda mais, afetando a rentabilidade de empresas exportadoras japonesas.

A queda na Ásia disparou o índice de volatilidade Vix, e o mercado financeiro entrou em “modo pânico”, com investidores buscando ativos mais seguros para se proteger – entre eles, o dólar. O aumento do Vix foi o maior desde a pandemia do novo coronavírus.

A turbulência atingiu em cheio as empresas de tecnologia dos EUA, que eram beneficiadas por esse dinheiro barato japonês. Do dia 31 de julho ao dia 7 de agosto, as sete maiores empresas do setor no país perderam US$ 1,218 trilhão em valor de mercado, segundo Einar Rivero, sócio fundador da consultoria Elos Ayta.

“Os grandes investidores do mundo aproveitaram o momento de grande incerteza e acharam um bom motivo para realizar lucros, principalmente nas ações ligadas à tecnologia”, explicou o economista Alvaro Bandeira, coordenador de economia da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil (Apimec). “A alta dos juros no Japão também contribuiu para isso. E aí lançam, com os dados que saíram, que a economia americana poderia entrar em recessão. Isso assustou o mundo todo, já que a China também está derrapando”, afirmou.

Nvidia perdeu US$ 446 bilhões; Amazon, US$ 254 bilhões; Apple, US$ 187 bilhões; Alphabet, US$ 154 bilhões; Microsoft, US$ 148 bilhões; Tesla, US$ 128 bilhões. Apenas a Meta, dona do Facebook, teve valorização de US$ 36 bilhões nesse período.

A perda supera o valor de mercado de todas as empresas brasileiras na B3, convertidas para o dólar, que soma US$ 826 bilhões. No Brasil, o dólar deu um salto em relação ao real, saindo de R$ 5,72 para R$ 5,85 na abertura do pregão.

Para o País, um dos efeitos da alta do dólar é o impacto sobre a inflação. Isso pode ser observado principalmente nos preços no atacado, que já refletem a valorização da moeda americana ao longo deste ano – antes, portanto, dessa última turbulência.

A inflação medida pelo IGP-DI, da Fundação Getúlio Vargas, saiu de -3,61% no acumulado em 12 meses até janeiro, para uma alta de 4,16% em julho, refletindo a forte valorização do dólar, que começou 2024 cotado em R$ 4,85.

6 a 8 de agosto: Mercados se recuperam

Depois da forte queda no dia 5, a bolsa do Japão subiu 10%, no dia seguinte, recuperando parte das perdas. Desde a divulgação da taxa de desemprego, no próprio dia 2, a economista Claudia Sahm concedeu uma série de entrevistas para defender a sua teoria, de um lado, mas também para tentar acalmar investidores, afirmando que não necessariamente os EUA estão em recessão.

“O aumento da taxa de desemprego em julho para 4,3% levou a regra de Sahm para 0,53 – logo acima do gatilho. Mesmo assim, há boas razões para ver o aumento atual da taxa de desemprego como um exagero da dinâmica recessiva, pelo menos um pouco”, escreveu a economista na rede social X.

Segundo ela, desta vez pode ser diferente, principalmente pelos impactos da pandemia no mercado de trabalho e o aumento da imigração nos EUA. “Já argumentei antes que pode ser diferente desta vez – isto é, a regra Sahm dispara sem recessão. As mudanças abruptas na força de trabalho desde a pandemia, incluindo o aumento da imigração, contribuiriam substancialmente para o aumento do desemprego”, disse.

Declarações de autoridades monetárias do Japão também ajudaram a melhorar o quadro, com a sinalização de que a taxa de juros por lá não vai continuar subindo.

Para o economista-chefe de Austin Rating, Alex Agostini, o mercado se precipitou com a leitura dos dados da economia dos EUA. “Foi um susto momentâneo, não uma mudança estrutural na macroeconomia ou na economia global. Pra mim, o cenário para os EUA ainda é de ‘pouso suave’ sem uma forte recessão. Os riscos são menores do que o que foi compreendido na segunda-feira”, afirmou.

E o Brasil?

No Brasil, o Banco Central divulgou a ata do Copom na terça-feira, dia 7, dizendo que não “hesitará” em subir a Selic em caso de piora do cenário. O tom mais duro agradou investidores, o que também ajudou a reverter as perdas da moeda brasileira. Na sexta-feira, dia 9, o dólar já estava cotado a R$ 5,51.

Mesmo com a melhora dos mercados, os títulos públicos de cinco anos do governo dos EUA, considerados o ativo financeiro mais importante do mundo, despencaram. Isso significa que o mercado está prevendo uma forte queda da taxa americana, acompanhando a desaceleração no país.

Para o Brasil, isso ajuda a valorizar o real e a diminuir o risco de um novo ciclo de alta da taxa Selic. Mas também reflete uma piora de dinamismo na principal economia do mundo – o que poderá afetar o comércio internacional e produtos que o Brasil exporta.

BRASÍLIA – O mercado financeiro mundial passou por fortes turbulências nos últimos dez dias: o índice de volatilidade disparou ao maior nível desde a pandemia, um alerta de recessão nos Estados Unidos foi acionado, a bolsa de Tóquio afundou 12% em um único pregão e o dólar chegou a bater em R$ 5,86 em relação ao real no início da semana.

Nos EUA, as empresas de tecnologia perderam mais de US$ 1 trilhão em valor de mercado – entre elas a Amazon, a Apple e a Alphabet, dona do Google.

Dólar chegou a bater R$ 5,86 em meio à turbulência nos mercados globais. Foto: Agência Brasil

A pergunta que tem rondado a cabeça de economistas, investidores e pessoas comuns por todo o globo é: o que aconteceu para provocar tamanha incerteza? E como isso afeta o Brasil?

Veja abaixo a linha do tempo com dez gráficos mostrando as causas para a instabilidade, que depois foi quase integralmente revertida.

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31 de julho: Banco Central do Japão sobe os juros

Tudo começou no último dia 31 de julho, com a “superquarta” dos mercados financeiros, quando vários bancos centrais importantes no mundo promovem reuniões de política monetária para decidir a taxa de juros. Uma decisão do banco central do Japão, ainda na madrugada do Brasil, pegou os investidores de surpresa.

Desde o colapso do sistema financeiro americanos, em 2008, que provocou um feito cascata sobre várias economias do mundo, o BC japonês mantém os juros zerados ou negativos.

Entre janeiro de 2016 a março de de 2024, os investidores literalmente pagavam para emprestar dinheiro ao Tesouro japonês, com uma taxa de retorno de -0,1%. Em março deste ano, contudo, os juros subiram para 0,1% – e em 31 de julho, o BC elevou novamente a taxa para 0,25%, para combater uma taxa de inflação de 2,6% em junho, em relação ao mesmo mês do ano passado.

Mas por que juros de 0,25% podem causar fortes impactos na economia internacional? O problema é que isso afetou o chamado “carry trade”, um tipo de operação em que investidores internacionais captam recursos em um país e aplicam em outro.

Com o aumento dos juros pelo BC japonês, esse fluxo foi parcialmente revertido, com capitais deixando diversas economias e ativos para buscar rentabilidade no Japão, ainda que com a taxa mínima de 0,25% ao ano.

Isso fez o iene, a moeda japonesa, se valorizar, enquanto moedas de países emergentes, como o Brasil, perderam valor. O aumento dos juros, por outro lado, tem o efeito colateral de pressionar o custo de rolagem da dívida japonesa, que passa de 200% do PIB. Isso alimentou o receio de que o risco fiscal no país possa se agravar.

Para os consumidores japoneses, a incidência de juros “tão altos” é quase uma novidade, já que isso não ocorre desde 2008. Tudo isso foi interpretado pelo mercado como risco.

31 de agosto: BC dos EUA indica cortes, BC brasileiro fica em cima do muro

No mesmo dia 31, o banco central americano, Fed, manteve a taxa de juros no patamar entre 5,25% e 5,5% ao ano pela oitava vez seguida – mas, durante coletiva de imprensa, o presidente Jerome Powell, afirmou que o início do ciclo de cortes estava sobre a mesa na próxima reunião de setembro.

Até então, os receios do banco central e do próprio mercado financeiro estavam focados mais na inflação americana, e menos na possibilidade de uma forte recessão.

Aqui no Brasil, o Banco Central, à noite, manteve a taxa básica de juros (Selic) em 10,5% ao ano, mas endureceu o discurso no seu comunicado. Ainda assim, a decisão do BC foi vista por parte do mercado como “dovish”, ou seja, menos preocupado com a inflação.

Alguns economistas, bancos e consultorias defendiam uma sinalização clara de alta de juros em setembro, por causa da piora das expectativas de inflação no Brasil. Isso ajudou a pressionar o dólar em relação ao real.

2 de agosto: desemprego nos EUA aciona o ‘alarme da recessão’

No dia 2 de agosto, uma sexta-feira, o quadro muda de figura. O índice payroll, que mede a criação de empregos privados formais nos EUA, referente ao mês de julho, veio abaixo do esperado. Já a taxa de desemprego subiu de 4,1% em junho para 4,3% em julho.

Embora ela permaneça baixa, o que preocupa os investidores é a rapidez do aumento – já que, em janeiro, o índice media 3,7%.

Além disso, economistas mais pessimistas com o cenário da economia americana dizem que há vários outros indicadores mostrando uma forte perda de fôlego do nível de atividade.

Um deles seria o aumento da inadimplência no cartão de crédito, que dobrou nos últimos três anos. O índice saiu de 1,54% do total de crédito concedido na modalidade, em julho de 2021, para 3,16% em julho deste ano.

O aumento do desemprego acionou o “alarme de recessão da economia americana”, medido pela “regra de Sahm”. Essa teoria foi formulada pela economista Claudia Sahm, que trabalhou no Fed entre 2007 e 2019. Ela elaborou uma tese para ajudar os governos a prever ciclos de recessão e, assim, conseguir acionar medidas de estímulo, para amenizar o impacto.

Pela “regra de Sahm”, todas as vezes em que a média móvel trimestral da taxa de desemprego nos EUA subiu 0,5 ponto percentual acima da média da taxa de desemprego dos últimos 12 meses, o país entrou em recessão.

O gráfico abaixo mostra as vezes em que isso ocorreu. As subidas do desemprego que cumpriram esse pré-requisito, foram, posteriormente, seguidas por período de recessão (faixa cinza). O receio é que isso vá se repetir agora.

5 de agosto: Bolsa do Japão afunda, índice de volatilidade dispara

Na segunda-feira, dia 5 de agosto, o pânico toma conta dos mercados com a abertura da bolsa japonesa. O índice Nikkei recuou 12%, o maior tombo em 37 anos. Houve também um efeito cascata em várias bolsas da região, como Coreia do Sul (-8,8%), Taiwan (-8,35%), Singapura (-4,07%) e Índia (-2,6%).

Um dos medos dos investidores foi que o Banco do Japão estivesse na contramão do mundo, subindo juros em época de recessão nos EUA – que se espalharia para a economia mundial. Essa desaceleração forçaria um corte mais rápido dos juros pelo Fed, o que diminuiria o diferencial de juros entre as economias dos EUA e do Japão. Com isso, o iene se valorizaria ainda mais, afetando a rentabilidade de empresas exportadoras japonesas.

A queda na Ásia disparou o índice de volatilidade Vix, e o mercado financeiro entrou em “modo pânico”, com investidores buscando ativos mais seguros para se proteger – entre eles, o dólar. O aumento do Vix foi o maior desde a pandemia do novo coronavírus.

A turbulência atingiu em cheio as empresas de tecnologia dos EUA, que eram beneficiadas por esse dinheiro barato japonês. Do dia 31 de julho ao dia 7 de agosto, as sete maiores empresas do setor no país perderam US$ 1,218 trilhão em valor de mercado, segundo Einar Rivero, sócio fundador da consultoria Elos Ayta.

“Os grandes investidores do mundo aproveitaram o momento de grande incerteza e acharam um bom motivo para realizar lucros, principalmente nas ações ligadas à tecnologia”, explicou o economista Alvaro Bandeira, coordenador de economia da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil (Apimec). “A alta dos juros no Japão também contribuiu para isso. E aí lançam, com os dados que saíram, que a economia americana poderia entrar em recessão. Isso assustou o mundo todo, já que a China também está derrapando”, afirmou.

Nvidia perdeu US$ 446 bilhões; Amazon, US$ 254 bilhões; Apple, US$ 187 bilhões; Alphabet, US$ 154 bilhões; Microsoft, US$ 148 bilhões; Tesla, US$ 128 bilhões. Apenas a Meta, dona do Facebook, teve valorização de US$ 36 bilhões nesse período.

A perda supera o valor de mercado de todas as empresas brasileiras na B3, convertidas para o dólar, que soma US$ 826 bilhões. No Brasil, o dólar deu um salto em relação ao real, saindo de R$ 5,72 para R$ 5,85 na abertura do pregão.

Para o País, um dos efeitos da alta do dólar é o impacto sobre a inflação. Isso pode ser observado principalmente nos preços no atacado, que já refletem a valorização da moeda americana ao longo deste ano – antes, portanto, dessa última turbulência.

A inflação medida pelo IGP-DI, da Fundação Getúlio Vargas, saiu de -3,61% no acumulado em 12 meses até janeiro, para uma alta de 4,16% em julho, refletindo a forte valorização do dólar, que começou 2024 cotado em R$ 4,85.

6 a 8 de agosto: Mercados se recuperam

Depois da forte queda no dia 5, a bolsa do Japão subiu 10%, no dia seguinte, recuperando parte das perdas. Desde a divulgação da taxa de desemprego, no próprio dia 2, a economista Claudia Sahm concedeu uma série de entrevistas para defender a sua teoria, de um lado, mas também para tentar acalmar investidores, afirmando que não necessariamente os EUA estão em recessão.

“O aumento da taxa de desemprego em julho para 4,3% levou a regra de Sahm para 0,53 – logo acima do gatilho. Mesmo assim, há boas razões para ver o aumento atual da taxa de desemprego como um exagero da dinâmica recessiva, pelo menos um pouco”, escreveu a economista na rede social X.

Segundo ela, desta vez pode ser diferente, principalmente pelos impactos da pandemia no mercado de trabalho e o aumento da imigração nos EUA. “Já argumentei antes que pode ser diferente desta vez – isto é, a regra Sahm dispara sem recessão. As mudanças abruptas na força de trabalho desde a pandemia, incluindo o aumento da imigração, contribuiriam substancialmente para o aumento do desemprego”, disse.

Declarações de autoridades monetárias do Japão também ajudaram a melhorar o quadro, com a sinalização de que a taxa de juros por lá não vai continuar subindo.

Para o economista-chefe de Austin Rating, Alex Agostini, o mercado se precipitou com a leitura dos dados da economia dos EUA. “Foi um susto momentâneo, não uma mudança estrutural na macroeconomia ou na economia global. Pra mim, o cenário para os EUA ainda é de ‘pouso suave’ sem uma forte recessão. Os riscos são menores do que o que foi compreendido na segunda-feira”, afirmou.

E o Brasil?

No Brasil, o Banco Central divulgou a ata do Copom na terça-feira, dia 7, dizendo que não “hesitará” em subir a Selic em caso de piora do cenário. O tom mais duro agradou investidores, o que também ajudou a reverter as perdas da moeda brasileira. Na sexta-feira, dia 9, o dólar já estava cotado a R$ 5,51.

Mesmo com a melhora dos mercados, os títulos públicos de cinco anos do governo dos EUA, considerados o ativo financeiro mais importante do mundo, despencaram. Isso significa que o mercado está prevendo uma forte queda da taxa americana, acompanhando a desaceleração no país.

Para o Brasil, isso ajuda a valorizar o real e a diminuir o risco de um novo ciclo de alta da taxa Selic. Mas também reflete uma piora de dinamismo na principal economia do mundo – o que poderá afetar o comércio internacional e produtos que o Brasil exporta.

BRASÍLIA – O mercado financeiro mundial passou por fortes turbulências nos últimos dez dias: o índice de volatilidade disparou ao maior nível desde a pandemia, um alerta de recessão nos Estados Unidos foi acionado, a bolsa de Tóquio afundou 12% em um único pregão e o dólar chegou a bater em R$ 5,86 em relação ao real no início da semana.

Nos EUA, as empresas de tecnologia perderam mais de US$ 1 trilhão em valor de mercado – entre elas a Amazon, a Apple e a Alphabet, dona do Google.

Dólar chegou a bater R$ 5,86 em meio à turbulência nos mercados globais. Foto: Agência Brasil

A pergunta que tem rondado a cabeça de economistas, investidores e pessoas comuns por todo o globo é: o que aconteceu para provocar tamanha incerteza? E como isso afeta o Brasil?

Veja abaixo a linha do tempo com dez gráficos mostrando as causas para a instabilidade, que depois foi quase integralmente revertida.

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31 de julho: Banco Central do Japão sobe os juros

Tudo começou no último dia 31 de julho, com a “superquarta” dos mercados financeiros, quando vários bancos centrais importantes no mundo promovem reuniões de política monetária para decidir a taxa de juros. Uma decisão do banco central do Japão, ainda na madrugada do Brasil, pegou os investidores de surpresa.

Desde o colapso do sistema financeiro americanos, em 2008, que provocou um feito cascata sobre várias economias do mundo, o BC japonês mantém os juros zerados ou negativos.

Entre janeiro de 2016 a março de de 2024, os investidores literalmente pagavam para emprestar dinheiro ao Tesouro japonês, com uma taxa de retorno de -0,1%. Em março deste ano, contudo, os juros subiram para 0,1% – e em 31 de julho, o BC elevou novamente a taxa para 0,25%, para combater uma taxa de inflação de 2,6% em junho, em relação ao mesmo mês do ano passado.

Mas por que juros de 0,25% podem causar fortes impactos na economia internacional? O problema é que isso afetou o chamado “carry trade”, um tipo de operação em que investidores internacionais captam recursos em um país e aplicam em outro.

Com o aumento dos juros pelo BC japonês, esse fluxo foi parcialmente revertido, com capitais deixando diversas economias e ativos para buscar rentabilidade no Japão, ainda que com a taxa mínima de 0,25% ao ano.

Isso fez o iene, a moeda japonesa, se valorizar, enquanto moedas de países emergentes, como o Brasil, perderam valor. O aumento dos juros, por outro lado, tem o efeito colateral de pressionar o custo de rolagem da dívida japonesa, que passa de 200% do PIB. Isso alimentou o receio de que o risco fiscal no país possa se agravar.

Para os consumidores japoneses, a incidência de juros “tão altos” é quase uma novidade, já que isso não ocorre desde 2008. Tudo isso foi interpretado pelo mercado como risco.

31 de agosto: BC dos EUA indica cortes, BC brasileiro fica em cima do muro

No mesmo dia 31, o banco central americano, Fed, manteve a taxa de juros no patamar entre 5,25% e 5,5% ao ano pela oitava vez seguida – mas, durante coletiva de imprensa, o presidente Jerome Powell, afirmou que o início do ciclo de cortes estava sobre a mesa na próxima reunião de setembro.

Até então, os receios do banco central e do próprio mercado financeiro estavam focados mais na inflação americana, e menos na possibilidade de uma forte recessão.

Aqui no Brasil, o Banco Central, à noite, manteve a taxa básica de juros (Selic) em 10,5% ao ano, mas endureceu o discurso no seu comunicado. Ainda assim, a decisão do BC foi vista por parte do mercado como “dovish”, ou seja, menos preocupado com a inflação.

Alguns economistas, bancos e consultorias defendiam uma sinalização clara de alta de juros em setembro, por causa da piora das expectativas de inflação no Brasil. Isso ajudou a pressionar o dólar em relação ao real.

2 de agosto: desemprego nos EUA aciona o ‘alarme da recessão’

No dia 2 de agosto, uma sexta-feira, o quadro muda de figura. O índice payroll, que mede a criação de empregos privados formais nos EUA, referente ao mês de julho, veio abaixo do esperado. Já a taxa de desemprego subiu de 4,1% em junho para 4,3% em julho.

Embora ela permaneça baixa, o que preocupa os investidores é a rapidez do aumento – já que, em janeiro, o índice media 3,7%.

Além disso, economistas mais pessimistas com o cenário da economia americana dizem que há vários outros indicadores mostrando uma forte perda de fôlego do nível de atividade.

Um deles seria o aumento da inadimplência no cartão de crédito, que dobrou nos últimos três anos. O índice saiu de 1,54% do total de crédito concedido na modalidade, em julho de 2021, para 3,16% em julho deste ano.

O aumento do desemprego acionou o “alarme de recessão da economia americana”, medido pela “regra de Sahm”. Essa teoria foi formulada pela economista Claudia Sahm, que trabalhou no Fed entre 2007 e 2019. Ela elaborou uma tese para ajudar os governos a prever ciclos de recessão e, assim, conseguir acionar medidas de estímulo, para amenizar o impacto.

Pela “regra de Sahm”, todas as vezes em que a média móvel trimestral da taxa de desemprego nos EUA subiu 0,5 ponto percentual acima da média da taxa de desemprego dos últimos 12 meses, o país entrou em recessão.

O gráfico abaixo mostra as vezes em que isso ocorreu. As subidas do desemprego que cumpriram esse pré-requisito, foram, posteriormente, seguidas por período de recessão (faixa cinza). O receio é que isso vá se repetir agora.

5 de agosto: Bolsa do Japão afunda, índice de volatilidade dispara

Na segunda-feira, dia 5 de agosto, o pânico toma conta dos mercados com a abertura da bolsa japonesa. O índice Nikkei recuou 12%, o maior tombo em 37 anos. Houve também um efeito cascata em várias bolsas da região, como Coreia do Sul (-8,8%), Taiwan (-8,35%), Singapura (-4,07%) e Índia (-2,6%).

Um dos medos dos investidores foi que o Banco do Japão estivesse na contramão do mundo, subindo juros em época de recessão nos EUA – que se espalharia para a economia mundial. Essa desaceleração forçaria um corte mais rápido dos juros pelo Fed, o que diminuiria o diferencial de juros entre as economias dos EUA e do Japão. Com isso, o iene se valorizaria ainda mais, afetando a rentabilidade de empresas exportadoras japonesas.

A queda na Ásia disparou o índice de volatilidade Vix, e o mercado financeiro entrou em “modo pânico”, com investidores buscando ativos mais seguros para se proteger – entre eles, o dólar. O aumento do Vix foi o maior desde a pandemia do novo coronavírus.

A turbulência atingiu em cheio as empresas de tecnologia dos EUA, que eram beneficiadas por esse dinheiro barato japonês. Do dia 31 de julho ao dia 7 de agosto, as sete maiores empresas do setor no país perderam US$ 1,218 trilhão em valor de mercado, segundo Einar Rivero, sócio fundador da consultoria Elos Ayta.

“Os grandes investidores do mundo aproveitaram o momento de grande incerteza e acharam um bom motivo para realizar lucros, principalmente nas ações ligadas à tecnologia”, explicou o economista Alvaro Bandeira, coordenador de economia da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil (Apimec). “A alta dos juros no Japão também contribuiu para isso. E aí lançam, com os dados que saíram, que a economia americana poderia entrar em recessão. Isso assustou o mundo todo, já que a China também está derrapando”, afirmou.

Nvidia perdeu US$ 446 bilhões; Amazon, US$ 254 bilhões; Apple, US$ 187 bilhões; Alphabet, US$ 154 bilhões; Microsoft, US$ 148 bilhões; Tesla, US$ 128 bilhões. Apenas a Meta, dona do Facebook, teve valorização de US$ 36 bilhões nesse período.

A perda supera o valor de mercado de todas as empresas brasileiras na B3, convertidas para o dólar, que soma US$ 826 bilhões. No Brasil, o dólar deu um salto em relação ao real, saindo de R$ 5,72 para R$ 5,85 na abertura do pregão.

Para o País, um dos efeitos da alta do dólar é o impacto sobre a inflação. Isso pode ser observado principalmente nos preços no atacado, que já refletem a valorização da moeda americana ao longo deste ano – antes, portanto, dessa última turbulência.

A inflação medida pelo IGP-DI, da Fundação Getúlio Vargas, saiu de -3,61% no acumulado em 12 meses até janeiro, para uma alta de 4,16% em julho, refletindo a forte valorização do dólar, que começou 2024 cotado em R$ 4,85.

6 a 8 de agosto: Mercados se recuperam

Depois da forte queda no dia 5, a bolsa do Japão subiu 10%, no dia seguinte, recuperando parte das perdas. Desde a divulgação da taxa de desemprego, no próprio dia 2, a economista Claudia Sahm concedeu uma série de entrevistas para defender a sua teoria, de um lado, mas também para tentar acalmar investidores, afirmando que não necessariamente os EUA estão em recessão.

“O aumento da taxa de desemprego em julho para 4,3% levou a regra de Sahm para 0,53 – logo acima do gatilho. Mesmo assim, há boas razões para ver o aumento atual da taxa de desemprego como um exagero da dinâmica recessiva, pelo menos um pouco”, escreveu a economista na rede social X.

Segundo ela, desta vez pode ser diferente, principalmente pelos impactos da pandemia no mercado de trabalho e o aumento da imigração nos EUA. “Já argumentei antes que pode ser diferente desta vez – isto é, a regra Sahm dispara sem recessão. As mudanças abruptas na força de trabalho desde a pandemia, incluindo o aumento da imigração, contribuiriam substancialmente para o aumento do desemprego”, disse.

Declarações de autoridades monetárias do Japão também ajudaram a melhorar o quadro, com a sinalização de que a taxa de juros por lá não vai continuar subindo.

Para o economista-chefe de Austin Rating, Alex Agostini, o mercado se precipitou com a leitura dos dados da economia dos EUA. “Foi um susto momentâneo, não uma mudança estrutural na macroeconomia ou na economia global. Pra mim, o cenário para os EUA ainda é de ‘pouso suave’ sem uma forte recessão. Os riscos são menores do que o que foi compreendido na segunda-feira”, afirmou.

E o Brasil?

No Brasil, o Banco Central divulgou a ata do Copom na terça-feira, dia 7, dizendo que não “hesitará” em subir a Selic em caso de piora do cenário. O tom mais duro agradou investidores, o que também ajudou a reverter as perdas da moeda brasileira. Na sexta-feira, dia 9, o dólar já estava cotado a R$ 5,51.

Mesmo com a melhora dos mercados, os títulos públicos de cinco anos do governo dos EUA, considerados o ativo financeiro mais importante do mundo, despencaram. Isso significa que o mercado está prevendo uma forte queda da taxa americana, acompanhando a desaceleração no país.

Para o Brasil, isso ajuda a valorizar o real e a diminuir o risco de um novo ciclo de alta da taxa Selic. Mas também reflete uma piora de dinamismo na principal economia do mundo – o que poderá afetar o comércio internacional e produtos que o Brasil exporta.

BRASÍLIA – O mercado financeiro mundial passou por fortes turbulências nos últimos dez dias: o índice de volatilidade disparou ao maior nível desde a pandemia, um alerta de recessão nos Estados Unidos foi acionado, a bolsa de Tóquio afundou 12% em um único pregão e o dólar chegou a bater em R$ 5,86 em relação ao real no início da semana.

Nos EUA, as empresas de tecnologia perderam mais de US$ 1 trilhão em valor de mercado – entre elas a Amazon, a Apple e a Alphabet, dona do Google.

Dólar chegou a bater R$ 5,86 em meio à turbulência nos mercados globais. Foto: Agência Brasil

A pergunta que tem rondado a cabeça de economistas, investidores e pessoas comuns por todo o globo é: o que aconteceu para provocar tamanha incerteza? E como isso afeta o Brasil?

Veja abaixo a linha do tempo com dez gráficos mostrando as causas para a instabilidade, que depois foi quase integralmente revertida.

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31 de julho: Banco Central do Japão sobe os juros

Tudo começou no último dia 31 de julho, com a “superquarta” dos mercados financeiros, quando vários bancos centrais importantes no mundo promovem reuniões de política monetária para decidir a taxa de juros. Uma decisão do banco central do Japão, ainda na madrugada do Brasil, pegou os investidores de surpresa.

Desde o colapso do sistema financeiro americanos, em 2008, que provocou um feito cascata sobre várias economias do mundo, o BC japonês mantém os juros zerados ou negativos.

Entre janeiro de 2016 a março de de 2024, os investidores literalmente pagavam para emprestar dinheiro ao Tesouro japonês, com uma taxa de retorno de -0,1%. Em março deste ano, contudo, os juros subiram para 0,1% – e em 31 de julho, o BC elevou novamente a taxa para 0,25%, para combater uma taxa de inflação de 2,6% em junho, em relação ao mesmo mês do ano passado.

Mas por que juros de 0,25% podem causar fortes impactos na economia internacional? O problema é que isso afetou o chamado “carry trade”, um tipo de operação em que investidores internacionais captam recursos em um país e aplicam em outro.

Com o aumento dos juros pelo BC japonês, esse fluxo foi parcialmente revertido, com capitais deixando diversas economias e ativos para buscar rentabilidade no Japão, ainda que com a taxa mínima de 0,25% ao ano.

Isso fez o iene, a moeda japonesa, se valorizar, enquanto moedas de países emergentes, como o Brasil, perderam valor. O aumento dos juros, por outro lado, tem o efeito colateral de pressionar o custo de rolagem da dívida japonesa, que passa de 200% do PIB. Isso alimentou o receio de que o risco fiscal no país possa se agravar.

Para os consumidores japoneses, a incidência de juros “tão altos” é quase uma novidade, já que isso não ocorre desde 2008. Tudo isso foi interpretado pelo mercado como risco.

31 de agosto: BC dos EUA indica cortes, BC brasileiro fica em cima do muro

No mesmo dia 31, o banco central americano, Fed, manteve a taxa de juros no patamar entre 5,25% e 5,5% ao ano pela oitava vez seguida – mas, durante coletiva de imprensa, o presidente Jerome Powell, afirmou que o início do ciclo de cortes estava sobre a mesa na próxima reunião de setembro.

Até então, os receios do banco central e do próprio mercado financeiro estavam focados mais na inflação americana, e menos na possibilidade de uma forte recessão.

Aqui no Brasil, o Banco Central, à noite, manteve a taxa básica de juros (Selic) em 10,5% ao ano, mas endureceu o discurso no seu comunicado. Ainda assim, a decisão do BC foi vista por parte do mercado como “dovish”, ou seja, menos preocupado com a inflação.

Alguns economistas, bancos e consultorias defendiam uma sinalização clara de alta de juros em setembro, por causa da piora das expectativas de inflação no Brasil. Isso ajudou a pressionar o dólar em relação ao real.

2 de agosto: desemprego nos EUA aciona o ‘alarme da recessão’

No dia 2 de agosto, uma sexta-feira, o quadro muda de figura. O índice payroll, que mede a criação de empregos privados formais nos EUA, referente ao mês de julho, veio abaixo do esperado. Já a taxa de desemprego subiu de 4,1% em junho para 4,3% em julho.

Embora ela permaneça baixa, o que preocupa os investidores é a rapidez do aumento – já que, em janeiro, o índice media 3,7%.

Além disso, economistas mais pessimistas com o cenário da economia americana dizem que há vários outros indicadores mostrando uma forte perda de fôlego do nível de atividade.

Um deles seria o aumento da inadimplência no cartão de crédito, que dobrou nos últimos três anos. O índice saiu de 1,54% do total de crédito concedido na modalidade, em julho de 2021, para 3,16% em julho deste ano.

O aumento do desemprego acionou o “alarme de recessão da economia americana”, medido pela “regra de Sahm”. Essa teoria foi formulada pela economista Claudia Sahm, que trabalhou no Fed entre 2007 e 2019. Ela elaborou uma tese para ajudar os governos a prever ciclos de recessão e, assim, conseguir acionar medidas de estímulo, para amenizar o impacto.

Pela “regra de Sahm”, todas as vezes em que a média móvel trimestral da taxa de desemprego nos EUA subiu 0,5 ponto percentual acima da média da taxa de desemprego dos últimos 12 meses, o país entrou em recessão.

O gráfico abaixo mostra as vezes em que isso ocorreu. As subidas do desemprego que cumpriram esse pré-requisito, foram, posteriormente, seguidas por período de recessão (faixa cinza). O receio é que isso vá se repetir agora.

5 de agosto: Bolsa do Japão afunda, índice de volatilidade dispara

Na segunda-feira, dia 5 de agosto, o pânico toma conta dos mercados com a abertura da bolsa japonesa. O índice Nikkei recuou 12%, o maior tombo em 37 anos. Houve também um efeito cascata em várias bolsas da região, como Coreia do Sul (-8,8%), Taiwan (-8,35%), Singapura (-4,07%) e Índia (-2,6%).

Um dos medos dos investidores foi que o Banco do Japão estivesse na contramão do mundo, subindo juros em época de recessão nos EUA – que se espalharia para a economia mundial. Essa desaceleração forçaria um corte mais rápido dos juros pelo Fed, o que diminuiria o diferencial de juros entre as economias dos EUA e do Japão. Com isso, o iene se valorizaria ainda mais, afetando a rentabilidade de empresas exportadoras japonesas.

A queda na Ásia disparou o índice de volatilidade Vix, e o mercado financeiro entrou em “modo pânico”, com investidores buscando ativos mais seguros para se proteger – entre eles, o dólar. O aumento do Vix foi o maior desde a pandemia do novo coronavírus.

A turbulência atingiu em cheio as empresas de tecnologia dos EUA, que eram beneficiadas por esse dinheiro barato japonês. Do dia 31 de julho ao dia 7 de agosto, as sete maiores empresas do setor no país perderam US$ 1,218 trilhão em valor de mercado, segundo Einar Rivero, sócio fundador da consultoria Elos Ayta.

“Os grandes investidores do mundo aproveitaram o momento de grande incerteza e acharam um bom motivo para realizar lucros, principalmente nas ações ligadas à tecnologia”, explicou o economista Alvaro Bandeira, coordenador de economia da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil (Apimec). “A alta dos juros no Japão também contribuiu para isso. E aí lançam, com os dados que saíram, que a economia americana poderia entrar em recessão. Isso assustou o mundo todo, já que a China também está derrapando”, afirmou.

Nvidia perdeu US$ 446 bilhões; Amazon, US$ 254 bilhões; Apple, US$ 187 bilhões; Alphabet, US$ 154 bilhões; Microsoft, US$ 148 bilhões; Tesla, US$ 128 bilhões. Apenas a Meta, dona do Facebook, teve valorização de US$ 36 bilhões nesse período.

A perda supera o valor de mercado de todas as empresas brasileiras na B3, convertidas para o dólar, que soma US$ 826 bilhões. No Brasil, o dólar deu um salto em relação ao real, saindo de R$ 5,72 para R$ 5,85 na abertura do pregão.

Para o País, um dos efeitos da alta do dólar é o impacto sobre a inflação. Isso pode ser observado principalmente nos preços no atacado, que já refletem a valorização da moeda americana ao longo deste ano – antes, portanto, dessa última turbulência.

A inflação medida pelo IGP-DI, da Fundação Getúlio Vargas, saiu de -3,61% no acumulado em 12 meses até janeiro, para uma alta de 4,16% em julho, refletindo a forte valorização do dólar, que começou 2024 cotado em R$ 4,85.

6 a 8 de agosto: Mercados se recuperam

Depois da forte queda no dia 5, a bolsa do Japão subiu 10%, no dia seguinte, recuperando parte das perdas. Desde a divulgação da taxa de desemprego, no próprio dia 2, a economista Claudia Sahm concedeu uma série de entrevistas para defender a sua teoria, de um lado, mas também para tentar acalmar investidores, afirmando que não necessariamente os EUA estão em recessão.

“O aumento da taxa de desemprego em julho para 4,3% levou a regra de Sahm para 0,53 – logo acima do gatilho. Mesmo assim, há boas razões para ver o aumento atual da taxa de desemprego como um exagero da dinâmica recessiva, pelo menos um pouco”, escreveu a economista na rede social X.

Segundo ela, desta vez pode ser diferente, principalmente pelos impactos da pandemia no mercado de trabalho e o aumento da imigração nos EUA. “Já argumentei antes que pode ser diferente desta vez – isto é, a regra Sahm dispara sem recessão. As mudanças abruptas na força de trabalho desde a pandemia, incluindo o aumento da imigração, contribuiriam substancialmente para o aumento do desemprego”, disse.

Declarações de autoridades monetárias do Japão também ajudaram a melhorar o quadro, com a sinalização de que a taxa de juros por lá não vai continuar subindo.

Para o economista-chefe de Austin Rating, Alex Agostini, o mercado se precipitou com a leitura dos dados da economia dos EUA. “Foi um susto momentâneo, não uma mudança estrutural na macroeconomia ou na economia global. Pra mim, o cenário para os EUA ainda é de ‘pouso suave’ sem uma forte recessão. Os riscos são menores do que o que foi compreendido na segunda-feira”, afirmou.

E o Brasil?

No Brasil, o Banco Central divulgou a ata do Copom na terça-feira, dia 7, dizendo que não “hesitará” em subir a Selic em caso de piora do cenário. O tom mais duro agradou investidores, o que também ajudou a reverter as perdas da moeda brasileira. Na sexta-feira, dia 9, o dólar já estava cotado a R$ 5,51.

Mesmo com a melhora dos mercados, os títulos públicos de cinco anos do governo dos EUA, considerados o ativo financeiro mais importante do mundo, despencaram. Isso significa que o mercado está prevendo uma forte queda da taxa americana, acompanhando a desaceleração no país.

Para o Brasil, isso ajuda a valorizar o real e a diminuir o risco de um novo ciclo de alta da taxa Selic. Mas também reflete uma piora de dinamismo na principal economia do mundo – o que poderá afetar o comércio internacional e produtos que o Brasil exporta.

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